Que futuro para a Porsche na F1?

Por a 19 Setembro 2022 08:34

Já existiram muitos ‘divórcios’ na Fórmula 1, e ‘namoros’ que não deram em casamento, mas há muito que não existia um caso com tanto impacto quando este da Porsche com a Red Bull…

Tudo parecia encaminhado para que a Porsche e a Red Bull pudessem protagonizar um casamento de sonho, mas pouco antes da cerimónia os noivos voltaram estranhamente as costas, surpreendendo o paddock.

Desde que se começou a falar do ingresso da marca alemã na Fórmula 1 que esta foi dada como certa nos braços da equipa de Milton Keynes, que não precisava, nem precisa, de um motor para a entrada em vigor do novo regulamento para unidades de potência, em 2026, mas tinha interesse em ter um construtor do seu lado, por uma questão de prestígio e financeiro, claro.

As negociações estavam a decorrer de forma positiva e chegou a ser dado como certo um anúncio oficial da relação no Grande Prémio da Áustria, num circuito e evento da Red Bull, assim como foi dado como provável a revelação em Zandvoort de uma edição especial do Porsche 911, com a assinatura de Max Verstappen.

Nada parecia ser capaz de se intrometer na atracção das duas partes que acabariam nos braços uma da outra.

No entanto, o tempo foi passando sem que nada fosse dito, primeiro porque os regulamentos de 2026 não eram oficialmente publicados, o que aconteceu no dia 17 de Agosto, abrindo a porta para que o casamento fosse anunciado, como era exigência dos responsáveis máximos do Grupo Volkswagen.

Porém, a Audi revelou oficialmente que estaria na Fórmula 1 a partir de 2026 no Grande Prémio da Bélgica, deixando Markus Deusmann (presidente do conselho de administração da marca de Ingolstadt) até escapar que a Porsche teria o seu motor construído pela Red Bull, mas sem que o construtor de Zuffenhausen se chegasse à frente.

Subitamente, os homens da Red Bull, principalmente Christian Horner, colocavam água na fervura, sublinhando que não havia um acordo entre as duas partes até que na sexta-feira do Grande Prémio de Itália a Porsche, tentando salvar a sua face, distribuiu um comunicado onde afirmava que “as duas companhias (n.d.r.: a própria e a Red Bull) chegaram agora conjuntamente à conclusão de que estas conversações não serão continuadas.

A premissa foi sempre que uma parceria seria baseada em circunstâncias de igualdade, o que incluía não apenas uma parceria ao nível do motor, mas também ao da equipa. Isto não pôde ser alcançado”.

E esta é a questão que afastou as duas partes, frustrando um casamento que esteve perto de acontecer.

A Red Bull, catalisada por Dietrich Mateschitz, via como uma boa possibilidade uma parceria a todos os níveis com a Porsche, que se iniciava na Red Bull Techonology – o departamento responsável pela conceção e construção dos chassis da equipa e da Alpha Tauri – e seguia até à divisão de motores – a Red Bull Powertrains.

Porém, esta visão foi perdendo força à medida que as negociações iam avançando e Christian Horner e Dr. Marko se apercebiam no peso da organização que a Porsche pretendia implementar, o que tiraria agilidade a toda a estrutura, algo que sempre foi um ponto forte da equipa de Milton Keynes.

Um dos casos mais evidentes foi a incapacidade da marca de Zuffenhausen poder anunciar o seu projecto de Fórmula 1 sem a publicação do regulamento de motores, uma exigência do Grupo Volkswagen.

Esta era uma indicação clara do peso de uma grande organização e da burocracia que caracteriza o grupo.

Com a Porsche a deter 50% das ações de toda a estrutura, sempre que fosse necessário de um reforço financeiro para qualquer investimento, Horner e Dr. Marko teriam de lidar também com os homens do conselho de administração da marca alemã ao invés de, como até agora, ligarem a Mateschitz para o informarem do que necessitavam, recebendo uma resposta em poucos dias.

Sem a exigência de embarcar numa relação deste género, de igualdade entre duas entidades, os responsáveis da Red Bull contrariaram os desejos da Porsche, oferecendo apenas a possibilidade de esta financiar o programa de motores, pelo que receberiam o seu nome na tampa das válvulas.

Horner e Dr. Marko estavam numa posição de força, com a Red Bull Powertrains, e não precisariam de um construtor para animar os seus chassis, ao passo que a Porsche, sem uma estrutura capaz de poder construir uma unidade de potência para a Fórmula 1, precisava da Red Bull para o seu projecto na categoria máxima.

Para além disso, a Red Bull, que tem um programa de marketing agressivo tendo por base o mundo dos Grandes Prémios, não estava disposta a perder a sua identidade.

Do lado da Porsche, esta pretendia ter uma palavra a dizer em todos os aspetos da estrutura que defenderia as suas cores e, claro, ter a sua parte nos proveitos financeiros da operação, agora que as equipas podem ser um centro de lucro.

Com necessidades tão antagónicas, o casamento que era visto como de sonho, seria um pesadelo, uma vez que as expectativas de ambas as partes nunca seriam alcançadas, e a relação acabou por ceder espetacularmente mesmo antes de ter verdadeiramente começado.

Red Bull e Porsche: futuro divergente

O casamento da Red Bull com a Porsche colapsou ainda antes de ter sido dado o nó, mas a equipa de Milton Keynes tem motivos para estar otimista para o futuro, ao contrário da sua prometida que tem a sua entrada na Fórmula 1 em risco.

A Red Bull decidiu manter a sua independência e não embarcar numa aventura com a Porsche, que tiraria independência e visibilidade, mas a formação de bandeira austríaca está na confortável posição de não precisar da mítica marca germânica para poder animar os seus chassis.

Com a edificação da Red Bull Powertrains, Christian Horner e Helmut Marko não precisam de um construtor para colocar um motor nas costas dos seus pilotos como tem acontecido até aqui, podendo ser eles a colocar as condições ao invés dos seus potenciais parceiros e foi isso que aconteceu no caso da Porsche, que sem infraestruturas para conceber uma unidade de potência competitiva para a Fórmula 1, estaria sempre nas mãos dos desejos da Red Bull.

A equipa de Milton Keynes, em último caso, tem a capacidade para se apresentar sozinha nas grelhas de partida do Campeonato do Mundo de 2026, tendo já colocado nos seus novíssimos bancos de potência uma primeira versão do motor de combustão interna que usará no novo ciclo regulamentar.

Mas existem outras possibilidades para o futuro da Red Bull.

A Honda parece cada vez mais interessada em regressar à Fórmula 1, depois de ter anunciado o seu afastamento oficial da categoria a partir deste ano.

Os japoneses têm como ‘modus operandi’ conceber os seus próprios motores no Japão para depois os fornecer às equipas suas parceiras, como aconteceu com a McLaren, Red Bull e Alpha Tauri desde que voltou ao mundo dos Grandes Prémios desde 2015.

Esta abordagem não necessitaria da Red Bull Powertrains, mas de acordo com os rumores que correm no paddock, a Honda estaria disponível para deixar a conceção e construção do motor de combustão interna ao novo departamento da formação de Milton Keynes, ao passo que o sistema híbrido seria desenvolvido em Sakura, no país do Sol Nascente.

Porém, Helmut Marko tem vindo a fazer ondas sobre a quantidade de contactos que a Red Bull tem vindo a receber de construtores automóveis, indagando a possibilidade de haver uma parceria.

Com as novas instalações, a estrutura das bebidas energéticas é uma solução apetecível para qualquer marca que queira ingressar na Fórmula 1, ou continuar com papéis diferentes dos atuais.

Um casamento com a Red Bull seria uma forma barata, uma vez que não precisaria do investimento massivo para construir uma estrutura capaz de construir motores competitivos para a categoria máxima do desporto automóvel.

Um exemplo, que para já não tem sido apontado, é a Alfa Romeo.

A marca italiana vai deixar a Sauber para abrir espaço para a Audi, não tendo ainda decidido o que fazer depois.

Jean-Philippe Imparato, o CEO do construtor de Arese, já afirmou que todas as opções estão em cima da mesa, inclusive ingressar na IndyCar.

No entanto, por pouco mais que aquilo que paga atualmente para batizar a Sauber, poderia assumir o ‘naming’ das unidades de potência construídas pela Red Bull, encontrando-se, em princípio, na luta pelas vitórias e por campeonatos.

Como se pode perceber, a Red Bull está numa situação de força, podendo ditar os seus próprios termos a quem quer que esteja interessada embarcar consigo numa aventura na Fórmula 1, mas a sua presença nas grelhas de partida está garantida. Já a Porsche tem uma situação bastante diferente…

A Porsche está condicionada

Sem a Red Bull, a Porsche não tem o seu futuro na Fórmula 1 assegurado, podendo até existir o risco de todo o projeto implodir.

A marca alemã apostava “todas as suas fichas” numa parceria com a estrutura de Milton Keynes, sendo esta a responsável por conceber e construir, inclusivamente, as unidades de potência, uma vez que a Porsche não tem neste momento a capacidade técnica para edificar um motor de Fórmula 1 competitivo a tempo de 2026, quando o novo regulamento entra em vigor.

Encontrar uma equipa com quem possa juntar forças para se bater na grelha de partida mais difícil do mundo, não sendo uma tarefa fácil, é possível e não será por aí que a Porsche deixará de entrar no mundo dos Grandes Prémios.

Neste momento, existem quatro equipas sem ligações óbvias a um grande construtor – a Alpha Tauri, a Haas, a McLaren e a Williams.

A McLaren já mostrou, nas suas negociações com a Audi, que não está interessada sem ceder o seu capital a uma marca de automóveis a qualquer custo, podendo ser uma opção muito cara para a Porsche.

Para além disso, no grupo existe uma marca de automóveis que concorre diretamente com os produtos do construtor alemão, o que poderá não ser uma situação fácil de resolver, dado que um McLaren Porsche seria uma confusão para o departamento de marketing de Zuffenhausen.

A Haas não seria cara e o seu nome poderia rapidamente desaparecer, uma vez que não tem qualquer peso no mundo das corridas a nível global.

Porém, ao adquirir a formação de bandeira americana o construtor alemão estaria apenas a comprar a inscrição, uma vez que a Haas praticamente compra tudo a fornecedores – chassis, suspensões, caixas de velocidade, etc – o que o obrigaria a realizar um investimento massivo para poder ter a capacidade de poder construir todos os componentes necessários.

A Alpha Tauri seria uma situação semelhante, o que deixa a Williams como a opção mais viável, podendo todo o processo ser facilitado por Jost Capito, que conhece bem os meandros do Grupo Volkswagen.

No entanto, serão os motores a grande dor de cabeça da Porsche, uma vez que não tem os meios para os conceber, construir e desenvolver.

Uma das opções seria edificar a infraestrutura para o fazer, mas isso é caro e demora tempo, principalmente, no período em que vivemos, em que a falta de matérias-primas estão a criar problemas de fornecimento de diversos componentes.

Outra possibilidade seria a Porsche contratar uma empresa especialista para a construção da sua unidade de potência. Rapidamente surgem nomes que poderiam dar conta do recado sob a batuta dos técnicos alemães, como seria o caso da Cosworth ou AVL, tendo a empresa austríaca já trabalhado com a Honda, Ferrari e Red Bull, o que lhe garante uma ideia clara do que é necessário para fazer um motor de Fórmula 1 competitivo.

A Porsche poderia ainda pegar na unidade de potência que a Audi construirá para o seu projeto. Inicialmente, foi decidido entre as duas marcas cada uma ter o seu motor para poderem ser o mais competitivas possível, mas a situação mudou e poderá haver uma reavaliação.

Contudo, a marca de Ingolstadt faria sempre a unidade de potência de acordo com os seus interesses, o que deixava a Porsche numa situação difícil quanto à competitividade do seu monolugar.

A marca alemã tem algumas soluções para continuar com o seu projeto na Fórmula 1, mas todas elas são de recurso e muito aquém do potencial inicial do seu desejado casamento com a Red Bull.

Veremos se os responsáveis da Porsche estão determinados em garantir um lugar na grelha de partida do Campeonato do Mundo de 2026.

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