O que dão os “prognósticos depois do jogo” na Fórmula 1?

Por a 8 Abril 2020 21:29

Revisitar jornais antigos redunda, por vezes, numa interessante diversão, especialmente quando se encontram artigos que pretendem antever o futuro. É um desses exemplos que vos oferecemos hoje, um texto escrito no início de 2006, que pretende dar alguma luz sobre o que alguns pilotos poderiam ser… um dia.

O texto arranca com um “Consegue imaginar a F1 daqui a 10 anos? Adivinhar o aspeto dos carros talvez seja complicado mas, para adivinhar os pilotos do futuro, basta analisar as fórmulas de promoção. Candidatos a estrelas, Lewis Hamilton, Robert Kubica, Álvaro Parente”. Um bom ponto de partida”.

Continuemos: “Suzuka, 9 de Outubro de 2005, Grande Prémio do Japão. Na espetacular ultrapassagem de Fernando Alonso a Michael Schumacher, por fora, na curva 130R, caiu um mito. Naquele momento, o heptacampeão passava o ceptro da realeza ao príncipe das Astúrias: Alonso era o novo rei da Fórmula 1. É a lei natural das coisas. O próprio Schumacher correu ao lado de Mansell, Prost e Senna antes de, também ele, se tornar uma lenda da Fórmula 1. Na próxima década, quando Alonso e Kimi Raikkonen ponderarem a despedida da modalidade com um palmarés recheado de títulos, a discussão em torno dos seus herdeiros versará outros jovens sedentos de vitórias, carregados de talento. É por isso que o elemento humano continua a ser um dos fatores mais apaixonantes da Fórmula 1, despertando idolatrias no público e obsessões nos chefes de equipa que perscrutam as fórmulas de promoção em busca do novo Schumacher ou do novo Alonso.

Alguns potenciais campeões já chegaram ao desporto. Nico Rosberg é o novo menino-bonito de Sir Frank Williams, dono da melhor equipa privada da atual Fórmula 1 e alguém que sempre privilegiou o talento e a competitividade dos seus pilotos. Heikki Kovalainen também já tem a trajetória delineada por Flavio Britatore, seguindo o mesmo programa elaborado para Alonso ao fazer um ano como piloto de testes antes de guiar para a Renault no Mundial. Outros, como Nelson Piquet Jr, também estão já na antecâmara da disciplina.

Rosberg, Kovalainen e Piquet Jr. são o arquétipo do jovem piloto com carreira consolidada no karting e nas categorias de acesso à Fórmula 1. Casos como o de Tiago Monteiro, que conquistou o seu espaço sem ter um passado ligado ao karting e sem títulos nas fórmulas inferiores, são cada vez mais raros. E, com o progressivo monopólio dos grandes construtores mundiais, a tendência é para que o talento do piloto seja, mais do que o pacote de patrocínios, o grande fator de decisão das equipas”.

Desconstruindo o que foi antevisto até aqui, e apesar de se falar na “próxima década”, a verdade é que 15 anos depois tanto Fernando Alonso como Kimi Raikkonen ainda por cá andam, embora o espanhol tenha feito um ano sabático de F1, que pode mesmo tornar-se despedida definitiva. Já Kimi Raikkonen, já lhe fizeram o ‘enterro da F1’ várias vezes, mas ainda por cá continua.

Passemos aos mais jovens. “Nico Rosberg é o novo menino-bonito de Sir Frank Williams”. Acertou, Rosberg chegou ao título, mas não foi fácil, porque pela frente encontrou um ‘monstro’, Lewis Hamilton. O alemão aproveitou bem uma oportunidade que se lhe deparou e foi Campeão em 2016. Mas despediu-se da F1 logo a seguir…

Já Heikki Kovalainen, teve uma passagem mediana pela F1. Um triunfo e uma pole para quem esteve na McLaren e na Renault é pouco. Nelson Piquet Jr. Durou duas épocas, foi uma vez ao pódio e o que o marcará para sempre é o ‘Crashgate’ de Singapura.

E agora, Lewis Hamilton. O AutoSport escreveu na altura: “O inglês convenceu a McLaren das suas qualidades aos… 13 anos. E as palavras de Martin Witmarsh, director da equipa inglesa, não poderiam ser mais explícitas: «Não suportaríamos o seu orçamento durante tantas épocas se não achássemos que, um dia, ele poderia ser Campeão do Mundo ao volante de um McLaren». O motivo de tamanha aposta é fácil de perceber se atendermos ao impressionante currículo de Hamilton. Verdadeiro ás do karting, aos 15 anos já era Campeão da Europa (venceu as provas todas) e do Mundo de Fórmula A, ganhando igualmente o Masters de Bercy. A prova de fogo da transição para os monolugares deu-se na Fórmula Renault, onde ganhou a primeira corrida aos 17 anos. No ano seguinte foi campeão britânico da modalidade. Em 2004, optou por correr no mais importante campeonato de Fórmula 3, as Euroseries, ganhando uma das corridas de Norisring.

Mas foi em 2005 que Hamilton esteve absolutamente imparável, ao dominar por completo as Euroseries, vencendo ainda o tradicional Masters de Zandvoort. As suas aptidões inatas ficaram demonstradas na primeira vez que se sentou num monolugar de GP2. Fez duas sessões de testes em Paul Ricard e obteve o melhor tempo em ambas, batendo pilotos que estiveram na competição em 2005, como Piquet Jr, Adam Carroll, Nicolas Lapierre ou Jose Maria Lopez.

Ao contrário do que o seu aspeto possa induzir, este pequeno mestiço de Tewin não é um jogador de futebol ou um cantor de hip-hop. É piloto

de corridas, nasceu para isso. Há mesmo quem afirme que ele vai fazer pelo automobilismo o que Tiger Woods fez pelo golfe.

Ron Dennis já veio serenar os ânimos, dizendo que é muito improvável que a sua estreia em corridas de Fórmula 1 seja com um McLaren.

O futuro imediato passa pela ART e, se a equipa de Nicolas Todt lhe der um monolugar tão eficaz quanto o de Rosberg, então 2006 vai ser a última etapa antes de Hamilton chegar à Fórmula 1”.

Como se sabe hoje, teve razão quem disse que “vai fazer pelo automobilismo o que Tiger Woods fez pelo golfe”. E se calhar, mais.

Já Ron Dennis, depois de ter acertado em cheio, primeiro, enganou-se logo a seguir: “é muito improvável que a sua estreia em corridas de Fórmula 1 seja com um McLaren”. Não só foi, como quase foi Campeão no ano de estreia.

Já quanto a Robert Kubica, ninguém conseguiria antever uma carreira brutalmente interrompida daquela forma: “bastou uma breve sessão de testes com a Renault para se perceber que o piloto de Cracóvia é mesmo um nome a fixar para os próximos anos, impressionando pela facilidade com que chegou a tempos competitivos. Mais do que fornecer feedback técnico aos engenheiros – Kubica conta apenas algumas dezenas de voltas num Fórmula 1 e desconhece a maioria das pistas do Mundial – Mario Theissen quererá que o seu terceiro piloto pressione Jacques Villeneuve ao longo de 2006 e, se confirmar a rapidez esperada, que ocupe o lugar do canadiano em 2007.”

Seria uma progressão quase perfeita para um piloto que começou a dar nas vistas em 1998, no karting, quando se tornou o primeiro não transalpino a vencer o difícil campeonato Junior de Itália. No ano passado, mostrou uma regularidade notável rumo ao título nas World Series by Renault. Depois disso, foi um dos protagonistas no GP de Macau de Fórmula 3, ao travar uma interessante luta pela vitória com o brasileiro Lucas di Grassi. E, estando já integrado numa escuderia de Fórmula 1, o jovem representante do leste europeu tem motivos para estar otimista”.

E tinha mesmo. Pena foi que a BMW saiu cedo da F1, e o polaco, que já tinha chegado às vitórias foi para uma Renault que já não era a mesma de uns anos antes.

Também se falou de Álvaro Parente: “Igualmente com um título importante no bolso, Álvaro Parente também poderá integrar a próxima geração de pilotos de Fórmula 1, desde que a sua carreira continue a ser gerida com a eficácia revelada em 2005. Com efeito, o piloto português teve um ano muito preenchido, acumulando dezenas de milhares de quilómetros entre provas de Fórmula 3, A1 GP e até de Fórmula 3000 italiana! Se a isto juntarmos os testes efetuados no GP2, será difícil encontrar outro jovem piloto que tenha rodado tanto como fez Álvaro Parente na época passada, sendo competitivo em diferentes pistas e monolugares.

Mesmo não escondendo que o objetivo é o GP2, o atual campeão da Fórmula 3 britânica mostra-se cauteloso ao abordar os contactos que tem mantido com diversas equipas interessadas. Álvaro tem o talento; só falta mesmo o resto. A Arden, por exemplo, escolheu Michael Ammermüller para secundar Lapierre em 2006, depois de Parente ter batido claramente o alemão nos testes que ambos fizeram com a equipa em dezembro.

Só que Ammermüller é piloto Red Bull…”

Álvaro Parente esteve muito bem no teste que fez com a Renault, e no mesmo fim de semana de 2009 em que o piloto português dava a primeira vitória à Ocean Racing Technology de Tiago Monteiro na primeira corrida da GP2 em Spa, ficou a saber-se que estava perto de assegurar um volante numa das novas equipas de F1 em 2010, a Virgin (ex-Manor).

A Virgin Racing estava muito interessada nos seus serviços. Os bons resultados do piloto português nas últimas corridas de GP2, culminando no domínio total que exerceu em Spa-Francorchamps tanto na qualificação como na primeira corrida de Spa, deixaram bem claro que Parente tinha talento mais do que suficiente para ascender à F1 e como a Virgin Racing queria ter um jovem de qualidade ao lado dum piloto experiente no seu primeiro ano nos Grandes Prémios, o nome do português estava no topo da lista de preferências dos ingleses.

Como é evidente o dinheiro também tinha um papel importante na decisão final dos homens da Virgin Racing, pois ao piloto jovem que pretendiam contratar eram exigidos fortes apoios financeiros. As perspetivas eram boas, mas como se sabe, nunca aconteceu. A Virgin Racing apresentou o seu monolugar VR01 e a equipa para 2010 mas sem a presença de Álvaro Parente. Algum tempo antes, Parente tinha sido ‘profético’: “Ao longo destes anos também aprendi que os resultados não bastam para se chegar à Fórmula 1. Toda a gente sabe que o meu objetivo é estar lá mas é importante garantir apoios para que isso aconteça. Estamos no bom caminho mas ainda não há nada confirmado”. Foi pena, pois tinha valor mais do que suficiente para lá ter estado.

Por aqui se percebe que ‘adivinhar’ o futuro é sempre complicado, pois são tantas as incógnitas. Quem poderia, por exemplo, antever o grave acidente de Kubica, que, em condições normais, teria chegado à Ferrari e aí, mais ou menos facilmente poderia ter sido campeão. São as voltas da vida…

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