Miguel Ramos: O prémio merecido na trigésima época

Por a 17 Novembro 2020 13:00

Dois portugueses num McLaren da Teo Martin Motorsport. Uma fórmula de sucesso que resultou em 2015 e que cinco anos depois voltou a resultar. Miguel Ramos foi campeão do GT Open, na companhia de Henrique Chaves e celebrou da melhor forma a sua trigésima época de competição.

Miguel Ramos falou ao AutoSport sobre a época fantástica que viveu com Chaves no GT Open, competição que foi dominada pela dupla lusa de fio a pavio. Um dos pilotos mais experientes teve de aguentar a pressão da última corrida que ficou decidida de forma caricata, mas com justiça a ser feita, como referiu Ramos:

“ É um prémio pelo trabalho que eu e o Henrique fizemos ao longo do ano. Fomos os mais consistentes, estivemos sempre à frente e esta consistência permitiu-nos vencer apesar da intempérie que nos criaram na última corrida, com um comportamento pouco ético por parte dos nossos adversários. Mas apesar disso, conseguimos vencer pois tínhamos mais pontos conquistados até ali. Poderia ter sido uma injustiça pois aquele incidente fez com que não marcássemos qualquer ponto na última corrida, mas felizmente o trabalho feito permitiu que levássemos a melhor. Durante todo o fim de semana estiveram mais preocupados connosco do que com eles próprios e a certo ponto não aguentaram a pressão, nós aguentamos e vencemos.”

O tão falado incidente nos últimos momentos da prova deixou um amargo de boca aos portugueses que lutaram de forma limpa até ao final, mas que viram os seus adversários fazerem jogo sujo:

“Custou-me imenso ver aqueles comportamentos e ficou claro que havia uma estratégia montada. O Stephane Ortelli devia ter vergonha pois já é um piloto experiente, bastante prestigiado, com uma carreira impressionante e fez o sujo papel de perder tempo já com uma volta de atraso, esperando que o colega de equipa se aproximasse. Mesmo assim consegui passá-lo. Depois o Vincent Abril perdeu a cabeça, pois faltava apenas um minuto e vinte para o fim da corrida e sabia que não bastava ultrapassar, tinha de me ganhar dois segundos pois tinha o handicap de penalização porque não cumpriu com o tempo na troca de pilotos. O toque que me deu não foi de luta porta com porta, pois ele bateu-me na traseira do carro. Na volta anterior já tinha tentado e saiu completamente fora de pista no final da reta interior. “

“Eu estava algo nervoso com esta situação. Sabia que tinha a corrida sob controlo e sabia que ritmo colocar de forma segura sem arriscar nada. Ele estava mais rápido que toda a gente pois eles usaram uma estratégia de pneus novos no último stint e por isso estava mesmo ao ataque. O primeiro momento que me deixou apreensivo foi quando a equipa me avisou que o Ortelli estava à minha espera, pois estava a perder muito tempo. Mais ainda quando percebi que ele estava a ser maldoso e por exemplo, levantava o pé a meio da curva três que é feita sempre em aceleração, com o intuito de eu perder o carro. Tinha de ter muito cuidado na ultrapassagem pois se ele me atirasse fora eu perdia a corrida e o campeonato mas o companheiro de equipa dele lucrava. Quando começou a ver bandeiras azuis começou a aumentar o ritmo mas para mim foi otimo pois com aquele andamento o colega não chegaria a alcançar-me. A equipa deve ter reparado isso e ele voltou a baixar o andamento, mas ele cometeu um erro e consegui passar. Bastava-me seguir sem cometer erros mas infelizmente cometi um e o Abril aproximou-se. Como sabia que ele tinha dois segundos de penalização estava relativamente tranquilo e numa tentativa de ultrapassagem ele foi demasiado ambicioso e travou tarde demais, eu fiz-lhe uma cruz e fiquei convencido que ele nunca mais me passava. Sabia que a pista tinha apenas dois locais de ultrapassagem e que estávamos na última volta. Se ele me passasse iria atrás dele e nunca perderia dois segundos. Nunca imaginei que ele tentasse uma ultrapassagem naquela curva.”

A estratégia maldosa dos adversários resultou em momentos de alta tensão no final e impediram os merecidos festejos:

“Quando entrei na gravilha o meu engenheiro disse que o campeonato estava ganho. Mas quando sai do carro queria matar toda a gente. Na boxe ainda demorei meia hora a tirar o capacete, pois a adrenalina e a raiva eram imensas, apesar do meu engenheiro, o Henrique e o Teo Martin me dizerem que a penalização era óbvia. Sei que eles apelaram e acho que não faz sentido outra decisão que a que foi tomada, mas se acontecer algo diferente é a descredibilização total do campeonato. Aquilo foi premeditado e começou logo na manhã de domingo, na qualificação, pois o Louis Prette parou o carro no terceiro setor à espera do Henrique para atrapalhar a volta e temos imagens. Perderam completamente a cabeça. E no sábado o Prette já tinha dado um toque ao Henrique, que segurou o carro e não foi à gravilha. Nós tínhamos um plano bem delineado. Só tínhamos de fazer a nossa corrida sem nos metermos em guerras pois eles é que tinham de correr atrás do prejuízo. Mas naquele incidente de sábado a vontade era o Henrique ter ripostado e tê-lo colocado fora, porque bastava isso para ficarem arredados do título. Se pensássemos como eles para nós bastava ter feito isso e era muito mais simples. “

“Não contávamos era com esta triste situação pois gostava de ter festejado, gostava de ter ido ao pódio e não fui. É uma mágoa que fica pois gostava de ter celebrado e não foi possível. Merecíamos ter vencido aquela corrida em Barcelona pois assim passava o Andrea Montermini, que tem o recorde de vitórias na competição, pois ficava com 21 vitórias e isso era o meu objetivo naquela corrida.”

Parecia que estava escrito nas estrelas. A vontade de fazer dupla com Chaves não foi atendida à primeira, mas a Pandemia mudou o cenário e o resultado é o que se conhece:

“Não estava previsto isto, mas a pandemia deu esta oportunidade. Eu queria fazer dupla com o Henrique, mas os planos do Teo Martin eram diferentes e passavam pelo Henrique correr com um piloto inglês e eu fazer dupla com o Fabrizio Crestani. Mas com a pandemia decidiu colocar apenas um carro em Pro e o Teo escolheu-me a mim e ao Henrique, o que me deixou muito satisfeito. Creio que os astros se alinharam e foi um campeonato sem espinhas, muito bem gerido quer na estratégia, quer nos handicaps, quer na forma como extraímos a capacidade do Henrique. Ele é muito rápido é um piloto com elevadíssimo potencial, ainda é muito jovem. Apesar de tudo tivemos alguns azares. Na segunda corrida em Budapeste a entrada de um Safety Car perto do fim tirou-nos a vitória. Em Paul Ricard cometemos um erro nas boxes com o tempo de handicap que nos custou também a vitória. Mas os azares fazem parte e os outros também com certeza tiveram azares.”

Apesar do orgulho que sente por ter conquistado mais um título para Portugal, Ramos começa a pensar na reforma:

“Este ano os atletas portugueses estão em grande em várias disciplinas. Tem sido uma mão cheia de projetos vencedores. Sinto orgulho por também ter conquistado este título, mas já estou velhote. Quando fui ao pódio, com o Prette e o Abril a soma dos anos deles dá 45 e eu tenho 49. Eu olhava para eles e pensava `isto devia ser como no golf e devia ter um handicap a meu favor`. Para o ano provavelmente não farei nada em Pro e talvez faça em Pro Am. Tenho de passar mais do stress para a diversão. O Pro Am no Blancpain é um projeto exigente e difícil pois há boas equipas e são tripulações de dois Am e um Pro e pela dificuldade torna-se aliciante. No GT Open em Pro Am não custaria tanto, por causa do sistema de handicap à classe, pois com isso nunca se pode ganhar o campeonato à geral. Tenho de esperar para ver o que surge. Todos os anos digo que é o último e depois aparece um projeto que me motiva. Este ano estive até para não fazer por causa disto da pandemia, mas o Teo Martin convenceu-me e apresentou um projeto interessante com o Henrique que era o que queria. Estou convencido que se parar não volto mais, pois é preciso treinar seriamente todos os dias e conheço-me, se não tiver o objetivo das corridas não treino todos os dias. Vamos ver. Se surgir um projeto interessante com o Henrique acho que sim faço mais um ano. Se não for com ele tenho de ponderar bem. Vai depender muito também da evolução da pandemia. Para ser sincero não penso ainda no próximo ano e estou mais concentrado na evolução desta situação.”

Mais um ano em cheio para Miguel Ramos que voltou a mostrar a sua classe dentro e fora de pista. Esperemos que para o ano a dupla portuguesa volte às pistas para nos dar mais alegrias

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