Ayrton Senna na Lotus: De jovem promessa a ‘Magic Senna’

Por a 21 Março 2019 16:17

Bastou uma época para que o jovem Ayrton Senna percebesse que a Toleman era demasiado pequena para o seu ego e enorme ambição. Estava na Fórmula 1 para ganhar e ser campeão, por isso sabia que o seu futuro passava por uma das melhores equipas, que estivesse, como ele, habituada a ganhar. No “paddock”, Senna era ainda visto como uma jovem promessa, com grande talento e potencial para se tornar um campeão, mas logo na sua primeira época na F1 mostrou que era mais do que um dos pilotos mais rápidos do pelotão. A Lotus viu nele o piloto de que necessitava para voltar a ser uma equipa ganhadora, digna da herança de Colin Chapman, e Ayrton Senna não tardou a confirmar que a escolha tinha sido acertada, pois logo na primeira época com a equipa deixou a sua marca no exigente e competitivo mundo da F1. Começou então a construir uma imagem que ficaria bem resumida por duas palavras: “Magic Senna”.

Quem o definiu como mágico foi Gérard Ducarouge, que chegara à Lotus a meio de 1983 para procurar recuperar a via da inovação técnica, perdida ainda antes da morte súbita de outro mágico, Colin Chapman. Mas faltava um piloto do calibre de Jim Clark, Graham Hill, Jochen Rindt, Emerson Fittipaldi ou Mario Andretti, os Campeões do Mundo com a Lotus, para garantir que nada ficava por explorar do potencial da renovada Lotus, que incluía já os motores Renault Turbo. A primeira época de Senna e, sobretudo, a sua soberba estreia no Mónaco, tinha despertado o “paddock” e as equipas passaram a ver nele um campeão do futuro, por isso Peter Warr, instigado por Ducarouge, resolveu uma jogada de antecipação, que lhe valeu uma pequena guerra com a Toleman ao anunciar a contratação do brasileiro quando faltavam quatro corridas para o final da época.

Entre o final de 1984 e o início de 1985, o seu primeiro ano na Lotus, tivemos três Grandes Prémios consecutivos “a falar português”, e o último desta série ficaria como uma das obras-primas da carreira de Ayrton Senna. Ele já tinha feito o esboço dessa obra em 1984, precisamente no Mónaco, mas foi no Estoril que a terminou, depois de ter conquistado a sua primeira “pole position” na véspera. Foi o primeiro acto de grande inspiração do fim-de-semana, apesar de ainda não dispor da última versão no motor Renault V6 Turbo, reservado apenas a um dos carros oficiais da marca francesa, depois sublimado com uma corrida “do outro mundo”, numa pista inundada e que parecia estar menos molhada para ele do que para todos os seus adversários…

Numa F1 condicionada pelos limites de consumo, que levavam ao estrangulamento dos V6 Turbo em corrida, era em qualificação que Senna exprimia o seu talento para ominar os mais de mil cavalos dos motores Renault, tornando-se o campeão das “pole position”. Conquistou sete em 1985 e oito em 1986, mas estas não davam pontos e não conseguiu estar na luta pelos títulos até à última corrida. Em 1987, já com os motores Honda V6 Turbo, os Williams-Honda, Nigel Mansell e Nelson Piquet não lhe permitiram ir além de uma “pole”.

A sua passagem pela Lotus saldou-se por dezasseis “poles”, mas apenas seis vitórias, todas elas marcadas por um cunho pessoal. Houve outro festival de Senna numa pista molhada em 1985, no emblemático circuito de Spa-Francorchamps, no ano seguinte ganhou um “sprint” emocionante em Jerez, batendo Mansell por 14 milésimos de segundo, na sua primeira vitória em pista seca, e depois apenas conseguiu impor-se em circuitos citadinos, outra sua especialidade… Duas vitórias em Detroit e o primeiro duma série impressionante de sucessos no Mónaco, completaram um pecúlio demasiado magro para Ayrton. A Lotus não saciara a sua sede de vitórias, pois só estas o poderiam levar ao ambicionado título de Campeão do Mundo, por isso Senna decidiu “mudar de ares”, sabendo já que tinha abertas as portas da melhores equipas, e um importante trunfo na mão, pois os japoneses da Honda queriam que ele continuasse com os seus motores.

O jovem tímido, que saíra directamente da Fórmula 3 para a Toleman, era apenas uma recordação para os que tinham acompanhado a sua entrada no mundo da F1. Ou para os que, como é o nosso caso, ainda se recordam de Ayrton plantado junto do balcão de recepção da sala de imprensa de Hockenheim, à espera que algum jornalista lhe desse atenção e perguntasse como é que ele tinha conseguido deixar o segundo da corrida de Fórmula Ford 2000 a quase uma volta, depois de ganhar três segundos por volta aos seus adversários mais rápidos… Tinha amadurecido e destacara-se rapidamente num meio em que selecção e competição são impiedosas. A rapidez, a competência, o profissionalismo, a entrega total eram já evidente, bem como um carisma que todos já lhe reconheciam, permitiram que pudesse ser ele a fazer as melhores opções para o seu futuro na F1. Por isso, ao perceber que não poderia ser campeão na Lotus, mas que não devia abdicar dos motores Honda, não só escolheu a equipa McLaren, apesar de passar a ter que lidar com a concorrência interna de Alain Prost, como levou consigo os motores japoneses para a equipa de Ron Dennis. Não os da Lotus, mas os dos Williams-Honda, apesar do título acabado de conquistar por esta parceria. E esta foi um dos episódios que o compatriota Nelson Piquet nunca lhe perdoou!

Nos limites da perfeição

Andar nos limites era um exercício natural, uma “rotina”, para Ayrton Senna. Era essa a impressão que transmitia, mas também era a forma como se sentia ao volante de um carro de competição, o que lhe permitiu ser um dos pilotos que mais se aproximou dos limites da perfeição, ou mesmo o que chegou mais longe nesse domínio.

Não o afirmamos com base numa opinião pessoal, numa qualquer manifestação de idolatria por alguém que justificou merecer a nossa admiração, mas com base em algo muito concreto, em factos que nos foram transmitidos por Bernard Dudot, responsável técnico pelos motores Renault V6 Turbo que Senna utilizou em duas das épocas que fez na Lotus. Já depois de terem trabalhado em conjunto, as nossas conversas com Dudot constituíam sempre uma oportunidade para procurarmos conhecer um pouco mais sobre Ayrton como piloto. Numa delas confrontámos o técnico francês com a capacidade do brasileiro transmitir informações sobre o carro, e que o teria levado a afirmar que poderiam dispensar a telemetria quando Senna analisava o comportamento do carro. A resposta foi surpreendente, mas elucidativa: “O Ayrton foi o único piloto que conheci que transmitia todas as informações, de forma detalhada, mesmo após uma volta de qualificação feita nos limites.” Então e os outros? E o Alain Prost não o faz também? “Nenhum outro o faz. Alguns , como o Alain, conseguem transmitir informações quando andam abaixo dos 90 por cento dos limites, mas após uma verdadeira volta de qualificação… não têm nada a dizer!”

Por José Miguel Barros

Caro leitor, esta é uma mensagem importante.
Já não é mais possível o Autosport continuar a disponibilizar todos os seus artigos gratuitamente.
Para que os leitores possam contribuir para a existência e evolução da qualidade do seu site preferido, criámos o Clube Autosport com inúmeras vantagens e descontos que permitirá a cada membro aceder a todos os artigos do site Autosport e ainda recuperar (varias vezes) o custo de ser membro.
Os membros do Clube Autosport receberão um cartão de membro com validade de 1 ano, que apresentarão junto das empresas parceiras como identificação.
Lista de Vantagens:
-Acesso a todos os conteúdos no site Autosport sem ter que ver a publicidade
-Oferta de um carro telecomandado da Shell Motorsport Collection (promoção de lançamento)
-Desconto nos combustíveis Shell
-Acesso a seguros especialmente desenvolvidos pela Vitorinos seguros a preços imbatíveis
-Descontos em oficinas, lojas e serviços auto
-Acesso exclusivo a eventos especialmente organizados para membros
Saiba mais AQUI
Subscribe
Notify of
1 Comentário
Inline Feedbacks
View all comments
últimas F1
últimas Autosport
f1
últimas Automais
f1