Pentti Airikkala: O ‘professor’ de um ‘certo’ Jari-Matti Latvala

Por a 19 Fevereiro 2023 12:11

Nunca teve um programa completo no WRC. Poucas vezes saiu da sua terra, até se estabelecer na Grã-Bretanha, nos anos 80. É um dos menos conhecidos vencedores de uma prova do WRC. Senhoras e senhores, apresento-vos Pentti Airikkala, um ilustre desconhecido.

Pentti Airikkala, apesar da sua ilustre ausência no panteão dos grandes pilotos, não deixou, por isso, de ser um dos mais espetaculares, digno dos melhores finlandeses voadores. As suas façanhas com o pesado Vauxhall Chevette 2300 HS ainda hoje são lembradas – bem como a sua desfaçatez e a sua grande capacidade de “endrominar” quem tinha o azar (ou a sorte…) de cair nas suas boas graças.

Por isso, mais pelas suas histórias, do que pela sua presença na História do WRC, este finlandês que um belo dia se devotou ao ensino (de ralis, pois claro!) e aos campos britânicos, é um marco bem vivo, 14 anos passados da sua morte, vítima de complicações renais após uma queda, numa altura em que já lutava contra um cancro, aos 64 anos.

Ou Mil Lagos… ou RAC

Pentti Airikkala começou nestas andanças dos ralis aos 20 anos, com um Volvo PV544 Sport. Adivinha onde? Pois claro: nos 1000 Lagos, a prova que ele mais vezes disputou – até 1984, ano em que já estava de armas e bagagens com os olhos em Inglaterra, fez o rali do seu coração nada mais que 17 vezes. Em 1990, fê-la pela 18ª vez. Nunca a venceu –os seus melhores resultados foram o 2º lugar em 1976, o 3º em 1978 e 1982 e o 5º em 1981 e 1983.

Na verdade, durante muitos anos, as suas aparições no WRC eram apenas em duas provas, por ano – ou os Mil Lagos, ou o RAC. Depois, a partir de 1985, foi apenas no RAC. E, em 1990, lá limpou com mais vigor o pó ao capacete, fazendo três provas do WRC. Então, 13 anos de paragem, antes da despedida final, no seu querido RAC, pois claro, em 2003. Foi o 37º rali da sua carreira no WRC, onde, embora tenha ficado mais conhecido pelas suas proezas com os carros de tração atrás, foi naqueles que tinham tração total que conseguiu alguns dos seus melhores resultados. Nomeadamente, a sua única vitória, no RAC, em 1989. Tinha então 44 anos e tornou-se o terceiro piloto mais velho a ganhar uma prova do campeonato, atrás somente de Hannu Mikkola e Björn Waldegaard.

Foi por essa altura que Airikkala adotou a pacata vilazinha de Bray, nas margens do Tamisa, como casa. Aí, construiu uma… casa, que tinha um jardim que terminava mesmo nas águas do rio; e, num cais, lá estava o seu barco clássico, ao qual dedicava muitas das suas horas livres. Na realidade, Airikkala depressa se tornou figura de proa nas corridas de barcos locais.

Muitos anos depois de já estar a viver em Inglaterra, Airikkala, que nunca renegou a sua nacionalidade, assumindo-se com um finlandês de gema, ainda dizia alto e bom som, para quem o queria (e não queria…) ouvir: “Onde está um finlandês, lá está um tubarão!” [“where there’s a Finn, there’s a Shark!”]. Para bom entendedor…

O contador de anedotas… ou talvez não

Pentti Airikkala era uma figura carismática, ao pé da qual ninguém ficava indiferente. Dele, são muitas as histórias, com “h” e com “e” – a tal palavra que não existe, mas que tantos insistem em tomá-la como significado de anedota, ou historieta de polichinelo. Muitas delas, nunca alguém as confirmou e, seja como for, não foi por isso que ainda hoje são recordadas.

Alguma vez ouviu dizer que os espectadores podiam ficar sem os dedos, se os metessem dentro das entradas de ar dos Peugeot 205 Turbo 16? Pois o bom do Pentti garantia que sim, eles iriam ficar sem as cabeças dos dedos se fizessem isso!

Sabia que, um belo dia, o Hannu Mikkola garantiu ao Pentti que, se a Audi lhe pagasse para isso, ele até o trator da quinta era capaz de pilotar? Pois, nós também não… e também não sabemos se ele disse isso alguma vez!

Em 1987, Pentti Airikkala foi à primeira prova do campeonato de ralis do Canadá, que se chamava Rocky Mountain rally e tinha lugar na longínqua Pincher Creek, em Alberta. Um canadiana meio maluco teve uma ideia: convidar o bom do Pentti para ir até uma escola da região e divertir os “putos” e respetivos paizinhos… mas com os seus próprios carros e eles sentados ao lado! Tudo correu bem, até que a certa altura as coisas correram… mal, e um Mazda RX3 ficou que nem o chapéu de um pobre. Porquê? Pois tinha rebentado um pneu e o carro desatara a capotar… Muito polidamente, Pentti pediu desculpas e, mais tarde, o dono do carro explicou como as coisas se tinham passado e de como tinha sido uma… honra, mesmo que isso tivesse representado o funeral do Mazda: “Ele, simplesmente, estava a conduzir duas mudanças acima daquilo que eu alguma teria conseguido fazer, em todo o lado e sempre a escorregar, em todo o lado também!”

Nos seus tempos do Vauxhall Chevette 2300 HS, ele andava por Helsínquia, a capital do país, com um Mercedes 190. Até aqui, nada de mal – só que, lá atrás, brilhava uma placazinha prateada, que dizia o seguinte: “O que separa os homens dos rapazes é o tamanho do seu brinquedo”. [“You can tell the men from the boys by the size of their toys”] Pois!

Mas talvez que as histórias mais badaladas sobre Airikkala sejam aquelas em que ela fala ardentemente de um (nunca visto, nunca levado a sério) projeto de um Grupo B chamado… Pepsi-Yamaha. Sabe o que era isso? Não? Nós também não…

O professor e o seu melhor aluno

Quanto se retirou a tempo inteiro dos ralis, Pentti Airikkala dedicou-se à sua escola de pilotagem, que criou no Oxfordshire e onde principalmente ensinou a técnica de travagem com o pé esquerdo. Entre os seus alunos mais famosos, contaram-se Colin McRae e Richard Burns, ambos mais tarde campeões do Mundo de Ralis.

Porém, poucos anos antes da sua morte, Airikkala apostou num miúdo imberbe nos seus 17 anos: Jari-Matti Latvala – que, em 2002, se estreou no RAC, ao volante de um Mitsubishi Lancer Evo VI, o mesmo que, um ano mais tarde, encerrou a carreira do “Mestre”, numa altura em que a sua saúde estava já em declínio.

Mas, regressando a 2002, Latvala acabou a prova em 17º e 1º entre os Mitsubishi. O “Mestre” ficou algo desalentado com o resultado do seu protegido, garantindo então que acreditava num lugar dentro do “top ten”! Porém, isso não o impediu de ensinar ao jovem lobo tudo aquilo que sabia – e, anos mais tarde, o seu orgulho era enorme pela progressão de Jari-.Matti, que ele considerava como um filho dileto, quiçá um dos poucos que acreditava nos seus métodos sem hesitar e que não o considerava um lunático… em especial quando se tratava de escolher as afinações para um carro ralis, onde as suas opções eram por vezes demasiado radicais… mas funcionais!

PENTTI AIRIKKALA

Nome: Pentti Airikkala

Nascimento: 4 de setembro de 1945 (Helsinkki)

Falecimento: 30 de setembro de 2009 (Bray, Berkshire, UK)

Nacionalidade: Finlandesa

Estreia na competição: 1965 (Volvo PV544 Sport)

Primeiro rali no WRC: Rali dos Mil Lagos 1973

Último rali no WRC: Rali da Grã-Bretanha 2003

Ralis do WRC: 37

Vitórias no WRC: 1

Primeira vitória no WRC: RAC 1989

Última vitória no WRC: RAC 1989

Pódios no WRC: 6

Classificativas ganhas no WRC: 147

Pontos no WRC: 102

Marcas no WRC: Opel (1973);Vauxhall (1974-80/1985-86); Ford (1974/76/80/81/90); Toyota (1977); Mitsubishi (1982/88/2003); Lancia (1983/88); Nissan (1984); Opel (1987)

PALMARÉS

WRC (1973-90/2003)

1973 – 1 Rali (Opel Kadett Rallye) () 1974 – 2 Ralis (Vauxhall Magnum Coupé/Ford Escort RS 1600 Mk I) ()

1975 – 2 Ralis (Vauxhall Magnum Coupé) () 1976 – 2 Ralis (Ford Escort RS 1800 Mk II); 2º Mil Lagos ()

1977 – 3 Ralis (Toyota Celica 2000 GT/Vauxhall Chevette 2300 HS). (*)

1978 – 3 Ralis (Vauxhall Chevette 2300 HS). 3º Mil Lagos; 9º CM (10 pontos)

1979 – 4 Ralis (Vauxhall Chevette 2300 HS). 3º Suécia, 7º RAC. 15º CM (16 pontos)

1980 – 4 Ralis (Vauxhall Chevette 2300 HSR/Ford Escort RS 1800 Mk II). 6º Suécia. 36º CM (6 pontos)

1981 – 3 Ralis (Ford Escort RS 1800 Mk II). 3º Suécia, 5º Mil Lagos, 4º RAC. 9º CM (30 pontos)

1982 – 2 Ralis (Mitsubishi Lancer Turbo). 3º Mil Lagos. 15º CM (12 pontos)

1983 – 1 Rali (Lancia 037 Rally). 5º Mil Lagos. 21º CM (8 pontos)

1984 – 1 Rali (Nissan 240 RS). Não pontuou

1985 – 1 Rali (Vauxhall Astra GT/E). Não pontuou

1986 – 1 Rali (Vauxhall Astra GT/E). Não pontuou

1987 – 1 Rali (Opel Kadett GSI). Não pontuou

1988 – 1 Rali (Lancia Delta Integrale). 4º RAC. 30º CM (10 pontos)

1989 – 1 Rali (Mitsubishi Galant VR-4). 1 vitória (RAC). 14º CM (20 pontos)

1990 – 3 Ralis (Ford Sierra RS Cosworth 4×4). 11º San Remo. Não pontuou

2003 – 1 Rali (Mitsubishi Lancer Evo VI). Não pontuou

(*) Ainda não havia WRC para Pilotos. Em 1978, foi instituída a Taça FIA e, em 1979, o Campeonato do Mundo de Pilotos.

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