F1: Grande Prémio da Hungria de 1997: A corrida fabulosa de Damon Hill

Por a 28 Dezembro 2022 17:25

A corrida de Damon Hill no Grande Prémio da Hungria de 1997 ficou para sempre marcada pela exibição fantástica que fez durante o evento. Mesmo com um Arrows-Yamaha que não era muito competitivo, as circunstâncias nesse dia juntaram-se para lhe dar uma hipótese inesperada de vencer aquele Grande Prémio, a qual só lhe seria negada numa última volta frenética. Nesta edição recordamos essa magnífica corrida daquele que era, na altura, o Campeão do Mundo em título

Foi com grande estupefação que o circo da Fórmula 1 reagiu à notícia de que, Damon Hill, que estava prestes a sagrar-se Campeão do Mundo de 1996 com a dominadora equipa Williams, iria assinar contrato com a equipa Arrows, de Tom Walkinshaw. 

Hill tinha sido empurrado para fora da Williams em favor de Heinz-Harald Frentzen, ativando um direito de opção no contrato do alemão que estava na Sauber. 

As negociações para um contrato não chegaram a bom porto entre o britânico e a Williams, que tinha uma tradição de colocar fora da equipa pilotos que se tinham sagrado campeões e que queriam ver os seus contratos melhorados.

Depois de ter deixado de lado ofertas de equipas como a McLaren, Benetton ou a Jordan, pela qual assinou uma opção de 10 dias até que o prazo expirou, sem hesitar, Hill falou com Walkinshaw, que tentava formar uma equipa competitiva a longo prazo, e assinou contrato. Foi uma enorme surpresa ver um piloto de alto calibre passar para uma equipa que tentava afastar-se do fundo do pelotão, mas havia muita ambição. Walkinshaw conseguiu resolver uma situação delicada com o fornecimento de motor, acabando por seguir com a Yamaha, que procurava tornar o seu motor fiável depois dos inúmeros problemas no ano anterior com a Tyrrell; tinha assegurado o fornecimento de pneus Bridgestone, que iriam entrar na Fórmula 1 em 1997; e garantiu os serviços do brasileiro Pedro Diniz, levando consigo uma boa ajuda financeira com o seu patrocínio da Parmalat. Em suma, era uma bela oportunidade para todos os envolvidos, e ter um Campeão do Mundo numa equipa que queria crescer era absolutamente fantástico.

Para Hill era uma jogada algo arriscada: ir para uma equipa que nunca vencera uma corrida desde que entrou na Fórmula 1, em 1977. Mas se o carro falhasse, Hill podia sempre culpar o carro. Já se tudo desse certo, o britânico estava em posição de dizer que os seus esforços tinham ajudado a equipa a ter uma combinação sólida, fiável e rápida, tirando proveito disso.

Uma nova casa

Os sinais nos testes de pré-temporada foram positivos para os pneus Bridgestone, com Olivier Panis a fazer bons tempos no seu Ligier-Mugen Honda. Também com um Ligier-Mugen Honda, mas na versão de 1995, Damon Hill iniciara os testes para perceber os Bridgestone, e fez bons tempos em Suzuka, apesar de um acidente.

Em janeiro, o novo Arrows A18 estava pronto e foi apresentado, e Walkinshaw mostrava-se extremamente otimista para a temporada que aí vinha, dizendo: “Temos que ambicionar ter um carro que é capaz de terminar nos três primeiros de forma razoavelmente consistente na segunda metade da temporada. Se conseguirmos fazer isso não há motivos para o Damon não conseguir vencer uma ou duas corridas.”

Nos primeiros testes a prioridade foi perceber o comportamento dos pneus, mas havia alguns problemas com o motor Yamaha, ainda numa especificação anterior, o que deixou Damon um pouco frustrado mas ainda com algum otimismo. “Penso que o carro é bom, mas não conseguimos andar por causa de todos os problemas e por isso não o conseguimos desenvolver. Estou a aguentar mas não estou muito satisfeito.”

No final dos testes, Hill teve um susto com uma falha na asa dianteira, mas acabou por viajar para Melbourne para a primeira corrida da temporada. Havia então muito nervosismo na equipa, que queria começar a temporada com uma boa prestação, e todos queriam ver como é que o campeão do mundo iria começar a sua nova vida numa equipa menos forte. Durante a semana que antecedeu a corrida circularam alguns rumores de que, devido ao fraco desempenho do carro, Hill tinha deixado a equipa, algo que estava longe de ser verdade.

Primeiras corridas da temporada

O Grande Prémio da Austrália provou ser um enorme desastre para a equipa. Hill e Diniz tiveram muitas dificuldades, com Hill a qualificar-se no 20º lugar e Diniz a não marcar um tempo dentro dos 107% da pole, recebendo, mesmo assim, permissão para participar na corrida.

Se as coisas corriam mal, na corrida iriam correr pior. No ano anterior, Hill venceu a corrida, mas neste ano nem sequer conseguiu terminar a volta de aquecimento, porque o acelerador bloqueou e o britânico ficou parado em pista, Diniz chegou ao fim mas com quatro voltas de atraso.

A prestação foi um desastre para Tom Walkinshaw, que voltou imediatamente aos testes antes da corrida no Brasil. Aí, Hill teve uma melhoria no desempenho, qualificando-se em nono, e na corrida fez uma prestação positiva, chegando mesmo a estar no quarto lugar até que uma fuga de óleo resultou numa falha no motor a apenas quatro voltas do fim.

Nas corridas que se seguiram, Hill somou vários abandonos: na Argentina teve problemas de motor; em São Marino e numa corrida muito molhada no Mónaco sofreu com colisões; e em Espanha voltou a ter um motor Yamaha problemático. A série de abandonos acabou no Canadá, onde terminou no 9º lugar e a uma volta do vencedor. Pelo meio teve um grande acidente em testes em Magny-Cours, onde danificou muito um chassis, e não ficou impressionado com a nova versão do motor Yamaha. A sua paciência para com o carro parecia estar a esgotar.

Momento de viragem

A corrida em França, no circuito de Magny-Cours, foi o início de um ponto de viragem da temporada. Hill teve problemas logo na primeira curva na primeira volta, quando teve uma saída de pista e partiu a asa dianteira, praticamente desaparecendo da corrida. Terminou no 12º e último lugar dos classificados, a umas distantes três voltas de atraso.

A corrida seguinte era o Grande Prémio da Grã-Bretanha, em Silverstone, a corrida caseira de Hill e da Arrows. Um evento em que Tom Walkinshaw mostrou o seu lado implacável e veio dar um recado ao seu piloto, que soou como uma espécie de pontapé para um campeão do mundo que parecia estar desmotivado, principalmente depois de um pobre Grande Prémio de França, onde Hill praticamente não se viu depois da sua aventura da primeira volta. E este recado que Walkinshaw deixou foi em público, numa tentativa de obrigar a uma reação de Hill.

“Qualquer profissional só pode ser tão bom como foi a sua última corrida, e se o Damon quer estar numa situação melhor, ele deve estar a dar 110% para mostrar a outros o que ele é capaz de fazer. Tenho que voltar a colocá-lo na fervura. Tenho sido sutil, mas agora é tempo de ser franco. É altura para mim de lhe relembrar daquilo que ele é capaz”, referiu o responsável máximo da estrutura.

Um dia depois, e após muitos rumores a circularem de que o britânico podia deixar a equipa, foi a vez de Damon dar a sua visão: “Há tanto que eu posso fazer que o piloto pode fazer. Eu estava interessado em minimizar isto e não fazer comparações entre o que eu sinto que foi o pacote oferecido no início do ano pelo Tom e aquele que temos agora. Eu não quero decepcionar ninguém. Eu estou 100% com a equipa.”

A mensagem foi recebida, alta e clara, e Damon, depois de dar uma boa resposta ao patrão, deu mais uma resposta positiva na qualificação ao colocar o Arrows-Yamaha no 12º lugar. A sua corrida foi boa e tirou proveito dos abandonos de alguns pilotos à sua frente para terminar no 6º lugar, na mesma volta do líder, e somando o último ponto em disputa na corrida. Finalmente, Hill marcava pontos com a Arrows e mostrava ter fibra de campeão depois de uma época decepcionante até aqui.Por outro lado, o motor Yamaha finalmente mostrava alguma fiabilidade depois de sofrer problemas em testes antes desta corrida.

A corrida seguinte, em Hockenheim, na Alemanha, seria um teste ideal para o motor Yamaha, e Hill conseguiu terminar no 8º lugar, a uma volta do vencedor, pelo que ainda podia haver alguma esperança no motor, mesmo com rumores de que a Yamaha planeava terminar a sua aventura complicada na Fórmula 1. A chegada do famoso engenheiro John Barnard à equipa ajudou um pouco em resultado dos ajustes que pôde fazer no carro, e desde que o motor Yamaha, construído pela Engine Developments de John Judd, passou a ser desenvolvido pelos engenheiros da TWR, melhorou a fiabilidade. Foram bons resultados nestas duas corridas, mas nunca ninguém imaginava o que viria a acontecer na corrida seguinte, na Hungria.

Fim de semana inesperado

Com um Ferrari revisto, Michael Schumacher foi dominando o fim de semana e iria fazer a pole no Hungaroring, com o Williams-Renault de Jacques Villeneuve no segundo lugar. A Arrows ficou estupefacta com o desempenho de Damon Hill. O seu estilo de condução suave era uma vantagem neste circuito, e os pneus Bridgestone pareciam funcionar muito bem, sobretudo quando a pista estava mais quente, tendo vantagem sobre os Goodyear, mas nunca ninguém imaginaria que se iria qualificar num incrível terceiro lugar nos últimos segundos da qualificação numa pista que estava a ficar mais fria. Um feito extraordinário para um carro que nunca se tinha qualificado melhor do que no nono lugar. Hill ficou apenas a três décimas de segundo do tempo de Schumacher, que teve um acidente no warm up e danificou o seu carro, sendo obrigado a passar para o carro de reserva, que era a versão antiga do F310.

No dia da corrida, a pista estava quente. Más notícias para os pilotos com pneus macios da Goodyear. Apenas três pilotos tinham a opção mais dura, um deles era Heinz-Harald Frentzen, que partia do 6º lugar no seu Williams-Renault. Hill tinha pneus macios da Bridgestone e parecia apostado em aguentar qualquer tipo de degradação.

Quando as cinco luzes vermelhas apagaram, Michael Schumacher derrapou em demasia mas manteve a liderança. Damon Hill fez um dos melhores arranques da sua carreira e passou instantaneamente Jacques Villeneuve, ascendendo ao segundo lugar. A Arrows rejubilava e o piloto britânico ganhou confiança. Já o canadiano caiu para o quinto lugar num arranque desastroso.

Schumacher atacou nas primeiras voltas mas rapidamente degradaram-se os pneus e Hill colocou-se em posição de ataque. A vantagem para o McLaren-Mercedes de MikaHäkkinen era segura e podia concentrar-se num Ferrari que começava a andar cada vez mais devagar.

Mesmo rodando com os pneus macios da Bridgestone, a diferença em aderência era enorme entre Hill e Schumacher. Damon via um comboio atrás de si a aproximar-se perigosamente e não podia permitir ter a pressão de ultrapassar e, ao mesmo tempo, de manter a posição.

Momento de bravura

Na volta 10, Damon fez o seu primeiro ataque, tentando colocar-se no interior na difícil curva 1, mas Michael fechou bem a porta. Damon tinha que voltar a insistir, e assim fez na volta seguinte. Desta feita foi mais decidido e impediu Michael de tentar colocar o carro no interior. Contra todas as expetativas, Damon Hill estava na liderança do Grande Prémio da Hungria… num Arrows-Yamaha!

Não estando suficientemente contente por liderar, Hill começou a rodar quase três segundos por volta mais rápido do que os rivais, que estavam presos atrás de Schumacher. Häkkinen atacou, mas ficou fora de prova na volta 13 com a perda de pressão hidráulica. Villeneuve era agora terceiro e estava farto de rodar atrás de uma chicane móvel. O canadiano, não querendo perder mais tempo para Hill, passou Schumacher na volta 14, numa manobra semelhante à de Hill. No final dessa volta, Schumacher parou para trocar de pneus e não voltou a ameaçar os líderes na corrida.

Com isto, Hill não só liderava a corrida como ainda tinha oito segundos de vantagem. Uma altura em que Villeneuve e Frentzen iniciaram um ataque ao Arrows e conseguiram reduzir a diferença para três segundos, mas quando o segundo Arrows, de Pedro Diniz, apareceu para ser dobrado, os Williams perderam três segundos. Depois, Villeneuve perdeu também mais tempo aquando da sua primeira paragem nas boxes, na volta 24, com uma roda que demorou um pouco mais a apertar.

A tensão nos mecânicos da Arrows aumentou quando Hill apareceu nas boxes para a sua primeira paragem, na volta 25. Hill parecia calmo ao volante, parou o carro no sítio certo e os mecânicos sustiveram a pressão e fizeram um bom trabalho, mandando Hill na frente de Villeneuve.

Frentzen estava agora na frente e com pneus duros podia fazer esta corrida com apenas uma paragem, e isso preocupava Hill e Tom Walkinshaw, que percebia o perigo que a aposta conservadora do alemão podia representar. Mas a equipa suspirou de alívio quando o Williams deixou cair uma peça de metal na reta da meta e começou a largar chamas e fumo. Quando Frentzen parou, os mecânicos ficaram impossibilitados de reabastecer o carro porque o bocal de reabastecimento estava partido e inutilizável. Hill voltava assim à liderança e aumentava cada vez mais a diferença.

Hill controla a corrida

Villeneuve não conseguia manter o mesmo ritmo de Hill porque os seus pneus não o permitiam, e tinha o McLaren Mercedes de David Coulthard a aproximar-se perigosamente. Na volta 29, Hill liderava por 12 segundos, na volta 44 a diferença era de 21. O estilo suave e preciso de Hill favorecia o comportamento dos pneus numa pista muito técnica, permitindo que aguentassem mais tempo num composto mais macio, o que era desesperante para os pilotos atrás, que provavelmente não compreendiam o que se estava a passar.

A luta pelo segundo lugar tinha potencial para ter novidades após as paragens nas boxes. Coulthard entrou primeiro, na volta 50, Villeneuve parou uma volta depois. Quando o franco-canadiano saiu das boxes, Coulthard viu uma oportunidade de passar por fora, no lado sujo na curva 1… e deslizou desesperadamente o carro. Villeneuve estava no lado certo, mesmo com pneus frios, e manteve a segunda posição. Coulthard não desistiu, atacou na chicane, mas Villeneuve bloqueou o interior das curvas.

Tudo isto permitia a Hill aumentar mais o fosso. A sua segunda e última paragem na volta 51 correu de forma maravilhosa. Mais uma vez, os mecânicos fizeram um belo trabalho para mandar Hill de volta em apenas oito segundos. Tom Walkinshaw provavelmente ficou deliciado com a prestação da equipa, que tinha trabalhado no duro no fim de semana para resolver um problema num sensor eletrónico, e os mecânicos tinham desmontado a caixa de velocidades e perderam quase uma hora de tempo precioso em pista. Agora podiam ser recompensados por todo o trabalho que tinham tido até aí.

Mesmo com a pressão sobre os seus ombros, Hill continuava a marcar voltas rápidas e consistentes, parecendo imperturbável. Visto pelas câmaras da televisão, Damon dava sinais de tranquilidade e em momento algum mostrava estar em luta com o carro. Naquela temporada, por uma vez, as coisas estavam a funcionar muito bem naquele chassis.

Um primeiro susto

O ambiente na garagem da Arrows era de um nervosismo insuportável, principalmente quando Pedro Diniz abrandou subitamente em pista e teve que estacionar a meio da volta, em resultado de um problema elétrico. Os mecânicos viram o que se passou. Os responsáveis máximos da equipa também. Damon Hill certamente terá visto um carro igual ao seu parado, e é nesta fase que qualquer piloto começa a entrar em parafuso. Os olhos de Damon esbugalharam à procura de algo anormal, os ouvidos à procura de um som diferente, que não soasse bem. Na sua mente imaginou algum problema, mas resolveu continuar a fazer aquilo que tinha feito até aqui, uma condução limpa e elegante, o mesmo tipo de condução que lhe permitiu ser Campeão do Mundo menos de um ano antes.

A pressão voltou a aliviar quando Coulthard fez um pião na volta 66 ao tentar acompanhar Villeneuve e ficou fora de prova. Nesta fase, Villeneuve tinha mais de 20 segundos para o Sauber-Petronas de Johnny Herbert, que estava no 3º lugar e iria terminar nessa posição, e já tinha atirado a toalha ao chão na luta pelo primeiro lugar. Afinal, seis pontos no bolso, com Michael Schumacher no 4º lugar, com apenas três, era uma boa operação no campeonato.

Damon não corria para o campeonato, pelo que a sua missão era simplesmente ganhar. Chegando tão longe na corrida, não era hora de desistir, mas a poucas voltas do fim, com uns incríveis 30 segundos de vantagem, e a aumentarem cada vez mais, era hora de finalmente poder poupar o carro para as últimas voltas. A equipa certamente pedia prudência e redução do ritmo e Damon reagia de acordo com o plano. No rádio, Damon comunicava uma sensação de conforto e de crença de que o carro iria chegar ao fim sem problemas.

Pânico a bordo

Quando faltavam apenas três voltas para o final da corrida a vitória parecia certa, mas, de repente, o carro teve um comportamento estranho. “Eu saí da chicane e o acelerador não fechou quando eu levantei o pé”, disse Damon. “Pensei: ‘isto é um pouco estranho, talvez seja o meu pé’, e depois passaram três ou quatro curvas e não mudava corretamente as velocidades.”

Foi o princípio do desastre. Um problema na bomba hidráulica causou uma falha na ligação do acelerador. Primeiro foi a sensação de falha no acelerador eletrónico, porque não havia um cabo a ligar o acelerador ao motor, e sendo um sensor eletrónico, as coisas são mais difíceis de gerir. O carro podia ter uma aceleração brusca a meio de uma curva e ter consequências catastróficas. Depois, com os problemas para mudar de velocidade, a equipa pediu-lhe para colocar o carro em 5ª velocidade, mas só conseguiu mudar de 2ª para 3ª, e aí ficou preso. O carro tinha pouca aceleração em curvas lentas e falta de velocidade de ponta nas retas. O acelerador estava intermitente. Desesperadamente, Damon abanava o carro, à procura de um milagre que fizesse ligar alguma coisa que estivesse desligada, e comunicava à equipa via rádio que o acelerador não estava a trabalhar corretamente.

Ao aperceber-se dos problemas do rival, a Williams chama Villeneuve no rádio e pede-lhe para voltar ao ritmo de ataque. Dizem ao canadiano que Hill estava a andar muito devagar. Jacques executa a ordem e na volta 75 tira quase 10 segundos a Hill e na volta 76 tira mais 20 segundos. Chegava assim à última volta a cerca de cinco segundos do britânico. As esperanças de vencer dos elementos da Arrows eram cada vez menores, já que o carro teimosamente não voltava ao normal e estava cada vez mais lento. Ainda antes de Villeneuve apanhar Hill, já havia a sensação de não haver hipótese de um triunfo.

Uma ultrapassagem arriscada

Quando Villeneuve apanhou o Arrows, que estava muito lento, ficou sem saber como é que Hill iria reagir, e receoso de que o pudesse bloquear agressivamente, Villeneuve foi com duas rodas para a relva na saída da curva 3 ao mesmo tempo que Hill dava abanões no carro. A imagem de Villeneuve a passar na relva e a levantar algum pó ficou na retina para todos, e foi uma imagem marcante. O piloto da Williams passava para a liderança de uma corrida da qual já não tinha esperanças de vencer.

Villeneuve levou o carro até à meta sem problemas e venceu a corrida, dando à Williams a 100ª vitória num Grande Prémio. Mas o verdadeiro herói cruzou a meta nove segundos depois. Damon Hill conseguia levar o carro até ao fim e ficou num honroso segundo lugar. Tom Walkinshaw não ficou satisfeito por perder a corrida tão perto do fim, mas havia o sentimento positivo de que houve progressos na equipa, e havia um enorme orgulho no piloto britânico, que saiu do carro e deu um grande abraço a Villeneuve, o seu antigo colega de equipa na Williams. Hill manteve uma postura digna e aceitou educadamente e com um grande sorriso o troféu do segundo lugar.

“É fantástico vê-lo (Hill) aqui”, disse Villeneuve. “Ele merecia a vitória hoje. O Damon estava mesmo a voar. Lá para o final da corrida, esta estava a tornar-se muito sombria porque ele continuava a andar mais, mais e mais, até a duas voltas do fim, quando a equipa me disse que ele estava a abrandar. Por isso comecei a puxar outra vez, e quando cheguei a ele, ele ia da esquerda para a direita, e pensei que ele tinha uma suspensão partida, e sabia que me ia bloquear como é normal na última volta, por isso fui para a relva e o carro é mesmo bom na relva! Eu trabalhei na aderência do carro na relva ontem e por isso hoje estava mesmo bom!”

Segundo Damon Hill: “Eu já estava naquele ponto em que estás a pensar em contar vencer a corrida, mas quando pensas em coisas do género algo acontece, e eu tinha um problema na bomba hidráulica. O acelerador começou a trabalhar intermitentemente e eu não conseguia mudar de velocidade. Eu precisava era de 40 segundos, não de 30!”

Consequência de um bom dia

Para o mundo da Fórmula 1, na altura, este enorme resultado da equipa lançou dúvidas nos rumores de que a Yamaha iria sair da Fórmula 1 e alimentava a esperança de que Hill poderia ficar na Arrows. No fim, Tom Walkinshaw juntou-se a Brian Hart para desenvolver um motor V10, só que a Yamaha ficou fora do projeto de financiar e renomear o motor quando o carro de 1998 foi apresentado. A TWR iria comprar a companhia de Brian Hart mais tarde, e a Yamaha terminou uma história difícil e de pouco sucesso na Fórmula 1. Esta corrida iria ser o último pódio da Arrows como equipa e da Yamaha como fornecedora de motores na Fórmula 1.

Com incertezas no fornecimento de motores, e depois de uma grande corrida na Hungria, Hill estava disposto a negociar com outras equipas, entre elas a McLaren e a Prost, com Alain Prost em particular a estar muito receptivo a ter os serviços do seu antigo colega de equipa na Williams. Porém, no final acabou por se mudar de forma algo inesperada para a Jordan, que iria ter o uso exclusivo do motor Mugen Honda e tinha um projeto mais aliciante e com mais potencial para ser competitivo. Por outro lado, a estrutura tinha perdido um caso em tribunal contra a Benetton, pelo contrato de Giancarlo Fisichella, e tinha que contratar outro piloto. Por isso, nada melhor que um piloto campeão do mundo que trazia experiência e que ainda mostrava ser rápido, como o mostrou na segunda metade da temporada de 1997. Para substituir Hill, Tom Walkinshaw optou pelos serviços de Mika Salo, que tinha a reputação de ser um piloto rápido, sólido e que já estava a ser muito elogiado, entre outros, por Jean Todt. Para Walkinshaw era uma opção mais barata e possivelmente mais rápida do que Hill.

Até ao final da temporada, Hill teve prestações positivas, destacando-se um sétimo lugar na Áustria e um oitavo no Nürburgring, no chamado Grande Prémio do Luxemburgo, e na última corrida pela Arrows, em Jerez de la Frontera, Hill qualificou-se num fantástico quarto lugar, a apenas 0.058 décimas de segundo de Villeneuve, Schumacher e Frentzen, que tinham feito exatamente o mesmo tempo. Hill estava no quarto lugar da corrida quando abandonou ao fim de 47 voltas com problemas na caixa de velocidades.

Não foi uma carreira fácil para um Campeão do Mundo numa equipa do fundo do pelotão, mas foi uma experiência diferente para um piloto habituado a estar nos lugares cimeiros. Esta corrida no Hungaroring ficou para sempre como uma das mais imprevisíveis da história da Fórmula 1 e tirou as dúvidas sobre o britânico, de que apenas conseguia ganhar com o melhor carro. A sua magnífica prestação na Hungria provou de que conseguia ter bons resultados mesmo sem ter os melhores carros do pelotão. Nesta temporada em particular, teve momentos muito frustrantes e desmotivantes, mas depois de um puxão de orelhas do patrão começou a fazer desempenhos dignos de um Campeão do Mundo. Em suma, quase podemos dizer que Damon Hill era um grande piloto quando queria sê-lo. E nos dias em que as coisas corriam bem, mostrou inúmeras vezes de que podia ser um piloto quase imbatível e com grandes dotes de condução. Afinal de contas, tem um título no palmarés, o que é um curriculum vitae completamente preenchido.

Por Jorge Covas

Subscribe
Notify of
0 Comentários
Inline Feedbacks
View all comments
últimas AutoSport Histórico
últimas Autosport
autosport-historico
últimas Automais
autosport-historico
Ativar notificações? Sim Não, obrigado