Crónica: Charutos e comparações

Por a 19 Novembro 2020 16:45

O que é preciso provar para ser considerado o melhor? Como se deve conquistar o sucesso para ser respeitado? Questões que, aparentemente não têm respota.

Ronnie O’Sullivan,  jogador profissional de snooker e seis vezes campeão do mundo, comentou as conquistas de Lewis Hamilton, num tom de algum menosprezo:

“Se ele tem um carro que está um segundo por volta mais rápido do que os outros carros, em teoria tudo o que ele tem a derrotar é seu companheiro de equipa, Bottas – que parece estar confortável e feliz sendo o segundo piloto da equipa. Não me sentiria tão bem com a minha carreira no snooker se estivesse a jogar numa mesa se os buracos que estava a usar fossem maiores do que os do meu adversário.”

Será possível alguém ser unanimemente o melhor? Vale a pena alimentar esta conversa tão falada, mas que raramente traz uma resposta? Nem por isso. Basta olhar para o exemplo de Hamilton. É verdade que tem tido o melhor carro do grid, é verdade que está na melhor equipa da atualidade. Mas uma equipa com esta qualidade não quereria mais ninguém a não ser o melhor, e talvez por isso Hamilton é a peça fundamental da engrenagem. A qualidade do britânico está acima de toda a dúvida e quando saiu da McLaren tinha 21 vitórias e um título no seu CV, números já bastante apreciáveis. Na Mercedes encontrou o lugar certo para evoluir, mas foi graças ao seu talento que mereceu a confiança de Niki Lauda que o convenceu a ir para aos Flechas de Prata. Desde então tem estado constantemente a um nível que poucos conseguem alcançar. Apenas Rosberg foi capaz de o fazer, mas fê-lo por um ano apenas e depois retirou-se. Todos os que conhecem Bottas dirão que é um excelente piloto, mas tem estado a milhas de mostrar que pode bater o pé ao #44.

Para ser um campeão ao nível do de Hamilton é preciso ter um talento imenso e uma força mental tremenda. É preciso ter um foco brutal, uma disciplina a toda a prova, para enfrentar épocas de 20 corridas ou mais e cometer poucos erros (ou nenhuns). E fazer isso anos a fio.

A tarefa do piloto de F1 será sempre ingrata e talvez das mais únicas no mundo do desporto. É um desporto de equipa e para se mostrar valor é preciso ter uma boa equipa, mas na hora H, toda a pressão e as atenções estão viradas para o piloto. O peso de uma organização de centenas de pessoas nos ombros de um homem apenas, que no fim pode sentir que deu tudo, mas por ter um carro que não dava para mais fica com as migalhas, ou sem nada se fatores fora do seu controlo entrarem em cena. Encarar tudo isto, toda esta pressão e vencer, não está ao alcance de qualquer um.

E serve o acima escrito para todos os que são considerados dos melhores de sempre. Senna, Schumacher, Fangio…Todos eles enfrentaram desafios que exigiram deles o melhor e por serem os melhores foram para as melhores equipas e destacaram-se. Mas nenhum deles atingirá a unanimidade. Por cada voz a favor haverá uma contra, por um motivo muito simples… a paixão. Por isso o tema do melhor de sempre, seja em que competição for resultará num inevitavelmente num mar de incertezas, pois para além da diferença nas eras, há também a forma como o adepto vê e essa visão será sempre afetada pela sua paixão.

Mas uma coisa pode ser dita sem dúvida. Que todos os grandes campeões tiveram grandes máquinas, mas ao contrário do que possa parecer, nenhum deles fumou um charuto dentro do carro, pois a exigência é máxima. Pode parecer fácil, mas a arte dos melhores é fazer-nos acreditar que o que fazem é simples, quando está de facto ao alcance de muito poucos. Como pilotar um carro com pneus desfeitos em condições miseráveis e vencer, ou fazer um 147 no snooker em cinco minutos e 20 segundos. Quem vê pode sentir-se tentado a dizer “eu era capaz de o fazer”. Quem o faz sabe bem o trabalho que foi preciso para chegar ali.

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ople1992superrito-com
ople1992superrito-com
3 anos atrás

Claramente das questões mais parvas que se podem ter, esta de quem é o melhor de sempre. Ainda mais quando muitos comparam com outros pilotos de outras eras em carros igualmente superiores e usam argumentos distintos para dizerem que é melhor que outros quando os factos são os mesmos.
Claramente a frustração das pessoas passa para estás questões risíveis que de nada contribuem para o desporto em si.

tp84
tp84
3 anos atrás

Não costumo apreciar os textos do Fábio Mendes, mas o seu a quem de direito, e esta crónica merece ser elogiada. E estes dois ultimos parágrafos podem ser aplicados a muitos outros desportos. Pode dizer-se que Ronaldo só marcava tanto golo pq estava na melhor equipa, mas tbm só estava na melhor equipa porque marcava tanto golo. Para fazer parte do lote dos melhores do melhores nao basta ter talento.

831ABO
831ABO
3 anos atrás

Para quem não esteja por dentro do Snooker, Ronnie «Rocket» O’Sullivan é, além do jogador mais bem sucedido de sempre, um entusiasta de automóveis que figurou várias vezes no Top Gear. Gostei da analogia dos buracos. Aplica-se perfeitamente ao domínio da Mercedes, cujos pilotos jogam em mesas com buracos maiores do que as os adversários. Mas isso retira mérito ao Hamilton, ou a outros pilotos que tiveram carros dominadores? Não me parece. Caso contrário teria de recusar valor a pilotos como Fangio – se pensarmos bem, a dupla Fangio-Moss não é muito diferente de Hamilton-Bottas -, Mario Andretti, Ayrton Senna,… Ler mais »

macickx
macickx
3 anos atrás

A analogia dos buracos do Snooker que o 831 ABO concorda, está errada. Além de outros exemplos que há no passado, esta última prova do Hamilton. é exemplo. Ele veio de trás ,numa pista em condições traiçoeiras, até chegar ao 1º lugar. Depois foi preciso aguentar cerca de 50 voltas com os mesmos pneus numa pista secar! É obra. Não chega ter o melhor carro.

MurrayWalker
3 anos atrás

A questão qua ainda não vi ninguém fazer foi: Se nestas 14 épocas de F1 em que o Hamilton por lá anda, se os carros e a fiabilidade fossem iguais para todos os pilotos. Teria ele mais ou menos títulos do que aqueles que tem hoje? Quem é que o conseguiria bater? Alonso? com certeza que seria o maior candidato a roubar-lhe títulos com carros iguais, mas se no ano de rookie foi o que foi. A balança teria a pender para o lado do britânico. Vettel? mesmos nos seus melhores anos seria díficil roubar títulos ao Hamilton, com carros… Ler mais »

asfalto
asfalto
Reply to  MurrayWalker
3 anos atrás

Meu caro, os ses vão ficar para a posteridade, o que reinará é a teoria dos buracos maiores, assenta que nem uma luva.

MurrayWalker
Reply to  asfalto
3 anos atrás

Os “buracos maiores” sempre existiram na F1. A Lotus, Williams, McLaren, Ferrari, Redbull. Todas elas tiveram “buracos maiores” por longos períodos de tempo e de todos eles nasceram os maiores pilotos de sempre deste desporto.

Porque os ses, vão ficar para sempre para a posteridade, é que quem não vive de ses, mas sim de conquistas, há de ter algum mérito nisso.

asfalto
asfalto
Reply to  MurrayWalker
3 anos atrás

Mas isso para mim nem é assunto, o Murray é que parece que tem necessidade de justificar alguma coisa, até parece o Hamilton a dizer que foi difícil quando toda a gente viu como foi, e tem a própria opinião. Gosto muito de uma frase que diz assim, quem é não precisa de dizer. E a necessidade de querer valorizar o feito do Hamilton reflete alguma, muitos números com pouco valor porque joga com buracos mais largos.

MurrayWalker
Reply to  asfalto
3 anos atrás

Eu não pretendo justificar nada meu caro. Eu apenas acho que em situações exatamente iguais, em que se comparam com outras épocas e outros pilotos. Para as mesmas situações, nuns casos são buracos largos e noutros são buracos estreitos.

Isso é particularmente evidente quando se trata de esgrimir argumentos com adeptos da equipa mais popular do plantel e que têm menos de 50 anos. Porque basicamente toda a vida tiveram um único ídolo e nunca pensaram que pudesse ser comparável com mais alguém. Como agora se tem feito diariamente.

zedasrodas
3 anos atrás

Este tema parece aquela velha máxima «o que apareceu 1º o ovo ou a galinha?», já agora este Sr. campeão de snooker esqueceu-se que alem dos buracos pode ser umas bolas mais pequenas e outras maiores ou ainda umas mais leves e outras mais pesadas e ainda umas mais polidas do que outras, afinal há varias formas de desculpar a qualidade do jogo. Quanto ao tema F1 claramente nunca se pode nomear o melhor de sempre mas pode-se sim nomear o melhor da época e dizer-se que a década de 50 é comparável a de 80 ou a de 2000… Ler mais »

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