F1: Porque não uma qualificação diferente?

Por a 8 Junho 2020 11:30

A F1 terá em 2020 uma época diferente de todas as outras. E talvez por isso não seja descabido tentar novas soluções, incluindo nas qualificação.

A F1 tentou implementar um sistema de qualificação diferente, que já foi pensado há algum tempo e que foi negado pelas equipas e até pelos fãs. Mas será que faz sentido fazer esta experiência nesta fase? Pessoalmente, acredito que sim.

Sempre fui contra a implementação de um novo sistema de qualificação, por achar que o formato atual está bem e para ser ainda melhor, faltaria apenas acrescentar uma Q4, em que os cinco melhores fazem uma volta sozinhos, na busca pelo melhor tempo, um formato usado no WTCC e que me agradava particularmente, por permitir o uso do sistema de eliminação que funciona muito bem, ao que se juntaria uma a famosa volta única, sem mais carros em pista, apenas o piloto, o carro e cronómetro no derradeiro desafio em busca da volta perfeita. Mantenho esta opinião e acredito que estamos muito bem servidos assim. Mas estamos em 2020, um ano que nos puxou o tapete e virou o mundo de cabeça para baixo. Se este ano vai ser tão atípico, porque não experimentar? Afinal a qualificação já percorreu um longo caminho, feito de avanços e recuos.

A história das qualificações

Se no início dos tempos a grelha era definida por sorteio, desde 1950 que a pole position começou a ser definida por uma qualificação e em boa hora, pois tornou-se num espetáculo dentro do próprio espetáculo. Durante décadas o formato sofreu ligeiras alterações mantendo a mesma base. Até 1996, a qualificação seguia um padrão – havia duas sessões para definir a ordem da grelha, uma na sexta-feira e outra no sábado, sem qualquer restrição de combustível. Alguns truques foram usados para apimentar a qualificação, desde pneus e motores especiais de qualificação nos anos 80, até a pré-qualificação no final da década de 80 e início dos 90 – mas essencialmente o sistema permaneceu o mesmo. Esse formato, no entanto, tinha uma grande desvantagem: se o tempo piorasse de sexta para sábado, a segunda sessão de qualificação perdia todo o interesse.

Para garantir a emoção nas sessões de sábado, as regras foram alteradas em 1996, com a grelha a ser decidida por uma única sessão de uma hora, na qual os pilotos tinham no máximo 12 voltas para fazer a melhor volta, solução que durou até o final de 2002. As equipa preferiam esperar pelas melhores condições da pista e os pilotos costumavam passar longos períodos na garagem, à espera dos últimos minutos para ter a pista “limpa”.

Para acabar com este tempo de espera, foi implementada a qualificação numa volta única, que permitia também que equipas mais pequenas tivessem mais exposição na televisão. Na sexta-feira de cada fim de semana de corrida, os pilotos iam para a pista, um de cada vez, pela ordem de classificação do campeonato, completando uma única volta lançada, antes de regressar às boxes. No dia seguinte, o processo seria repetido para decidir a ordem final da grelha, desta vez com o piloto mais lento da sexta-feira em primeiro lugar e o piloto mais rápido em último – teoricamente com a pista mais limpa. Para apimentar as corridas aos domingos e dar mais imprevisibilidade aos sábados, os pilotos tinham que dar a volta com o combustível que iriam levar para a corrida.

Inevitavelmente, vimos algumas injustiças com pilotos que teoricamente teriam vantagem a ir para a pista com condições meteorológicas mais adversas, por exemplo. Mesmo assim, a base deste formato permaneceu por vários anos, embora com alguns ajustes:

Em 2004, as duas sessões de uma volta passaram a ser realizadas no sábado, com a ordem de de saída para a pista na primeira sessão agora determinada pela classificação da corrida anterior. Como antes, o piloto mais lento da primeira sessão seria o primeiro na segunda, mas com os dois segmentos agora tão próximos, o sistema podia ser manipulado – especialmente quando a previsão do tempo era instável, com pilotos a errarem propositadamente para saírem mais cedo na segunda sessão e evitar chuva eminente.

Sem surpresas, outros ajustes se seguiram e, em 2005, foi decidido que a grelha seria decidida agregando os tempos de duas sessões de qualificação – uma no sábado à tarde com pouco combustível e outra no domingo de manhã, quando os carros levariam já a quantidade desejada de combustivel para a corrida, o que voltou a tirar o drama da sessão de sábado, sendo este sistema abandonado após seis corridas. Nas 13 corridas restantes da temporada, cada piloto faria uma única volta com combustível para a corrida na tarde de sábado, com a ordem determinada pela classificação da corrida anterior.

Em 2006 a F1 voltou a mudar a qualificação, começando a era das sessões de eliminação em três partes, com os pilotos mais lentos a serem progressivamente eliminados de cada segmento até restarem 10 para lutar pela pole position, o que se revelou um sucesso.

Nesta primeira fase, os pilotos que chegavam à Q3 tiveram que se qualificar com as cargas de combustível que levariam para a corrida. Além disso, um sistema de crédito de combustível – projetado para garantir que cada carro fizesse muitas voltas – significava que os pilotos muitas vezes passavam várias voltas simplesmente “a queimar combustível” na Q3.

Em 2008, o sistema de três partes foi ajustado para que as equipas não pudessem mais adicionar combustível após a Q3, eliminando assim a fase desagradável de “queima de combustível”. No entanto, o foco da qualificação deixou de ser a velocidade dos pilotos, mas sim a carga de combustível que os carros levavam.

A proibição de reabastecimento em 2010 trouxe a tão desejada mudança para as voltas de qualificação com os carros leves. A qualificação – composta por três sessões e uma luta final de 10 pilotos pela pole – permaneceu inalterada por seis temporadas. Em 2016, as regras mudam mais uma vez. Os pilotos tinham uma janela de cinco minutos na Q1, Q2 e Q3 para fazer um tempo – mas após esse ponto, o piloto mais lento ia sendo eliminado a cada 90s. Dos 22 pilotos deste ano, 15 passavam para a Q2 e depois oito para a Q3 – até que sobravam apenas dois homens a lutar pela pole. Este sistema foi rapidamente abandonado, tendo durado apenas duas provas, e o formato anterior foi recuperado.

O formato atual da qualificação é do agrado da grande maioria, mas a F1 continua a tentar modificar a qualificação por um motivo muito simples… é a forma mais simples que tem de tentar apimentar a competição, sem mudar a corrida de domingo, que se pretende que mantenha o mesmo formato. Mudar a corrida seria mudar o que de mais puro há na F1 e os responsáveis sempre quiseram evitar isso.

Porquê mudar? Ou… porque não?

A nova proposta passa por fazer uma corrida de qualificação ao sábado cuja ordem da grelha seria definida pela classificação do campeonato pela ordem inversa, ou seja o primeiro sairia de último e por aí em diante. A corrida seria de 30 minutos, e o resultado final definiria a grelha para domingo. Uma corrida recheada de ação, em que os favoritos teriam de suar muito para chegar ao topo, pois neste caso as lutas pelas posições seriam mais acesas e não veríamos pilotos de equipas pequenas a abrirem a porta com tanta facilidade. Seriam corridas intensas, com muitas lutas.

Como já acima referido, não gosto desta ideia, pois retira a beleza da qualificação atual, que se baseia na tentativa de fazer a volta perfeita. A mestria do piloto e a qualidade do carro são postas à prova de forma única neste tipo de qualificação. E permite-nos distinguir um bom piloto em qualificação de um bom piloto em corrida. Hamilton é exímio na qualificação e por isso é justamente considerado o mais rápido do grid, mas nem sempre o mais rápido vence numa corrida, e pilotos como Sergio Pérez que em qualificação não são tão fortes, superam esse handicap nas corridas. Sem o sistema atual, esta dicotomia perder-se-ia e a F1 ficaria mais pobre.

Mas estamos em 2020. Teremos duas corridas seguidas na mesma pista. Se a vontade é experimentar, que seja este ano, em que pouco há a perder. Sim há um campeonato a ser decidido, mas este título terá sempre um peso especial, pelo que a ideia de ver um exemplo prático do que pode ser um formato destes certamente me empolgaria e levaria mais pessoas a sintonizar as corridas, para ver a novidade. Se corresse bem era uma opção para o futuro. Se corresse mal, tinha sido uma experiência num ano atípico que serviria de lição. Entendo e concordo com os motivos que levaram a Mercedes a negar a ideia. Mas este é um tempo de pensar fora da caixa, de tentar soluções novas e apesar de ser contra este formato proposto, gostaria de o ver aplicado no mundo real. É pena esta oportunidade estar a ser desperdiçada.

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4 Comentários
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jem
jem
3 anos atrás

Não se deve mudar o que está bem. Nem se deve inventar nada que possa colocar em causa a verdade desportiva.

Scuderia Fast Turtle
Scuderia Fast Turtle
Reply to  jem
3 anos atrás

Há malta que quer mudar só para mudar. Não as pensam.

sr-dr-hhister
sr-dr-hhister
3 anos atrás

“Sempre fui contra a implementação de um novo sistema de qualificação, por achar que o formato atual está bem… Mas estamos em 2020, um ano que nos puxou o tapete e virou o mundo de cabeça para baixo. …porque não experimentar? ”

Sempre fui contra assaltos à mão armada, mas hei, estamos em 2020, porque não experimentar?

Enfim, há cada lógica!

4RcNg
4RcNg
Reply to  sr-dr-hhister
3 anos atrás

Não é a nossa opinião e tendência, que faz variar formas de ilicitude ou licitude. São as determinações normativas de um Estado de Direito que o fazem. O exemplo dado é porquanto desacertado. Quanto á F1, também o que conta é o sentido normativo e de regra. Se mudarem uma regra, não tem nada de irrazoável.Na vontade e concordância comum, todos continuam a competir da mesma forma e estão sujeitos ás mesmas consequências. Se houvesse audácia e arrojo deviam optar por fazer variar a forma da prova que se repete na mesma pista com poucos dias de intervalo, para evitar… Ler mais »

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