Haas F1: O SONHO AMERICANO

Por a 5 Fevereiro 2020 15:57

Por José Manuel Costa

Alguém disse um dia: “para se ganhar uma pequena fortuna nas corridas, temos de gastar uma enorme fortuna”. E Eugene “Gene” Haas é um homem que sabe muito bem disso. Esteve na Nascar a solo, desde 2002, e depois juntou-se a Tony Stewart, em 2008, e o sucesso foi imediato. Mas o homem que se tornou bilionário com máquinas únicas, sonhava com a Formula 1

Ganhar milhares de milhões de dólares com máquinas sofisticadas dedicadas à produção de peças especificas, é parte da história de Eugene “Gene” Haas, nascido no dia 12 de novembro de 1952 em Ohio, diplomado em ciências, finanças e gestão e dono da Haas Automation. Viu um dos seus sócios (Abel Bugarin) perder muito tempo a posicionar, manualmente, um indexador e decidiu inventar uma máquina que fizesse o mesmo trabalho de forma muito mais rápida. Patenteada a invenção, nascia a Haas Automation, hoje o maior fabricante de máquinas CNC e ferramentas dos EUA, e um dos maiores do mundo, com um volume de vendas de vários milhares de milhões de dólares. Passou maus momentos, como o sucedido em 2006, quando foi preso por evasão fiscal e falsificação de declarações fiscais. Foi julgado e chegou a acordo, esteve dois anos de pena suspensa e pagou 75 milhões de dólares ao IRS americano.

A sua paixão pelo desporto automóvel empurrou-o para a Nascar, comprando as instalações da Hendrick Motorsport em Concord, Carolina do Norte, o “Silicon Valey” das corridas de “stock cars” nos Estados Unidos da América. O primeiro piloto na Cup Series, a divisão principal da Nascar, foi Jack Sprague, começou a fazer o campeonato a tempo inteiro em 2003, mas até 2008 a média de finalização da equipa não ia além do 27º lugar. A associação a Tony Stewart – numa primeira fase Gene Haas pagava a equipa toda e entregou 50% do capital a Stewart como pagamento pelos seus serviços como piloto – foi decisiva e acabou com o título de Tony Stewart em 2011.

Mas, Gene Haas queria mais, muito mais, e depois de ver muitos projetos norte americanos não serem bem-sucedidos – nomeadamente US F1 e a Haas Lola F1 de Carl Haas e Teddy Mayer, sendo que Carl Haas não tem nada a ver com Gene Haas – decidiu pegar na “stars & strips” e afirmar os Estados Unidos da América no pináculo da competição automóvel.

A CONSTRUÇÃO DA EQUIPA

Gene Haas aproveitou o colapso da Marussia F1 e comprou as instalações da equipa de Banbury e algum do seu material, tentando o americano rodear-se dos melhores para poupar tempo. Encomendou à Dallara o chassis e estabeleceu com a Ferrari um acordo técnico para receber as mecânicas. De recordar que a Haas nasceu sob um modelo de equipa “low cost” que a FIA quis implementar em 2015, sem sucesso.

E a cereja no topo do bolo foi a escolha de um italiano para diretor geral da equipa. Sim, Guenther Steiner é italiano (nasceu a 7 de abril em 1965 em Merano, Itália), nunca acabou o curso de engenharia e depois de ser mecânico na equipa Mazda Rally Team Europe, no Mundial de Ralis entre 1986 e 1988, esteve na equipa Top Run de ralis entre 1989 e 1990, foi responsável pelos reconhecimentos e, mais tarde, responsável técnico da equipa Jolly Club entre 1991 e 1996.

Passou pelo Europeu de Ralis com a Prodrive e chegou à M-Sport como gestor de projeto, chegando a diretor de engenharia da equipa de Malcolm Wilson em 2000, trabalhando com pilotos como Colin McRae e Carlos Sainz na Ford World Rally Team. Chegou à Fórmula 1 pela porta da Jaguar e pela mão de Niki Lauda, como responsável pelo lado administrativo do departamento de engenharia.

Os maus resultados forçaram a sua saída da Jaguar, estando um ano parado até tomar o lugar de Wiet Huidekoper como diretor técnico do Opel Performance Center, no final de 2003.

A compra da Jaguar por parte da Red Bull trouxe Guenther Steiner de regresso a Milton Keynes, aproveitando o abandono do DTM por parte da Opel no final de 2005. Quando Adrian Newey entrou na Red Bull, o espaço de Steiner desapareceu e Dieter Mateschitz, o dono da Red Bull, “desviou” o italiano para os Estados Unidos da América para construir uma equipa para a Nascar.

Steiner falou com a esposa e foi para Mooresville, Carolina do Norte, onde foi o responsável técnico da Red Bull Toyota na Nascar entre abril de 2006 de abril de 2008. Acabou por abandonar a marca de bebidas energéticas, mas manteve-se nos EUA, esteve remotamente ligado à grande farsa chamada US F1 e acabou nos braços de Gene Haas e de Joe Custer (pai de Cole Custer, piloto da Stewart Haas na Cup Series da Nascar), encarregue de construir uma equipa de Fórmula 1, entrevistando cada elemento recrutado e estando nas negociações com a Ferrari e com a Dallara. O italiano conseguiu erigir a primeira equipa americana a competir na F1 em 30 anos, sendo uma das personagens do paddock da Fórmula 1 ao aplicar a típica forma de estar italiana à descontração tipicamente norte-americana.

QUINTA SERÁ DE VEZ?

A temporada de 2020 será a quinta época da Haas F1 Team, o sonho de Gene Haas, um trajeto que tem conhecido mais baixos que altos, com a temporada de 2019 a ficar no curto registo da equipa como a pior de sempre. Recordamos que a Haas F1 Team estreou-se no GP da Austrália de 2016, já cumpriu 86 corridas (a equipa não participou em duas provas, GP de Singapura e GP do Brasil com Romain Grosjean), tendo desde sempre como piloto o francês Romain Grosjean, apesar das já célebres fúrias de Guenther Steiner. Por lá já passaram Esteban Gutierrez (na época quando era protegido da Ferrari) e Kevin Magnussen. A forte ligação à Ferrari levou a Haas, nos treinos livres, a dar oportunidades a Antonio Giovinazzi e Charles Leclerc.

O palmarés da equipa é muito pobre nestes quatro anos, apenas duas voltas mais rápidas (ambas no GP de Singapura, em 2018 e 2019 e ambas por Kevin Magnussen). Contas feitas, a Haas F1 Team obteve 197 pontos, disputou 8.642 voltas e 43.511 km de prova. A melhor classificação de sempre no Mundial de Construtores foi o 5º lugar em 2018 e no Mundial de Pilotos o 9º lugar de Kevin Magnussen no mesmo ano. A melhor posição na grelha de partida foi o 5º lugar (por 7 vezes), em corrida ficou em 4º lugar uma única vez (GP Áustria de 2018 com Romain Grosjean).

Claramente, o ano de 2018 foi o melhor da Haas F1 Team, ficando perto de ser a melhor equipa das “outras” atrás da Renault e com exibições convincentes.

Quando se esperava que 2019 fosse o ano de “explosão” da equipa norte-americana, tudo aconteceu ao contrário!

Encontrado um novo patrocinador, necessário para aliviar o constante investimento de Gene Haas na equipa, tudo parecia risonho. A decoração do carro recuperava cores míticas como o preto e dourado, com a Rich Energy a entrar num acordo com a Haas para um contrato multianual. Os testes de Barcelona até correram bem e apesar de Guenther Steiner reclamar com várias situações, acabou por ser premonitório: “O que é que estamos aqui a fazer com este frio que só vamos encontrar, talvez, em Spa?”

O VF-19 revelou-se um carro mal nascido – andava depressa nos treinos, nas corridas afundava-se incapaz de gerir os pneus – e a Haas conheceu muitos problemas ao longo da temporada, ficando Steiner à beira de um ataque de Kevin Magnussen foi sexto com o Haas no GP da Austrália, mas esse foi o melhor resultado do ano, pois a partir daí os resultados pioraram muito nervos com a falta de competitividade e, ainda, as guerras pessoais entre Grosjean e Magnussen. O 6º lugar de Magnussen na Austrália foi o melhor de 2019.

Para piorar tudo, fora das pistas o acordo entre a equipa e a Rich Energy mostrou ser uma enorme patranha e terreno movediço. No mês de julho, antes do GP da Grã Bretanha, a Rich Energy lançou na rede social Twitter o fim do acordo de patrocínio à Haas, alegando fracas performances. A Haas e a gestão da Rich Energy negaram a publicação – que se soube depois que era uma vingança pessoal do ex-proprietário da empresa –, mas como o que nasceu torto, tarde ou nunca se endireita, a ligação acabou mesmo quando a empresa de bebidas energéticas se envolveu em processos legais, nomeadamente, o plágio do logótipo. Tudo acabou em setembro depois do GP de Itália.

Contas feitas, 2019 foi o pior ano da Haas F1 Team e quando se aguardava uma decisão mais radical por parte da equipa, eis que Guenther Steiner anuncia a mesma dupla de pilotos para 2020. Desta feita com o carro a regressar às cores tradicionais vistas em 2018, ou seja, será cinzento com destaques vermelhos e brancos, tentando colocar para trás das costas o ano passado. Mas terá, também, de ser um carro muito melhor que o de 2019. Acredita-se que todos na equipa tenham aprendido com os muitos erros cometidos o ano passado.

Mas Guenther Steiner também tem de melhorar, errar menos, irritar-se menos e ser mais clarividente nas suas decisões. Os engenheiros terão de encontrar mais força descendente no chassis do VF-20, resolvendo imediatamente os problemas com a gestão dos pneus, o enorme problema da Haas em 2019. Tudo isto terá de acontecer já nos testes de Barcelona, pois a Haas não pode voltar a ficar na penúltima posição entre as equipas, apenas na frente da medíocre Williams. Apesar dos bolsos muito fundos de Gene Haas, estar nesta posição não é o desejo do americano. Sabe que a competição automóvel obriga a alguma ponderação e paciência, muito mais na Fórmula 1. Se é verdade que alguns dizem que a época de 2018 foi a melhor porque tinham um carro que era a cópia do Ferrari, está nas mãos da equipa liderada por Guenther Steiner provar o contrário. E provar a Gene Haas que o investimento acabará por oferecer resultados que, no caso da Haas F1 Team, é ser o melhor dos outros, ou seja, o quarto lugar.

O futuro da equipa não estará, para já, em risco, até porque em 2021 entra em vigor o teto orçamental, o mesmo que em 2015 esteve na génese do projeto Haas F1 Team e que acabou por nunca ser imposto. Gene Haas acredita que esta nova regulamentação pode ser uma vantagem para a equipa e, por isso, os próximos anos estarão, quase de certeza, garantidos. Mas Steiner e a sua equipa terão de fazer muito mais em 2020 para que o americano recupere, pelo menos, o sorriso e mantenha o investimento para o futuro.

Subscribe
Notify of
0 Comentários
Inline Feedbacks
View all comments
últimas Autosport Exclusivo
últimas Autosport
autosport-exclusivo
últimas Automais
autosport-exclusivo
Ativar notificações? Sim Não, obrigado