Nico Hulkenberg: Campeão que nunca foi Campeão

Por a 10 Janeiro 2020 19:13

Chama-se Nicolas Hulkenberg, mas todos o conhecem como Nico, tem 32 anos e esteve 10 anos na Fórmula 1 depois de ter “limpado” tudo o que eram fórmulas de acesso à disciplina maior. Ganhou Le Mans, era considerado como um dos melhores da sua geração, mas o topo da competição automóvel foi madrasto e o alemão sai da Fórmula 1 como uma promessa não cumprida e com apenas uma pole position e duas voltas mais rápidas em 177 corridas

Quando nasceu no dia 19 de agosto de 1987, Klaus Dieter e Susanne Hulkenberg deixaram a sua lucrativa empresa de expedição marítima para acompanhar o rebento, claramente um clone da mãe. O rapaz cresceu e cedo deu indicações que queria ser piloto de automóveis, usando o dinheiro dos pais para competir no karting. Mas o pai, mais austero, não o deixou “brincar” enquanto não conheceu todos os meandros da expedição marítima, como o pai, para mais tarde assumir a liderança da Hulkenberg Spedition. Foi nesse período que se tornou fluente em holandês, alemão, francês e inglês.

Começou aos 10 anos no Karting e a sua história está repleta de títulos na Alemanha e a nível europeu e mundial e tem ligações a Michael Schumacher: o seu empresário foi, durante muito tempo, Willi Weber. O alemão que predisse que Hulkenberg estaria pronto para a Fórmula 1 em 2008 (teria 21 anos). Foi ele que disse à imprensa que o piloto nascido em Emmerich era um “talento incrível” que lhe fazia lembrar Schumacher na sua juventude. Foi, também, Willi Weber que lhe colou a alcunha de “The Hulk”. Porquê? Porque, dizia Weber, o alemão transformava-se quando colocava o capacete e se sentava no carro.

Passou pelas fórmulas de promoção facilmente, ganhando na Fórmula BMW (2005), ganhou o infame A1GP com nove vitórias na temporada de estreia, sendo, ainda hoje, o mais bem-sucedido piloto da disciplina. Ganhou na F3 no segundo ano de participação (2008) e venceu a GP2 (2009) à primeira, num ano onde a concorrência era de peso: Álvaro Parente, Vitaly Petrov, Lucas di Grassi, Romain Grosjean, Pastor Maldonado, Guido van der garde, Jêrome ’Ambrosio,

Sergio Pérez, Johnny Cecotto Jr., enfim, um plantel cheio de qualidade. O alemão ganhou com boa vantagem para Petrov, conquistando cinco vitórias, no Nürburgring (2), Hungaroring (1), Valencia (1) e Algarve (1).

O CANTO DE SEREIA DA FÓRMULA 1

Graças aos préstimos de Willi Weber, Nico Hulkenberg conduziu um Fórmula 1 em 2007, no caso, um Williams, envolvido num teste que se sucedeu ao falhanço das negociações com Flavio Briatore, o patrão da Renault. O alemão, no circuito de Jerez, passou a ferro o piloto titular Kazuki Nakajima e ficou a zeros 0,4 segundos de Nico Rosberg. Claro está que ficou como piloto de testes para 2008, prolongado para 2009. Uma vida complicada, pois a FIA tinha banido os testes. Como referimos, o alemão “entreteve-se” a ser campeão na F3 e na GP2, antes de chegar o dia.

Foi no dia 2 de novembro que Nico Hulkenberg recebeu a confirmação que seria piloto da Williams em 2010, lado a lado com Rubens Barrichello. A estreia na Fórmula 1 foi no GP do Bahrain e a sua primeira participação saldou-se por um 14º lugar final.

No caminho difícil da Fórmula 1, Nico Hulkenberg passa ao Q3 pela primeira vez na terceira corrida da carreira (Malásia) e o primeiro ponto é conquistado na Malásia com um sortudo 10º lugar (Alonso viu o motor do carro partir a três voltas do final). A primeira e única pole position aconteceu no GP do Brasil. Apesar de um bom ano de estreia, Nico Hulkenberg não manteve o lugar na Williams para 2011.

A PROMESSA NUNCA CUMPRIDA

Nico Hulkenberg não conseguia materializar todo o potencial que mostrou na ascensão até à Fórmula 1 e perder o lugar logo no ano de estreia não foi um bom cartão de visita. Até porque no ano seguinte regressou ao estatuto de piloto de testes que fazia uns treinos livres à sexta-feira. As qualidades do alemão convenceram Otmar Szafnauer a juntá-lo a Paul di Resta na equipa para 2012.

Foi um ano feliz para o alemão, que pontuou duas vezes seguidas pela primeira vez na carreira, chegou a liderar corridas e foi protagonista de uma polémica com Lewis Hamilton. Na última corrida da temporada, o GP do Brasil, Hulkenberg chegou a liderar a corrida até que Hamilton passou por ele. Mas não se rendeu e na volta 55 tentou passar pelo britânico na curva 1, mas deixou a traseira escorregar e acertou no McLaren Mercedes, acabando com a corrida de Hamilton. Recebeu um “drive through” deixando escapar, possivelmente, a primeira vitória e o primeiro pódio. Diga-se que o alemão bateu sem apelo nem agravo Paul di Resta na qualificação 12 – 8 e ficou 17 pontos à frente do escocês.

Apesar desta excelente temporada, Nico Hulkenberg decidiu sair para a Sauber e numa temporada fraquinha, onde teve a seu lado Kamui Kobayashi, deu espetáculo no GP da Coreia do Sul: terminou em 4º depois de uma verdadeira batalha com Lewis Hamilton e Fernando Alonso, não cometendo um único erro e defendendo-se como um veterano do espanhol. Constatado o erro que tinha sido seguir para a Sauber, Hulkenberg regressou à Force India. Em várias provas deu mostras de talento, com muitas lutas em pista, particularmente com Fernando Alonso, e fechou o ano em 9º lugar, sendo reconfirmado para 2015. O carro era menos competitivo e Hulkenberg cometeu, também, alguns erros, perdendo na comparação com Sergio Pérez que ficou 20 pontos na sua frente.

No terceiro ano com a Force India deu um ar da sua graça, batendo Sergio Pérez, mas lutando com um carro pouco competitivo.

Mais uma vez, perdeu pódios ao seu alcance no Mónaco, na Áustria, na Bélgica, enfim, a malapata do pódio perseguiu Hulkenberg. O alemão foi convidado para a Renault e nem olhou para trás.

OS ANOS DA RENAULT

Chegou à equipa francesa e face à concorrência de Jolyon Palmer, Hulkenberg deu espetáculo: arrancou oferecendo à equipa o melhor resultado numa corrida

desde o regresso à F1, um 6º lugar em Espanha, e foi batendo o seu colega de equipa com facilidade. Mostrou ainda o seu lado mais lunar com um “bate boca” com Kevin Magnussen. O alemão apelidou o dinamarquês de “horrível e um dos pilotos menos dignos de toda a grelha de partida”, ao que Magnussen, no seu estilo truculento, respondeu “amigo, chupa-me os c….”. Viu Jolyon Palmer ser substituído por Carlos Sainz Jr., “emprestado pela Red Bull”, mas o alemão continuou a ser o melhor, mas a sofrer de muitos problemas de fiabilidade.

Em 2018 manteve-se a dupla Hulkenberg e Sainz. Muitos problemas de fiabilidade continuaram e o alemão decidiu ilustrar-se provocando um violento acidente

na Bélgica, depois de ter sido batido por Carlos Sainz no Mónaco, sem espinhas, a primeira derrota em treinos desde o GP do Japão de 2016. Ainda assim, chegou à pausa de verão no sétimo lugar do mundial, o melhor dos “outros”. Posição que, apesar de muitas dificuldades na segunda metade da temporada, manteve sendo forte contribuinte para o quarto lugar da Renault nos construtores.

Com a companhia de Daniel Ricciardo, a luz de Hulkenberg começou a fenecer até que recebeu a notícia que tinha chegado ao fim a sua participação com a Renault, no GP da Bélgica. Na ocasião o piloto referiu que “a decisão não foi tomada apenas pela performance” deixando no ar que os franceses queriam um francês na equipa. E não estava errado. Não deu parte de fraco e na corrida do Abu Dhabi recolheu o título de “Piloto do dia”, a primeira vez que o conseguiu.

Apesar de tudo, Nico Hulkenberg sempre foi um piloto consistente e entre 2013 e 2018 terminou sempre no top 10. Mas o alemão tem um recorde que ninguém quer: é o piloto com mais provas disputadas (177 Grandes Prémios) sem um único pódio. Sobre isso, Hulkenberg é pragmático: “Gostaria de ter um par de pódios e de vitórias, mas nunca tive a felicidade de ter um carro de topo. É verdade que tive momentos onde poderia reclamar um pódio, mas infelizmente sempre aconteceram coisas e o azar acabou por prevalecer.” Lembrar que este ano, no GP da Alemanha, Hulkenberg esteve muito perto de acabar com essa malapata: seguia em segundo com toda a gente a cometer erros e abriu-se uma janela para a vitória e um portão para o pódio, mas acabou de encontro às barreiras de proteção e fora da corrida.

A ENDURANCE E A VITÓRIA EM LE MANS

Hulkenberg poderá encontrar no WEC uma saída para a sua carreira, pois recordamos que o alemão foi contratado pela Porsche para competir nas 24 Horas de Le Mans de 2015, no terceiro 919 Hybrid, depois de ter participado na corrida de Spa Francorchamps do WEC. Com Earl Bamber e Nick Tandy, Nico Hulkenberg venceu Le Mans, a primeira vitória da Porsche desde 1988. Com esta vitória, o alemão junta-se a Johnny Herbert e Bertrand Gachot como os pilotos de Fórmula 1 da era moderna a ganhar Le Mans.

A Renault agradeceu o trabalho de Nico Hulkenberg, mas as loas e os elogios não tiram a tristeza ao piloto alemão que em 2020 será mais um “ex-piloto” de Fórmula 1 que deixou excelente impressão pelas equipas por onde passou.

Otmar Szafnauer, antigo responsável da Force India, referiu: “Pessoalmente, adoro o Nico. Penso que ele tem talento, é uma pessoa fixe, muito honesta e direta, depois de o conhecermos. Não há meias palavras com ele e penso que ele é suficientemente bom para ficar.”

Já Hulkenberg finaliza: “Comecei a perseguir o sonho da F1 quando tinha sete anos e se alguém nessa altura me dissesse que iria ter uma carreira de 10 anos na F1, diria que estava louco, mas aceitaria. Foi bom, estou feliz com a minha carreira, tendo sido muito fiável e consistente em equipas da segunda metade da tabela. Não tenho de me esconder de nada!”

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