Entrevista a Carlos Bica: “O LANCIA 037 ERA UM AUTÊNTICO FÓRMULA!”

Por a 9 Fevereiro 2019 14:57

Alimentava o sonho de ser

piloto de ralis, levando o carro do pai a desafiar as curvas das

florestais de Arganil. Depois de alguns anos a cantar notas, Carlos

Bica mudou-se para o lado esquerdo, agarrando, com as duas mãos, o

volante de uma carreira que culminaria com a conquista de quatro

títulos de campeão nacional. Mais de duas décadas depois,

convidámo-lo a “vestir” o fato de competição para revisitar

esses anos dourados que dedicou ao automobilismo.

Por Nuno Branco (entrevista originalmente publicada na edição 1859, 14 agosto 2013)

Sabendo que tens raízes em Arganil, é fácil deduzir, mas conta-nos como nasceu a tua ligação aos automóveis…

Nos anos 60, havia em Almada um piloto chamado Rui Mirco que corria com um Mini Cooper S em provas de velocidade. O Rui era amigo do meu pai e, como tal, acabámos por ir vê-lo correr em algumas provas, conhecendo locais como a Granja do Marquês ou Montes Claros. Nessas provas, tive, pela primeira vez, a oportunidade de ver em acção, pilotos como o Manuel Gião, o José Lampreia, o António Peixinho, entre outros, e comecei a interessar-me pela competição. No entanto, a verdadeira paixão surge no início dos anos 70, quando assisto, pela primeira vez, a uma edição do Rali de Portugal. Foi amor à primeira vista! O meu sonho passou a ser participar, nem que fosse por uma vez, nessa grande prova. A partir daí, e sempre que ia, em Setembro, de férias para Arganil, pedia o carro ao meu pai e ia para a Serra do Açor conduzir. Muitas vezes, chegava a andar por lá o dia inteiro, voltando para casa apenas quando a gasolina escasseava…

Tinhas ídolos de juventude?

Em Portugal, na altura, admiravam-se os feitos de pilotos como Nicha, Gião, Nené, Romãozinho, António Carlos Oliveira, etc. Na Fórmula 1, lembro-me de começar a acompanhar nomes como Cevert, Stewart, Rindt, Fittipaldi, Lauda, mas o meu verdadeiro ídolo foi, depois, Ayrton Senna. Nos ralis, gostava de todos aqueles que davam cartas na altura, como eram os casos de Waldegård, Mikkola, Alen, Vatanen, Nicolas, Thérier, Kankkunen ou Rörhl.

Os primeiros passos na competição haveriam de ser dados a cantar notas…

É verdade, comecei como navegador. Em Almada, sempre que alguém ia participar num rali de Iniciados, Promoção ou Nacional, tentava ir a seu lado, o que aconteceu várias vezes. Estreei-me nas provas piratas em 1977, fiz ralis de Iniciados no ano seguinte, disputando depois, entre 1978 e 1980, o Campeonato Nacional.

A tua estreia como piloto aconteceu, precisamente, em 1980. Que te lembras desse dia?

Foi no Rali de Beja. Levei como navegador o meu grande amigo Jorge Miranda e alinhámos com um Ford Escort Mexico. Na primeira Classificativa, tivemos duas saídas de estrada e ficámos com a sensação que íamos ter um péssimo tempo, quando, na realidade, ganhámos o troço por 17 segundos e, no final, vencemos o rali!

Do início da tua carreira à criação de uma equipa, decorreu pouco tempo. Como surge a equipa Duriforte?

Em 1978, estava na oficina do José Veiga, e este queria participar no Rali Vidreiro, mas faltavam-lhe 50 contos (250 €). Fui ter com o meu pai e perguntei-lhe se dava patrocínio ao José Veiga e assim começou a aventura. Em 1979, comprámos o Escort México e, em 1980, comprámos um Ford RS1800, ex fábrica – HHJ705N.

Eu fazia o Nacional como navegador do José Veiga e os Iniciados como piloto, navegado pelo Jorge Miranda, no Escort Mexico. Em 1981, mudei para RS1800 e, desta vez, tinha ao meu lado o Luis Calafate, mas, nos Açores, fiz o meu primeiro rali com o Fanã (Fernando Prata), que haveria de ser meu navegador durante grande parte da minha carreira.

Como foram os primeiros anos de uma jovem equipa que procurava a afirmação nacional?

Com muitas dificuldades, mas com a ajuda de muita gente que ia aos ralis apoiar-nos! Davam-me assistência com os próprios carros e ferramentas, sem receberem nada em troca. Passo a passo, fomos evoluindo, aprendendo com os erros e, com a ajuda de alguns patrocínios, conseguimos formar uma das melhores equipas do Nacional de Ralis.

O Escort era a máquina que (quase) todos queriam ter na altura. Que recordações guardas da condução desse mítico carro?

Conduzir o Escort dava um prazer enorme. A concorrência era grande, o que me ajudou a crescer enquanto piloto. Recordo-me que passava horas a ver os pilotos de fábrica em filmes. O carro permitia uma aprendizagem fantástica, transmitindo muitos ensinamentos e, ao mesmo tempo, perdoando muitos erros. Lembro-me de um episódio no Rali do Algarve, em 1984 quando, a cerca de 300 metros do final de um troço, entrei em pião numa curva à direita e fiquei em sentido contrário. Como era difícil fazer inversão de marcha, meti a marcha-atrás e acabei o troço assim. Hoje em dia, na internet, podem ver-se imagens desse momento…

Como é que os homens da Lancia te convenceram a conduzir o 037?

Aquando da estreia do Lancia S4 no Rali do Algarve, em 1985, o carro teve alguns problemas e eu passei o Markku Alen em algumas Classificativas. Ele deu depois uma entrevista ao jornal A Bola, dizendo que pensava que, em Portugal, só havia dois pilotos: o Joaquim Moutinho e o Joaquim Santos, mas que tinha visto passar nos troços algarvios um tal de Carlos Bica, de quem tinha gostado muito, o que me deixou orgulhoso.

No fim do rali, o Cesare Fiorio, o Giorgio Pianta e o Ninni Russo perguntaram-me se não estaria interessado em correr em Portugal com um carro da marca italiana. E foi então que que passei a conduzir o Lancia Rally 037.

Ainda te recordas do primeiro contacto com o carro? Como era conduzir aquela “Besta”?

O primeiro contacto aconteceu na pista de testes da Abarth. As mudanças não entravam, o barulho era tremendo, um autêntico Fórmula, até que o Pianta se sentou ao meu lado e me deu umas dicas. Aí, as coisas melhoraram, mas o primeiro rali da temporada de 86, o Sopete, com o tempo incerto, foi muito difícil. Fomos depois ao Rali das Camélias e, logo no primeiro troço, Alcabideche, entrámos em pião numa curva e começámos andar em marcha atrás, mais depressa do que vínhamos andando até aí, para a frente, batendo de traseira numa árvore. No Rali de Portugal, marcado pela desistência dos pilotos de fábrica, conseguimos finalmente terminar a prova, em segundo lugar, o que nos permitiu ganhar rodagem com o carro. Ainda assim, não era fácil dominá-lo, sobretudo quando explorávamos os seus limites. O nosso melhor rali acabou por ser o da Madeira, onde estavam doze Lancia 037 inscritos. No final, ficámos em quinto lugar, quarto dos 037 e os melhores portugueses.

Pelas suas características, terá sido este o carro que mais te marcou? Todos me deram boas recordações mas, relativamente ao 037, ficou uma espécie de sabor amargo por só ter corrido um ano com ele….

Para alguém que conduzira um Grupo B, a transição para o Grupo A foi algo frustrante ou o Delta 4WD era igualmente estimulante?

A mudança do Grupo B para o Grupo A foi drástica. Em tão poucos meses, a Abarth não tinha capacidade para fornecer a equipa de fábrica e ainda os privados, tendo por isso sugerido que se construísse um carro no preparador Conrero, que já tinha provas dadas com a Opel. O resultado final foi aquilo a que chamávamos um “N/A”, nem grupo A, nem grupo N! Foi um ano difícil, com vários episódios, como o do Rali da Madeira, onde treinámos com o 037 e, quando começou o rali, as notas estavam todas erradas para o Delta. Com a chegada do Grupo A, de fábrica, no rali do Algarve desse ano, tudo começou a ser diferente.

De 1988 a 1991 assistiu-se a uma hegemonia de Carlos Bica no Nacional de Ralis. Qual dos quatro títulos te deu mais gozo conquistar?

Todos foram importantes, principalmente por ser a primeira vez que um piloto vencia o Campeonato Nacional quatro vezes consecutivas, mas o primeiro foi o mais difícil, pois ganhei por meio ponto em relação ao Quim Santos.

Terá sido este, o momento mais feliz da tua carreira?

O primeiro campeonato foi efectivamente o mais marcante, complementado pelo nascimento do meu filho Mário, poucos dias depois.

Eras, nesta altura, piloto profissional?

Nunca fui profissional, mas houve anos em que a equipa me absorveu entre 200 a 250 dias por ano, pois era eu quem tinha a última palavra em tudo o que se relacionasse com o projecto e, por isso, tinha que lhe dedicar muito tempo.

Como te caracterizas enquanto piloto?

Não me considero um piloto de sprint, explosivo, sempre a fundo do primeiro ao último metro, mas sim um piloto táctico para ralis de vários dias, tentando controlar o andamento conforme as necessidades.

Nesse período de domínio, gostarias de ter contado com uma concorrência mais forte, nomeadamente com carros de quatro rodas motrizes?

Nos cinco anos em que corri com carros de quatro rodas motrizes tive, como adversários, dois carros da Renault oficial, dois Ford, um da Diabolique e outro da Rodam, e ainda um Toyota oficial, conduzidos pelos melhores pilotos da altura. Nos ralis de Portugal, Madeira e Açores, onde tínhamos a concorrência estrangeira, lutávamos todos nós, os pilotos nacionais, com equipas que dispunham de meios semelhantes e, normalmente, ganhávamos. Por isto, digo que a competitividade existente não era má, embora gostasse de ter tido mais concorrência, já que ajuda sempre a evoluir.

Quem consideras ter sido o teu grande adversário?

Nos dez anos que corri no Nacional, tive a companhia de grandes pilotos como António Rodrigues, Joaquim Moutinho, António Coutinho, Inverno Amaral, Jorge Ortigão e tantos outros, mas, pelo tempo que correu e pela grande equipa que o apoiava, a Diabolique, destaco o Quim Santos.

Foste por três vezes o melhor português no Rali de Portugal. Qual era a táctica para fazer a correcta gestão de uma prova com aquelas características?

Como o rali durava cinco dias, com cerca de 2000 km e mais de 500 km de troços, tinha que existir alguma táctica, pois quem tentasse fazer todo o rali a fundo, não chegaria ao fim. No meu caso, na primeira etapa, em asfalto, tentava andar rápido, sem cometer erros para não perder muito tempo, já que a segunda etapa era em terra e não convinha sair muito atrás por causa do pó. Nas segunda e terceira etapas, a palavra de ordem era tentar poupar o carro nos maus pisos para não ter problemas mecânicos muito graves, de difícil resolução. Na quarta etapa, o objectivo era colocar no carro as melhores peças para se poder atacar, pois alguns já estavam presos por fios tanto na mecânica como fisicamente. O Rali era muito duro e, nalgumas edições, cheguei a perder cerca de 10 quilos.

O que garantia maior retorno mediático, ser campeão nacional ou o melhor português no Rali de Portugal?

Na altura, o Rali de Portugal devia ser o evento que dava maior retorno mediático. Nas negociações com os patrocinadores, essa prova valia 40% do pacote total.

Depois do quarto título consecutivo, e ainda relativamente jovem, decides pôr um fim à tua carreira. O que te levou a tomar essa decisão?

Após a conquista do quarto campeonato, só uma carreira internacional seria motivante. Queria continuar a evoluir e sentia que, do ponto de vista da pilotagem, estava mais do que preparado par dar o salto. Infelizmente, não consegui a verba para dar corpo a esse projecto e decidi dar por finalizada a carreira desportiva. Queria algo mais, ser o “melhor da minha rua” já não chegava.

Apesar disso, chegaste a competir além-fronteiras?

As únicas experiencias no estrangeiro passaram por três participações no Memorial Bettega, e uma ida ao Rali da Polónia, que recordo negativamente já que, tínhamos todas as condições para vencer, mas por incompetência da equipa Astra, não o conseguimos…

Nunca pensaste abraçar outras modalidades?

Tive uma experiência única no todo terreno, em 1990, na Baja de Portalegre, onde alinhei com o tal Lancia Delta “N/A”. Recordo-me que choveu muito e, a 60 km do fim, quando estávamos em quinto lugar, o motor sobreaqueceu, em virtude da grande quantidade de lama no radiador, e partiu. No entanto, a minha paixão chamava-se ralis.

Mais recentemente, chegaste a conduzir o carro Zero no Rali de Portugal – versão Algarvia. Tecnicamente, do ponto de vista da condução, como caracterizas as diferenças entre as Classificativas do novo e do antigo Rali de Portugal?

Basicamente, a grande mudança operou-se na filosofia dos ralis. Na altura, tínhamos cerca de 2000 km de rali, com mais de 500 km de troços, e agora temos 1000 km de rali e 300 km de Classificativas. O Algarve reúne, neste momento, as condições ideais para responder ao caderno de encargos da FIA mas, em termos de troços, o nosso país está, felizmente, bem servido, tanto no norte como no sul.

Como vês o estado actual do desporto automóvel em Portugal?

No desporto automóvel, já fiz um pouco de tudo. Fui navegador, piloto, director de equipa, integrei a direcção da FPAK, fui membro dos corpos sociais do ACP e da APPA, passei por várias fases do desporto automóvel, mas nunca me lembro de uma situação tão má, em todos os aspectos, como a que vivemos nos últimos 10 anos.

Felizmente, o ACP e a equipa liderada por Carlos Barbosa, conseguiram colocar de novo o Rali de Portugal no calendário do Campeonato do Mundo, sendo esse o único aspecto positivo a assinalar nos últimos tempos.

Encontras na agricultura biológica alguma da adrenalina que um ex-piloto ainda precisa?

Sem dúvida. No Algarve, onde vivo atualmente, tenho um projecto de agricultura biológica, que requer grandes cuidados para responder a exigentes critérios de qualidade. Nesse aspecto, a adrenalina está presente, mas ao mesmo tempo, e tal como os ralis no passado, dá-me imenso gozo. Por outro lado, dedico também mais tempo aos filhos, especialmente à Beatriz, que ainda vive connosco, mas também aos graúdos Mário e Carlota, a viver em Lisboa, e ao Tiago, que vive em São Paulo, com quem tentamos estar sempre que possível.

Recordas com frequência os tempos em que desafiavas o cronómetro nas curvas da Serra do Açor?

Recordo com saudade. Tive a sorte de ter começado nos ralis, no tempo em que tudo era um pouco amador, treinava-se com carros da Avis e, ao fim do dia, juntavam-se uns trinta ou quarenta pilotos e navegadores para jantar. Evoluiu-se depois para outra fase, mais profissional, em que as pessoas eram mais fechadas, só pensando na equipa e nos resultados. De qualquer modo, do princípio ao fim, vivi anos fantásticos…

BICA CHEIA…DE TÍTULOS

Se é frequente vermos, no desporto motorizado, como em outras modalidades ou outras artes, os filhos a seguirem as pisadas dos pais, o contrário é menos comum. Já o jovem Carlos Bica evoluía no percurso desportivo quando foi confrontado com o facto de o seu pai, Carlos Costa Bica, ter decidido alinhar em provas do Regional de Iniciados, como recorda o Carlos (filho): “Estávamos em 1982 e o meu pai mostrou interesse em fazer ralis de Iniciados! Acabou por fazer duas provas com o meu antigo carro, o Escort Mexico, sendo eu o seu navegador. No ano seguinte, dispondo já do Escort RS1800, e com o João Madeira como navegador, foi campeão de Iniciados Sul aos 50 anos! Devo dizer que, para mim, não era fácil estar do lado de fora e senti exactamente o que os meus pais passavam cada vez que eu corria”. Note-se que, nesta altura o Campeonato de Iniciados estava dividido em dois (Norte e Sul) e da contenda disputada a sul, faziam parte provas como o Rali do Sintrense, o Rali Cidade de Évora ou o Rali Cidade de Abrantes. Mas os títulos em ralis não acabam por aqui. Já depois de Carlos Bica ter abandonado a competição, e numa espécie de passagem de testemunho, o seu irmão Jorge Bica, haveria de se sagrar campeão nacional em 1993, ao volante de um Lancia Delta.

O DIA EM QUE VATANEN VIU UM FORMATO QUE LHE ERA FAMILIAR

O Rali de Portugal de 1985 foi, sem dúvida, uma das provas mais marcantes da carreira de Carlos Bica. A justificá-lo, está, não só o excelente resultado alcançado, mas também o facto de ter disputado quase todo o rali com o Escort bastante mal tratado, na sequência de uma saída estrada ainda na ronda de Sintra. Para Bica, que se fazia acompanhar nesta prova por João Sena, este percalço inicial haveria de tornar o rali numa prova bastante insólita: “No dia anterior fomos fazer reconhecimentos a Sintra e recordo-me de uma curva que costumava ter areia, mas que, nesse dia em que fomos reconhecer, estava limpa. Acontece que, no dia do rali, o Vatanen teve um despiste nessa curva e voltou a sujá-la. Quando lá chegámos também nos despistámos e capotámos várias vezes, conseguindo, mesmo assim, chegar ao fim do troço. O carro parecia o chapéu de um pobre! Não tinha uma única peça da carroçaria que não estivesse amachucada. Durante o resto do rali, não voltei a conseguir sair pela minha porta! Fomos tentando arranjá-lo o melhor possível, mas saímos da ronda de Sintra em 96º da classificação geral. Lembro-me que, logo após o final da ronda, quando estávamos na neutralização, junto ao Aeródromo de Tires, o Vatanen viu o meu carro e ficou curioso, querendo saber a quem pertencia. Quando descobriu, veio ter comigo, deu-me um abraço e comentou que o estado do carro lhe fazia lembrar a forma como havia deixado alguns Escort no passado! O restante rali foi feito em Maximum Attack, como diria Markku Alen, já que nada tínhamos a perder. A prova acabou por nos correr muito bem, tendo terminado em 7º lugar e 2º da classificação dos portugueses. A combinação do resultado com o estado do carro acabaria por nos dar destaque em vários jornais do estrangeiro…”

AS DIFERENÇAS DE UMA ASSISTÊNCIA OFICIAL

No Rali de Portugal de 1990, Carlos Bica contou com assistência oficial da Lancia, o que, para além da evidente vantagem competitiva, permitiu, acima de tudo, ter consciência dos meios de que dispõem as equipas de fábrica e de como isso se reflecte na forma como pilotos, mecânicos e restante staff realizam o seu trabalho. A consubstanciar estes contrastes, o piloto português recorda “dois momentos que nunca vou esquecer: o primeiro, quando chegámos ao troço da Freita, perto das duas horas da madrugada e estava a nevar! Na assistência, disseram-nos que não vinham preparados para aquelas condições e, por isso, iriam montar pneus intermédios no Delta, como haviam feito nos carros oficiais. Pediram-nos para nos safarmos o melhor possível! Quando chegámos ao troço, a neve era tanta, que mais parecia uma Classificativa do Monte Carlo. Nós éramos os primeiros não oficiais e, quando partimos, chegámos à conclusão que os pilotos de fábrica, que haviam partido antes de nós, haviam adoptado um estilo de condução como se estivessem algures na Suécia. Só que ali, na Freita, os montes de neve eram substituídos por muros e, em resultado disso, nos quilómetros iniciais, só víamos montes de peças no meio da estrada. Foi um suplício conduzir naquelas condições, mas conseguimos chegar ao fim, sem grandes mazelas.

O segundo episódio

refere-se ao último dia. Estávamos a discutir o 5º lugar com o

Hannu Mikkola, que alinhava num Mazda 323 4WD. Na primeira passagem

por Arganil, quando faltavam cerca de 10 km para o final do troço,

tive um furo e abrandei de imediato para mudar o pneu, quando ouço,

pelo rádio, o Ninni Russo, que seguia no helicóptero, a

perguntar-me o que estava a fazer. Quando lhe disse que pretendia

mudar a roda, respondeu-me imediatamente para seguirmos assim até ao

fim da Classificativa, e assim fizemos. Quando chegámos ao final,

com a frente quase destruída no lado direito, tínhamos cerca de dez

mecânicos à nossa espera para reparar o carro. É então que o Fanã

sai do carro aos gritos, lembrando que só tínhamos 7 minutos para

estar ali. O Ninni virou-se para ele e disse ‘tu aqui és

navegador, nós a assistência, por isso, vai para dentro do carro,

aperta o cinto e, quando aquele senhor, o Rino (n.d.r. Rino

Buschiazzo, chefe dos mecânicos) te der ordem para partir, façam a

ligação o mais depressa possível e, se puderes, dá-lhe notas na

ligação’.

Passados alguns minutos, tínhamos montada no Delta uma frente completamente nova, sem penalizarmos! Chegámos ao final do rali em 5º lugar, à frente do Mikkola”…

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