F1 e WRC: A tradição dos ‘finlandeses voadores’

Por a 14 Julho 2023 15:09

A Finlândia sempre foi um dos maiores exportadores de talento para os ralis, Fórmula 1, todo-o-terreno e até para o motociclismo! Alguns finlandeses permanecem como lendas vivas do desporto motorizado. Saiba quem são…

Ari Vatanen, Hannu Mikkola, Timo Salonen, Keke Rosberg, Juha Kankkunen, Tommi Mäkkinen, Mika Häkkinen, Kimi Räikkönen e Marcus Grönholm. De Kalle Rovanpera falaremos daqui a uns anos bons, e de Jari-Matti Latavala, uma nota de destaque, não pelo que ganhou, mas pelo espetáculo que deu nos troços…

Consegue imaginar quantos títulos mundiais trouxeram estes pilotos para a Finlândia? Nós damos-lhe a resposta: 17. Deve ter reparado que apenas Rosberg, Häkkinen e Raikkonen não foram campeões do mundo nos ralis. É precisamente nesta especialidade que o domínio dos pilotos finlandeses assumiu durante muito tempo contornos quase míticos, que dois franceses trataram de rebater nas últimas duas décadas. E os números comprovam-no: das 44 edições disputadas no Mundial de Ralis (instituído oficialmente em 1979), mais de metade (18+14) foram ganhas por pilotos daquele país báltico e por três franceses. Juha Kankkunen (campeão em 1986, 87, 91 e 93) e Tommi Mäkkinen (1996, 97, 98 e 99) eram, inclusive, até à altura os únicos pilotos na história do Campeonato do Mundo com quatro títulos no palmarés. Marcus Grönholm (vencedor em 2000 e 2002) também imortalizou o seu nome ao entrar na restrita galeria dos bicampeões, onde já estavam os “não-nórdicos” Walter Rohrl, Massimo Biasion e Carlos Sainz, com os franceses Sebastien Loeb e Sébastien Ogier a revirarem por completo estes recordes.

Há ainda uma outra categoria de “finlandeses voadores” na história dos ralis: aqueles que nunca foram campeões do mundo.

O caso mais conhecido é o “nosso” Markku Alen que, apesar das 20 vitórias em provas do Mundial (cinco em Portugal), nunca chegou a Campeão do Mundo. Em 1978, um ano antes da estreia do Mundial, “o finlandês mais português do mundo” venceu a Taça FIA, o título de ralis mais prestigiante até então.

Mas os verdadeiros percursores da era dos “finlandeses voadores” foram homens como Rauno Aaltonen (Campeão Europeu em 1965), Timo Mäkkinen, Simo Lampinen e Pauli Toivonen (Campeão Europeu em 1968). Este último era pai de Henri Toivonen, o mais jovem vencedor de uma prova do Mundial de Ralis, que morreu no Rali da Córsega em 1986, após o seu Lancia se ter despistado e explodido.

Eles e a Fórmula 1

Apesar de menos expressiva do que nos ralis, a presença dos finlandeses na Fórmula 1 rendeu três títulos mundiais. Em 1982, Frank Williams e Patrick Head entregaram um dos seus carros a Keke Rosberg, depois deste os ter impressionado num teste em Paul Ricard. Com apenas um Grande Prémio vencido nessa época, o finlandês conquistou o título de pilotos para a Williams. Quase uma década depois, Rosberg tornou-se manager de um jovem promissor, seu compatriota, que tinha dado nas vistas ao sagrar-se campeão da Fórmula 3 britânica.O seu nome? Mika Häkkinen, futuro Campeão do Mundo de Fórmula 1 em 1998 e 1999.

A entrada no Mundial de F1 deu-se pela porta da Lotus-Judd, em 1991. Dois anos volvidos e Häkkinen seria contratado para piloto de testes da “sua” McLaren.

Nessa altura, as fracas performances de Michael Andretti precipitaram o regresso do piloto americano aos Estados Unidos. O jovem finlandês foi promovido a piloto de corridas e, no primeiro GP com um McLaren-Ford (Estoril, 1993), qualificou-se à frente do companheiro de equipa, Ayrton Senna. No entanto, um grave acidente nos treinos para o Grande Prémio da Austrália, em 1995, quase acabava com a carreira (e a vida) de Häkkinen. Numa curva a alta velocidade, um pneu furado atirou o McLaren contra os muros de proteção do circuito de Adelaide. O esmagamento de um nervo facial provocou lesões cerebrais que mantiveram Häkkinen em coma durante algumas horas. Apesar de ter recuperado, muitos notaram que o estilo de condução do piloto finlandês tinha mudado após o acidente. A fogosidade original tinha sido substituída por um estilo suave, de trajectórias “limpas” e, sobretudo, incrivelmente veloz.

Talvez por ter passado pelo “inferno”, Häkkinen não se conteve no pódio da sua primeira vitória (Jerez, 1997) e chorou. Chorou tanto que a sua alcunha foi humoristicamente alterada para “The Crying Finn”. O certo é que, com ou sem lágrimas, quase ofuscou a passagem de outros compatriotas pela Fórmula 1, como J.J. Lehto e Mika Salo.

Em 2002, Ron Dennis descobriu na Sauber a nova “pérola” finlandesa: Kimi Raikkonen. A preferência da Mercedes passava então pelo alemão Nick Heidfeld mas, talvez influenciada pelo factor-Häkkinen, a escuderia britânica preferiu o talento finlandês à regularidade germânica e piloto ainda na McLaren-Mercedes provou que era, juntamente com Fernando Alonso, o principal candidato a dominar a Fórmula 1 na década seguinte, mas só conseguiu ser campeão em 2007, com a Ferrari, num campeonato memorável que Raikkonen, Lewis Hamilton e Fernando Alonso chegaram à última prova separados por um ponto, com o finlandês em terceiro, acabou por ser ele o campeão.

As fornadas seguintes estiveram longe da valia dos finlandeses voadores até então. Pilotos como Miko Hirvonen (WRC) e Jari-Matti Latvala (WRC) carregaram sobre os ombros a responsabilidade de manter a linhagem dos “finlandeses voadores”. Na Fórmula 1, Heikki Kovalainen teve uma carreira positiva, mas que se quedou só por uma vitória, e nos ralis Hirvonen e Latvala nunca conseguiram sair da sombra de Loeb e depois de Ogier.

As sete vitórias que Valtteri Bottas já conseguiu na F1 desde 2013 – leia-se, depois de ter substituído o campeão Nico Rosberg (ele que é filho de um campeão finlandês, mas é alemão) – não lhe valem um estatuto de grande estrela, pois sabe-se que muitos outros pilotos de 2016 para cá, com um Mercedes, teriam feito o mesmo, ou melhor. É muito bom, mas não é excelente.

Nos ralis, Mikko Hirvonen e Jari-Matti Latvala estão entre os melhores de sempre da história dos ralis em número de pódios, mas bem mais longe quando se fala de vitórias e não constam quando falamos de títulos. Uma enorme travessia do deserto que a Finlândia fez nos ralis, e que terminou em 2022 com o título de Kalle Rovanpera. Esapekka Lappi é um bom finlandês voador, mas é Kalle Rovanpera que se arrisca a bater todos os recordes anteriores dos seus compatriotas, se calhar dos franceses, também. Daqui a uns anos talvez tenhamos que refazer este texto e ter mais umas ‘coisitas’ para dizer quanto aos finlandeses.

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