Morreu Slim Borgudd: Uma carreira de vencedor

Por a 24 Fevereiro 2023 11:47

Slim Borgudd teve uma carreira curta na Fórmula 1, mas foi recordado pela originalidade do seu patrocinador: um certo grupo musical chamado ABBA.

Karl Edward Tommy Borgudd morreu aos 76 anos e, curiosamente, foi um dos mais eficazes pilotos suecos. Apesar dos seus títulos e das suas vitórias, é normalmente desprezado pelos “especialistas” em automobilismo, apesar de ter mesmo pontuado na F1. E até a sua veia de músico é objeto de desdém, apesar de te tocado com os ABBA e alguns outros génios da música mundial, com Alexis Korner e de ter fundado grupos musicais diversos e publicado mesmo um álbum a solo.

Tommy Borgudd – que mudou nos anos 60 o seu nome para Slim, por ter se ter apaixonado pela música de Memphis Slim, que viu tocar em Nova Orleães – estreou-se na Fórmula Ford, fazendo corridas de vez em quando até, em 1972, quando a sua carreia na música estava a entrar em declínio como profissional. Nesse ano, ganhou cinco corridas em provas de clube e, até 1975, correu com um Hillman IMP e um Volvo 122 no campeonato sueco de Turismo, bem como na Fórmula Ford escandinava, campeonato que ganhou em 1973.

Em 1976, Borgudd mudou-se para a F3, correndo de forma esporádica em 1977, antes de fundar a sua própria equipa, no ano seguinte, com a qual passou a correr a tempo inteiro, quer na Suécia, quer na Europa. Em 1979, sagrou-se campeão sueco e foi 3º no Europeu. 1980 foi um ano quase nulo, pois a sua aposta na F2 borregou à nascença e Borgudd apenas apareceu n GP do Mónaco de F3, onde estava em 3º quando a carroçaria do seu monolugar se saltou, forçando- a conduzir até ao final da prova com uma só mão e, com a outra, a segurar a “dita cuja”!

Depois, foi a F1 e o resto da sua carreira está descrito em local próprio. (v Caixa). Seja como for, entre 1968 e 2009, Slim Borgudd fez um total de 379 corridas, ganhou 125, subiu por mais 119 vezes ao pódio e assinou 68 melhores voltas.

Entre outros, nos monolugares, ganhou a Taça escandinava de Fórmula Ford, o campeonato da Suécia de F3, o European Toyota Cup de F3 e foi 3º no FIA European de F3. Foi ainda vencedor da FIA Nordic Cup em carros de Turismo e foi por quatro vezes campeão da Europa de Camiões. Nada mau, para quem é quase ignorado na história do automobilismo mundial!

F1 era outra música

A passagem (tardia) de Slim Borgudd pela F1 foi breve. Em 1981 e 1982, o sueco participou em 15 GP e pontuou num deles – o da Grã-Bretanha, onde terminou em 6º lugar. Desses 15 GP, apenas correu numa dezena, não se qualificando nos outros cinco. E, no seu último ano, correu apenas nos três primeiros GP da temporada.

Borgudd era um sujeito persistente; desistir não fazia parte do seu vocabulário e os seus esforços de chegar à F1 foram notados pelo alemão Günther Schmid. Excêntrico, tinha uma fábrica de jantes, a ATS – o mesmo nome da equipa de F1 que fundou em 1977. As letras queriam, na verdade, dizer Auto Technisches Spezialzubehör e foi por trás destas letras que Borgudd, então com 34 anos, uma idade quase “vetusta” para se iniciar numa “coisa” como a F1, fez a sua estreia, com o chassis D4 – amarelo, com o nome ABBA em evidência nos flancos. O sueco foi 24º nos treinos, em San Marino, que terminou em 13º, humilhando o bem mais experiente (e jovem, 25 anos) Jan Lammers, que não se qualificou. Depois, passou para o HGS1 (ou D5), mas as primeiras três tentativas ficaram-se pelos treinos. Até que, em Silverstone, sorriu-lhe a sorte grande: 21º na grelha, conseguiu chegar em 6º, então o último lugar com direito a pontos. Até ao final do ano, terminou mais um GP (Holanda, em 10º) e abandonou nos restantes quatro, não se qualificando para a esquisita prova que teve como palco as ruas do Hotel Caesar Palace, em Las Vegas.

Por isso, Borgudd foi chamado à Tyrrell por mérito próprio no ano seguinte, tendo como colega de equipa Michele Alboreto. O seu 011 começou por ser branco, em Kyalami, mas depois acabou azul, em Long Beach – na que foi a sua última corrida de F1, pois logo a seguir Brian Henton bateu à porta de Ken Tyrrell com uma mala cheia de dinheiro, o pobre (literalmente) do Slim foi chutado para a rua, apesar de ter terminado sempre as únicas três corridas que fez em 1982 – foi, mesmo, 7º no Brasil. E adeus F1!

Sobre o seu primeiro ano, que até foi bem sucedido, refira-se que Borgudd colocou o nome dos ABBA nos flancos dos ATS sem que o seu amigo Bjorn Ulvaeus lhe dissesse alguma vez que iria pagar-lhe alguma coisa. Com a sua enorme lábia, o sueco lá convenceu Schmid de que ter lá esse nome lhe iria trazer rapidamente novos patrocínios, interessados obviamente pela “musicalidade” do nome… Ora, nem isso sucedeu, nem os ABBA pagaram um cêntimo que fosse à equipa alemã. Truques…

Um músico com várias “mãos”

Slim Borgudd é comumente conhecido como o piloto de F1 que foi baterista dos ABBA. Porém, se isso foi verdade, não o foi totalmente. Borgudd era, isso sim, um grande amigo de Bjorn Ulvaeus, um dos “B” do grupo sueco e tocou várias vezes em estúdio, onde fez mesmo algumas gravações avulso. E, oficialmente, se tocou com os ABBA em concertos, na verdade nunca participou na gravação de nenhum disco comercializado pelo grupo. Porém, Borgudd teve uma longa e prolífica carreira musical, de que a maior parte das pessoas nem sequer suspeita

Para começar, a ligação de Borgudd à música e aos automóveis está quase umbilicalmente ligada. Apaixonou-se pelas corridas quando, em 1959, viu Stirling Moss em ação, na pista sueca de Karlskoga. Nessa altura, já andava atrás das bandas locais mas, aos 16 anos, decidiu entrar para a Marinha Mercante!

Pouco depois, mudou o nome para “Slim” – em homenagem a Memphis Slim, um músico que viu tocar quando, numa viagem, ele próprio decidiu fazer um improviso, num club noturno de Nova Orleães, onde tinha entrado para “lavar a alma” do sal marinho.

A sua primeira experiência musical “a sério” foi em 1965, quando se juntou a um grupo chamado “Lea Riders Group”, que tinha visto nascer na sua cidade natal, tinha ele apenas 15 anos. Borgudd tocava um “blues rock” com influência de Willie Dixon, estilo que foi evoluindo ao longo dos anos, tornando-se um roqueiro progressivo e, nos anos 70, fazendo trabalho de estúdio como “freelancer”.

Em 1968, decidiu fundar a sua própria banda, os “Made in Sweden”, com os respeitados Bo Häggström (baixo elétrico) e Georg Wadenius (guitarrista). Slim era baterista e vocalista ocasional e o grupo destacou-se por tocar um “jazz/rock” de fusão progressivo. O seu primeiro álbum surgiu anda nesse ano a chamava-se “With Love”.

Ainda em 1968, Borgudd conheceu num clube londrino a lenda do “jazz” Chris Barber, que também era piloto de automóveis. Borgudd comprou-lhe um Lotus 22 e, na Suécia, começou a correr em campeonatos de clube, com bastante sucesso.

Mas, regressado à música, Borgudd e os “Made in Sweden” aguentaram-se até meados da década de 70, tendo pelo meio lançado um álbum que foi um enorme sucesso, “Made in England”, em 1970. Pouco depois, Borgudd juntou-se a outra banda progressiva, os “Solar Plexus”, assistindo à desintegração do seu anterior grupo. Até ao fim da sua vida, em 1975, os “Solar Plexus” produziam uma série de bons álbuns, mas nenhum deles especialmente bom, antes de os seus membros, entusiasmados pelo advento da música “pop” e principalmente pelo “disco”, seguissem direções diferentes.

Borgudd tocou para vários músicos e grupos, como Alexis Korner, Teddy Wilson, Monica Zetterlund, Thad Jones, Mel Lewis, Cornelius Wreswijik e até com a Oquestra Filarmónica Dinamarquesa. Borgudd tinha um talento especial como baterista e foi nessas condições que, ainda na década de 60, se encontrou com Bjorn Ulvaes, mais tarde um dos fundadores dos ABBA. Nasceu entre ambos uma forte amizade e Ulvaes apadrinhou-o mesmo em muitos momentos da sua careia nos automóveis, como na F1. Em “troca”, Slim deu o seu talento em várias sessões de estúdio do grupo sueco, na primeira metade dos anos 70. Um dos últimos grupos com que tocou foi os “Hootenanny Singers”, que viria a dar origemi aos ABBA. Depois disso, continuou a trabalhar como “free lancer” na música e lançou mesmo um álbum chamado “Funky Formula”, com o seu nome e onde aparecia de capacete na cabeça e ao volante de um Viking de F3.

Os anos depois: F3, F3000, Camiões e Turismos

Depois de ter saído da F1, a carreira de Slim Borgudd continuou, impávida e (pouco) serena. Em 1983 fez o campeonato sueco de F3 e em 1984 acabou por surpreender no GP de Macau de F3, qualificando-se em 2º e, depois de liderar a corrida no arranque, antes de falhar uma travagem, atrasou-se e terminou em 6º lugar – nada mau, para um “rapaz” já com 38 anos e perante a nata da F3 mundial. No ano seguinte, repetiria a presença, mas com menos sucesso: foi 22º nos treinos e acabou para lá do “top ten”.

Nesse ano de 1985, fez o primeiro campeonato da nova F3000, com um Arrows A6/Cosworth ex-F1 recondicionado, correndo em três provas, com Amco Color: depois da sua estreia com um 10º lugar em Vallelunga, desistiu em Spa e Donington. E foi então que o seu ecletismo veio ao de cima: em 1986, decidiu fazer o Campeonato da Europa de Camiões, vencendo-o nesse ano e no seguinte, nas Divisões 2 e 3, respetivamente. Continuou neste campeonato por mais alguns anos, até 1997, sendo 3º na Classe B em 1992. Na categoria-rainha, a Super Race, foi vice-campeão em 1994 e de novo campeão em 1995, batendo por larga margem Steve Parrish e Markus Östreich. Em 1996 foi 5º e em 1997, 4º. Neste ano, deixou de vez as corridas, acusando a Mercedes-Benz de favorecer outros pilotos e passando a viver em Coventry, correndo de vez em quando em eventos locais, para matar o vício.

Entretanto, ainda em 1986, regressou às corridas de Turismo, fazendo algumas provas com um Volvo 240 Turbo e estreou-se nas de Sport, com um Tiga TC286. Participou nas 24 Horas de Le Mans de 1987 e, em 1989, venceu as 24 Horas de Willhire, em Snetterton, com um Ford Sapphire Cosworth, que partilhou com Mark Hales.

Até abandonar as corridas e ao mesmo tempo que estava no Europeu de Camiões, Slim Borgudd tomou parte também em várias corridas do BTCC, em 1993, com um Mazda Xedos 6 cor-de-rosa, com o qual não teve grande sucesso. Mas foi no campeonato nórdico de Turismo, o NTCC, que voltou aos lugares da frente, sagrando-se campeão em 1994, com o mesmo carro.

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