“Sai da frente… Almeida!”

É verdade que não há nenhum anzol em pista (apenas o do anel do reboque que, felizmente, desta vez não foi preciso chamar), mas tal como qualquer peixe fora do seu habitat natural, torna-se difícil ‘respirar’ ou, por outras palavras, dissipar as constantes descargas de adrenalina provocadas pela condução de um veículo cuja relação peso/potência não ultrapassa os 2,6 kg/cv e cuja traseira ‘rabeia’ mais depressa uma cobra em perseguição da sua presa. Não é por acaso que Dani Sordo e Sergio Vallejo, dois dos mais conceituados pilotos espanhóis de ralis, volta e meia, não resistem aos encantos da modalidade e, pondo de lado o vedetismo, disputam a corrida de Arteixo, a mais importante de Espanha, capaz de juntar 60 Crosscars no mesmo fim de semana e deixar 20 em lista de espera.

No passado domingo, não havia, em Sever do Vouga, 60 Crosscars – é certo – (eram apenas nove no Troféu Energia Racing), mas havia algo tão ou mais importante para a sobrevivência da modalidade: milhares de espetadores que encheram o anfiteatro natural da pista do Alto Roçário e que por oito euros não trocaram o calmo piquenique familiar de domingo por um agitado almoço de ‘sandes de pó’, enquanto assistiam a verdadeiros recitais de condução em pista.

E é precisamente em pista que as emoções vão mais longe. Se aprender a técnica de domínio de um Semog com motor 600 cc de mota (Suzuki GSX-R ou Honda CBR) é uma questão de prática (o segredo é curvar sempre em aceleração com a dianteira apontada para o apex da curva) e exige apenas a colocação em prática da frase da moda “a mim o medo é uma cena que a mim não me assiste”, para ganhar corridas ou lutar pelas primeiras posições a história já é outra. Um ‘arranque-canhão’ é fundamental, mas tentar evitar toques dos adversários e andar, durante toda a corrida, com o motor sempre a gritar entre as 12000 e as 16000 rotações é também indispensável. Depois, a boa forma física ajuda muito (sim porque direção assistida não está disponível, nem como extra!), mas são sobretudo as muitas horas de treino extracurricular que acabam por fazer a diferença. Se numa jornada do Troféu Energia Racing se anda bastante tempo em pista (sempre são dois treinos cronometrados, três corridas de qualificação e uma Final), para lutar pelas primeiras posições é preciso dedicar muito mais horas a lutar contra o cronómetro, seja para descobrir o set up ideal para cada pista, seja para ganhar ritmo competitivo.

Por tudo isso ou melhor, sem tudo isto, terminar a Final no meio do pelotão – em quinto, a lutar pelo quarto lugar e com o sexto a ‘cheirar’ o nosso escape – acabou por ser, em Sever do Vouga, quase uma vitória. Entre os malabarismos da condução e a tradicional ‘papa de terra’ a que é impossível escapar dentro do habitáculo do Crosscar apoiado pela RP Motorsport, Kumho Tyres, NorteShopping e, claro está, a AutoSport, só apetecia mesmo dizer: “Sai da frente… Almeida!”.

Filipe Pinto Mesquita