Está a categoria TCR a perder fôlego?

Por a 11 Março 2020 15:23

Por Sérgio Fonseca

À primeira vista pode parecer que sim. A decisão inesperada da Volkswagen e da Audi em parar abruptamente o lançamento dos seus novos carros para mais popular categoria de carros de Turismo da actualidade, o progressivo desaparecimento de algumas marcas, a ameaça da proeminência dos carros eléctricos e as dificuldades por qual está a passar a Taça do Mundo FIA de Carros de Turismo (WTCR) passam exactamente essa imagem distorcida de uma categoria que, ao contrário das aparências, não está em debacle.

Quando o conceito idealizado por Marcello Lotti se materializou em 2015 existiam apenas três carros: o SEAT Leon TCR DSG (versão praticamente idêntica ao modelo utilizado na Supercopa), a primeira geração do Honda Civic Type-R TCR (construídos pela JAS Motorsport com muito do que sobrou do modelo ex-WTCC) e o muito mal nascido Ford Focus TCR (que haveria mais tarde de ter uma segunda vida, igualmente sem sucesso). A partir daí assistiu-se a um “boom” de novos carros, uns saídos dos departamentos de “customer racing” dos grandes construtores e outros de garagistas entusiasmados com a possibilidade de criar um produto para as grandes massas. Ao todo, quinze marcas têm hoje carros homologados para a categoria TCR.

Após um longo interregno em que não houve uma regulamentação à medida das necessidades das competições nacionais de carros de Turismo, este conceito TCR apareceu para colmatar esse espaço. Lotti e o seu WSC Group rapidamente trataram de expandir a sua ideia, tendo sido recebida de braços abertos em vários países e regiões, um pouco por todo o globo, totalizando um número superior à vintena de campeonatos. Com a incapacidade da FIA em encontrar uma solução melhor após o fiasco dos TC1, até o mundial se serviu deste regulamento técnico a partir de 2018 para se reabilitar.

Como todos os fenómenos de automobilismo, os preços dos primeiros TCR praticamente duplicaram em relação a hoje, embora rapidamente tenha sido estabelecido um limite máximo do preço de venda para todas as viaturas (150,000 euros). Porém, ao contrário, dos seus antecessores Superturismos ou FIA S2000, o TCR foi sabiamente pensado para as equipas privadas e não para os construtores. Com as limitações técnicas impostas desde o princípio, as marcas cedo perceberam que este regulamento não era terreno fértil para jogos de engenharia mas tinha todas as condições para ser favorável a um modelo de negócio rentável para os departamentos de competições. E assim foi.

TCR Europa cresce a olhos vistos…

O recém sair de cena da Volkswagen e da Audi não foi provocado pela falta de interesse na categoria ou queda nas vendas, mas sim por uma mera questão política de um grupo muito fustigado pelo “Dieselgate”. Ambas as marcas continuarão a prestar assistência técnica e a vender material aos seus clientes enquanto a vida útil do Golf e o RS 3 LMS durar. Por seu lado, a Opel abraçou o TCR ainda no tempo da administração da General Motors, agora sob o sombreiro do Grupo PSA é natural que não vá querer pisar o terreno onde está a “prima” Peugeot. Os projectos da KIA, Subaru, Ford ou FIAT, todos eles lançados por estruturas privadas, nunca ganharam tracção e ninguém ficou admirado em vê-los desaparecer.

Definitivamente, para as administrações das grandes marcas, o que está em voga é o carro eléctrico, e não podemos ignorar quanto o automobilismo navega sabor das tendências do mercado automóvel. Não foi por acaso que o Eurosport Events, a entidade promotora do WTCR, lançou este ano o PureETCR, que não é muito mais que “uma versão electrificada” do TCR elaborada pelo mesmo grupo de pessoas. Contudo, nos próximos anos, estes carros eléctricos de competição, além de serem extremamente complexos de colocar em pista, requerem também budgets incomportáveis para um comum concorrente privado.

Depois da MG ter aparecido surpreendentemente o ano passado, este ano a Cupra terá um novo carro e a Mazda finalmente vai juntar-se à festa. Várias outras marcas estão atentas ao que se passa e passará na categoria nos próximos anos. Por isso mesmo, Lotti e seus pares não têm estado a dormir em cima do êxito alcançado e continuam apostar em levar os TCR a novos mercados. O TCR Austrália foi um retombante sucesso à primeira e para este ano está previsto o arranque do TCR South America, em mais uma tentativa de entrar no importante mercado sul-americano.

A facilidade em trabalhar nestes carros, o acesso a um mercado global, o BoP relativamente consensual e a estabilidade dos regulamentos são trunfos que dão garantias que o TCR está a ficar. Por outro lado, este é ainda um produto que oferece viaturas visualmente apelativas e capazes de proporcionar corridas interessantes para os espectadores. Caso as marcas virem as costas à competição com motores a combustão, o que não acontecerá à “competição cliente” a curto prazo, o que não faltarão é preparadores interessados em ocupar esse espaço. O sucesso obtido pela Romeo Ferraris com o pequeno Alfa Romeo Giulietta, tanto em termos de resultados em pista, como comerciais, serve como exemplo que um projecto privado bem montado pode nesta categoria ombrear com o que melhor fazem os grandes construtores.

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