Crónica: Esta “doença” dos motores

Por a 12 Janeiro 2021 10:00

São os momentos negros que nos fazem ponderar sobre o que fazemos e para onde vamos. São as tragédias que nos fazem refletir sobre as nossas escolhas. Faz hoje um ano que Paulo Gonçalves nos deixou, a fazer aquilo que mais gostava.

“Com o sucesso, não aprendemos absolutamente nada. Com fracassos e contratempos, é possível tirar conclusões”, disse Niki Lauda, depois de uma vida recheada de sucessos, mas também de momentos difíceis. São momentos como a notícia da morte de Paulo Gonçalves, que nos fizeram e fazem parar para pensar.

O desporto motorizado é um dos mundos mais competitivos e difíceis, onde para ter sucesso não chega apenas ter talento. Para se chegar ao topo é preciso uma mistura de ingredientes especiais, que não se encontram facilmente. O esforço, a entrega e os sacrifícios que se fazem, têm de ser “servidos em quantidades generosas” e nem sempre dão os frutos desejados… ou merecidos. Muitos foram os que tentaram e não conseguiram. Poucos foram os que conseguiram de facto deixar uma marca indelével.

Mas para quê? A troco de quê, tantos dão sangue, suor e lágrimas, às voltas num circuito, ou a percorrer troços, a velocidades que fariam o comum dos mortais ficar congelado? Alguns pensarão que é apenas a busca da adrenalina, outros apenas a procura do reconhecimento ou do sucesso. É muito mais que isso. É uma luta pessoal em busca de ser cada vez melhor.

Ninguém ficou indiferente à notícia da morte de Paulo Gonçalves. Admito que a minha “praia” é a velocidade e tudo o que implique um pouco mais de pó, não me atrai tanto, mas reconheço a valia, talento e coragem dos homens e mulheres que tentam chegar ao fim do mais duro rali do mundo. E sempre admirei a postura de Paulo Gonçalves… que sorte tivemos em tê-lo como representante das cores lusas. Um homem que nunca virou a cara à luta, que mostrou uma resiliência e determinação ao alcance de poucos, em especial no Dakar, uma prova que foi sempre algo ingrata para ele e que merecia ter vencido.

O seu currículo invejável, com inúmeros títulos conquistados, diz pouco sobre o homem, que nunca desistiu e sempre tentou até ao fim, apesar das dificuldades. Na minha mente fica a imagem de uma queda de Paulo Gonçalves em 2016. Uma queda violenta, que deixaria por terra qualquer um. Mas Gonçalves nem um segundo ficou no chão. Levantou-se logo, pegou na moto e seguiu. E talvez seja isto que nos deva ficar na memória. Um herói, que percorreu os troços mais difíceis, sempre com uma determinação inabalável, e que a cada queda respondeu com uma dose ainda maior de determinação.

Talvez seja isto o desporto motorizado… uma caricatura a alta velocidade da vida, em que os maiores nomes serão provavelmente os maiores exemplos de como andar neste mundo. Talvez seja esta superação constante dos artistas que nos faz gostar “disto” e dá sentido a este desporto. Bruce McLaren disse uma vez “fazer algo bem vale tanto a pena, que morrer a tentar fazê-lo melhor não pode ser considerado loucura”.

Certamente que aos familiares e amigos esta consolação servirá de pouco no dia que se recorda um momento de tanta dor, mas a certeza de que Paulo Gonçalves foi o verdadeiro exemplo do que é o espírito do Dakar e que o seu nome será recordado para sempre, é motivo de orgulho e que esta busca incessante pela vitória será inspiração para muitos. E isto não pode ser considerado loucura. Paulo Gonçalves e muitos outros artistas dos motores, serão recordados durante muito anos… a “imortalidade” é o prémio pelas suas conquistas e mais que isso, pela sua postura. A nós, resta-nos dentro das nossas possibilidade, pelo menos tentar seguir estes exemplos e recordar os seus feitos. E se assim for, talvez tudo isto, esta “doença” dos motores, faça mais sentido.

Faz um ano que perdemos um dos grandes. Um ano depois de um dos dias mais tristes de 2020, que começou tão mal para o desporto motorizado nacional. Um ano sem o herói Paulo Gonçalves, um nome, um homem que nunca será esquecido.

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1 Comentário
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Paulo Cunha
Paulo Cunha
3 anos atrás

Tem sido um Dakar diferente desde o início. Tem faltado a emoção de esperar pelo fim das etapas e acompanhar a luta constante do Paulo Gonçalves.
Muitas saudades

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