F1, James Hunt: Champanhe e testosterona…

Por a 11 Fevereiro 2024 11:18

O seu amigo Niki Lauda considerava-o «o mais carismático piloto da F1». Rebelde e audacioso, James Hunt terminava as corridas com uma cerveja na mão, um cigarro na outra e uma beldade por perto

Como é que um homem que tremia que nem varas verdes na grelha de partida e por vezes vomitava antes das provas se transfigurava em pista num autêntico gladiador, incapaz de ceder ao medo que o assaltava sempre que se sentava num carro de corridas? James Hunt foi um desses casos raros que deixou uma marca na F1, não tanto pelo talento natural, mas pela bravura e, por vezes, a loucura, que empregava na condução.

Para este “beto” rebelde, produto de colégio fino inglês, a adrenalina e a testosterona eram o seu doping em pista, da mesma forma que a motor-home da Marlboro. Rodeado de belas manequins, fumando dois maços de tabaco (e não só) por dia e bebendo champanhe e cerveja a rodos, este era o seu “habitat” natural.

Sorte e audácia

A sorte sorri aos audazes e James Hunt, um audacioso por natureza, foi bafejado pela sorte, que o levou ao título de campeão do Mundo de F1. Em primeiro lugar, o irascível britânico dificilmente teria passado das fórmulas menores, se não fosse ter encontrado emLord Hesketh a sua alma gémea, que lhe deu os meios para ascender à F1. Depois, teve a sorte de ver Emerson Fittipaldi deixar um lugar vago na McLaren em 1976, para correr na sua própria escuderia, a Copersucar. Uma oportunidade que, como habitualmente, agarrou com ambas as mãos, relegando para plano secundário o companheiro de equipa Jochen Mass e lutando pelo título com o seu velho amigo dos tempos da F2, com quem chegou a partilhar um apartamento, o austríaco da Ferrari, Niki Lauda. Ainda assim, dificilmente o britânico teria sido campeão do Mundo nesse ano, se Lauda não sofresse aquele terrível acidente em Nurburgring, que o afastou das pistas durante algumas corridas e o debilitou para o resto da temporada. O epílogo dessa época foi no último GP, em Fuji. Lauda partia para a corrida em vantagem pontual, mas o dilúvio que se abateu sobre Monte Fuji levou o piloto austríaco a abandonar a prova ao fim de duas voltas, alegando motivos de segurança.

Apesar de ter equacionado não alinhar na prova, James Hunt sentou-se ao volante do seu McLaren M23 e guiou, como um cão danado. Batalhou até ao terceiro lugar final, que lhe garantiu os pontos necessários para se sagrar campeão do Mundo de F1, como aliás havia prometido a si mesmo quando, com 18 anos, viu em Silverstone a sua primeira corrida.

La dolce vita

Apesar da oposição familiar, o menino de colégio inglês começou cedo a lutar pelo sonho, gastando todo o dinheiro que amealhava nos seus empregos em part-time para equipar o seu Mini de corridas, que no entanto não foi aceite na primeira prova em que se inscreveu, porque a “bacquet” era um cadeirão da sala. Seguiram-se as fórmulas de iniciação, onde o inglês granjeou a reputação de “Hunt the Shunt”, ou seja “O Cambalhotas”, de tão aparatosos eram os acidentes em que se envolvia com a mesma frequência com que aparecia com mulheres bonitas no paddock.

Raramente os seus acidentes deixavam sequelas físicas, mesmo aquele em que aterrou num lago com o seu Fórmula Ford e só não se afogou porque não tinha dinheiro para os cintos de segurança. Dado o seu carácter temperamental e tendência para causar carambolas, James Hunt estaria provavelmente condenado a penar na F2, não fosse o seu feliz encontro com Lord Hesketh, que cedo o elegeu como “golden boy” e apadrinhou a sua carreira, primeiro na Fórmula 3 e na F2, onde a Hesketh Racing ganhou reputação de consumir mais champanhe do que gasolina e de ter mais mulheres bonitas do que mecânicos no paddock e, depois, em 1973, com a entrada em cena na F1, palco por excelência para o ego extravagante de Lord Hesketh e para o seu émulo em pista, James Hunt. Depois de duas épocas na Hesketh, o bom do Lord decidiu que já não podia sustentar a mais glamourosa e “louca” escuderia da história da F1, deixando Hunt livre para ingressar na McLaren. Somando seis vitórias nessa época, graças ao bom chassis e ao seu estilo “raivoso” de condução, Hunt atingiu o seu objectivo, para iniciar então uma curva descendente na carreira.

Em 1977 e 1978, o McLaren esteve longe de ser competitivo e o piloto longe de estar motivado. Com a entrada em cena da tecnologia “efeito de solo”, o britânico considerou que o papel da pilotagem estava reduzido, e fez em 1979 algumas corridas com a Wolf, para abandonar a competição por razões de “auto-preservação”. Foi ainda corrosivo comentador da BBC com Murray Walker, e depois retirou-se de cena. Em 1993, antes do casamento com Helen, uma loura com metade da sua idade, James Hunt foi vítima de um ataque cardíaco com 46 anos, pagando o preço precoce de uma vida de excessos. Para a história fica o temerário piloto que passeava descalço e em tronco nú no paddock, com uma cerveja na mão e um cigarro na outra.

Lord Hesketh

Lord Thomas Alexander Fermor-Hesketh, terceiro Barão de Hesketh, foi o “mecenas” que conduziu James Hunt à F1. Só um aristocrata tão pouco convencional como Lord Hesketh podia patrocinar um rebelde “cool” como James Hunt e montar uma das mais glamourosas e românticas aventuras da F1 da década de 70. Com apenas 21 anos, Hesketh recebe uma faustosa herança, que rapidamente começa a desbaratar no desporto motorizado. Em conjunto com o seu amigo Anthony Horseley monta a Hesketh Racing Team, iniciando a aventura com um Surtees F2 e convidando James Hunt, que Hesketh chamava de “superstar”, para uma co-produção ao melhor estilo de Hollywood. Como as fórmulas menores não eram suficientes para galvanizar Hesketh, rapidamente migram para a F1, onde se estreiam com um March “adaptado” por Harvey Postlethwaite, que desenharia para 1974 o Hesketh 308. Apesar de ser olhada com desconfiança e desprezo pela elite da F1 da época, a equipa conquista notoriedade no paddock, com as beldades e festas no iate de Hesketh, as “rezas” dos mecânicos à grande “galinha do céu”, para favorecer a sorte de Hunt, ou com um consumo de champanhe superior ao de gasolina.

Em pista, a fibra de Hunt e a eficácia do chassis projectado por Postlethwaite permitiram granjear respeito, logo com dois pódios em 1973, mais três em 1974 e uma vitória em 1975, no GP da Holanda. Depois de ver o seu “superstar” migrar para a McLaren em 1976, Hesketh vendeu a sua equipa ao petro-milionário canadiano Walter Wolf, sócio de Frank Williams. Hesketh dedicou-se então a salvar o que restava da fortuna da família e envolveu-se mais tarde na política, chegando a integrar o Governo conservador de Margaret Thatcher.

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1 Comentário
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Scirocco
Scirocco
1 ano atrás

Está algures a beber uma cerveja com o Niki.

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