Fórmula 1: Será que o teto orçamental resolve desequilíbrio?

Por a 26 Setembro 2018 17:10

Numa altura em que se fala da crescente diferença entre o primeiro (Mercedes, Ferrari, Red Bull) e o segundo pelotão (Renault, Haas/Ferrari, McLaren/Renault e Force India/Mercedes), fomos tentar perceber qual tem sido a tendência dos últimos anos. Fará sentido a Liberty Media ‘travar’ os orçamentos ou mesmo diminui-los drasticamente?

Guenther Steiner, diretor de equipa da Haas, é de opinião que um teto orçamental teria mais impacto, para que as equipas mais pequenas pudessem competir com as três principais equipas da Fórmula 1: “A diferença só pode ser superada com um teto orçamental pois seja qual for o design, as equipas com mais recursos e dinheiro podem trabalhar mais e melhor”. A verdade é que essa diferença sempre existiu. Provavelmente o que aconteceu hoje é que esta é cada vez maior…

Desde o início da “Era turbohíbrida”, em 2014, que se tem vindo a verificar na prática duas divisões no plantel – “As Três Grandes” e o “Segundo Pelotão”, tendo a diferença entre as duas vindo a ser exacerbada.

Quando um novo regulamento entra em vigor é normal que o fosso entre as equipas mais bem apoiadas e as que exibem maiores constrangimentos económicos aumente e, depois de em 2013 – a derradeira temporada com os antigos motores atmosféricos munidos de KERS – termos verificado uma diferença curtíssima entre o tempo da pole-position e o melhor tempo do líder das equipas do segundo pelotão – ao longo do ano a média da diferença foi de apenas 100,878%, sendo 100% a média das marcas das pole-positions – na temporada seguinte, com o arranque das unidades de potência V6 turbohíbridas, o mesmo coeficiente subiu para os 101,079%. Ou seja, cavou-se o fosso…

Apesar do incremento de mais de 0,2 pontos percentuais, ainda nesse ano a Williams, que então já não podia ser considerada uma equipa de topo, conseguiu imiscuir-se na luta entre as “Três Grandes” – Mercedes, Red Bull e Ferrari – e muito embora não tenha conseguido qualquer vitória – esse feito foi monopolizado pela Mercedes e pela Red Bull – garantiu uma pole-position e era consistentemente uma contendora ao pódio, beneficiando da potência dos propulsores da Mercedes para se impor perante a Ferrari e a Red Bull, ambas com problemas nos respetivos V6 turbohíbridos.

A equipa de Frank Williams chegou mesmo a embaraçar a equipa italiana, garantindo o terceiro posto do Campeonato de Construtores a apenas oitenta e cinco pontos da formação de Milton Keynes, ao passo que a Mercedes era inalcançável até para a suas opositoras diretas.

Se por um lado, os resultados da formação e Grove foram beneficiados pelos problemas da “Scuderia” e da equipa e Milton Keynes, por outro, realizou um bom trabalho, aproveitando a unidade de potência do construtor alemão para criar um carro competitivo e fiável.

Mas se a Williams dava um salto relativamente às suas performances dos anos anteriores, a McLaren, que até 2013 inclusive, poderia ser considerada uma das grandes, deu um tombo assinalável, terminando num desapontante quinto lugar o Campeonato de Construtores de 2014.

A fraca prestação da equipa de Woking foi determinante para que o fosso entre as grandes e as restantes aumentasse em 2014, mas daí para a frente a protagonista foi outra.

Contudo, sem a força de outrora, a estrutura de Grove foi caindo ao longo dos anos, ainda que em 2015 tenha beneficiado dos problemas de fiabilidade das unidades de potência da Renault para manter o terceiro lugar, mas desta feita a frente da Red Bull, tendo também sido responsável pelo alargamento do fosso entre as “Três Grandes” e o segundo pelotão.

Muito embora sem o apoio financeiro a que o trio da frente tem acesso, a Williams poderia e deveria ter aproveitado a base de trabalho realizada em 2014 e 2015 para criar uma dinâmica de crescimento que lhe permitisse regressar ao grupo das grandes equipas, lugar que perdeu em meados da década passada. Isto acabou por não acontecer e em 2016 deu um tombo de terceiro lugar no Campeonato de Construtores para quinto, sendo batida pela Force India, passando a esta o testemunho de liderar o segundo pelotão atrás dos “Três Grandes” que cada vez se tornavam maiores.

A então equipa de Vijay Mallya com um budget honesto – que rondava os cento e cinquenta milhões de euros – mostrou ser capaz de fazer muito com pouco, mas dificilmente poderia conseguir reduzir a diferença que a separava das forças dominantes, dado os mais de trezentos milhões de euros que a separava dos orçamentos de Mercedes, Ferrari e Red Bull.

A enorme capacidade financeira das “Três Grandes” exprime-se numa maior força de trabalho, o que lhes permite explorar muito mais possibilidades que as equipas mais pequenas, que têm de escolher um conceito e esperar que seja o correto.

Imagine que está a caminhar para a praia com mais três amigos sem conhecer o caminho – sem recorrer a GPS, claro – e se deparam com uma rotunda com quatro saídas. Se cada um seguir por um dos caminhos, haverá um que vai acertar. Se for sozinho, terá de apostar numa das opções e esperar que esteja certo. Caso não encontre o caminho terá de voltar para trás e experimentar todas as saídas até acertar. É esta a diferença entre as equipas mais fortes e as menos desafogadas financeiramente, o que contribuiu decisivamente para o crescimento da diferença entre as “Três Grandes” e as restantes, que se cifou em 101,547% e 101,859% em 2016 e 2017, respetivamente, o reinado da Force India.

Acresce que, com a introdução de um novo regulamento técnico ao nível dos chassis em 2017 contribuiu ainda mais para o alargamento da diferença entre os dois grupos. Face ao quadro esperado para 2018, seria difícil que a Force India se mantivesse no topo do segundo pelotão.

Por um lado, a McLaren terminava a sua relação com a Honda, que a votou ao fundo das grelhas de partida ao longo de três temporadas. Por outro, o investimento que a Renault tem realizado desde 2016 em Enstone começaria a verificar-se em pista, tendo como objetivo assumir-se como a líder do segundo pelotão e incomodar as “Três Grandes”.

A equipa de Woking foi um deceção, ficando claro logo ao fim de algumas corridas que dificilmente estaria no grupo das primeiras do segundo pelotão, ao passo que a Renault, muito embora se mostre capaz de liderar pontualmente a perseguição à Mercedes, Ferrari e Red Bull, não deu o salto competitivo que desejava.

Até ao Grande Prémio de Itália, inclusive, a diferença entre os dois grupos diminui ligeiramente – 101,791% – relativamente a 2017, mas ainda assim é maior que todos os restantes anos da “Era Turbohíbrida”, o que mostra que a Renault tem ainda que trabalhar bastante para aceder ao exclusivo grupo das “Grandes”.

Na verdade, a equipa do construtor francês tem vindo a perder gás nas últimas provas e tem sido acossada pela Haas, que pretende roubar à formação de Enstone o quarto lugar que esta ainda exibe no Campeonato de Construtores.

Para além do evidente interesse suscitado pela luta entre duas equipas, existe também a curiosidade de estas duas escuderias representarem dois conceitos completamente distintos.

De um lado, temo uma equipa que constrói tudo o que coloca nos seus carros, inclusivamente as unidades de potência. Por outro, temos uma compra tudo a fornecedores – desde o chassis, à Dallara, até motores, suspensões e caixa de velocidades à Ferrari – recebendo o rótulo de “equipa-B”, neste caso da formação de Maranello.

No fundo, trata-se também de uma batalha que se verifica no paddock, com o número crescente de equipas a ficaram sobre a esfera de influência das estruturas maiores – Alfa Romeo Sauber e Haas, no caso da Ferrari, e Racing Point Force India no da Mercedes – o que desagrada à Williams e McLaren que sentem que, com esta filosofia poucas possibilidades poderão ter de regressar ao espaço que já foi seu – a cabeça do pelotão.

A filosofia da Haas tem a capacidade de competir de uma forma notável por menos de cento e cinquenta milhões de euros por ano, no entanto, isto significa a perda de identidade da Fórmula 1, que sempre teve equipas capazes de construir os seus próprios carros, e a captação da categoria pelas estruturas maiores, que passariam a ter ainda mais influência em todo o destino da disciplina, o que poderá não ser muito positivo.

Para evitar isto, a FIA e a FOM pretendem implementar um conjunto de medidas em 2021 – distribuição mais igualitária dos prémios monetários, partilha de peças e um tecto orçamental.

Atualmente existe uma discrepância profunda entre o dinheiro que as dez equipas recebem.

De um dos lados temos a Ferrari, que recebe mais de duzentos milhões de euros entre todos os itens através dos quais a FOM distribui dinheiro pelas equipas, do outro temo a Sauber que passa por pouco os cinquenta milhões.

Os homens que gerem a Fórmula 1 pretendem alterar esta situação e garantir uma distribuição mais equitativa. Segundo alguns rumores no paddock, o novo Pacto da Concórdia, que terá de ser assinado a tempo de 2021, garantirá a qualquer equipa, pelo menos, cem milhões de euros por temporada, o que só por si, na sua essência, garante a sobrevivência das estruturas, até das mais pequenas, desde que geridas de uma forma eficiente. No entanto, poderá significar uma redução nos prémios das maiores equipas, o que não será uma medida bem-vinda por estas.

Com as peças partilhadas, a FIA e a FOM pretendem que não sejam despendidas quantias astronómicas em componentes que pouco contribuem para o espetáculo e que, muitas vezes, o público não entende. Para além disso, é também uma forma de reduzir o espectro de peças que contribuem para as diferenças de performance, o que poderá permitir uma aproximação entre todas as equipas.

O teto orçamental, impedirá as diferenças abissais de budgets que se verificam atualmente, o que é decisivo para o fosso entre as “Três Grandes” e o segundo pelotão, colocando foco na eficiência a todos os níveis, o que permitirá, garantidamente, que a totalidade do plantel se aproxime.

A grande questão será perceber se as estruturas maiores estão interessadas em admitir que isto aconteça… Ninguém gosta de ver o seu bolso mexido…

 

 

Caro leitor, esta é uma mensagem importante.
Já não é mais possível o Autosport continuar a disponibilizar todos os seus artigos gratuitamente.
Para que os leitores possam contribuir para a existência e evolução da qualidade do seu site preferido, criámos o Clube Autosport com inúmeras vantagens e descontos que permitirá a cada membro aceder a todos os artigos do site Autosport e ainda recuperar (varias vezes) o custo de ser membro.
Os membros do Clube Autosport receberão um cartão de membro com validade de 1 ano, que apresentarão junto das empresas parceiras como identificação.
Lista de Vantagens:
-Acesso a todos os conteúdos no site Autosport sem ter que ver a publicidade
-Oferta de um carro telecomandado da Shell Motorsport Collection (promoção de lançamento)
-Desconto nos combustíveis Shell
-Acesso a seguros especialmente desenvolvidos pela Vitorinos seguros a preços imbatíveis
-Descontos em oficinas, lojas e serviços auto
-Acesso exclusivo a eventos especialmente organizados para membros
Saiba mais AQUI
Subscribe
Notify of
2 Comentários
Inline Feedbacks
View all comments
últimas FÓRMULA 1
últimas Autosport
formula1
últimas Automais
formula1
Ativar notificações? Sim Não, obrigado