OPINIÃO: Este Rali Safari fez-nos todos lembrar de que fibra são feitos os ralis…

Por a 27 Junho 2022 16:50

Se todas as provas do WRC fossem tão intensas e diferenciadas como esta, o WRC não estava no ‘marasmo’ mediático que se encontra hoje em dia.

Confesso que há muito penso nas razões que levaram o Mundial de Ralis a perder interesse ao longo do tempo.

Não me interpretem mal, o WRC é hoje em dia uma disciplina entusiasmante com grandes carros, grandes pilotos e uma maioria de provas muito bem disputadas.

O Mundial de Ralis continua a ter uma enorme legião de fãs, seguidores ‘hardcore’, que são os melhores adeptos do mundo.

Em quantos desportos os adeptos passam noites ao frio, à chuva, palmilham quilómetros para cima e para baixo para ver um espetáculo como poucos há no mundo do desporto.

Qualquer adepto vibra nos seus desportos coletivos favoritos, que seja no futebol, basquetebol, râguebi, o que for, mas e sensação se ver passar um bom carro de ralis, bem guiado é única.

Estou à vontade para o dizer, porque o primeiro rali que vi ao vivo foi o Rali de Portugal de 1986. Ou melhor, vi passar uma dezena de carros. Foi curto, mas intenso. Interessei-me por isto nesse dia 5 de março de 1986, estudava números, depressa virei para as letras. E já passaram 38 anos.

Voltando ao tema, os ralis perderam interesse, por culpa própria, mas principalmente porque as coisas mudaram muito na indústria automóvel ao longo dos anos, e as sucessivas crises pelo meio só têm ‘ajudado’ que os ralis percam ainda mais gás.

Se nos lembrarmos, depois dos fortes anos 90, com muitas marcas, grandes pilotos e espetáculo na estrada, a meio de 2000 os ralis foram começando a fraquejar um pouco, e a principal machadada foi a crise do sub-prime, importada da América do Norte, que ‘lixou’ o mundo todo.

A partir daí as coisas complicaram-se nos ralis, porque estavam complicadas na indústria, é um reflexo lógico.

Quem manda, a FIA, e o Promotor, foram fazendo alterações, mudando regras, tentando dar a volta ao tema, como já estavam alguns anos antes, mas com outra ‘bagagem’ financeira e sem (tanta) crise.

Em 2017, os regulamentos foram bons, os carros ainda melhores, e depois de vários anos de domínio da Volkswagen, parecia que o WRC ia arrebitar outra vez.

Em termos desportivos, foi bom, muitas lutas, qualquer uma das quatro equipas venceu ralis, sete pilotos venceram, mas em 2018, as coisas mudaram um bocadinho. Ainda assim foi bom. Todas as quatro equipas voltaram a vencer, embora uma delas já se destacasse claramente, a Toyota.

Aqui, a correlação de forças já tinha mudado muito ao ponto da Ford não ter vencido uma única vez. Nessa altura, a saída da Citroën do WRC e a bipolarização entre a Toyota e a Hyundai desequilibrou ainda mais a competição.

A saída da Citroën foi uma machadada forte para o WRC, e a pandemia de 2020 aumentou a crise, isto num contexto em que (para mim) o principal problema continua a ser a grande indefinição da indústria automóvel.

Sem saber para onde vai a indústria, qual é o construtor que se atreve a gastar rios de dinheiro sem saber se está a apostar no ‘cavalo’ certo.

É muito difícil o trabalho do Promotor e da FIA nesta altura, com o WRC.

Mas desde que não haja mais debandada, a competição está longe de estar moribunda.

E este fim de semana de Rali Safari provou-o. E mostrou uma coisa que defendo há muito para o WRC: devia haver dois ou três eventos absolutamente diferenciadores no WRC, todos os anos.

Claro que nós gostamos dos ralis sprint, a velocidade dos carros é espantosa, e o espetáculo que dão, é imenso, mas é preciso mais para as pessoas se interessarem. É preciso muito do que houve este fim de semana com o Rali Safari.

É claro que é fácil perceber que é impossível hoje em dia ter um Safari como ‘antigamente’, os carros, por causa do dinheiro que se pode gastar, são os mesmos de todas as outras provas e não os ‘tanques de guerra’ que eram feitos especificamente para o Safari.

Dentro do que existe, não concordo nada com muito do que vi escrito nas redes sociais este fim de semana que este rali não ‘cabe’ no atual WRC, porque os carros (coitadinhos) não aguentam. Os Toyota aguentaram os quatro!

Os ralis precisam de ter provas diferenciadas (o que não é fácil nas atuais regras, sem haver exceções). É óbvio que sei ser quase impossível, tendo em conta os orçamentos limitados de hoje, que as equipas aceitassem algo desse estilo, mas num mundo mais perto do perfeito, para mim o WRC teria três ou quatro provas diferenciadoras por ano.

Por exemplo, este Safari neste estilo com mais um dia. O Rali da Acrópole com troços escolhidos a dedo entre a rapidez e a dureza, um Monte Carlo mais extenso e com duas alternativas de percurso, de modo a ‘garantir’ muita neve e gelo.

São apenas exemplos. nem sequer é nada ‘doutro mundo’.

Penso que o WRC tem um potencial que está muito longe de ser bem explorado.

Eu sei que com dinheiro tudo se faz, e esse escasseia, mas podia estar a fazer-se mais alguma coisa. Tomara ao Promotor do WRC ter 13 provas como o Rali de Portugal, a todos os níveis. Não falta público, espetáculo, acontecimentos, super especiais a levar os ralis ao público menos conhecedor.

Terminando com ‘este’ Safari. Foi como nos velhos tempos, em formato ‘mini’, uma prova de resistência. Não vale a pena dizer que ‘antigamente’ os carros aguentavam tudo. Sim, mas porque eram feitos especificamente para isso, e os atuais, não.

Tenho a certeza absoluta que, se o interesse dos 13 ralis do WRC 2022 fossem todos como este Rali Safari, a ‘música’ mediática era outra.

Não interessa para o caso que só a Toyota tenha feito um carro para aguentar este Safari. Os Hyundai e os Ford tiveram problemas a mais. Essa é outra história, para outra altura.

Este Rali Safari fez-nos todos lembrar de que fibra são feitos os ralis…

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