Política: Tema de discórdia na Fórmula 1

Por a 8 Fevereiro 2023 12:20

Política e Fórmula 1 são duas coisas que geralmente não se misturam, pois quando isto acontece, os resultados não são bonitos de se ver. Há alguns exemplos que podiam ser dados, mas vamos apenas recordar o caso do Grande Prémio de África do Sul, um evento com tradição no calendário, que foi abandonado após a corrida de 1985 quando a política social discriminatória do apartheid se tornou indefensável.

Um exemplo: Bernie Ecclestone nunca gostou de política. Quando um troféu no pódio do Grande Prémio da Turquia de 2006 foi entregue pelo presidente da República Turca do Chipre, um estado não reconhecido pela maior parte dos países do mundo, a FIA reagiu imediatamente multando os organizadores da prova e quase cancelando o contrato para a prova seguinte. Depois, em 2011, instabilidade política e social levou ao cancelamento do GP do Bahrein. Mas Bernie Ecclestone sempre gostou de dinheiro, por isso a prova árabe depressa regressou ao calendário, em 2012, mesmo com todas as confusões que tiveram lugar desde aí. Há outros exemplos, por exemplo quando Vladimir Putin, Presidente da Rússia, foi ao pódio do GP da Rússia de 2015, depois da ocupação da Crimeia em 2014.

O mundo da F1 sempre procurou viver à margem de marés políticas, fossem elas importantes ou meras questiúnculas, mas por vezes o espetáculo não conseguiu escapar incólume. Foi o caso do GP da África do Sul, que durante anos foi parte do integrante do Campeonato do Mundo de Fórmula 1, mas que em 1985 levou a machadada final. Depois do período da descolonização africana, o sistema de apartheid, que impunha separação total entre brancos e negros, foi perdendo popularidade e levou à retirada forçada da África do Sul de diversas competições, desde os Jogos Olímpicos aos Campeonatos de Mundo de modalidades como cricket, rugby e futebol.

Foi apenas em 1985 que houve reações no mundo da F1. A prova sul-africana foi a penúltima do calendário e Alain Prost já era campeão. As equipas Renault e Ligier obedeceram à lei francesa e boicotaram a prova, enquanto as autoridades brasileiras pressionaram Nelson Piquet e Ayrton Senna para não viajarem para Kyalami, e a federação sueca quase proibiu Stefan Johansson de correr. Com apenas 21 carros presentes e 18 à partida, a corrida não teve grande história e foi dominada por Nigel Mansell. Só depois do final do apartheid, em 1991, é que o GP da África do Sul regressou em 1992 e 1993.

Verão no Hemisfério Sul

Enquanto as corridas europeias paravam no inverno, muitas equipas aproveitavam o verão do outro lado do equador para testar novas soluções técnicas, experimentar novas pistas e ganhar mais alguns prémios monetários. Estas corridas geralmente tinham lugar em janeiro e fevereiro, visitando países como a Argentina, Austrália, Nova Zelândia e, a partir de 1960, a África do Sul.

Os países do sul tinham as suas próprias corridas, onde pilotos locais misturavam máquinas de diversas proveniências, incluindo antigos F1, sport-protótipos de dois lugares e viaturas construídas localmente, os denominados ‘specials’, como o invulgar Netuar-Peugeot e os vários LDS, cópias de monolugares europeus construídas por Doug Serrurier.

O GP da África do Sul foi ressuscitado em 1960 depois de décadas de inatividade, integrando um calendário de corridas locais, onde a maior parte dos pilotos eram sul-africanos e rodesianos (do atual Zimbabwé). East London foi o primeiro palco do evento, que logo atraiu pilotos europeus, para em 1962 passar a contar para o Mundial de F1, encerrando a temporada onde Graham Hill foi campeão pela primeira vez. Em 1965, a corrida passou de Dezembro para Janeiro, e dois anos mais tarde trocou de base de operações, mudando-se para o circuito de Kyalami, nos arredores de Joanesburgo. O evento foi apanhado no meio da guerra FISA-FOCA em 1981 e nesse ano não contou para o Mundial.

Ao contrário do que acontecia na América do Sul e nos antípodas, raramente os pilotos locais conseguiam impor-se face às equipas europeias. O único sul-africano a ganhar o Grande Prémio do seu país foi Jody Scheckter, em 1975, quando era piloto da Tyrrell, depois de ultrapassar Carlos Pace no início da corrida.

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MVM
MVM
7 anos atrás

Parabéns por mais este excelente artigo, JLA. A Fórmula 1 não é apolítica: é um baluarte da sociedade capitalista de consumo, o que lhe confere um cunho claramente político. Mesmo a introdução de motorizações híbridas é uma atitude política, já que a ecologia e a utilização de energias renováveis são preocupações dos sistemas políticos actuais (quanto mais não seja pela necessidade de gerir recursos escassos, como o petróleo). Sendo assim, e porque importa revestir este capitalismo de uma capa humanística por questões de imagem, teria ficado muito mal à F1 aprovar, mesmo que passivamente, um regime como o Apartheid. Só… Ler mais »

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