Há exatamente 30 anos, Didier Auriol tornava-se no 1º Campeão do Mundo francês…

Por a 23 Novembro 2024 10:14

Há exatamente 30 anos, a 23 de novembro de 1994, Didier Auriol tornou-se no primeiro Campeão do Mundo de Ralis francês. Como sabemos, depois disso, outros dois franceses acrescentaram 17 títulos a essa contabilidade, mas o primeiro foi bem especial…porque não foi nada fácil e sucedeu depois de uma das provas mais ‘desastradas’ da carreira do francês no WRC.

FOTOS Arquivo AutoSport, Martin Holmes e Oficiais

Foi a 23 de novembro de 1994, no RAC, País de Gales, no troço de Gartheiniog. Carlos Sainz tinha-se despistado no troço anterior, Dyfi, deixando Didier Auriol livre para conquistar o título.

30 anos volvidos, Didier foi convidado para participar no Rali do Japão na categoria Nacional ainda e sempre com Denis Giraudet ao lado.

Recordando o Rali da Grã-Bretanha de 1994, pela primeira vez em 18 anos, um vencedor ‘caseiro’, Colin McRae!

Como referimos, as esperanças de Carlos Sainz de um terceiro título mundial desapareceram quando saiu da estrada e quem aproveitou foi um surpreendido Didier Auriol. Poucas pessoas tinham conquistado um título mundial depois de um rali tão desastroso!

Didier Auriol começou a prova com 11 pontos de vantagem sobre Carlos Sainz e só precisava de percorrer o traçado para afastar qualquer esperança que o espanhol pudesse ter de o desafiar. Mas as coisas correram sempre mal na prova. Mas teve sorte, pois pode realizar o seu sonho, quando o Subaru de Sainz, então em segundo lugar, saiu da estrada, perdeu quase 40 minutos e abandonou.

Depois de um rali cheio de atribulações, o francês foi o surpreendente Campeão do Mundo. Teve uma prova extraordinária: perdeu quatro minutos no primeiro dia depois de ter batido numa pedra, dez minutos quando saiu da estrada e, no segundo dia, mais quatro minutos quando o turbo falhou. “Para mim, o evento perfeito é quando conduzo na perfeição para ganhar.”

Kankkunen lutou arduamente para bater Sainz – tudo fez parte da batalha para ajudar Auriol a conquistar o título.

Tornar-me campeão nestas circunstâncias é fantástico, mas não me estou a queixar!”

Recordando o rali, o piloto da Ford, François Delecour, saiu da estrada num troço, ficou desorientado, cortou uma grande parte do percurso da especial e foi excluído. A sua equipa protestou contra a penalização, mas foi-lhe vedada a possibilidade de recomeçar na manhã seguinte. No segundo dia, Richard Bums, saiu da estrada na PEC9, bateu numa pedra e partiu a suspensão. A Ford entrava no último evento do seu programa projetado para o Campeonato do Mundo, o único sinal promissor foi o terceiro lugar de Bruno Thiry no seu primeiro RAC de sempre: Delecour regressou a casa em desgraça, Miki Biasion sofreu mais uma vez uma falha de motor. No último dia, Wilson saiu de estrada. À medida que Auriol se deparava com problemas atrás de problemas, poucos previam que conseguisse manter a liderança do campeonato. A certa altura, estava em 94º lugar na geral, mas o francês não se deixou abater. Continuou a um ritmo que considerava seguro e tornou-se evidente que o oitavo lugar no final era possível. Com Sainz seguro no segundo lugar, a situação da Subaru parecia segura, especialmente se, como último recurso, pudessem dizer a McRae para abrandar e deixar Sainz subir artificialmente para primeiro. Este cenário mediático foi evitado quando o espanhol saiu da estrada e, no final da prova, Auriol estava meia hora atrás dos líderes, mas era o novo Campeão do Mundo!

A história de Didier Auriol

De motorista de ambulâncias, a Campeão do Mundo de Ralis. Chama-se Didier Auriol, e muito antes da era “Sebastiânica”, de Loeb e Ogier, os ralis mundiais conheceram um simpático francês, que começou a dar nas vistas no Rali da Córsega, onde os franceses davam cartas, já que, para os finlandeses, os grandes senhores dos ralis de então, a prova tinha muitas curvas, não tinha saltos e era em asfalto.

Auriol estreou-se no WRC em 1984, precisamente na Córsega, um rali que se tornou na sua ‘quinta’ preferida e onde venceu…seis vezes. Antes disso, tinha largado o seu emprego na condução de ambulâncias, onde os ‘cronos’ eram importantes, mas as vitórias eram sempre dos pacientes a precisar de ajuda.

Começou no Mundial em 1984, mas daí até 1986, só participou na Córsega, desistindo nas três participações. No ano da revolução no WRC, em 1987, obteve os primeiros pontos, ao alcançar o oitavo posto na Córsega e o quarto no Sanremo, sendo que no ano seguinte, 1988, venceu pela primeira vez, aos comandos do Sierra Cosworth. Passou para a Lancia, em 1989, e logo começou a lutar pelas vitórias, inclusivamente em pisos de terra, onde os franceses ainda não faziam face aos finlandeses.

Seis vitórias num só ano

Apesar de bons anos com a Lancia, tendo mesmo vencido por seis vezes em 1992, só com a Toyota em 1994 chegou ao almejado título mundial. Nesta fase da sua carreira, Auriol não sabia, mas já tinha alcançado 80% das vitórias que conseguiria no WRC, pois daí até 2005, ou 2003, quando correu pela equipa oficial da Skoda, só voltaria a vencer mais quatro vezes, uma vez em 1995, e outras tantas em 1998 e 1999, sempre com a Toyota, sendo que a sua derradeira vitória teve lugar, em 2001, já com a Peugeot, no Rali da Catalunha.

Empurrão a Sébastien Loeb

Pelo meio, alguns anos sem ‘volante’ oficial (1996 e 1997) a tempo inteiro, mas o regresso da Toyota com o Corolla, foi um bom novo fôlego para o francês, que tinha nesta fase grandes adversários. Tivesse Sébastien Loeb tido metade dos valorosos oponentes de Auriol ao longo destes anos, e muito provavelmente não somaria tantos títulos. Aliás, Auriol diz isso mesmo: “No meu tempo o Loeb não ganharia tantos ralis, já que os iria dividir com o Colin McRae, Carlos Sainz, Tommi Makinen, comigo e estou certo que nunca venceria de forma tão fácil como sucedeu muitas vezes.”, referiu o francês que chegou a dar um empurrão a Loeb: “Cheguei a apoiá-lo, patrocinei um Toyota Corolla com que correu, mas asseguro-vos que não contribuiu mais para que ele chegasse onde chegou.”

Condutor de ambulâncias

Condutor de ambulâncias ou piloto de ralis não é assim tão diferente. A ideia é ir de A a B sem perder tempo e o mais depressa possível. Que o diga Didier Auriol.

Bom, convenhamos que há diferenças: no segundo caso, é preciso fazer isso por várias vezes e é a soma de todas essas partes que leva à vitória. Ou não!Didier Auriol conseguiu o feito por 20 vezes no WRC e, aqui, carimbou a medalha do título de Campeão do Mundo com o seu nome, em 1994. Mas como foi chegar até lá?Deixemo-nos então de conversa fiada e vamos ao percurso deste que foi o primeiro piloto francês a sagrar-se Campeão do Mundo no WRC, em 1994, fez agora 20 anos, no ano que terminou há pouco.

Didier Auriol era o condutor da ambulância lá da terra (Millau,uma pequena vila da região pirenaica, onde o turismo e os vinhos são a sua maior fonte de rendimentos) quando se embeiçou pelos ralis, estreando-se aos 21 anos, com um pequeno Simca 1000 Rallye. Em 1982, ao volante do seu lendário Ford Escor tRS 2000 cor de rosa e patrocinado pela Lavabre Cadet, uma casa fabricante de luvas existente em Millau, ganhou a sua primeira prova – o RallyeduQuercy, batendo para isso 109 adversários. No ano seguinte, com um Renault R5A lpine, foi o primeiro na Categoria 2 no Rallyed esGarrigues – e, no final do ano, foi eleito “Espoir de l’Année” [A Esperança do Ano] pela conceituada revista Échappement.

E esta publicação, principalmente dedicada às competições realizada em solo gaulês, até tinha razão: em 1984, Auriol entrou na sua primeira prova do WRC, o Tour de Corse, mas desistiu com problemas no turbo do Renault 5 Turbo. Repetiu a experiência consecutivamente nos anos seguintes, abandonando em 1985 e 1986 e classificando-se em 8º em 1987. Neste ano, tinha já ganho o Campeonato francês e preparava-se para repetir o feito por duas vezes mais, em rápida sucessão. Até que, em 1998, na sua quinta participação na prova e oitava no WRC, surpreendeu tudo e todos ao vencer, batendo para isso, com o Ford Sierra RS Cosworth oficial, a ‘armada’ da Martini Lancia, com Yves Loubet (2º) a Bruno Saby (3º), reputados especialistas da prova, a acompanhá-lo no pódio. Uma façanha tanto mais impressionante, quanto o seu colega de equipa, um tal Carlos Sainz, que também estava a começar nestas coisas do WRC, terminou ‘só’ em 5º lugar, atrás do BMW M3 de outro ‘local hero’, François Chatriot.

Piloto profissional… e ganhador

Depois desta vitória, a carreira de Didier Auriol apenas poderia ir dar a um caminho – o que levava ao Olimpo do WRC. Em 1989, conseguiu o seu primeiro contrato a tempo inteiro – e logo com a Martini Lancia, cujos responsáveis deixara de boca à banda na ilha natal de Napoleão Bonaparte. Nesse ano, fez seis provas – mas repetiu o triunfo na Córsega. E, em 1990, falhou o título no WRC, sendo batido por Carlos Sainz. Mesmo assim, ganhou mais três provas (e outra vez a Córsega, pela terceira vez seguida!) – apenas menos uma que o campeão, mas o espanhol fez a temporada na sua totalidade e o francês apenas uma parte.

Com o Lancia Delta Integrale 16V do Jolly Club, o ano de 1991 não correu da melhor forma. Desistiu em Monte Carlo e nem os pódios em Portugal (2º), Córsega (2º), Nova Zelândia (3º), Argentina (3º) e Mil Lagos (2º), ou muito menos o seu único triunfo dessa temporada, em Sanremo, foram suficientes para bater a sua classificação anterior.

E a ‘vingança’ que serviu fria em 1992, em que ganhou seis provas – recorde que apenas acabou igualado em 2004 e batido em 2005, por um certo Sébastien Loeb – continuou a ser insuficiente para ser Campeão do Mundo; na verdade, voltou a ser 3º, com mais cinco vitórias que o ‘vice’, Juha Kankkunen, e duas que o campeão, de novo Carlos Sainz, o seu antigo companheiro na Ford.

Insatisfeito, deixou a Martini Lancia e assinou com a Toyota Castrol Team. Mas, em 1993, embora tenho começado a vencer (no Monte Carlo), voltou a ser 3º no final do ano. A consagração aconteceu em 1994: ao volante do Toyota Celica Turbo 4WD, apenas desistiu por duas vezes (Monte Carlo, acidente e Acrópole, motor) e uma notável regularidade (2º em Portugal, 3º no Safari, vitórias seguidas na Córsega e Argentina, 5º na Nova Zelândia, 2º nos Mil Lagos, terceira vitória do ano em Sanremo e o 6º lugar no RAC) bastou para, finalmente, carimbar o seu nome entre os eleitos no Álbum d’Ouro do WRC. Foi há 20 anos.

Curiosamente, depois disso, a sua carreira sofreu uma queda brusca, nos três anos que se seguiram – apenas ganhou (de novo!) na Córsega, em 1995 e, em 1996, depois da Toyota ser excluída do Mundial, passou por um ano quase sabático, fazendo apenas três provas, em três carros diferentes.

Auriol começou 1997 com um Ford Escort RS Cosworth da R.A.S. Sport, mas parou nos meses seguintes, voltando à ação na Argentina, com um Toyota Celica GT-Four privado (H.F. Grifone SRL). Acabou a prova em 5º e isso parece ter refrescado a memória dos homens da Toyota Castrol Team, que o recrutaram outra vez. Com 40 anos, iniciou uma segunda vida em, com o Corolla WRC, agradeceu a confiança em si depositada, com mais duas vitórias – Catalunya em 1998 e China em 1999.

No final este ano, a Toyota deixou o WRC e, sem alternativas, acreditou no projeto das SEAT Sport, fazendo a temporada de 2000 com o medíocre CordobaWRC. Mesmo assim, conseguiu a proeza de terminar no pódio (3º) o infernal Safari.

Estranhamente, a História tem tendência a repetir-se: a SEAT deixou o WRC no final de 200 e Auriol viu-se de novo sem ‘patrão’ – mas de novo por pouco tempo: a Peugeot Total recrutou-o e, pela primeira vez na sua carreira no WRC, foi piloto oficial de uma equipa francesa. E, uma vez mais, Auriol soube ser agradecido: com o 206 WRC, venceu na Catalunya – assinando a que foi a sua 20ª e derradeira vitória no WRC. Mas, nem isso nem os três 3º lugares no Sanremo, na Córsega e na Austrália, chegaram para ele continuar na marca do leão.

2002 foi mais outro ano quase sabático. Com um Toyota Corolla WRC privado, desistiu no Monte Carlo e venceu (finalmente!) o TMN Rallye de Portugal. Mas, nesse ano, a prova não estava no calendário do WRC – o que, nem por isso,deixou de ser um marco importante na carreira de um piloto que, nas vezes em que nos visitou, nem sempre foi feliz – terminou no pódio em 1990, 1991, 1994 (2º) e 1999 (3º), foi 5º em 1995, 8º em 2001 e 10º em 2000. Nas outras, abandonou…

Finalmente, em 2003 conseguiu aquele que iria ser o seu último contrato como piloto de fábrica. Na Skoda Motorsport, passou mais tempo a ficar pelo caminho do que a terminar ralis. Primeiro, com o Octavia WRC e, na fase final, com o Fabia WRC, de que foi o principal responsável pelo desenvolvimento. E foi (quase) tudo.

A última prova do WRC em que participou foi o Monte Carlo, em 2005 mas, depois disso, como amante assumido de carros históricos e clássicos, fez por várias vezes o Rallylegend – a última delas este ano, em que até venceu, com um CitroënXsaraWRC, carro que nunca pilotou durante a sua carreira no… WRC.

Além disso, Auriol fez ainda algumas provas do IRC, entre elas o Sanremo e o Rali da Rússia, em 2008, desistindo em ambas, com um FIAT Abarth Grande Punto S2000. Em 2006 e 2007, ‘just for fun’, fez o Monza Rally Show.

Nos últimos anos, passou a alugar carros seus a outros pilotos, além de se tornar gestor de pistas de ‘karting’ e de uma unidade hoteleiras de luxo, na bela paisagem da Ilha de Reunião – e pela qual se apaixonou quando, em 1996, aí venceu uma prova.

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