TAP/Rali de Portugal 1995: Luta de titãs até ao final

Por a 9 Abril 2023 11:14

A edição de 1995 do TAP/Rali de Portugal foi uma das mais emocionantes de sempre. Juha Kankkunen e Carls Sainz bateram-se que nem leões até ao final, alternando-se no comando e vencendo quase o mesmo número de troços (13 contra 12 respetivamente). Na Figueira da Foz, quem subiu primeiro ao palanque de chegada, foi o madrileno.

Por isso, o título do AutoSport de 13 de Março de 1995: “Parabéns, señor Carlos Sainz”. Merecidos: “Durante três dias, foi espetacular a luta entre dois dos melhores pilotos do mundo, nas classificativas portuguesas. Sainz a Kankkunen chegaram a estar a 22s (!), empataram por duas vezes e trocaram quatro vezes, o primeiro pelo segundo lugar. Acabou por ganhar o piloto espanhol, que ‘resolveu’ a prova nas últimas três classificativas. Assistimos ao mais emocionante TAP de sempre, onde as outras vedetas foram Rui madeira e uma organização mãos do que eficaz comandada por César Torres.”

Pois foi: “mudando este ano quase toda a sua estrutura, o ali ficou mais compacto mas também mais duro, quer para os pilotos, quer ainda para as marcas, que viram aplicadas em todo o seu esplendor todas as regras que a FIA decidiu [estrear] este ano no Mundial de Ralis. Assistências limitadas, reabastecimentos previamente marcados e pneus condicionados, poderiam contribuir para que a verdade desportiva fosse de algum modo falseada.”

Mas felizmente, nada de anormal sucedeu por causa deste “apertar” federativo e “nenhuma das desistências verificadas se deveu a falta de assistência.” Por isso, “a luta foi leal e durou até à última prova de classificação, [numa luta] mais do que empolgante [e] que arrastou atrás de si uma imensa multidão, quer de portugueses quer ainda de espanhóis, que, de bandeira em punho não se cansavam de apoiar o seu ídolo.”

Para Carlos Sainz, o vencedor, “foi uma grande luta entre mim e o [Juha] Kankkunen. Andámos os dois a 110 por cento durante toda a prova e posso dizer-vos que por vezes nem acreditava no que estava a fazer. (…) Eu nunca acreditei que, na Toyota, estivessem a dormir. (…) No Mundial [de Ralis] nunca se pode facilitar nada. A procura da perfeição deve ser constante.”

Por um diapasão semelhante afinava Juha Kankkunen: “Foi um rali estupendo, talvez um dos mais duros da minha carreira, que o Carlos [Sainz] me ganhou, com toda a justiça e sem que haja quaisquer outras dúvidas.”

“Madeira em destaque”

Mas, para lá dos dois homens da luta, outro houve que deixou os espetadores cheios de água na boca: Rui Madeira, que não apenas foi “o melhor português” como ainda venceu o grupo N, terminando em 9º lugar da geral: “[Madeira] cumpriu o prometido, ao afirmar após o [rali de] Monte Carlo, que venceria a Produção em Portugal.” Porém, a sua tarefa não foi isenta de problemas, conforme ele mesmo contou ao AutoSport: “Logo nos troços iniciais, ficámos sem direção assistida por causa do defeito de uma bomba. (…) Mas, logo que o problema ficou resolvido [após Sever do Vouga], não houve mais nada a dizer do carro.”

Madeira – cujo Mitsubishi Lancer ostentava as cores do AutoSport – enfatizou ainda as vantagens de correr “numa equipa de fábrica: podemos guiar sem estarmos preocupados com mais anda. Foi isso que fiz (…) e tudo correu de feição e agora consigo estar numa posição privilegiadas nos dois campeonatos.”

A saber: o português e a Taça FIA de Produção, que veio a ganhar no final a temporada. No ano seguinte, foi ele quem venceu o Rali de Portugal, então fora do WRC, ao volante de um Toyota Celica GT Four da equipa italiana Grifone.

CLASSIFICAÇÃO

1º Carlos Sainz/Luis Moya (Subaru Impreza 555), 5h32m37s; 2º Juha Kankkunen/Nicky Grist (Toyota Celica GT Four), a 12s; 3º Colin McRae/Derek Ringer (Subaru Impreza 555), a 3m14s; 4º Armin Schwarz/Klaus Wicha (Toyota Celica GT Four), a 4m59s; 5º Didier Auriol/Bernard Ocelli (Toyota Celica GT Four), a 6m13s; 6º Bruno Thiry/Stéphane Prevot (Ford Escort RS Cosworth), a 8m45s; 7º Richard Burns/Robert Reid (Subaru Impreza 555), a 14m21s; 8º Alex Fiorio/Vittorio Brambilla (Ford Escort RS Cosworth), a 25m37s; 9º Rui Madeira/Nuno Rodrigues da Silva (Mitsubishi Lancer EVO VII), a 30m59s (1º Gr. N/Melhor português); 10º Jorge Recalde/Martin Christie (Mitsubishi Lancer EVO VII), a 34m45s; 11º Isolde Holderied/Tina Thörner (Mitsubishi Lancer EVO VII), a 40m56s; 12º Masao Kamioka/Kevin Gormley (Subaru Impreza), a 41m44s; 13º Paulo Meireles/António Abreu (VW Golf Rallye G60), a 43m14s; 14º José Miguel/Carlos Magalhães (Ford Escort RS Cosworth), a 45m30s; 15º Hideaki Miyoshi/Mike Corner (Subaru Impreza), a 49m51s; 16º Piergiorgio Deila/Pierangelo Scalvini (Peugeot 306 16V), a 55m18s (1º Gr.A/2); 17º Andrea Navarra/Renzo Casazza (Toyota Celica GT Four), a 56m58s; 18º Herrmann Gässner/Harald Brock (Mitsubishi Lancer EVO VII), a 1h00m23s; 19º Gaby Goudezeune/Filip de Pelsemaeker (Mazda 323 GT-R 4WD), a 1h00m30s; 20º Uwe Nittel/Monika Eckhardt (Toyota Celica GT Four), a 1h02m13s. Classificadas 39 equipas.

“Gracias a todos!”

Foi este o título da conversa que o AutoSport teve na Figueira da Foz, com o espanhol Carlos Sainz, o vencedor da intensa luta que travou, durante três dias, com o finlandês Juha Kankkunen. Para Sainz, esta que foi a sua segunda vitória em Portugal – depois da alcançada em 1991, então com um Toyota Celica GT Four – foi “uma vitória importante [na sua carreira], não só porque consegui derrotar Juha Kankkunen [que tinha ganho no ano anterior], mas também porque isso aconteceu numa prova das mais difíceis que disputei até agora.”

Saniz chegou com um “zero absoluto” a Portugal, depois de ter desistido na Suécia e o triunfo “foi ouro sobre azul”. Ao longo da prova – onde Sainz ganhou 12 troços, contra 13 de Kankkunen, alternando-se ambos sempre no cimo da classificação – onde “não houve a possibilidade de mudar muitas coisas [no Subaru]”, nem sempre tudo correu de feição e Sainz chegou a ser batido pelo seu colega de equipa, Colin McRae, no segundo dia, quando a equipa fez uma escolha errada de suspensões para [o troço de ] São Lourenço, situação que ficou resolvida apenas “após a assistência de Vieira do Minho.”

O momento chave da prova, para Sainz, foi “no troço da Amoreira e no seguinte”, onde “as condições atmosféricas estavam muito delicadas.” A vitória apenas ficou garantida para Sainz a três classificativas do final mas, na última, ainda houve lugar para um susto, quando se partiu um tubo dos travões: “[Pensamos] que estava tudo perdido. Foi uma das situações mais complicadas de toda a minha carreira. (…) Estava convencido de que tinha deitado tudo a perder. Nem queria acreditar.”

Afinal, quiseram os deuses que assim não acontecesse e Sainz levou para casa o segundo triunfo nas estradas portuguesas: “Acho que esta prova foi muito mais disputada que a de 1991. Contra o Auriol, tudo se resolveu na primeira passagem pelos troços de Arganil, agora lutámos até ao fim.”

César Torres fez “balanço positivo”

Na primeira pessoa, César Torres, então o Presidente do ACP/ACP Sport, responsável pela organização do TAP/Rali de Portugal, fez uma crónica de balanço da prova, em que considera que este “é obviamente positivo, já que tudo correu da melhor forma, com todas as provas de classificação a serem disputadas ao minuto previsto, sem acidentes de maior que motivassem interrupções da prova e em que os controlos e controladores estiveram bastante seguros.”

Isto, apesar de terem existido “alguns problemas na zona de Viseu, onde a cobardia novamente apareceu a coberto da noite.” Uma situação que não é exclusiva da prova portuguesa, “pois repete-se aqui e noutras provas do Mundial De Ralis.”

Cereja sobre o bolo, para César Torres houve “a sorte de [ter existido] uma grande competição para o primeiro lugar e,quando isso acontece e as coisas correm bem, toda a gente está interessada no rali e a organização aproveita-se disso para se

“Marcus Gronholm voou”

O título expressa bem o que sucedeu ao sueco Marcus Gronholm, que protagonizou o “mais aparatoso” dos acidentes que aconteceram no rali. Em Folques/Lomba, depois de sair de Viseu “esperançado em anular os 54 segundos que o separavam de [Bruno] Thiry [sexto classificado na altura], o Toyota Celica Turbo 4WD da Scuderia Griffone, “passou a tomada de tempo muito depressa e, com o piso escorregadio, [Gronholm] nunca mais conseguiu controlar o carro, acabando por derrubar um pinheiro.”

No seu percurso [“cambalhota”, como definiu o acidente o AutoSport), o Toyota “ainda tocou em dois espetadores, ferindo-os sem gravidade.” Em jeito de conclusão, referiu-se que “para o aparato do despiste, as consequências foram mínimas.” Claro: Gronholm desistiu!

Clio Maxi bateram na mesma pedra!

OsdoisClio Maxi da Renault portuguesa viveram uma total odisseia nesta edição do Rali de Portugal. Primeiro, “foi uma aventura para conseguirem terminar os carros a tempo de se apresentarem nas verificações técnicas”. Depois, vierama desistir exatamente no mesmo sítio e pelo mesmo motivo: “uma pedra que partiu o cárter” segundo confirmou então,aoAutoSport, Moisés Martins, o responsável técnico da equipa Renault Gest/Galp.

Público atirou pedras aos carros em Viseu

No balanço feito ao comportamento do público, o AutoSport referiu que “das 31 provas especiais de classificação disputadas neste TAP/Rali de Portugal, só no troço de Viseu, no último dia da segunda etapa, se registaram problemas cm o público. A coberto da noite, fazendo apelo a uma injustificada cobardia, não faltou quem, inexplicavelmente, se desse ao trabalho e paciência de palmilhar alguns quilómetros debaixo e um frio de rachar (…) só para, estupidamente, atirar com enormes pedregulhos aos para-brisas dos carros que iam passando.”

Entre eles, Grégoire de Mevius, “que chegou ao fim do troço com o para-bisas do Nissan partido” (..), afirmando, furioso, que “os portugueses são estúpidos! Parece que não gostam de nós!” Outras vítimas dos “desordeiros” – conforme foram qualificados pela GNR, que lamentou “ser difícil, se não impossível, resolver o problema, pois os concorrentes não nos conseguiam dizer ao certo o sítio onde estavam” – foram Jorge Recalde, Paulo Meireles, Piergiorgio Deila e António Rius, “cujo SEAT apresentava um para-brisas com um enorme buraco.”

“Alguns energúmenos – como bem afirmou César Torres – [que] uma vez mais se puseram a coberto da noite e quase estragavam a festa, atirando pedras aos concorrentes que passavam.”

No final, Viseu recebeu um “cartão amarelo”. E o AutoSport não se coibia de avisar: “Cuidado com os jogos de suspensão!” Ou seja, cuidado com o comportamento do público, ou então a FIA não iria permitir que o Rali de Portugal continuasse no calendário do Mundial, suspendendo a prova por causa do mau comportamento de alguns.

RTP, a maior equipa

Não, não foi “nem a Subaru, nem a Toyota, muito menos a Ford”, a receberem o galardão pela maior equipa presente no rali. “A equipa mais poderosa (…) era a da RTP, com um total de efetivos superior a 150 pessoas. Estas estavam distribuídas por cerca de 30 carros, dos quais cinco de exteriores, equipados com 22 câmaras, quatro equipas soltas com câmaras para reportagem, um helicóptero também equipado com câmara e três equipas de computadores para gráficos e inserção de carateres.”

Felizmente, nessa altura ainda nem sequer se sonhava que, um belo dia, iria existir uma “coisa” chamada Troika, para colocar um pouco de juízo nas cabeças pensantes da TV nacional. É que todo este aparato foi usado “para fazer cinco diretos de classificativas, mais 15 intercalares e um balanço de meia-hora emitido no sábado, ao qual se juntava ainda uma hora diária ’em bruto’ para a FOCA e unilaterais para as televisões finlandesa e espanhola (Canal Plus).”

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