Porsche Cup Brasil, Dener Pires: “A hospitalidade portuguesa é especial”
Em 2025, a Porsche Carrera Cup Brasil celebra 20 anos de história. A competição, que se consolidou como um dos principais campeonatos do Brasil, é hoje referência em organização, visibilidade e número de participantes. Por trás desse sucesso está Dener Pires, fundador, CEO e alma do projeto.
Dener Pires é um dos principais nomes do automobilismo brasileiro. Responsável por transformar a Porsche Carrera Cup Brasil numa referência, é reconhecido por sua atuação na organização, preparação de carros e promoção de eventos. Embora tenha competido como piloto amador, a sua principal contribuição está na gestão e profissionalização do desporto.
Falamos com Dener Pires sobre a vinda da competição a Portugal, onde fará duas rondas duplas, no Autódromo Internacional do Algarve, e no Circuito do Estoril.
“Tudo começou com um 914”
A história de Dener na competição automóvel começa quase no berço. Na oficina do pai, desde cedo aprendeu a beleza, complexidade e exigência do trabalho na mecânica de automóveis. Com quatro anos, viu o seu pai construir um kart de dois lugares, com canos de água, com um motor de moto de dois tempos para ele e para os seus irmãos.
No entanto, a primeira paixão não foram os automóveis. Ainda muito novo, recebeu de presente uma moto, com uma caraterística diferente…não funcionava. Com o seu trabalho, sempre com a orientação do pai, começou a entender o funcionamento de toda a mecânica. Desde esse momento, tudo o que envolvia mecânica passou a ser motivo de interesse extremo.
O momento que define o destino de Dener aconteceu uns anos depois, com o seu irmão, no centro de São Paulo, onde entrou num stand e viu um Porsche 914. Foi naquele momento que decidiu que iria ter um. Sem saber, aquela decisão iria mudar a sua vida:
“Já lá vã mais de 40 anos desde que vi naquele stand o Porsche 914”, relembra Dener, referindo-se ao carro que marcou o começo da sua paixão pela marca. “Eu tinha 17 anos, hoje tenho 59. Aquele carro foi muito mais do que um desportivo, foi uma forma de me conectar com a Porsche e com a engenharia alemã. Trabalhar nele fez-me entender por que esses carros são tão eficientes. Tudo começou ali.”
Um sonho de uma competição justa e sustentável
Um ano depois, comprou o desejado 914, a que se seguiu um 914/6, mas nessa altura eram ainda as motas que faziam bater o coração mais rápido, com competição à mistura, em provas de enduro. Mas foi o 914/6 que serviu de porta de entrada para as pistas. O que começou como uma simples negociação para vender o Porsche acabou se transformando numa conexão entre dois apaixonados por corridas — e isso levou Dener às pistas.
Cada vez mais envolvido no mundo das corridas de resistência e sempre com máquinas da marca de Estugarda, Dener viu-se confrontado com a falta de regulamentação, com uma diversidade de máquinas permitidas que davam azo a algumas injustiças.
“Eu era apaixonado pelas corridas, tinha uma equipa, mas não havia regulamentação. Às vezes eu era o vilão, aparecendo com o carro mais rápido. Outras vezes, era o prejudicado. Era injusto”, explica.
Dener percebeu que só haveria uma forma de criar um campeonato justo: começar do zero. Criar uma competição de custos controlados, bem regulamentada, que permitisse boas corridas e uma base sustentável. “Também precisava ser financeiramente viável. Eu queria viver disso, tirar o meu sustento. De 2000 a 2004 trabalhamos no projeto. Fizemos o estudo de mercado, aprendermos o máximo possível e construir uma relação com a Porsche. Em 2005 o projeto foi para as pistas.”
Convencer a Porsche foi difícil
“Sim, foi difícil”, admite Dener sobre a missão de convencer a Porsche Alemanha a apoiar o projeto. “Eles tiveram uma experiência má na Venezuela, que deixou os alemães com o pé atrás com os sul-americanos. E eu, como brasileiro, herdei essa desconfiança.”
Durante cinco anos, trabalhou para construir a confiança necessária. Participou de provas internacionais, como Le Mans e Daytona, como mecânico, e acumulou contactos e experiência. “Eu precisava mostrar que a gente tinha musculatura para executar. E conseguimos. “Trabalhava na parte mecânica, com motores e outros componentes. Em equipas privadas com apoio oficial da Porsche.” Essa vivência prática moldou a sua visão: “Quando penso algo, gosto de mostrar na prática que é possível. Nada convence mais do que um evento realizado com sucesso.”
O interesse da marca existia, mas dependia das encomendas de carros. O interesse do lado dos brasileiros também existia, mas muitos queriam ver primeiro antes de aceitar o desafio. Depois de muito trabalho, a Porsche Carrera Cup Brasil iniciou-se.
“Começamos modestamente, com 13 carros. Já na segunda corrida foram 15. No ano seguinte, 24. E assim fomos crescendo.”
“Trocar os carros ajudou a crescer”
Em 2008, o 996 saiu de cena para dar lugar ao 997, mais voltado para a competição. “Era um carro com DNA de corrida. A mudança foi importante”, explica Dener. “Os 996 ficaram parados por pouco tempo, pois criamos uma categoria de entrada, que hoje é a Challenge. Além dos modelos mais recentes, usávamos modelos anteriores, para permitir a entrada de novas pessoas.”
O modelo de múltiplas categorias permitiu crescimento. “Mesmo quando o cenário económico piorava, nunca ficamos abaixo de 17 carros no grid. E logo voltávamos a mais de 25.”
Portugal: raízes, estratégia e calor humano
A internacionalização da Porsche Cup Brasil começou em 2010. Cinco anos depois do início da competição, o salto para fora do Brasil aconteceu. Por necessidade, mas também por convicção. Apesar do Brasil ter muita paixão pelas corridas, as pistas com homologação FIA são apenas três.
Assim, era preciso dar o salto para fora para permitir aos pilotos vivenciarem novas realidades. Dener entendia que poderia fazer crescer toda a estrutura, a sua e as equipas, os pilotos. E Portugal acabou por ser destino em 2011. Os motivos para esta aposta arrojada são simples de entender:
“Sou neto de portugueses, que foram de Montemor-o-Velho para o Brasil nos anos 20. Hoje sou cidadão português, mas na altura nunca tinha vindo cá. Sempre tive um carinho especial. Portugal tem um clima favorável, tem boa estrutura, e sabia que o meu pessoal seria bem recebido. A hospitalidade portuguesa é especial. A língua, a comida, a hotelaria… O povo português esbanja simpatia.”
O segredo do sucesso em Portugal
No ano passado, o autódromo do Estoril encheu-se para ver as corridas da Porsche Cup Brasil — um feito cada vez mais raro em Portugal. Qual o segredo? “Não existe um truque só. São vários fatores. Primeiro, o espetáculo: ninguém sai de casa para ver algo mau. Depois, a recetividade: quem vai, precisa sentir que viveu algo maior do que uma corrida. O nosso evento permite que as pessoas entrem no paddock, vejam os carros de perto, conversem com os pilotos, sintam o ambiente. Isso muda tudo”, afirma. “E o carinho mútuo entre portugueses e brasileiros ajuda também.”
A Porsche Cup movimenta cerca de 350 profissionais nas suas etapas internacionais. “Cada um com a sua história. Às vezes, você apaixona-se mais pela trajetória de um mecânico do que pelo piloto vencedor. O automobilismo é isso: esforço coletivo, superação.”
Surpresas para a festa dos 20 anos
Para os fins de semana da Porsche Carrera Cup Brasil teremos dois formatos. No próximo fim de semana (27 e 28 de junho) teremos uma jornada sprint, a quarta de seis jornadas. Cada carro é tripulado por apenas um piloto, com duas corridas de 25 minutos + 1 volta. No fim de semana seguinte, teremos a primeira jornada da etapa endurance, constituída por três jornadas. Cada carro pode ter de dois a três pilotos em provas que podem ser de 300 ou 500km.
Nas corridas Sprint há três categorias: A Trophy, com os Porsche 911 GT3 CUP 991.1, para pilotos iniciantes; a Challenge, com os Porsche 911 GT3 CUP 991.2, para pilotos já com alguma experiência, mas ainda com margem de progressão; A Carrera, com Porsche 911 GT3 CUP 992 para pilotos com mais experiência (categoria de topo). Nas corridas de Endurance, não há categoria Trophy.
Sobre a etapa portuguesa em 2025, Dener deixou a dúvida no ar, com a possibilidade de termos alguns pilotos portugueses em pista: “Vamos ter surpresas, sim. Mas vou deixar como surpresa mesmo.”
O impacto em números
A Porsche Cup Brasil já tem 20 anos de história e números impressionantes: “A Porsche Cup já teve mais de 500 pilotos nesses 20 anos. Em 2025, vamos ter entre 90 e 100 pilotos inscritos, somando corridas de sprint e endurance. E mais de 400 colaboradores. Tivemos nas bancadas de Interlagos 35 mil pessoas, mais de 7 mil que passaram pelo nosso paddock. Temos mais de 30 marcas associadas ao campeonato, com transmissão em TV aberta no Brasil e em canais desportivos, inclusive em Portugal com a Sport TV.
Da oficina do pai a uma das mais respeitadas competições do universo Porsche
A história de Dener Pires é de superação. Tal como o pai ensinou na oficina, o jovem de Guarulhos apaixonado pelas duas rodas foi encontrando soluções para cada desafio. Entrou no mundo Porsche por causa de um 914 e daí, criou a sua base para desenvolver um negócio cada vez mais forte.
A Porsche Carrera Cup Brasil é uma referência e o público de Portugal terá quatro fins de semana, dois no Algarve, dois no Estoril, para poder ver as máquinas em pista e a máquina do campeonato que este ano, passa 45% do seu tempo em território nacional. Um exemplo do bom trabalho que se faz no mundo das corridas e uma oportunidade para ver de perto esta competição.
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