Fenómenos da Fórmula 1: Carlos Reutemann, de piloto a político

Por a 7 Março 2023 16:16

Um dos pilotos mais carismáticos da sua época, Carlos Reutemann correu na Fórmula 1 durante dez anos. Venceu 12 corridas, mas o máximo que conseguiu foi ser vice-campeão. Desde então, tornou-se uma figura de proa na política da Argentina

Quando Carlos Reutemann fez as suas primeiras corridas, em 1965, a Argentina tinha deixado de ser uma potência no desporto automóvel, o seu país tinha perdido as duas grandes provas de Fórmula 1 e do Mundial de Marcas, e o seu ídolo Juan Manuel Fangio tinha-se retirado da competição havia sete anos. Mesmo sem F1, Lole, como era conhecido, queria ser piloto e começou a correr em turismos com um Fiat modificado, com o qual foi campeão entre 1966 e 1968.

Mas Reutemann queria ser piloto internacional em monolugares, e importou um chassis BWA de Fórmula 2, equipado com motor Fiat. Este chassis italiano nunca foi muito competitivo na Europa mas o piloto pareceu ser capaz de descobrir-lhe os segredos, já que foi praticamente imbatível ao conquistar o título de Mecânica Argentina F2 em 1969. Resolveu então emigrar e juntou-se a Hector Staffa para ressuscitar a equipa de competição do Automovil Club Argentino, com Reutemann como primeiro piloto. No seu primeirao ano no Europeu de F2 ficou mais conhecido por atirar Jochen Rindt para fora de pista, mas no segundo ano já conseguiu ganhar corridas, perdendo o título de 1971 para Ronnie Peterson. Pelo caminho, disputou também a sua primeira corrida de F1 com um velhinho McLaren M7C da Ecurie Bonnier: o novo GP da Argentina, que como mandavam as regras era uma prova extra antes de passar para o calendário um ano depois.

A primeira vitória

Os carros de F2 do Automovil Club Argentino eram construídos pela Brabham, e Bernie Ecclestone, no seu papel de olheiro, contratou Reutemann para secundar Graham Hill, em 1972. Ecclestone estava tão interessado no patrocínio da gasolineira YPF como no talento do piloto, mas Reutemann tratou de mostrar a toda a gente que não foi para a F1 para ser um mero figurante: logo na sua corrida de estreia, por sinal na Argentina, conseguiu a pole position. Dois meses depois, venceu o GP do Brasil no circuito de Interlagos.

Foi preciso esperar, no entanto, até 1974 para a sua primeira vitória no Mundial. Foi no GP da África do Sul, aproveitando o abandono de Niki Lauda. No final do ano, esteve imbatível em Watkins Glen, liderando toda a prova depois de sair da pole position.

Mas a relação com a Brabham acabou por azedar quando a equipa começou a usar motores Alfa Romeo em vez dos mais potentes Cosworth DFV e Reutemann deixou a equipa a meio da época em 1976. Enzo Ferrari resolveu ir buscá-lo para substituir temporariamente Niki Lauda, e depois deixou-o como reserva até ao final do ano. Em 1977, Ferrari pagou a lealdade do argentino colocando-o a tempo inteiro na equipa como colega do austríaco, tanto que até ao final da época Reutemann passou a ser o piloto preferido dentro da estrutura da equipa, para em 1978 montar um ataque ao título, mas o Ferrari não foi tão rápido como o inovador Lotus com efeito de solo, e Reutemann teve que se contar com o terceiro lugar.

Reutemann queria ganhar e mudou de ares para a Lotus, recuperando o apoio da Martini (antes patrocinadora da Brabham), mas foi para a equipa de Colin Chapman na altura errada. Em 1980, aceitou o convite para apoiar a candidatura de Alan Jones na equipa Williams, mas Reutemann esperava ser recompensado com uma hipótese de lutar pelo título no ano seguinte. O argentino sentiu-se sempre desapoiado pela equipa britânica, mesmo quando era ele que estava mais perto do título, que perdeu por um ponto para Nelson Piquet. Desiludido, deixou a F1 na primavera de 1982.

Novos desafios

Durante a sua carreira na F1, Reutemann fez algumas corridas ocasionais de sport-protótipos, conseguindo mesmo o segundo lugar em algumas provas, como os 1000 km de Monza (na altura com a Ferrari). Em 1980, correu no troféu Procar, onde venceu uma prova, mas depois de deixar a F1 fez algumas provas ocasionais em ralis.

Nos anos 90, prestes a entrar na casa dos 50 anos, Reutemann reciclou a sua personalidade magnética e a sua vontade de vencer e lançou uma carreira política na sua terra natal, Santa Fé. Foi governador da sua província em duas ocasiões (de 1991 a 1995 e novamente de 1999 a 2003), onde tentou impedir as derrapagens orçamentais que tinham levado o seu país à recessão. Após declinar várias vezes, aceitou finalmente o convite para se candidatar à presidência em 2003. Não conseguir vencer, foi novamente convidado para se candidato em 2011, mas desta feita declinou, permanecendo Senador, o que acontece já desde 2003.

Carlos Reutemann, o herói

O Rali da Argentina sempre foi muito famoso entre o povo, um povo muito ligado aos seus heróis. E Carlos Reutemann, depois duma grande carreira na Fórmula 1, era um desses heróis. Talvez por isso, no meio de tantas coisas novas e estranhas no Rali da Argentina, talvez a visão mais chocante para os visitantes tenham sido as multidões de espectadores, nas ligações. Porquê nestes locais? Nos 1.100 km de ligação entre Buenos Aires e Tucumán, os pilotos relataram que nunca encontraram mais de três quilómetros seguidos entre dois grupos de espectadores, em ambos os lados da estrada! E não era por causa dos carros que estavam a competir numa prova do WRC – era porque essa era uma hipótese de verem passar os heróis locais.

A estrela desse espetáculo era Carlos Reutemann. Recebia ramos de flores e cestas de fruta das senhoras, idosos queriam apertar-lhe a mão, as raparigas quase lutavam umas com as outras para lhe disputarem um beijo, os jovens corriam a pedir-lhe um autógrafo. E até para os jornalistas mais endurecidos, Reutemann era uma figura impressionante. Ele foi o primeiro vencedor – e piloto! – de Grande Prémio a subir ao pódio numa prova do WRC.

Como perder um campeonato

Carlos Reutemann foi um bom, e eclético, piloto, mas em 1981, perdeu um título que podia ter ganho. Chegou a ser um dos melhores pilotos do mundo, mas a sua carreira foi extremamente atribulada. Apesar de não ser o preferido dentro da Williams, e depois de já ter facilitado a vitória a Alan Jones em Long Beach, no Brasil estava mais forte e decidiu não ceder a liderança a Jones, como lhe foi pedido da boxe da Williams.

Farto de ser remetido para um segundo papel, Carlos Reutemann estava em grande forma no início de 1981 e decidiu ir à luta. A partir daqui o ambiente ficou inquinado dentro da Williams, com Jones a considerar a antiguidade e o seu contrato como um posto, e Reutemann a impor a lei dos resultados na pista.

Durante a primeira metade da época, o argentino venceu mais uma corrida e foi consistente, num dos anos mais equilibrados de sempre na Fórmula 1 mas, a partir da ronda inglesa, as suas performances começaram-se a apagar… Muito se especulou se seria obra da equipa, mas um dado é certo: Reutemann era um piloto psicologicamente frágil e inconstante, e a energia usada para se impor a Jones e afrontar a posição da direção da Williams, aliada à crescente pressão de Nelson Piquet, em Brabham, e da intromissão constante dos cada vez mais rápidos e ocasionalmente fiáveis Renault turbo pilotados por Arnoux e um muito jovem Alain Prost, começaram a provocar os seus efeitos. Além disso, Jones, vítima de alguns erros e azares mecânicos na primeira metade da época, e sem opções pelo título, tinha decidido retirar-se no final de 1981 e recusou-se terminantemente a ajudar Reutemann. Chegados a Las Vegas, Reutemann liderava o Mundial com 49 pontos, mas tinha Piquet apenas a um ponto e um surpreendente Laffite a seis.

Reutemann fez a pole, na frente de Jones, Villeneuve, Piquet, Prost e Watson, mas no dia da corrida arrancou muito mal, o que permitiu a Jones tomar o comando, seguido de Villeneuve, Prost e Giacomelli. A corrida não lhe correu nada bem e em clara perda, foi sendo facilmente batido em pista. Piquet precisava apenas de um ponto e ficar na frente de Reutemann e resistiu no quinto lugar, enquanto Carlos Reutemann terminava em oitavo.

Apesar de terem visto o seu piloto perder o título, a Williams festejou efusivamente a vitória de Alan Jones e o título de Construtores. Quanto a Reutemann, era um homem quebrado que cruzava a meta e que desaparecia nas boxes. Não parecia exausto como Piquet, apenas derrotado, como se já tivesse partido. Anos mais tarde, Patrick Head diria que o Williams do argentino estava em bom estado, apesar de alguns problemas de caixa. Tinha sido a motivação e a pressão a bloquear Reutemann. Jones saiu, a Williams decidiu manter Reutemann e contratar Rosberg para 1982 mas, com apenas duas provas completas e uma presença no pódio logo na ronda inaugural, Carlos Reutemann abandonou subitamente a F1.

Falou-se que as tensões crescentes entre Inglaterra e a Argentina, que levariam à Guerra das Malvinas em abril, convenceram definitivamente Reutemann ao adeus, já que este tinha ambições políticas quando deixasse a competição. No entanto, a opinião geral, corroborada por muitas pessoas dentro da Williams, afirmavam simplesmente que a motivação do piloto já não estava lá.

Ironicamente, a formação de Grove venceria o título com Keke Rosberg, até então visto como um piloto rápido e agressivo, nunca como um possível ganhador e campeão.

MICRO

Biografia

Nome: Carlos Alberto Reutemann

Nasceu: 12/4/1942, em Santa Fé, Argentina

Palmarés:

1966-1968 – Campeão Argentino Turismo

1969 – Campeão Argentino F2 (10 vitórias)

1971 – 2º Europeu F2 (Brabham, 1 vitória extra-campeonato); 2º Francês F2; 2º Brasileiro F2 (1 vitória)

1972 – 16º F1 (Brabham, 3 p.), 1º GP Brasil F1 (Brabham, extra-campeonato)

1973 – 7º F1 (Brabham, 16 p.); Mundial de Marcas (Ferrari)

1974 – 6º F1 (Brabham, 32 p., 2 vitórias); Mundial de Marcas (Alfa Romeo)

1975 – 3º F1 (Brabham, 37p., 1 vitória)

1976 – 16º F1 (Brabham/Ferrari, 3 p.)

1977 – 4º F1 (Ferrari, 42 p., 1 vitória)

1978 – 3º F1 (Ferrari, 48 p., 4 vitórias)

1979 – 6º F1 (Lotus, 20 p.)

1980 – 3º F1 (Williams, 42 p., 1 vitória), 5º Procar (BMW, 1 vitória)

1981 – 2º F1 (Williams, 49 p., 2 vitórias)

1982 – 15º F1 (Williams, 6 p.)

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