Foi em 2005 que Rui Sousa, então campeão nacional de todo-o-terreno, surpreendeu tudo e todos ao trocar os trilhos poeirentos pelas águas do Tejo. Deixou temporariamente a sua Nissan Navara e aventurou-se num catamarã de motonáutica, numa experiência que, apesar de inusitada, acabou por confirmar a sua versatilidade enquanto piloto.
Na altura, Rui aceitou o convite para participar numa prova do Campeonato Nacional de Motonáutica, trocando o fato de competição por um colete salva-vidas. E não se saiu nada mal: dominou os treinos ao fazer o segundo melhor tempo e liderou a corrida durante três voltas. Só um toque ligeiro numa bóia mais teimosa o afastou da vitória, mas ainda assim garantiu o segundo lugar da sua classe.
“Arranquei bem, percebi que estava a ganhar terreno e arrisquei. Mas as águas começaram a ficar agitadas, e como ainda não tinha muita experiência, preferi não exagerar. Depois, acabei por tocar numa bóia que falhou a trajetória e o barco começou a meter um bocadinho de água”, recordava, entre risos.
Nada que lhe retirasse o bom humor — nem o carinho do público, que assistia curioso à estreia do piloto em “mares nunca dantes navegados”. Um espetador mais espirituoso até comentou: “Olha para ele, parece um miúdo com brinquedo novo. É sempre o último a sair da água!”
Um brinquedo… com 70 cavalos-vapor
Mas que brinquedo! Embora o motor do catamarã tivesse apenas 70 cv — uma fração, comparado com os 300 cv da sua Navara —, a relação peso/potência permitia-lhe atingir os 160 km/h, numa experiência tudo menos fácil dentro de um cockpit minúsculo e exposto aos elementos: “Curiosamente, a condução até é parecida. As curvas são descritas da mesma forma. Só que aqui é preciso ter muito cuidado com o vento para não levantar o bico. Não há travão nem embraiagem, só um acelerador e um comando que ajusta a frente”, explicava Rui Sousa na altura.
O maior desafio, contava, nem era a máquina em si, cujos segredos depressa desvendou, mas sim a força da natureza: “As correntes e o vento são imprevisíveis. Nunca pensei que o vento mudasse tanto de uma volta para a outra. Isso torna o barco instável e obriga a um esforço físico acrescido, até porque a posição de condução não é nada confortável.”
Ralis TT no coração
Apesar da boa prestação e da adrenalina da velocidade sobre a água, Rui Sousa não escondeu onde está o seu coração: “O todo-o-terreno é mais imprevisível. Aqui, depois de se conhecerem os ventos e as marés, torna-se tudo mais fácil. Agora, gostava era de experimentar um Fórmula 1 — o topo da motonáutica.”
Uma competição com muito potencial… e poucos concorrentes
Na altura, a prova disputada em Vila Franca de Xira mostrou tanto o potencial da motonáutica nacional como as suas fragilidades. A falta de pilotos tornava as corridas algo monótonas, cenário que a nova direção da federação prometia combater.
O evento reuniu várias categorias, incluindo: Um Fórmula 1 (extra-competição) com 370 cavalos; Cinco F2 com cerca de 220 cv; Um Fórmula 3; Sete S-850 (a classe onde competiu Rui Sousa); Cinco PR-750, com cascos em borracha e ainda algumas motos de água
Duas décadas depois, esta aventura continua a ser uma das mais curiosas na carreira de Rui Sousa, provando que, para um verdadeiro piloto, o desafio tanto pode vir pela lama dos troços como pela rebentação das águas do Tejo.