Circuito de Braga quase a fazer 30: festeja-os com ou sem corridas?

Por a 30 Novembro 2022 12:21

O Circuito de Braga está ‘fechado’ para as corridas, devido a uma ‘luta’ entre as várias entidades interessadas, a Câmara Municipal de Braga, a FPAK, o Clube Automóvel do Minho e os sócios do empreendimento. Procura-se uma solução para o desporto automóvel, numa pista que sempre conviveu com os aviões, tendo sido uma alteração da legislação que levou à situação em que nos encontramos agora. Enquanto as coisas não se resolvem, recordamos a inauguração, que foi “uma Festa Bonita”

Foi assim que o AutoSport definiu aquilo que se viveu, nesse último fim-de-semana de Agosto de há quase 30 anos, na pista traçada em redor do aeródromo das Palmeiras, perto de Braga.

Mesquita Machado (então presidente da Câmara Municipal de Braga), Vasco Sameiro e Alfredo Barros

Numa altura em que o Circuito de Vila Real já tinha desaparecido, vítima da sua periculosidade e que o de Vila do Conde estava prestes a seguir o mesmo caminho, esmagado pelas exigências urbanísticas da zona, corria-se o risco de Portugal ficar apenas com o Autódromo do Estoril como local único para a prática do automobilismo de velocidade. Por isso, a construção de uma pista em Braga foi uma lufada de ar fresco e de esperança para a modalidade.

Depressa o Circuito Vasco Sameiro – uma justa homenagem ao pioneiro local do automobilismo nacional com o mesmo nome – foi considerado como um caso de “justiça” como bem disse então o engenheiro Mota Santos, administrador da Filinto Mota, “concessionário da Citroën e uma das empresas que ao longo dos anos tem marcado uma presença particularmente ativa (…) com o patrocínio a diversas equipas”: “É de uma grande justiça o Norte poder usufruir de uma pista permanente, pois o automobilismo sempre viveu muito dos seus pilotos e do seu público.”

Construído nos terrenos envolventes do aeródromo da Palmeira e sob a égide do Clube Automóvel do Minho, o Circuito Vasco Sameiro tem um perímetro de 3.021metros, com um total de 13 curvas, oito para a esquerda e cinco para a direita e a maior reta – a da meta – com 898 metros de comprimento. O seu traçado é percorrido no sentido contrário ao dos ponteiros dos relógios e tem-se mantido sem alteração ao longo dos anos. Desde 11 de Março de 2008 que possui a Homologação FIA de Grau 3, que lhe permite acolher provas internacionais de GTe de monolugares, como F3000 e semelhantes.

Na primeira sessão de ensaios, que teve lugar poucos dias antes da sua inauguração oficial competitiva e “foi reservada aos pilotos dos troféus VW Polo, Renault Clio e Toyota Iniciados e Nacional de Fórmula Ford”, todos “se revelaram satisfeitos” com o que “pisaram”, embora “reconhecendo e aceitando qua há ainda algo mais a fazer, no futuro, em termos de pormenor, como, por exemplo, o prolongamento dos corretores.”

E, de fato, durante os 20 anos seguintes, a pista de Braga foi evoluindo, de forma consistente e adaptando-se sempre às mais elementares e às mais exigentes nomas de segurança. Por ela, passaram milhares de pilotos; foi palco de provas internacionais, como a Taça da Europa de Carros de Turismo (ETCC), em 2009 e 2010.

Uma volta com… Celestino Araújo

Pista com um muito interessante de média e baixa velocidade, encadeadas e para todos os gostos, o Circuito Vasco Sameiro foi descrito por Celestino Araújo, um dos pilotos do Troféu Renault Clio/GALP como exigindo, na sua parte interior, “uma grande concentração na definição de trajetórias, sendo importante ‘desenhá-las’ bem e fazer o ‘vértice’ no sítio certo, porque as curvas são muito fechadas.”

E, concluindo que “é fundamental ter um bom alinhamento do carro e boas suspensões”, Celestino Araújo iniciou uma volta à pista bracarense: “Depois de fazer a reta da meta em 4ª, reduzo para 3ª na travagem para a direita, fazendo a esquerda da parabólica nessa velocidade e sempre em aceleração até à próxima direita, reduzindo para 2º e procurando aproveitar ao máximo. Volto a engrenar a 3ª e reduzo para 2ª antes de descrever a esquerda e logo a seguir volta à 3ª. Antes da direita que se segue, engreno a 2ª e depois a 3ª, fazendo a reta que antecede a chicane, antes da qual passo à 2ª velocidade, para sair em 3ª e voltar a reduzir para 2ª, exatamente na zona do túnel, descrevendo a parabólica antes da reta da meta nessa velocidade, para passar a 3ª e na meta engrenar a 4º.”

Radiografia do I Circuito de Braga

Prova a prova

O primeiro Circuito de Braga de sempre aconteceu no fim-de-semana de 28 e 29 de Agosto de 1993. Foram dois dias de muitas emoções, repartidas por um total de sete corridas, a saber: Campeonato Nacional de Velocidade, Grupo A, Classe II FISA; Campeonato Nacional Mobil de Fórmula Ford; Troféu BMW M3/Mobil; Troféu Renault Clio/GALP; Troféu VW Polo G40; Troféu Toyota Iniciados. No conjunto, foram 120 os pilotos que inauguraram, nesses dias, a pista bracarense.

Vamos, então, fazer a radiografia dessa emoção, com base nos textos da época. Ou seja, o AutoSport falou assim e disse de sua justiça, sobre o que se passou na (ainda) fresca pista do Circuito Vasco Sameiro – ou, mais prosaicamente, Circuito de Braga.

Troféu Toyota Iniciados: “Paulo Pereira em estreia incólume”

O primeiro piloto a inscrever o seu nome na galeria de vencedores no Circuito de Braga foi Paulo Pereira, que bateu Manuel Conceição e Luís Veloso na corrida do troféu Toyota Iniciados. Prova inaugural da pista bracarense, cuja abertura não podia “ter começado pior, com uma longa série de acidentes que resultaram em muita chapa amolgada mas, felizmente, sem consequências físicas para os pilotos.”

Tudo começou “quando estavam cumpridas seis das 12 voltas que compunham esta quinta corrida da temporada.” Então, “a bandeira vermelha teve que ser mostrada quando Castro Lopo capotou o seu Toyota. Na altura, Charles Flores liderava um extenso grupo, depois de ter passado Paulo Pereia à 4ª volta.” Reatada a prova, para mais quatro voltas, “Charles Flores despistou-se violentamente [no final da reta da meta]”, ficando atravessado à frente de João Ramos, que o não conseguiu evitar. O embate deixou o Starlet de “Flores totalmente destruído (como nunca tínhamos visto)”. Ramos “conseguiu prosseguir, mas muito atrasado”, vindo a terminar em 11º.

Com tudo isto, “Paulo Pereira acabou por subir ao lugar mais alto do pódio e obter a sua primeira vitória”, sofrendo apenas “a oposição de Manuel Conceição, que não o chegou, todavia, a incomodar até cortarem a linha de meta”, separados por 1,273s.

Troféu Renault Clio/GALP: “Vasco Campos esteve ‘muito forte’”

Numa prova que teve 22 concorrentes, “Vasco Campos [que tinha feito o melhor tempo nos treinos] foi o vencedor incontestado da segunda corrida do programa, que dominou de princípio ao fim, embora pressionado por José Araújo.” Ao fim e ao cabo, o resultado final da corrida apenas refletiu “a hierarquia verificada nos treinos, no que diz respeito aos três primeiros [Campos, José e Celestino Araújo], que andaram sempre destacados dos restantes opositores, um grupo constituído por Pedro Lacerda, António Onofre, Pedro Estrela e Jorge Leite.” Na parte final, “Campos e Araújo destacaram-se de Celestino e Jorge Leite ainda conseguiu ascender à quarta posição”, na frente de Onofre, Lacerda e estrela. Esta corrida teve duas partidas, depois de se ter levantado muito pó numa “confusão logo na primeira curva”, com vários pilotos a irem à terra e em que o principal prejudicado foi João Vilar, que ficou “com o Clio algo amachucado.”

Troféu VW Polo G40: “Manuel Barbosa de fio a pavio”

Manuel Barbosa “não deu quaisquer hipóteses aos seus adversários” na corrida que reuniu 16 pequenos VW Polo G40 e que abriu o programa do primeiro Circuito de Braga de todos os tempos: o irmão mais velho de João Barbosa dominou “os treinos e a corrida da primeira à última volta, numa prova pautada por uma certa monotonia.” O pódio ficou completo por Alberto Freitas e Mário Silva, ambos rodando a distâncias respeitáveis e perfeitamente isolados.

Nacional de Velocidade/Gr. A – Classe II – “Jorge Petiz e Leite Faria ‘laureados’”

As jornadas deste campeonato, o único para carros de Turismo existente nesse ano, eram divididas em duas corridas. Antes de Braga, a hegemonia tinha sido total, por parte da equipa TPM/Opel Motorsport, formada por Ni Amorim e Pedro Leite Faria, ambos ao volante dos competitivos Opel Astra GSE. Em Braga, pela primeira vez na temporada, assistiu-se à quebra dessa hegemonia – e logo “na primeira manga”, que foi “verdadeiramente espetacular, com os pilotos a rodarem juntos de princípio ao fim, cabendo a vitória ao piloto do [BMW] M3 [Jorge Petiz], que pressionou Ni Amorim durante toda a corrida, até conseguir ultrapassá-lo.” Na verdade, as coisas acabaram mal para Amorim, que era o líder do campeonato e, saindo de mais uma “pole position”, “comandou sempre […) seguido por [Jorge] Petiz, Pedro Azeredo, Rui Lages, Carlos Rodrigues e Pedro Leite Faria” – autor de uma recuperação, depois de falhar o arranque, que o levou ao último lugar do pódio. Na derradeira volta”, Amorim teve uma “saída de pista, que danificou a direção e a suspensão do Astra, nem chegando a alinhar na segunda manga.” A sua explicação foi simples: “Falhei a travagem.”

E a segunda manga acabou por “não ter história”, pois Leite Faria “arrancou muito bem, ao contrário da primeira vez, e passou Azeredo e Petiz por fora na primeira curva após a meta.” E as palavras do piloto do Astra espelharam bem aquilo que se passou depois: “A partir daí, dei o máximo, para então gerir a vantagem para o Azeredo”. Este, ao volante de um Toyota Carina E, queixou-se no final de algum atraso no acender das luzes dos semáforos, pelo que foi “colhido de surpresa” com tempo gasto nessa operação (mais de sete segundos), garantindo que foi aí que queimou a embraiagem. Mesmo assim, foi segundo, na frente de Petiz que, “com os pneus já degradados”, não conseguiu discutir a posição. Rui Lages (Toyota Carina E) foi quarto, apesar de um “tête”, repetindo a classificação da primeira corrida.

Nacional Mobil de Fórmula Ford: “Vitória contestada de Gonçalo Gomes”

“A estreia da Fórmula Ford em Braga não podia ter corrido pior, com o triunfo de Gonçalo Gomes na pista a sofrer contestação dos seus adversários, por falsa partida. Depois, como se tudo isso não bastasse, dois órgãos mecânicos [restritor de admissão do motor e filtro do ar, respetivamente] nos carros do 2º [João Barbosa] e 3º [Carlos Borges] classificados suscitaram dúvidas, sendo por isso selados para posterior verificação.”

Este foi o resumo feito pelo AutoSport da corrida de Fórmula Ford, que nesta primeira deslocação a Braga conseguiu reunir 27 pilotos, divididos pelos motores de 1600cc e 1800cc. Sobre a conturbada prova, e como sempre, o AutoSport estava lá e José Ribeiro, o escriba de serviço, garante ter assistido a tudo: “(…) no momento da largada, segundo nos foi possível observar, Gonçalo Gomes terá feito falsa partida para se colocar no comando dos acontecimentos da primeira à última volta.” Uma liderança que se revelou definitiva, apesar de “durante as 16 voltas da corrida” todos terem esperado “pacientemente” por “uma possível penalização” que não veio. O que justifica a declaração de que, nessa prova, “a desatenção [dos comissários desportivos] foi o prato forte.” No final, João Barbosa ficou “numa longínqua segunda posição” e a sua equipa decidiu “apresentar uma reclamação à Direção da Prova (juntando um cheque de 250 contos, posteriormente devolvido).”

Desportivamente “muito insossa, com grandes diferenças entre os primeiros, sobretudo depois do despiste de Sande e Castro na 9ª volta”, a prova valeu pela “luta dos carros de 1600cc, onde foram intervenientes Rosário Sottomayor e Nelson Basto” e onde também esteve envolvido Carlos Azevedo, com um carro de 1800cc. “Na última volta, Basto conseguiu suplantar, pela primeira vez, Sottomayor, quando esta se viu prejudicada na dobragem de Tiago Rodrigues.”

Troféu BMW M3/Mobil: “António Barros bisa vitória”

Esta foi uma das melhores corridas do programa, conforme atesta a posa do AutoSport: “Numa corrida bastante animada, a encerrar o programa de estreia da pista bracarense, António Barros, depois de um aceso duelo com António Rodrigues, venceu pela segunda vez esta temporada uma prova do Troféu BMW M3.” Mas não foi nada fácil pois, “durante as primeiras voltas, foi interessante seguir o despique pelas primeiras posições, com António Rodrigues, Ni Amorim, António Barros e Alcides Petiz como protagonistas.” Ao longo das voltas, a animação foi uma constante, com toques mais ou menos “maldosos” e até uma interrupção da prova, logo na primeira volta, depois de vários despistes consecutivos, entre eles de Barros, Amorim, António Rodrigues, Paulo Rodrigues e Adriano Barbosa. Após a segunda largada, as picardias continuaram e “o convidado [Ni] Amorim [que tinha assinado a “pole” de forma surpreendente] acabaria, ao levar um toque [de Barros], por ficar fora de prova.” E, “depois de passar Rodrigues, Barros ficou no comando, para não mais o perder até final, enquanto o anterior líder [Rodrigues] seria suplantado por Alcides Petiz na luta pelo segundo posto.”

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