Mario Andretti: Legado de família

Por a 17 Novembro 2023 14:24

Ao contrário de outros pilotos, Mario Andretti é um homem absolutamente normal. Não se lhe conhecem vícios nem atitudes de playboy ou atitudes reprováveis. Tipicamente um homem de família, chefe de um clã estreitamente ligado às corridas, apenas cultiva um amor desmedido pelos automóveis

MarioAndretti nasceu a 28 de Fevereiro de 1940, numa família italiana que viva em Motovun, na península de Istria, que então fazia parte da Itália e, após a II Grande Guerra, foi anexada pela Jugoslávia, de acordo com o estabelecido pelo Tratado de Paris; hoje, faz parte da Croácia. O pai de Mario chamava-se Luigi e era um fazendeiro; a mãe tinha o nome de Rina. Mario teve um irmão gémeo, Aldo. Em 1948, a família Andretti integrou o êxodo de Istria e instalou-se num campo de refugiados, em Lucca. Sete anos mais tarde, em 1955, emigraram para a América, estabelecendo-se em Nazareth, mais precisamente no vale de Lehigh: no bolso, tinham apenas 125 dólares. Em 1964, Mario Andretti naturalizou-se norte-americano.

De pequenino…

… Se torce o destino. E o destino de Mario Andretti começou cedo a definir-se: aos dois anos, recorda a mãe Rina, ele e Aldo passavam o tempo na cozinha a arrastar as tampas das panelas pelo chão, fazendo “Vrum! Vrum!” – e, garante, isto ainda sem terem alguma vez visto um carro! Aos cinco, os gémeos já faziam corridas com carrinhos de sabão, pelas ruas da aldeia. Pouco depois, arranjaram um biscate a arrumar carros numa garagem de aluguer – e Mario descreve a experiência de, pela primeira vez, ter posto um motor a trabalhar: “Foi um sentimento que não consigo descrever, sentir o motor a vibrar debaixo de mim, dado à vida pelas minhas próprias mãos. Sempre pensei que um dia iria sentar-me num carro de corrida.”

Esse dia chegou, ainda em Itália, tinha ele 13 anos: a sua estreia foi numa corrida de uma categoria que estava então a começar, chamada Fórmula Júnior. Depois, em 1954, ter visto passar o seu herói, Alberto Ascari, durante as Mille Miglia foi a faísca que faltava.

Mas a paixão teve que ficar em lume brando por uns tempos, pois no ano seguinte a família teve que sair de Itália, rumo ao outro lado do Atlântico. Porém, Mario e Aldo tiveram uma surpresa: mesmo ao lado da sua nova casa, em Nazareth, existia uma pequena pista oval, com piso de terra. Com o trabalho que faziam numa oficina do seu tio, ambos conseguiram o dinheiro suficiente para comprarem, e preparem, um Hudson Hornet Sportsman de 1948. Corria o ano de 1959 e os dois começaram a fazer corridas na região, sem os pais saberem. Venceram por duas vezes mas, antes do final da temporada, Aldo teve um grave acidente e quase morreu. O segredo acabou aqui – bem como a carreira de Aldo, que nunca mais se sentou num carro de competição. Então a solo, Mario fez 46 corridas de stock cars, na categoria Modified, vencendo 21, em 1960 e 1961.

Versátil e sempre com sucesso

A partir daqui e até pendurar o fato de competição e alojar numa vitrina o último capacete – deixou a IndyCar em 1994 mas, em 2000, participou uma última vez nas 24 Horas de Le Mans, a oitava desde que aí se estreou, em 1966 – Mario Andretti nunca mais parou. Rápido, corajoso, estratega – mas acima de tudo versátil, muito versátil. Só isso justifica o sucesso que, da NASCAR à Indycar (sem esquecer as corridas de sport-protótipos e, está claro, a F1), foi colhendo ao longo de uma carreira de décadas.

Na década de 1960, Andretti correu esporadicamente em provas de stock cars chanceladas pela USAC, terminando em 12º em 1965 e, em 1967, ganhando uma corrida e acabando o ano em 7º lugar. Fez o mesmo na NASCAR, onde o seu nome aparece em 14 provas, em quatro anos, tendo ganho a Daytona 500 em 1967, um dos grandes emblemas do automobilismo de competição dos ‘States’.

Esta intermitência teve uma razão de ser: o seu interesse esteve, sempre, focado em provas de monolugares. Depois dos midgets e sprint cars, Andretti quis mais e maior; em duas fases diferentes, correu de forma intensa na Indycar. A primeira, durou dez anos: estreou-se a 19 de abril de 1964, em Trenton, e acabou a corrida em 11º. O seu primeiro triunfo foi logo no ano seguinte, numa pista instalada no Indianapolis Raceway Park; neste ano, foi 3º na Indy 500, resultado que lhe permitiu conquistar o seu primeiro título e sagrar-se como o mais jovem campão de sempre nesta categoria, com apenas 25 anos. Em 1966, revalidou o título, com oito vitórias em 15 provas. Em 1967 e 1968, foi vicecampeão e, em 1969, dominou a temporada, ganhando nove provas, além da Indy 500 e conquistando o seu terceiro título de campeão. Entre 1966 e 1969, participou em 85 corridas de Indycar, vencendo 29.

Em 1973, deixou as provas em asfalto para se dedicar às corridas em pistas de terra, conquistando o título USAC neste tipo de provas em 1974!

Mario Andretti, depois de fazer algumas provas de Indycar enquanto pilotava a tempo inteiro na F1, regressou por completo aos ‘States’ em 1982, com a Patrick Racing. Dois anos mais tarde, já com a equipa Newman/Haas Racing, do seu amigo ator Paul Newman, conquistou o quarto título da sua carreira nos Indycar. Em Phoenix, no ano de 1993, tornou-se o piloto mais velho a ganhar uma corrida nesta competição – tinha 53 anos e 34 dias. No final desse ano, estabeleceu um novo recorde do mundo de velocidade, ao fazer a pole position para a corrida do Michigan à média de 377,029 km/h. 1994 foi o ano do seu abandono: na totalidade, correu em 409 provas de Indycar.

Campeão até na F1

Pelo meio, fez F1. Estreou-se em 1968 e, nos anos seguintes, sempre que os seus compromissos nos Estados Unidos o permitiam, corria no Mundial. Fez vários GP com marcas como a Lotus, a March e a Ferrari – na sua estreia com esta marca, venceu o seu primeiro GP, na África do Sul, em 1971. Porém, a sua primeira temporada completa na F1 aconteceu somente em 1975 – com a equipa norte-americana Parnelli. O abandono desta equipa, depois das duas primeiras provas em 1976, significou o regresso de Andretti à Lotus, onde se manteve até 1980. O primeiro triunfo com a equipa de Colin Chapman foi logo no GP do Japão, no final de 1976. No ano seguinte, com o Lotus 78, ganhou quatro provas e foi 3º no Mundial. O ano da consagração aconteceu em 1978: lutando contra o mais rápido, mas disciplinado, Ronnie Peterson, ganhou seis corridas e conquistou o título – mas foi um título triste, depois de ver morrer, em Monza, Peterson. O último ano com a Lotus foi penoso: o Lotus 81 foi um fiasco tecnológico e Andretti apenas conseguiu pontuar uma vez, na última prova do ano, nos Estados Unidos, onde foi 6º

1981 foi o seu último ano a tempo inteiro na F1, com a Alfa Romeo e foi tão mal sucedido como no ano anterior: apenas três pontos, fruto do quarto lugar na primeira corrida da temporada, curiosamente também nos Estados Unidos. No ano seguinte, decidiu rumar em definitivo a Nazareth. Aceitou o convite de Frank Williams para correr nos Estados Unidos, desistindo e, no final do ano, de Enzo Ferrari para se juntar a Patrick Tambay, na Ferrari: fez a pole em Itália, terminando em terceiro lugar e, em Las Vegas, abandonou, depois de ser sétimo nos treinos.

Repleto de honras

Eleito pela Associated Press e pela revista Racer, em 2000, elegeram-no como O Piloto do Século. Esta foi mais uma das muitas honrarias atribuídas a Mario Andretti. Mas, na verdade, ele está entre os eleitos e entre os poucos que ficaram na história do automobilismo mundial como únicos e fenómenos autênticos.

Andretti é o único piloto a ter ganho a Indy 500 (1969), a Daytona 500 (1967) e o Mundial de F1 (1978). Além disso, é um dos dois únicos pilotos a terem ganho corridas na F1, IndyCar, Campeonato do Mundo de Sport e NASCAR – o outro foi Dan Gurney. É também um dos dois únicos a terem ganho corridas na F1, na categoria principal da NASCAR e a Indy 500 – o segundo é Juan Pablo Montoya. Ganhou ainda corridas de midgets e de sprint, no início da sua carreira – os pequenos e letais carros de chassis tubular, enormes asas e motores com mais de 500 cv que corriam (ainda correm…) em pequenas pistas ovais com piso de terra. Em toda a sua carreira, Andretti conquistou um título na F1 (1978), quatro na Indycar (três sob a égide da USAC, um com a organização da CART) e um no campeonato IROC. No total, venceu 109 grandes corridas, realizadas em pistas de renome.

Finalmente, nenhum piloto norte-americano depois do GP da Holanda de 1978, a última corrida de F1 ganha por Andretti, voltou a subir ao lugar mais alto de um pódio na F1. E foi, ainda, o segundo e o último piloto norte-americano a sagrar-se campeão do Mundo de F1 – o outro foi Phil Hill, em 1961.

Considerado como Piloto do Ano nos Estados Unidos em 1967, 1978 e 1984 – o único a conseguir o feito em três décadas seguidas – entrou para o International Motorsports Hall of Fame em 2001, 11 anos depois de ter entrado para o Hall of Fame norte-americano. No dia 23 de Outubro de 2006 foi-lhe atribuído, pelo governo italiano, o título de Commendatore dell’Ordine al Merito della Repubblica Italiana.

Nome: Mario Gabriele Andretti

Data de nascimento: 28/02/1940 (80 anos)

Local de nascimento: Montana d’Istria, Itália (hoje Motovun, Ístria, Croácia)

Nacionalidade: Originalmente italiano, é hoje norte-americano (naturalizou-se em 1964)

Casado com Dee Ann desde 25 de Novembro de 1961. Dee Ann, natural de Nazareth, era a professora de inglês de Andretti, que apenas falava italiano quando foi para os ‘States’. Tiveram dois filhos, Michael (nascido em 5 de Outubro de 1962) e Jeff (nascido em 14 de Abril de 1964), também eles pilotos de automóveis. Michael chegou mesmo a correr na F1 em 1993, com a McLaren. Hoje, Mario e Dee Ann vivem numa casa perto do seu neto Marco, filho de Michael, em Bushkill Township, na Pennsylvania. Marco, nascido em 13 de Março de 1987, seguiu as pisadas da família e hoje ainda corre na IndyCar Series, onde é um dos principais pilotos.

Subscribe
Notify of
1 Comentário
Inline Feedbacks
View all comments
MC
MC
5 meses atrás

Mário Andretti é decerto um dos maiores pilotos de sempre e um dos mais versáteis, com um palmarés notável.

últimas AutoSport Histórico
últimas Autosport
autosport-historico
últimas Automais
autosport-historico
Ativar notificações? Sim Não, obrigado