GT2: Uma categoria que teima em não arrancar

Por a 15 Fevereiro 2021 12:23

Quando anunciou a categoria GT2, Stéphane Ratel certamente esperaria que três anos depois esta estivesse já a florescer, o que não é certamente o caso. Há motivos para tal e não é ainda razão para alarme.

Até 2011, nos campeonatos organizados pelo Automobile Club l’Ouest (ACO) e pela SRO Motorsport Group, a categoria GT2 representava o que hoje em dia são as categorias GTE-Pro e GTE-Am nos campeonatos sob a batuta do clube francês ou GT Le Mans no campeonato IMSA. A designação GT2 desapareceu, mas foi recuperada em 2018 pela SRO que a registou e está a ressuscitá-la. Ao contrário do que o nome indica, o que sem dúvida não joga a favor do conceito, e até do que deveria realmente representar na pirâmide dos GT, em termos de performance, os andamentos dos GT2 ficam entre os GT4 e os GT3.

“O espectro de clientes da nova classe GT2 é diferente das categorias GT3 e GT4”, explica Chris Reinke, o director da Audi Sport customer racing. “A classe GT2 tem o potencial de preencher um espaço. Há onze anos entramos nas corridas de GT3 e estas desenvolveram-se numa categoria altamente profissional. A despesa em que incorrem pilotos e equipas é alta e correr lá não é fácil para pilotos amadores e gentlemen”. Por outro lado, o influente responsável do departamento de competição-cliente da Audi é claro ao dizer que comparavelmente com um GT3, “um GT2 atinge velocidades mais altas e consegue tempos quase idênticos” e para os pilotos menos experimentados, estes carros têm a vantagem “das dinâmicas laterais não colocarem demasiadas exigências até para os amadores”.

A primeira marca a alinhar com a SRO foi obviamente a Porsche que vendeu mais de metade dos duzentos 911 GT2 RS Clubsport produzidos. A Audi seguiu-lhe os passos, mas o R8 LMS GT2 não foi um sucesso de vendas, longe disso, ficando as vendas muito aquém das expetativas. A McLaren deveria ser o terceiro construtor a juntar-se ao grupo, mas os ingleses arrependeram-se e arrepiaram caminho. Em 2019, por falta de quórum, a única manifestação de corrida para estes carros foi o “Porsche Motorsport GT2 Supersportscar Weekend” em Spa-Francorchamps, apenas para os clientes do 911 GT2 RS Clubsport e da versão moderna do 935. Com a Aston Martin, a Ferrari, a Mercedes-AMG e a BMW a lamentarem não terem modelos de estrada para encaixar nesta categoria, Ratel teve que arregaçar as mangas e conseguiu convencer a sempre leal Reiter Engineering a lançar um KTM X-Bow versão GT2, ao mesmo tempo que persuadiu a Lamborghini Squadra Corse a homologar o Húracan SuperTrofeo na categoria para 2021.

Este ano, pela primeira vez, haverá um campeonato só para os GT2 – o GT2 European Series – algo que até aqui não existia, esperando a SRO reunir cerca de dezoito participantes para esta época inaugural. Apesar de ter sido pensada para pilotos amadores, a verdade é que os números continuam a dizer que estes preferem comprar um GT3 a um GT2. Para além da oferta ser muito maior na GT3, tanto de carros como de campeonatos, não há uma diferença assim tão acentuada entre os dois conceitos. Aparentemente, nem uma diferença de cerca de 50 mil euros (ndr: no preço entre um GT2 e um GT3 da Audi) para ser suficiente para alterar a tendência. 

Para o piloto português Rodolfo Ávila, que foi durante vários anos o piloto oficial da Porsche Hong Kong e que recentemente testou o Audi R8 LMS GT2, o carro da casa de Ingolstadt “aproxima-se muito mais a um carro de estrada. É um carro pesado, as mudanças de caixa são mais lentas e não tem tanto downforce, logo não é possível fazer as curvas tão depressa”. O piloto luso radicado em Macau reconhece que o carro “está pensado para pilotos amadores”, mas que os GT3 atuais “são também muito mais fáceis de guiar para um gentleman driver”, isto porque têm “muita aerodinâmica e o controlo de tracção e o ABS são de elevada qualidade. Os carros são muito estáveis”.

Para as equipas, em termos de “running costs”, um GT2 é mais simpático que um GT3, sendo apenas guloso em pneus, travões e gasolina, enquanto nos GT3s actuais todos os quilómetros efectuados contam até ao mais pequeno parafuso. Contudo, um GT2 exige o mesmo tipo de atenção no local. “A nível de chassis precisa da mesma mão de obra que um GT3”, esclarece Ruben Silva, engenheiro da Dynamix Engineering que presta serviços especializados nas categorias de Grande Turismo. “No fundo, se queres maximizar os teus dotes de condução e a afinação do teu chassis precisas sempre de alguém que te ajude, um engenheiro. E em termos de mecânicos, necessitas sempre de ter dois mecânicos e um ajudante, não sendo diferente de um GT3 nos requerimentos mínimos”.

A atual situação da classe GT2 está longe de ser brilhante e até seria motivo de preocupação no seio da SRO se esta não tivesse sido ressuscitada por um motivo diferente do habitual. Ao contrário das primeiras iterações da categoria GT2, em que a categoria surgiu para cobrir uma necessidade, na maioria das vezes para apresentar uma alternativa mais barata à categoria rainha dos GT de então, esta actual GT2 nasceu como plano de reserva da SRO. Apesar de não precisar de o dizer “em alto e em bom som”, é por de mais sabido que Ratel restaurou a categoria GT2 para que esta pudesse ser uma alternativa à categoria GT3 – cujos direitos pertencem à FIA e não à SRO – e fê-lo precisamente quando a FIA e construtores discutiam acesamente o regulamento técnico da classe a introduzir em 2022. Não que a SRO pense em livrar-se dos GT3, bem pelo contrário, mas como a história tende a repetir-se, e caso a FIA não seja capaz de manter os custos da categoria a níveis aceitáveis, a SRO já preparou a sua bóia de salvação.

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