SCHUMACHER-FERRARI VS HAMILTON-MERCEDES: HÁ UMA NOVA DINASTIA NA F1?

Por a 9 Janeiro 2019 19:05

Bateu todos os recordes, o maior deles o número de títulos conquistados na Fórmula 1, tinha um estatuto em pista inatacável devido ao seu superior talento e à capacidade de reunir uma equipa em seu redor, utilizando-a para enriquecer o seu palmarés. Nasceu em janeiro, há 50 anos, tal como aquele que é hoje o seu sucessor, que já lhe roubou alguns dos recordes julgados imbatíveis e que acaba de chegar ao olimpo com a conquista do quinto título mundial e, tal como o primeiro, soube reunir a equipa em seu redor. Há uma nova dinastia na Fórmula 1?

Nasceu em Hurt-Hurmelheim, no mês de janeiro, no meio de porcas e parafusos, motores e cheiro a gasolina e, serodiamente, deu sinais que seria brilhante com um volante nas mãos recolhendo o seu primeiro título com tenros 15 anos. Repetiu no ano seguinte a receita e desaguou entre os adultos ficando num razoável terceiro lugar nos campeonatos de karting alemães e internacionais. Mostrou muita qualidade e depois de receber a coroa de vencedor do Campeonato Alemão e Europeu de Karting foi direto para os automóveis com a Fórmula Koenig. Passou pela disciplina como um meteoro, “limpou” nove corridas e o título, acelerando para a Fórmula Ford 1600. Vice-campeão europeu com apenas quatro corridas feitas, atirou-se para a Fórmula 3 e no ano de estreia ficou em segundo a um ponto do campeão, Karl Wendlinger. Nesse ano venceu a primeira manga do GP de Macau, pista onde nunca tinha andado…

Foi campeão de Fórmula 3, venceu as grandes corridas da disciplina, o GP de Fuji e de Macau, recebendo o cetro de Campeão do Mundo de F3, já que a corrida da Guia foi eleita como “o” Campeonato do Mundo. Começou a deixar claro que nada o impedia de chegar aos seus objetivos e Mika Häkkinen sentiu isso na pele, ou melhor, no carro. Fez parte do Junior Team da Mercedes, espalhou classe ao volante dos Sauber Mercedes, mas conseguiu apenas uma vitória no Mundial de Sport, no México, tendo como companheiro de equipa o alemão Jochen Mass.

Não ganhou as 24 Horas de Le Mans, porque Bertrand Gachot decidiu aplicar gás pimenta na cara de um taxista em Londres, perdeu o lugar na Jordan e o irlandês Eddie Jordan foi facilmente convencido, pelos dólares da Mercedes, em dar-lhe o volante que foi do azougado piloto franco-belga. Cumpriu a sua estreia na Fórmula 1 num dos mais belos palcos, o circuito de Spa Francorchamps. Imediatamente disse ao que vinha: sétimo na qualificação ao volante do belo Jordan 191 com as cores da 7Up, oferecendo meio segundo a Andrea de Cesaris, seu colega de equipa. A embraiagem do carro encurtou-lhe a estreia, mas fez o suficiente para que Flavio Briatore ganhasse a coragem de o arrancar das unhas de Eddie Jordan e, sobretudo, da Mercedes, que estava a contar com o piloto alemão para o seu regresso à Fórmula 1 em 1993. Acreditou no responsável da Benetton, virou costas a Jordan e à Mercedes, e sentou-se ao lado de Nelson Piquet, infernizando-lhe a vida.

Michael Schumacher é o homem de todos os recordes, o maior deles, os sete títulos de Pilotos conquistados, cinco deles consecutivos ao volante de um Ferrari. Controverso como homem, mostrou um feitio intratável em pista e conheceu, mesmo, o ponto mais baixo da sua carreira no ano de 1997. Nesse ano, Jacques Villeneuve, filho do enorme Gilles Villeneuve, deu-lhe “água pela barba” e a decisão do título foi arrastada para ao GP da Europa, disputado em Jerez de la Frontera, última corrida da temporada.

Acossado por Villeneuve, Schumacher viu o canadiano preparar-se para o ultrapassar e, na 48ª volta, decidiu tentar acabar com o campeonato provocando um acidente com o Williams. A coisa não correu bem, Villeneuve seguiu rumo ao título e Schumacher ficou na escapatória. A FIA não gostou da atitude do alemão – que se juntou a outros episódios, nomeadamente com Damon Hill (Austrália 1994, quando ambos embateram e abandonaram dando o primeiro título a Schumacher) – e desclassificou-o do Mundial de 1997, perdendo o título de vice-campeão. Algo que acompanhou, sempre, a carreira do alemão, tal como o episódio do pódio de

Imola, depois do acidente de Ayrton Senna que foi fatal para o brasileiro.

Foi com a Ferrari e com a tripla Jean Todt, Ross Brawn, Rory Byrne, que Michael Schumacher chegou ao topo: cinco títulos consecutivos e muitos recordes que ainda hoje sobrevivem. Foi também com a Ferrari que sofreu o seu pior acidente quando o alemão perdeu o controlo do Ferrari e saiu em frente a mais de 200 km/h, partindo as pernas. Retirou-se em 2006 com mais um vice-campeonato no bolso, regressando quatro anos depois, finalmente, com a Mercedes. Com 42 anos, o alemão mostrou que ainda era competitivo, mas não o suficiente para lutar por mais títulos. Virou as costas à Fórmula 1 em 2012 com um 13º lugar no campeonato. Um acidente numa pista de esqui, acabaria por o deixar entre a vida e a morte, não se sabendo, hoje, como está Michael Schumacher.

PERCURSOS SEMELHANTES

Nasceu no mês de janeiro em Tewin, Inglaterra, e começou a andar de kart com oito anos, tendo impressionado com o seu talento no meio dos adultos, captando a atenção de Ron Dennis, patrão da McLaren. Sem hesitações, Dennis decidiu acolher no seu seio o jovem piloto e financiou-lhe a carreira tendo como condição manter as exibições em pista e boas notas na escola. Com 17 anos, conquista o primeiro titulo com a vitória na Fórmula Renault Britânica.

Voou para a Fórmula 3, foi campeão em 2005 e deu um salto de gigante para a GP2 em 2006, ocupando o lugar de… Nico Rosberg na equipa ART Grand Prix. O seu brilhante talento permitiu-lhe espalhar classe e bater pilotos bem mais experientes, conquistando o título no ano de estreia. Desnecessário dizer que Ron Dennis não quis esperar mais e no ano seguinte colocou-o na McLaren-Mercedes ao lado de Fernando Alonso. Consumava-se, finalmente, a estreia de um negro na Fórmula 1, depois do americano Willy T. Ribbs ter aparecido, em 1986, no Circuito do Estoril, ao volante de um Brabham, mas para ensaios privados.

E no ano de estreia, começou logo a bater recordes: três pódios consecutivos, bateu o que tinha feito Peter Arundell (britânico que fez 11 corridas de F1, cometeu o feito de ganhar a primeira corrida na prova de estreia na Fórmula Livre e obteve dois pódios consecutivos na sua época de estreia, 1964, no GP do Mónaco e em Zandvoort) e assumiu a liderança do campeonato com 22 anos, na sua época de estreia. A primeira pole-position e a primeira vitória não tardaram (ambas no GP do Canadá 2007, o mesmo onde Robert Kubica sofreu um pavoroso acidente e onde o Safety Car esteve quatro vezes em pista), repetindo a gracinha na semana seguinte, no GP dos EUA, em Indianápolis, com pole-position e vitória, depois de uma galharda luta com Fernando Alonso. Isso deixou o espanhol “piurso” e a relação entre os dois desceu à garagem. Indiferente a isso, fechou as primeiras nove corridas da sua temporada de estreia com nove pódios!

Claro que o excesso de confiança levou ao erro, com um violento acidente no Nürburgring, de onde escapa sem uma beliscadura, e uma desobediência às ordens de Ron Dennis no GP da Hungria, que lhe valeu o patrão ordenar a Alonso que o bloqueasse. Uma violenta discussão com Ron Dennis não impediu que rubricasse no Hungaroring a sua terceira vitória da época. Voltou a vencer no GP do Japão disputado em Fuji e, naturalmente, com piso molhado e nevoeiro. Estava a caminho do título no seu ano de estreia, mas na China e no Brasil deitou tudo a perder. Em Xangai depositou o McLaren-Mercedes na areia da escapatória da entrada das boxes, abandonando, enquanto que no Brasil, debaixo da pressão de Alonso, despistou-se para depois ser vítima de um problema eletrónico que deixou o McLaren ao “ralenti”, perdendo muito tempo e terminando a corrida no sétimo lugar, perdendo o título para Kimi Räikkönen, que venceu na China e no Brasil.

Não conseguiu ser o primeiro piloto a ganhar o título na sua época de estreia, mas deixou claro que o futuro da Fórmula 1 passava por ele. No ano seguinte tinha Heikki Kovalainen a seu lado (Alonso decidiu regressar à Renault) e parecia reunir as condições ideais para conquistar o título. A Ferrari estava apostada em defender o título de Räikkönen e alguns erros acabaram por ir complicando a tarefa, até que na China deu mostras de

classe ao fazer a pole-position, a volta mais rápida na corrida e levar para casa o troféu reservado ao vencedor. No Brasil, foi tão cauteloso que foi inapelavelmente batido por Felipe Massa, não se entendendo com as alterações de humor da meteorologia brasileira. Massa liderou e ganhou a corrida e celebrou quando passou a linha de meta, pois o seu rival estava no sexto lugar, ultrapassado na volta anterior por Sebastian Vettel, e o título voltava a ficar na Ferrari. Festejos que acabaram em choro, pois o quarto classificado, Timo Glock (Toyota), perdeu o controlo do carro na subida para a meta perdendo a posição para o rival de Massa que, terminando em quarto, arrancou das mãos do brasileiro o título de Campeão do Mundo de Fórmula 1.

A Ladbrokes, casa de apostas britânica, tinha lançado duas apostas no ano de estreia de Lewis Hamilton: iria ganhar uma corrida de F1 antes dos 23 anos (40/1) e ser Campeão do Mundo antes dos 25 anos (150/1). Quem apostou ficou rico pois o britânico venceu a primeira prova aos 22 anos (GP do Canadá 2007) e foi campeão do Mundo em 2008, com tenros 23 anos. É verdade que, depois, esteve cinco anos para ganhar o segundo título, mas a sua conturbada vida pessoal e o domínio de Sebastian Vettel e da Red Bull contribuíram para isso. Alcançada a estabilidade emocional, o britânico é atualmente, e com a saída de Fernando Alonso, o melhor piloto

da Fórmula 1 e merece, agora, receber o legado de Michael Schumacher. Com 33 anos, está a tempo de alcançar o alemão no número de título e de vitórias, pois em quase tudo o resto, Lewis Hamilton já passou Michael Schumacher. Tal como o alemão reuniu em seu redor a Ferrari contando com a ajuda de todos, até dos companheiros de equipa, o britânico tem a Mercedes a seus pés e conta com o auxílio de todos. Tal como Schumacher, já conheceu pontos baixos na sua carreira e alguns destemperos que revelam traços de irascibilidade, nomeadamente, em pista e com a equipa. Mas Lewis Hamilton arrepiou caminho, encontrou a estabilidade pessoal necessária e em 2018 mostrou que está maduro e capaz de manter o domínio da Mercedes, assim Toto Wolff e a sua equipa consigam manter a vantagem competitiva ou, pelo menos, desenvolver o carro de maneira a fechar o fosso face aos adversários, como sucedeu em 2018. Quando terminar a primeira geração híbrida da Fórmula 1, Hamilton terá 35 anos e ainda muito tempo para adicionar recordes ao palmarés. Por tudo isto, Lewis Hamilton e a Mercedes merecem receber o testemunho dinástico de Michael Schumacher e da Ferrari, suspenso desde que o alemão abandonou a competição.

Nota: Artigo foi publicado na Edição 2140 do jornal AutoSport, de 2 de janeiro de 2019.

A estatística foi atualizada no momento da publicação do artigo

TÍTULO MUNDIAIS

SCHUMACHER – 7 (1994, 1995, 2000, 2001, 2002, 2003, 2004)

HAMILTON – 6 (2008, 2014, 2015, 2017, 2018, 2019)

IDADE DO PRIMEIRO TÍTULO

SCHUMACHER – 25 anos, 10 meses e 10 dias

HAMILTON – 23 anos, 09 meses e 26 dias

TÍTULO CONSECUTIVOS

SCHUMACHER – 5 (2000, 2001, 2002, 2003, 2004)

HAMILTON – 3 (2014, 2015 e 2017, 2018, 2019)

GRANDES PRÉMIOS DISPUTADOS ATÉ AO PRIMEIRO TÍTULO

SCHUMACHER – 52

HAMILTON – 35

ÉPOCAS DISPUTADAS ATÉ PRIMEIRO TÍTULO

SCHUMACHER – 4

HAMILTON – 2

TÍTULOS DE CAMPEÃO DO MUNDO COM MAIS QUE UMA EQUIPA

SCHUMACHER – 2 (Benetton, Ferrari)

HAMILTON – 2 (McLaren, Mercedes)

TÍTULOS DE CAMPEÃO DO MUNDO COM MAIS DE UM MOTOR DIFERENTE

SCHUMACHER – 3 (Ford Cosworth, Renault, Ferrari)

HAMILTON – 1 (Mercedes)

TÍTULO DE VICE-CAMPEÃO

SCHUMACHER – 2 (1998, 2006)

HAMILTON – 2 (2007, 2016)

NÚMERO DE PÓDIOS EM CAMPEONATOS

DO MUNDO DE PILOTOS

SCHUMACHER – 12

HAMILTON – 8

NÚMERO DE VITÓRIAS

SCHUMACHER – 91 (29.64% de vitórias)

HAMILTON – 84 (33,60% de vitórias)

IDADE DA PRIMEIRA VITÓRIA

SCHUMACHER – 23 anos, 7 meses e 27 dias (Bélgica 1992)

HAMILTON – 22 anos, 5 meses, 3 dias (Canadá 2007)

VITÓRIAS CONSECUTIVAS

SCHUMACHER – 7 (GP Europa e GP Hungria 2004)

HAMILTON – 5 (GP Itália e GP EUA 2014)

VITÓRIAS CONSECUTIVAS NO INÍCIO DA TEMPORADA

SCHUMACHER – 5 (Austrália, Malásia, Bahrain, São Marino, Espanha)

HAMILTON – 0

VITÓRIAS NUMA TEMPORADA

SCHUMACHER – 13/18 (2004 – 72,22%)

HAMILTON – 11/19 (2014 – 57,89%)

POLE POSITIONS

SCHUMACHER – 68 (22,15%)

HAMILTON – 88 (35,20%)

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