Nelson Silva: Objetivo cumprido, mais desafios a caminho

Por a 2 Janeiro 2023 12:55

Nelson Silva foi notícia nos primeiros meses do ano, ao tornar-se no primeiro amputado a correr numa competição nacional. O seu trajeto foi seguido pelo AutoSport e agora, terminada a época, é tempo de balanços.

2022 foi um ano de superação para Nelson Silva. Com o foco num objetivo ambicioso, iniciou uma caminhada que será recordada por muito tempo. A sua vontade era fazer história no desporto motorizado nacional, deixando uma marca muito especial: tornar-se o primeiro amputado a correr numa competição nacional, abrindo portas para outros que queiram seguir o seu exemplo. Fez-se história!

Falamos com Nelson Silva em março, quando preparava a sua época no Campeonato de Portugal Rotax, numa altura em que as dúvidas eram muitas. A época completa não estava garantida e faltavam ainda apoios. Mas as dúvidas foram-se desvanecendo à medida que o seu plano foi sendo cumprido e as metas alcançadas. Recordamos brevemente a história de Nelson, que em 2007 viu a sua vida virada do avesso, quando um acidente de mota lhe fraturou as duas pernas. Como consequência, a perna direita teve de ser amputada. No entanto, a forma como encarava a vida não se alterou e continua a querer fazer o que mais gosta, desafiando-se a si e mostrando aos outros que a sua limitação não o impede de chegar onde pretende. Foi nessa altura que a paixão pelos karts se fortaleceu, muito por influência do seu pai, que tinha uma equipa e uma paixão tremenda pelo desporto. Paixão essa que foi transmitida, até ao dia em que o pai faleceu devido a doença, em mais uma rasteira da vida. Mas Nelson nunca esmoreceu. Continuou de cabeça erguida e peito aberto, encarando cada contrariedade com coragem e perseverança. A cada contratempo respondeu com determinação e resiliência. Nunca gostou de ser ajudado e diz de forma muito clara que faz tudo o que os outros fazem, mas à sua maneira.

A velocidade e a adrenalina eram os condimentos indispensáveis à sua vida. Nunca temeu a velocidade. Como qualquer piloto, aprendeu a respeitá-la o suficiente, mas sem nunca se atemorizar. Aprendeu a aproveitar o que de bom ela dá, sem lhe dar demasiada liberdade. “A gasolina é o meu oxigénio” disse-nos na primeira entrevista. Os karts e a participação numa competição nacional tornaram-se numa prova de superação, num testemunho de vida e numa homenagem ao seu pai, que fundou a Albakarting e que, tal como o seu filho, vivia para as corridas.

Passados estes meses, o que aconteceu a Nelson Silva? Que objetivos foram atingidos? No balanço desta época desportiva, Nelson não podia estar mais feliz e orgulhoso:

Sabia que ia ser difícil”

“Foi um ano tremendo! Sabia que ia ser difícil, o que se confirmou, mas tinha em mim a força para chegar aos objetivos traçados e consegui. Terminei em sétimo na DD2 Master, num total de 13 inscritos. Fiz também uma prova no Campeonato de Portugal de Karting Toyota na categoria X30 Master, onde consegui o terceiro lugar na jornada de Leiria. Ainda fui convidado para participar na Taça da Madeira de Karting, onde fui recebido com todo o cuidado e atenção e aproveito para agradecer publicamente a toda a organização da prova que foi inexcedível, proporcionando-me todas as condições para competir.”

Mas se a época começou com o objetivo de abrir portas para o futuro, terminou superando as expectativas. A Albakarting, equipa que gere juntamente com o seu irmão Carlos, acabou por crescer de forma algo inesperada. Dylan Lima, de 16 anos, experimentou o karting graças à equipa e interessou-se pela competição. Depois de mostrar potencial em provas privadas, inscreveu-se no Campeonato de Portugal Rotax, na categoria Sénior Max. A evolução de Dylan, sempre orientado por Nelson, foi clara ao longo da época, culminando com o segundo lugar na categoria DD2, na Taça da Madeira de Karting. O trabalho desenvolvido pela Albakarting deu frutos, apenas 8 meses depois da primeira corrida de Dylan.

“A entrada em cena do Dylan trouxe-me mais responsabilidade, mas foi um desafio que surgiu de forma espontânea e natural. Ele mostrou muito potencial e quis correr na minha estrutura e assim, além de correr, passei também a dar assistência a um jovem com muito talento e grande margem de progressão. Consciente do grau de dificuldade acrescido, achei que era mais uma forma de mostrar que posso fazer o que os outros fazem, com a mesma qualidade.”

Mostrei que é possível”

Sendo o primeiro amputado a correr nos karts a nível nacional, Nelson Silva sentiu na pele os problemas de um país que não está ainda preparado para esta realidade, como nos explicou:

“Houve alturas em que senti claramente que não estavam preparados para me receber. Apesar de ter feito o meu pedido de licença à Federação e de estar explícita a minha condição, deparei-me diversas vezes com falta de conhecimento por parte de organizadores e comissários. Infelizmente houve um ou outro episódio menos feliz e sinto que a FPAK tem de ter mais cuidado em certos aspetos. Se queremos que mais pessoas com limitações físicas compitam no nosso desporto, não nos podemos ficar pelas palavras. Falei com algumas pessoas da Federação, mas não senti o cuidado que achei que deveria ter sido dado. No entanto, estou aberto a falar com a FPAK, indicando as dificuldades que senti e o que pode ser melhorado para recebermos mais pilotos com limitações.”

Desafiamos Nelson Silva a apontar os pontos altos e baixos da época. O piloto de Sintra encontrou muitos pontos positivos a realçar:

“Foi uma grande aventura, com momentos bons, outros nem por isso, mas este desporto é mesmo assim. Lembro-me da minha primeira corrida, talvez a mais difícil, por ser a estreia na competição e por ainda estar a tentar encontrar o melhor compromisso entre gerir a equipa com o meu irmão e fazer o meu trabalho em pista. Mas vivi grandes momentos, dentro e fora de pista. Sinto que evoluí muito, como piloto e homem, conheci pessoas fantásticas, fiz amizades, cumpri o meu sonho e consegui que a nossa equipa crescesse e mostrasse o seu valor. Houve momentos menos bons, sim, mas as vitórias que consegui este ano superam em muito esses momentos. Foi muito duro, física e psicologicamente, foi um desafio tremendo, mas consegui. Mostrei que é possível, mostrei que posso ser competitivo, que a nossa equipa pode ser competitiva. Foi uma aventura espetacular, que tive o gosto de fazer com a minha mulher e a minha filha, que abdicaram de muito para que eu pudesse chegar onde cheguei. A elas, ao meu irmão que esteve sempre ao meu lado e à minha família o meu agradecimento profundo, assim como a todos os que me apoiaram.”

Para concretizar, basta querer”

Quanto ao futuro, Nelson Silva olha com otimismo para 2023 e para os próximos desafios:

“Para já, o plano passa por repetir a presença no Campeonato de Portugal Rotax, se tiver apoios para tal. Mas a teimosia é uma caraterística minha e quero provar que nada é impossível. Pretendo colocar a fasquia ainda mais alta e fazer uma prova do CPK, na categoria X30 Super Shifter, atingindo assim o topo do karting em Portugal. Sei que não é fácil, mas também esta época não era fácil e consegui muito mais do que tinha inicialmente pensado. As limitações estão apenas na nossa cabeça. Para concretizar, basta querer. Quero também continuar a ajudar o Dylan a crescer e a melhorar. Ele vai continuar com a Albakarting e fico muito feliz e orgulhoso de o ter comigo em mais uma época. O plano passa também por fazer crescer a nossa equipa e gostaria muito de receber pilotos com algum tipo de limitação, que queiram fazer provas, ou apenas experimentar as sensações do karting. Não quero apenas abrir portas, quero que outros me acompanhem e que consigam superar-se.”

Se esta história já era inspiradora quando falamos dela pela primeira vez, tornou-se mais ainda. O seu exemplo dentro e fora de pista chamou a atenção de várias pessoas. Muitos ficaram a conhecer o seu projeto, várias pessoas interessaram-se e no final, os resultados excederam as expectativas. Tudo vale a pena quando a alma não é pequena, dizia Fernando Pessoa. Nelson Silva provou que tem uma alma gigante, apenas comparável à sua teimosia de provar que pode chegar onde quer, e à sua determinação. Desistir nunca será opção. Por ele, pelo seu pai, pela sua família e por todos os que o acompanham. 2022 foi um ano memorável para Nelson Silva, onde colecionou vitórias como poucos, juntando-as às muitas que já tem no passado. São vitórias que não valem taças. Valem muito mais do que isso.

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