A maldição do tri consecutivo no Rali de Portugal: 3 de seguida… não é para todos

Por a 9 Fevereiro 2023 13:32

Sabia que, depois do seu triunfo no Rali de Portugal 2013 e 2014 de Sebastien Ogier, não mais o vencedor da prova portuguesa do WRC se repetiu no ano seguinte. Até 2022, pelo menos. Como se percebe, o ‘bi’ é difícil. Imagine-se o tri…

Na história do Rali de Portugal só há um piloto que conseguiu vencer a prova três vezes seguidas. Miki Biasion, entre 1988 e 1990. Muitos outros estiveram perto, mas às três… não foi de vez.

Quando se olha para a rica história do Rali de Portugal há sempre curiosidades que saltam à vista, e uma delas é protagonizada por Massimo Biasion. Até hoje, o piloto de Bassano da Grappa é o único que venceu a prova portuguesa três vezes consecutivas. Foi entre 1988 e 1990, um feito que nunca tinha sido alcançado anteriormente, nem mesmo antes da prova passar a contar para o Mundial de Ralis, em 1973, nem o voltou a acontecer depois. Um dia, este será mais um dado curioso que algum piloto irá suplantar, pois a história do desporto automóvel é rica em situações do género. Por vezes, o destino dita que um determinado acontecimento demora muitos anos a repetir-se e olhando para o palmarés do Rali de Portugal, ficamos a saber que por seis vezes, outros tantos pilotos estiveram perto do tri… e não o conseguiram. Vamos recordar um pouco melhor as histórias…

Exclusão de partes

A primeira forte tentativa para chegar ao tri foi feita por Markku Alen, vencedor das provas de 1977 e 1978, mas foi derrotado o ano seguinte por Hannu Mikkola, que veio a Portugal motivadíssimo para vingar a derrota do ano anterior na famosa noite de Sintra. Em 1977, no auge da luta da Fiat com a Ford, e pilotando um Fiat 131 Abarth, Markku Alen tornou-se em 1977 no primeiro piloto a bisar no palmarés do rali. Ari Vatanen foi quem andou na frente na fase inicial do rali, mas como lhe era habitual, despistou-se ao colocar o Ford Escort fora de estrada já depois da tomada de tempo do troço da Lapa. O outro Ford Escort de Bjorn Waldegård ainda ameaçou Markku Alen, mas o sueco furou em Arganil e apenas conseguiu suplantar Ove Andersson, já na noite de Sintra.

1978 foi um ano espetacular o mítico “Grande Prémio de Sintra”. À partida para a ‘noite’, 11 segundos era a diferença entre Alen e Mikkola e à partida para a última passagem pelo troço de Sintra, Mikkola liderava por quatro segundos. Alen dá o que tem e o que não tem e faz 7m01s e 2m5s depois, Ilkka Kivimaki grita “Ganhámos, Markku!”. Mikkola demora a aparecer e quando o faz, trazia uma roda a menos no Ford Escort! Um toque numa pedra ‘decidiu’ o rali. É deste tipo de coisas que se fazem as ‘estórias’ nos ralis.

No ano seguinte, Hannu Mikkola estava apostado em virar a página e nem precisou de se esforçar muito. O tri não podia sequer acontecer, já que Alen e a Fiat nem sequer vieram a Portugal. Quanto à prova, a ausência da Fiat permitiu à Ford um calmo passeio em solo luso. A primeira tentativa de tri foi por…exclusão de partes.

A vez de Mikkola

Em 1983, o vencedor do rali só ficou conhecido em Arganil. Depois de anos quase sem adversários, a Audi tinha agora boa oposição da Lancia, com o excelente 037 Rally. Mas a prova portuguesa sempre foi maioritariamente em piso de terra e o Audi Quattro o ‘tanque’ necessário para as nossas difíceis estradas. Hannu Mikkola chegou à última etapa com uma boa vantagem, mas nos 56,5km de Arganil, furou e perdeu tempo para Walter Röhrl, que por sua vez também ele viria a perder tempo com problemas com os pneus do seu Lancia 037. Venceu Mikkola.

Finalmente, Markku Alen (Lancia) e Hannu Mikkola (Audi) voltariam a chegaram à última etapa do Rali de Portugal em posição de discutir o triunfo, como em 1978. Desta feita, chegaram ao último dia separados por 43 segundos com o finlandês da Lancia a recuperar 33 segundos logo na primeira passagem pelos 56,5 km. Com dez segundos de diferença, foi uma batalha ao segundo. Mas o Audi Quattro era melhor na terra portuguesa e Mikkolla venceu. Este foi também o ano dos recordes de Sintra por parte de Toivonen, seguidos de acidente e da grande prestação de António Rodrigues na primeira etapa, com um Lancia 037 Rally.

Mas uma vez e tal como sucedeu com Alen, o tri ficou ‘morto’ à partida, porque Mikkola só fez nove ralis com a Audi em 1985 e não veio a Portugal. Nessa prova, os favoritos eram os Peugeot 205 T16, e mesmo depois de Ari Vatanen desistir em Arcos-Portela, Timo Salonen tratou do assunto e ganhou o rali…

Finalmente o tri, de Biasion

Por fim, entre 1988 e 1990, fruto de um modelo, o Lancia Delta Integrale, quase imparável na altura, Miki Biasion fez história e levou de vencidas três edições de seguida. Neste final de década de 80, a Lancia não tinha adversários pois o Delta era claramente o melhor dos Grupo A e Massimo Biasion, tirando partido da grande vantagem face aos Mazda 323 4WD, Volkswagen Golf e Toyota Celica de duas rodas motrizes, triunfou nas edições de 1988 a 1990. E mais, a Lancia reservou para si sempre os três lugares do pódio nesses três edições ganhas por Biasion e na de 1990 colocou mesmo cinco carros no top 5. O último deles, Carlos Bica.

O rali de 1988 foi ganho por Miki Biasion sem o seu habitual navegador, Tiziano Siviero, que se aleijou numa sessão de testes no Quénia. Foi com Carlo Cassina e na estreia do novo Lancia Delta Integrale (que subsituia o Lancia Delta HF 4WD utilizado em 1987 e nas duas primeiras provas de 1988) que Biasion venceu, aproveitando bem um problema mecânico no carro de Markku Alen, logo na Especial de abertura no Autódromo do Estoril, com o finlandês a ser empurrado por outros carros para andar. Com o tempo perdido por Alen e com Michael Ericcson sem poder dar a mesma luta, Biasion dominou por completo o evento.

Em 1989, já com a equipa oficial da Toyota, novamente domínio do italiano com Miki Biasion a voltar a passear a sua superioridade. A Lancia venceu facilmente, porque os Toyota de Juha Kankkunen, Björn Waldegård e Carlos Sainz abandonaram.

Em 1990, a Toyota subiu muito de produção, mas ainda estava longe de chegar para a Lancia, com Miki Biasion a assinar a terceira vitória consecutiva. Este foi também o rali que ficou marcado pelo despiste de Louise Aitken-Walker que caiu com o seu Opel Kadett GSI ao rio Zêzere, afundando-se. Foi só um susto.

EscóciaXGrã-Bretanha

Os anos passaram, a era dos WRC nasceu em 1997, o mundo dos automóveis é abalado pela morte do pai do Rali de Portugal, e no ano seguinte, 1998, Colin McRae, no seu Subaru Impreza WRC venceu uma edição histórica, ao bater Carlos Sainz por 2.1s. O escocês foi o mais rápido inicialmente mas problemas com o motor do Impreza WRC que perdia óleo, fizeram com que McRae perdesse a vantagem amealhada. No último troço, McRae e Sainz entraram separados por meia dúzia de segundos. O espanhol ganhou 4,7 em Amarante mas não foi suficiente. Venceu McRae.

No ano seguinte, já na Ford, o Campeão do Mundo de 1995, voltava a vencer o Rali de Portugal, desta feita com o novo Focus WRC, com as míticas cores da Martini, depois de dar um um recital de condução nas classificativas iniciais em Ponte de Lima, gerindo depois a vantagem até ao fim, face aos pilotos da Toyota, Sainz e Auriol.

Mas mais uma vez, ficaria escrito que só Biasion alcançaria o tri na história do Rali de Portugal. Em 2000 foi a vez de Richard Burns voltar a dar à Subaru um triunfo em Portugal, num rali com luta até ao último metro. Marcus Grönholm, em Peugeot 206 WRC, iniciou a última etapa na frente, mas Richard Burns, estreando a versão P2000 do Impreza WRC, atacou nas derradeiras especiais em Ponte de Lima e venceu por 6,5 segundos.

A ‘era’ Armindo

Chegou o Séx XXI, a ponte de Entre-os-Rios caiu, o mau tempo apanhou de surpresa uma organização do Rali de Portugal, mal preparada para a tormenta que teria pela frente, e a FIA teve ali o argumento que precisava para colocar o Rali da Alemanha no Mundial de Ralis. Mas isso são outras histórias. A verdade é que o Rali de Portugal passou por momentos difíceis, rumou a Trás-os-Montes e aí ‘nasceu’ uma estrela: Armindo Araújo. Na altura piloto da Citroën Portuguesa, venceu as edições de 2003 e 2004, lutando com o seu Citroën Saxo Kit Car contra Grupos N de quatro rodas motrizes, todos eles incapazes de bater o futuro Campeão do Mundo de Produção. Sem a concorrência de pilotos estrangeiros, Armindo Araújo, a bordo de um Citroën Saxo Kit Car carimbou uma dupla vitória em 2003 e 2004, secundado em ambas as ocasiões por Pedro Leal.

No ano seguinte, o destino ‘diria’ novamente que em 2005 não iria haver tri de Armindo Araújo. O piloto da Mitsubishi, nesta altura, foi terceiro, na frente de Juha Kankkunen, mas sem conseguir bater o vencedor do rali, Daniel Carlsson e o segundo classificado, um ‘certo’ Mikko Hirvonen.

Surge Ogier

No ano de 2010 deu-se outra viragem no Mundial de Ralis, numa ‘era’ que ainda dura, seis anos depois. Sebastien Ogier venceu o Rali de Portugal, naquela que foi a sua primeira vitória de sempre no Mundial de Ralis, batendo com carros iguais, o Citroen C4 WRC, o hiper favorito Sébastien Loeb. Além do primeiro nome, Ogier partilha com Loeb o facto de ser um fruto das escolas de formação da federação francesa e integrado no Junior Team da equipa Citroën, Ogier fez um rali com grande maturidade, nunca cedendo à pressão constante de Loeb. Olivier Quesnel não deu ordens de equipa e Ogier pôde mesmo conquistar, em Portugal, o primeiro triunfo da sua carreira no WRC.

O francês que está agora na volkswagen, repetiu o feito um ano depois, em 2011, triunfando novamente na prova que se realizava no Algarve, mas desta feita já aos comandos do novo Citroën DS3 WRC e integrado na equipa principal da Citroën.

O ano de 2012 foi de transição de Ogier para a volkswagen e por isso nesta altura o francês fazia um périplo pelo Mundial de Ralis de Skoda Fabia S2000 e portanto era quase impossível chegar ao tri no Rali de Portugal Nesse ano o triunfo foi para Mads Ostberg, em Ford Fiesta RS WRC, depois da desclassificação de Mikko Hirvonen nas verificações técnicas devido a uma irregularidade na embraiagem do DS3 WRC.

Sébastien Ogier voltou em 2013 já com o seu Volkswagen Polo R WRC e foi com esse carro que venceu a prova, repetindo o feito no ano seguinte, tendo sempre como segundo classificado Mikko Hirvonen, então na Citroen. Na prova de 2013, a formação alemã não ganhou para o susto quando, na manhã do último dia, os seus pilotos conheceram problemas em simultâneo: O Polo WRC de Ogier, ao nível da embraiagem e o de Latvala ficou mesmo sem tracção dianteira, o que o obrigou a baixar ao terceiro lugar, por troca com Hirvonen, isto no troço de Almodôvar, um dos mais extensos de sempre da história do Rali de Portugal.

Em 2014, tudo foi mais fácil para Ogier, que geriu os acontecimentos de forma perfeita rumo à quarta vitória em Portugal, um feito que o deixou cada vez mais próximo do recorde de cinco vitórias de Markku Alen, feito que não conseguiu ainda alcançar este ano.

Só que é da ‘maldição do tri’ que falamos, e essa voltou à carga em 2015. A ‘profecia’ repetiu-se e novamente um piloto que venceu o Rali de Portugal duas vezes seguidas, voltava a não conseguir igualar o feito de Miki Biasion entre 1988 e 1990.

O ano passado, Jari-Matti Latvala constestou todos os prognósticos e ganhou em solo luso pela primeira vez. No regresso do Rali de Portugal ao Norte, a prova foi um autêntico jogo do gato e do rato entre Ogier e Latvala, com o francês a não conseguir recuperar no último dia os 9.5s com que chegou ao final da 2ª etapa, permitindo a Latvala o triunfo.

Em 50 edições de Rali de Portugal, só um piloto, Miki Biasion, triunfou na prova três vezes seguidas e este será um ‘recorde’ que o simpático piloto de Bassano Dal Grappa vai guardar para si, pelo menos mais dois anos. Neste momento, só o perde se Kalle Rovanpera vencer as três próximas edições…

Tri, só Biasion

1977 Alen, Markku Fiat 131 Abarth

1978 Alen, Markku Fiat 131 Abarth

1979 Mikkola, Hannu Ford Escort RS1800

1983 Mikkola, Hannu Audi Quattro A1

1984 Mikkola, Hannu Audi Quattro A2

1985 Salonen, Timo Peugeot 205 Turbo 16

1988 Biasion, Massimo Lancia Delta Integrale

1989 Biasion, Massimo Lancia Delta Integrale

1990 Biasion, Massimo Lancia Delta HF Integrale 16v

1998 McRae, Colin Subaru Impreza WRC98

1999 McRae, Colin Ford Focus WRC

2000 Burns, Richard Subaru Impreza WRC2000

2003 Armindo Araújo – Miguel Ramalho Citroën Saxo Kit Car

2004 Armindo Araújo – Miguel Ramalho Citroën Saxo Kit Car

2005 Daniel Carlsson – Mattias Anderson Subaru Impreza WRC

2010 Ogier, Sebastien Citroen C4 WRC

2011 Ogier, Sebastien Citroen DS3 WRC

2012 Ostberg, Mads Ford Fiesta RS WRC

2013 Ogier, Sebastien Volkswagen Polo R WRC

2014 Ogier, Sebastien Volkswagen Polo R WRC

2015 Latvala, Jari-Matti Volkswagen Polo R WRC

Subscribe
Notify of
0 Comentários
Inline Feedbacks
View all comments
últimas AutoSport Histórico
últimas Autosport
autosport-historico
últimas Automais
autosport-historico