Fórmula 1: Incoerências e fragilidades na decisão dos comissários

Por a 17 Novembro 2021 09:30

A polémica está de novo instalada na Fórmula 1, com o pedido de revisão ao incidente da volta quarenta e oito do Grande Prémio do Brasil por parte da Mercedes. Mas será que a marca tem fundamentos para o fazer?

Lewis Hamilton protagonizou uma recuperação fulgurante a partir do décimo lugar na grelha de partida e, na quadragésima oitava volta, lançou um ataque a Max Verstappen por fora na travagem para a Curva 4, a Descida do Lago.

O holandês travou bastante tarde, alargando a trajectória para fora da pista, recorrendo à escapatória de asfalto, tendo o inglês de fazer o mesmo para evitar um toque entre ambos.

Na altura, o incidente foi comunicado aos comissários desportivos, mas estes consideraram que não era necessário tomar qualquer acção, sendo considerado uma situação de corrida.

Porém, nesse momento as imagens da câmera do carro número trinta e três que apontava para a frente não estavam disponíveis, tendo, portanto, a decisão sido tomada sem recorrer a elas, o que deixava a deliberação fragilizada, caso as imagens aparecessem finalmente.

Mas antes de analisarmos o momento em que o seu aparecimento espoletou o pedido de revisão da Mercedes vamos olhar para o incidente em si.

Os dois carros circulavam lado a lado na aproximação à Descida do Lago, uma esquerda, com Hamilton do lado direito e à frente de Verstappen antes da travagem.

O holandês deixou a travagem para lá do último momento, passando para a frente do inglês, mas com a elevada velocidade a que circulava foi obrigado a sair de pista, tendo Hamilton de fazer o mesmo para evitar um toque entre os dois.

Olhando para o incidente desapaixonadamente – é claro que todos queremos ver lutas duras e justas, mas tem de haver limites – o piloto da Red Bull não terá cumprido as alinhas b) e c) do Artigo 2 do Apêndice L do Código Desportivo Internacional da FIA.

b) A ultrapassagem, de acordo com as circunstâncias, pode ser realizada tanto à direita como à esquerda.

Um piloto não pode sair da pista sem razão justificável.

Não é permitida mais do que uma mudança de trajectória para defender uma posição.

Qualquer piloto que se regresse para a trajectória, depois de ter defendido anteriormente a sua posição fora de linha, deve deixar pelo menos uma largura de carro entre o seu próprio carro e a extremidade da pista na aproximação à curva.

No entanto, são estritamente proibidas manobras suscetíveis de deter outros condutores, como a empurrar deliberadamente um carro para além da extremidade da pista ou qualquer outra mudança anormal de direção. Qualquer piloto que pareça culpado de qualquer uma das infrações acima referidas será reportado aos Comissários.

c) Os pilotos devem utilizar sempre a pista e não sair da pista sem uma razão justificável. Para evitar dúvidas, as linhas brancas que definem as extremidades da pista são consideradas como parte da pista, mas os correctores não.

Se um carro sair da pista por qualquer motivo, o condutor pode regressar.

No entanto, isto só pode ser feito quando for seguro fazê-lo e sem obter qualquer vantagem duradoura. Um condutor será julgado ter saído da pista se nenhuma parte do carro permanecer em contacto com a pista.

Na manobra da quadragésima oitava volta do Grande Prémio de São Paulo, Verstappen travou, aparentemente, propositadamente demasiado tarde, obrigando o seu adversário a sair de pista e, para além disso, ganhou uma vantagem duradoura, uma vez que saiu de pista e, com isso, manteve o comando.

A situação protagonizada pelo holandês e o inglês é em tudo semelhante às vividas por Lando Norris e Sérgio Pérez e entre o mexicano e Charles Leclerc durante o Grande Prémio da Áustria. Então, o inglês, devido ao primeiro episódio, e o piloto da Red Bull, nos restantes, foram penalizados com cinco segundos, recebendo ainda dois pontos na superlicença por cada um dos casos.

Dr. Gerd Ennser, Paolo Longoni, Derek Warwick e Walter Jobst, comissários do Grande Prémio da Áustria, justificaram as suas decisões precisamente com o Artigo 2 do Apêndice L do Código Desportivo Internacional da FIA.

Já Tim Mayer, Matteo Perini, Vitantonio Liuzzi e Roberto Moreno, os homens das decisões no Grande Prémio de São Paulo, não viram no incidente entre Hamilton e Verstappen qualquer motivo para actuar.

Esta incoerência entre os diversos comissários desportivos cria confusão entre os pilotos, que nunca sabem muito bem quais as regras que os regem e a ira entre os adeptos, que veem situações semelhantes serem decididas de forma distinta, dando ainda azo a sentimento de injustiça.

Seria necessário que na Fórmula 1 se pudesse verificar uma forma de abordar os incidentes de uma forma mais consistente. Seria extremamente benéfico para a imagem da categoria, uma vez que vão existindo algumas acusações de existirem favoritismos.

Mas se a decisão foi inconsistente com outras já tomadas este ano, a forma como foi tomada revela fragilidades.

Ao não levar em consideração as imagens da câmara de virada para a frente do carro número trinta e três os Comissários ficaram na posição de verem a sua decisão desafiada, caso o registo em vídeo aparecesse mais tarde.

Esta terça-feira, a FOM publicou no website e nas redes sociais da Fórmula 1 as imagens em questão e imediatamente a Mercedes acionou o seu direito de revisão da decisão, ao abrigo do Artigo 14.1.1 do código Internacional.

Numa primeira fase será decidido pelos mesmo comissários se as novas provas são relevantes e não estavam disponíveis no momento da deliberação original e só depois haverá uma reanálise à matéria de facto que poderá sortir ou não numa alteração da decisão inicial.

O desejo da Mercedes é claro, se houver um desfecho semelhante às que penalizaram Norris e Pérez no Red Bull Ring, Verstappen cairá para trás de Valtteri Bottas, que terminou o Grande Prémio de São Paulo no terceiro lugar a 3,080s do holandês.

O piloto da Red Bull perdia mais três pontos face a Hamilton nas contas do Campeonato de Pilotos, ao passo que no de Construtores a Mercedes veria a sua vantagem subir de onze para dezassete.

Sem dúvida aspectos muito motivadores para que Toto Wolff e os seus homens colocassem o processo em marcha, numa temporada em que tudo poderá fazer a diferença no final do ano.

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31 Comentários
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Daniel Sousa
Daniel Sousa
2 anos atrás

não espero mais nada que não seja 5s de penalização, e relegar o Verstappen para 3º. mas ainda podia haver mais, já que houve mais 2 infrações. O S na reta, e os desrespeitos à direção de prova. Portanto, 5 segundos… bem bom! já é levar ao colo. como é um adolescente, e os adolescentes entraram em força na F1 nestes últimos 2 anos, e dão muito dinheiro à F1, eu compreendo os olhos grossos, embora não concorde. Contudo, não espero mais nada que não seja 5 segundos de penalidade. e ainda teremos sempre os 5 pontos de SPA. a… Ler mais »

NOTEAM1
NOTEAM1
Reply to  Daniel Sousa
2 anos atrás

Se o Max levasse a penalização durante a corrida, até se pelo menos houvesse um relatório aberto a ser discutido após o final da corrida, o Max tinha a oportunidade de forçar o seu andamento e eventualmente abrir a vantagem para mais de 5s de diferença. Ao penalizar após do fim da corrida, quase uma semana depois não faz sentido, já que desvirtua por completo o resultado final. Os comissários são pagos para tomar medidas no momento, não semanas depois.

garantia4
garantia4
Reply to  NOTEAM1
2 anos atrás

Na mouche !

Daniel Sousa
Daniel Sousa
Reply to  NOTEAM1
2 anos atrás

Não vou analisar muito o seu comentário, porque já percebi há algum tempo que não consegue ser imparcial. Por acaso não se lembra de nenhum piloto que tenha levado 3 lugares na grelha para a corrida seguinte?

NOTEAM1
NOTEAM1
Reply to  Daniel Sousa
2 anos atrás

Eu não consigo ser imparcial? Dever estar a confundir-me com outra pessoa. O que o Max fez na corrida de Interlagos, não justifica uma penalização tão severa como exemplo que deu, isto para começar e rematar o assunto, já está a misturar alhos com bugalhos. Contudo, nenhum desses casos, escapou ao olhos da FIA, todos eles durante a corrida estiveram “under investigation”, o que altera por completo o contexto da situação. No caso do Max, de forma errada, adoptou-se filosofia do “let them race”, uma vez tomado esse caminho, não faz sentido absolutamente nenhum penalizar um piloto uma semana após… Ler mais »

Pascassio
Pascassio
Reply to  NOTEAM1
2 anos atrás

Então isso é compensar o crime!
Não faz sentido nenhum!
A verdade desportiva, deve estar sempre acima de tudo.

Homem_do_Leme
Homem_do_Leme
2 anos atrás

Penalizar o piloto depois de concluida a corrida não me parece o mais correto, quando o poderiam (e deviam na minha opinião) ter feito durante a corrida.
Eu gosto de ver corridas disputadas roda a roda, mas parece-me que não podemos cair em exageros como foi o caso e que se nada for feito vai acabar mais cedo ou mais tarde numa situação grave.
Quanto mais que não seja por uma questão de coerência com casos similares, acho que o Max deveria levar uma penalização na próxima corrida.

afmota
afmota
2 anos atrás

Se houvesse gravilha em vez de escapatória, o domínio na travagem de Verstappen não seria mais do que um erro grosseiro que o teria posto fora de corrida.
É óbvio que ganhou vantagem e merecia ter sido penalizado.
Pior ainda foi a manobra completamente amadora e indesculpável que fez umas voltas depois ao mudar de direção mais que uma vez a defender. A resposta arrogante que teve ao aviso dos comissários também passou em branco….
No meu entender, a mestria do Holandês na condução é apenas correspondida pela sua falta de fair-play e desrespeito por colegas e comissários.

Frenando_Afondo™
Frenando_Afondo™
2 anos atrás

Vê-se bem no onboard como Max deixa o carro ir e não vira o volante mais do que podia para alargar bem a trajectória, para impedir Hamilton de ultrapassar ou fazer um corte. Ele bem quis repetir Monza mas Hamilton está atento às manobras “à lá Max”.

danicardoso
danicardoso
2 anos atrás

Estou farto de ler estes comentários tendenciosos que mais parece um site de bola! Nem o Hamilton nem o Verstappen são meninos de coro! Ou vocês são todos muito novos ou têm memória de passarinho! Se houvessem estas irritantes intromissões de comissários no passado, o Ayrton Senna só tinha sido 2 vezes campeão do mundo, o Alain Prost só tinha sido 3 vezes, o Schumacher não tinha sido campeão no primeiro ano em que foi… Isto sempre foi assim. Não se é campeão do mundo sendo santinho! O próprio Hamilton é um produto de marketing! Com a história do racismo!… Ler mais »

icebergemchamas
icebergemchamas
Reply to  danicardoso
2 anos atrás

Verdade! Se existissem as atuais penalizações nos anos 80 e 90 do século passado tinhamos 2/3 do pelotão a partir das boxes em quase todas as corridas…

ricfil
ricfil
Reply to  danicardoso
2 anos atrás

Penso que a questão aqui não trata de comparar com outras épocas ou comparar outros pilotos. Nem as probabilidades apresentadas no comentário fazem sentido. Os pilotos de cada época “jogam” conforme as regras estabelecidas para essas mesmas épocas (regras das quais são conhecedores). Dizer que o Senna, ou o Prost ou o Mansell teriam menos ou mais títulos não faz sentido, uma vez que os pilotos adaptariam sempre as suas carreiras às condições e às regras que se lhes eram apresentadas á época. Eram mais duros nas corridas nos anos 80 ou 90? Eram, mas as regras assim o permitiam.… Ler mais »

Last edited 2 anos atrás by Ricfil
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