Fórmula 1: Quando os líderes erram…

Por a 26 Agosto 2022 12:02

Um dos exemplos mais recentes que nos vem à memória é a saída de pista de Sébastian Vettel, no GP da Alemanha de F1 de 2018, quando se preparava para vencer e posicionar-se bem no campeonato, mas ao longo da história da Fórmula 1 os exemplos de casos semelhantes são mais do que muitos. Vamos recordar alguns.

É sempre dramático e pouco abonatório para um piloto, respetivos donos de equipa e restante staff quando um piloto comete um erro e desiste, principalmente se o carro acaba “na sucata” ou se a performance está a ser boa e tudo fica estragado por um momento de distração, uma manobra mal calculada, ou um exagero de condução. Mas, pior ainda, é quando o líder da prova, sozinho na frente, se despista e arruína as prováveis chances de ganhar o Grande Prémio. Apresento aqui 10 dos casos mais conhecidos da história da modalidade.

1 – MIKA HÄKKINEN, SAN MARINO 1999

Ao contrário de 1998, em que a McLaren entrou a dominar a temporada e apenas alguns erros táticos na segunda metade da época e uma clamorosa quebra de motor em Monza arrastaram a luta entre Häkkinen e Schumacher até à última ronda do campeonato, no Japão, 1999 trouxe bem mais dores de cabeça. Para começar, Häkkinen tinha tido um acidente nos treinos e depois via a corrida estragada quando lutava pelo comando com problemas de acelerador, que o conduziam ao abandono. Depois de uma vitória no Brasil, urgia aproveitar a pole em San Marino para descolar dos Ferrari. Pois bem, Häkkinen até saiu bem e começou a construir uma boa liderança quando, no final da 17ª volta, vai largo ao limitador na entrada da reta a meta, o carro derrapa e o finlandês vai direto ao muro… Como se diz cá por estas bandas, 10 pontos à vida.

2 – FERNANDO ALONSO, CANADÁ 2005

Depois de cinco anos de domínio do binómio Schumacher/Ferrari, ocasionalmente desafiados pelos Williams e pelos McLaren, 2005 começava sob o signo da Renault e do até então mais jovem vencedor de sempre, Fernando Alonso. O espanhol, considerado à data como um dos melhores jovens pilotos do pelotão, estava em boas condições de lutar pelo título e já tinha conseguido uma boa vantagem na tabela classificativa sobre Kimi Räikkönen, que perdera o G.P. da Europa na última volta com uma quebra na suspensão. E, em Montreal, os Renault cedo estabeleceram o seu domínio, com Fisichella na frente de Alonso, até que o italiano perdeu a liderança e se dirigiu à boxe, para abandonar com problemas hidráulicos. Alonso via-se, assim, com uma boa vantagem quando estava decorrida metade da prova, mas, na volta 39, saiu largo da curva 4 e a traseira esbarrou no muro. Com uma suspensão danificada, não restou ao espanhol outra coisa que não entrar nas boxes para desistir. Räikkönen venceu e ganhou 10 pontos ao seu mais direto rival que, ainda assim, tinha uma vantagem segura no campeonato.

https://youtu.be/gUoSEGZryh4

3 – ALAIN PROST, MÓNACO 1982

Bem, o G.P. do Mónaco de 1982 está no top das melhores (e mais insólitas) provas da história da Fórmula 1, devido ao seu final héctico. Pois bem, quando foi dada a partida, parecia que os Renault iriam passear nas ruas do Principado, a não ser que sofressem com as habituais quebras no turbo. Arnoux liderava Prost, e este já tinha uma vantagem confortável sobre os restantes quando, na volta 15, Arnoux fez pião no segundo

S das Piscinas e deixou o carro ir abaixo…. Primeiro tiro no porta-aviões, já que o francês ficou imediatamente fora de prova. Já Prost parecia estar bastante à vontade, num dia frio e húmido, e o turbo estava a portar-se bem, o que deixava antever a terceira vitória do jovem piloto francês. Até que começou uma chuva miudinha… A brisa marítima do Mediterrâneo trouxe as nuvens e, mesmo com baixa intensidade e sem molhar a pista o suficiente para, a menos de 10 voltas do fim, se dar uma corrida às boxes, as condições de aderência estavam cada vez mais precárias. Num dos seus raros erros em 14 anos de Fórmula 1, Alain Prost não abrandou, apesar da enorme vantagem que dispunha sobre Riccardo Patrese e, na volta 74, saiu demasiado depressa da chicane do Porto – na altura, bem mais rápida e desafiante do que a gincana de

agora – derrapou e bateu nos rails, deixando o Renault muito maltratado. As últimas três voltas foram rocambolescas, e Riccardo Patrese, apesar de um erro, acabaria mesmo por carimbar a sua primeira vitória na F1… sem se aperceber que estava no comando.

4 – DAVID COULTHARD, AUSTRÁLIA 1995

Era a última ronda da época de 1995, e Michael Schumacher tinha já vencido o campeonato, depois de uma época sossegada e sem controvérsias, ao contrário de 1994, e em que a Benetton evidenciara o seu domínio e a Willams uma série de erros táticos, ajudados também por alguns erros do seu líder, Damon Hill. Por isso, o G.P. da Austrália, disputado pela última vez em Adelaide, seria uma excelente oportunidade de “limpar a imagem” de uma época de desilusões, e os Williams ocuparam a primeira linha da grelha.

Hill fez a pole, mas o jovem escocês David Coulthard largou melhor e assumiu a liderança, posicionando-se bem para conseguir a sua segunda

vitória da temporada. Pois bem, na 20ª volta, Coulthard foi dos primeiros a ser chamado para trocar de pneus, mas entrou na boxe demasiado depressa, bloqueou as rodas para travar para o apertado gancho que marcava a entrada no pitlane de Adelaide… e bateu no muro. Certamente foi um dos abandonos mais insólitos de sempre.

Numa prova atribulada de início ao fim, Damon Hill conseguiria vencer, enquanto Pedro Lamy se tornava no primeiro piloto português a pontuar na F1, levando o Minardi ao 6º lugar final.

5 – NIGEL MANSELL, MÓNACO 1984

O G.P. do Mónaco de 1984 ficou para a memória pelas excecionais exibições de Ayrton Senna e Stefan Bellof, ambos estreantes na F1, pela vitória de Alain Prost após a amostragem da bandeira vermelha antes do meio da prova devido às péssimas condições de aderência e visibilidade, e pela muita polémica entre o A.C. Mónaco e Jean-Marie Balestre, presidente da FISA. Pois bem, na verdade, o primeiro homem capaz de

desafiar Alain Prost nas condições extremamente adversas daquela corrida foi o britânico Nigel Mansell, então na Lotus, piloto esse claramente subestimado pela equipa e pelos seus pares.

No entanto, naquele dia, Mansell estava magnífico e cedo se mostrou o único capaz de acompanhar o francês da McLaren, passando-o na 11ª volta e destacando-se na liderança. No entanto, o inglês não adotou uma toada minimamente conservadora e acabou por bater na subida para o Casino durante a 16ª volta, furando dois pneus e quebrando a asa traseira, entre outros estragos, encostando mais à frente. Foi a primeira vez que Mansell esteve em claras condições de vencer, mas só conseguiria tal feito com a Williams na temporada seguinte.

https://youtu.be/n_-V4yJ5LFQ

6 – MIKA HÄKKINEN, ITÁLIA 1999

Häkkinen não estava a ter um ano fácil, mesmo se já tinha perdido a oposição do seu mais forte rival, Michael Schumacher, depois deste se despistar violentamente na 1ª volta do G.P. De Inglaterra e partir uma perna, afastando-o de grande parte da temporada. No entanto, uma série de erros táticos da McLaren, assim como a luta interna entre Häkkinen e o seu colega de equipa David Coulthard, deixavam Eddie Irvine, após três anos como fiel escudeiro de “Schumi”, a segurar o estandarte da Ferrari e a mostrar-se capaz de lutar pelo campeonato. Chegado a Monza, Häkkinen precisava urgentemente de uma vitória para se reafirmar dentro e fora da equipa, e conseguiu fazer a pole e um arranque perfeito, que lhe deram uma liderança confortável.

Parecia que o Häkkinen de 1998 estava de volta mas, surpreendentemente, na entrada da 30ª volta, Mika selecionou a mudança errada na 1º chicane, as rodas patinaram e o finlandês foi direto aos rails, terminando ali a prova. Célebre ficaram as imagens do habitualmente contido finlandês, a dar largas às suas emoções e a chorar copiosamente do lado de fora dos rails, no meio das árvores do Parque de Monza. Frentzen

venceu pela segunda vez na temporada e, com o mau resultado de todos os rivais, colocou o Jordan definitivamente na luta pelo título. Häkkinen

venceria o Campeonato de 1999, mas essa é outra história….

7 – AYRTON SENNA, MÓNACO 1988

Ayrton Senna já estava habituado a fazer história no Mónaco, e até à sua trágica morte conseguiria bater o recorde de vitórias de Graham Hill para se tornar no Príncipe do Mónaco da Fórmula 1. Naquele ano de 1988, os McLaren dominaram por completo a época, só perdendo o G.P. de Itália, e Senna conseguiu o seu primeiro título e afirmou-se, definitivamente, como um dos melhores pilotos de sempre. Os treinos do G.P. do

Mónaco foram lendários, já que o brasileiro fez uma volta demolidora, deixando o segundo classificado, o seu colega de equipa Alain Prost, a 1,4 seg. de distância. Senna afirmaria que essa volta fora de tal maneira perfeita que todas as sensações haviam desaparecido, como se corpo e máquina estivessem unidos de uma forma incrível e, finda a volta lançada, imediatamente abrandou e entrou nas boxes, não mais saindo, ciente da estranheza da sua experiência pessoal. No dia da corrida, saltou para o comando e assumiu uma liderança destacada, esmagando por completo o seu colega de equipa Alain Prost – a rivalidade entre ambos ainda não tinha chegado ao ponto crítico que levaria às colisões entre ambos no Japão em 1989 e 1990 – e parecia destinado a vencer mais uma prova quando, na volta 67, bateu sozinho em Portier. Senna abandonou o local e fechou-se no seu apartamento no Mónaco, recusando-se a falar com qualquer pessoa, até se decidir a ir ter com o staff da McLaren já de noite. O brasileiro ficou extremamente perturbado por não perceber como havia cometido tal erro infantil mas, a julgar pela análise de Prost às marcas dos pneus, o mais certo é que Ayrton tenha tocado ligeiramente nos rails no interior de Portier, saiu mais largo e foi direto aos rails exteriores, provavelmente devido a uma falha de concentração quando, perante tal avanço, a equipa o aconselhou a abrandar

ligeiramente o ritmo.

8 – MICHAEL SCHUMACHER, CANADÁ 1999

Michael Schumacher e a Ferrari aparentavam estar bem mais fortes em 1999 e capazes de lutar taco-a-taco com a McLaren, principalmente com o seu maior rival, Mika Häkkinen, a perder pontos por um conjunto de falhas mecânicas, erros pessoais e estratégicos. Schumacher chegava a Montreal na liderança do campeonato e fez a pole, rapidamente isolando-se na frente da corrida. No entanto, naquele dia, o muro de saída da chicane que leva à reta da meta fez as honras a três Campeões do Mundo… Primeiro, foi Damon Hill, na volta 15. Depois… na volta 30, foi a vez de Michael Schumacher. Num dos seus raros erros de condução, o piloto saiu mal da chicane e foi direto ao muro, entregando a liderança a Häkkinen, que dominou a segunda metade da prova e reassumiu o comando do campeonato. Pelo meio, o muro não poupou o homem da casa,

Jacques Villeneuve, que acabou da mesma forma que o seu colega de equipa Ricardo Zonta, à volta 35. Sem dúvida, o “Muro dos Campeões”!

https://youtu.be/ve2dydX_HP4

9 – JACK BRABHAM, MÓNACO 1970

1970 ficou marcado pelo título póstumo atribuído a Jochen Rindt depois de este ter falecido nos treinos do G.P. de Itália, em Monza, quando se despistou devido a uma falha mecânica no seu Lotus 72. E o título ficou garantido quando um jovem Emerson Fittipaldi, apenas com ano e meio na Europa e pilotando o terceiro Lotus oficial apenas desde o G.P. de Inglaterra, venceu nos EUA e impediu Jacky Ickx (Ferrari) de se apoderar da coroa do malogrado piloto, claramente o mais rápido ao longo da época. Bem, na verdade, Ickx só se tornou no maior rival de Rindt na segunda metade da época e, principalmente, após a sua morte, já que os Ferrari passaram a primeira metade “às aranhas” com inúmeros

problemas de fiabilidade. Na verdade, o piloto que maior pressão exerceu sobre Rindt até lá foi um tal de Jack Brabham…

Já com 44 anos e três títulos garantidos, um dos quais ao volante da sua própria equipa – feito único até hoje –, Brabham vinha de dois anos abaixo do esperado e muitos afirmavam que a idade já não perdoava. Pois, “Black Jack” encarregou-se de provar o contrário e venceu a primeira ronda, na África do Sul e, no Mónaco, cedo aproveitou as falhas dos March oficiais e da equipa de Ken Tyrrell para estabelecer uma liderança

aparentemente inalcançável. Até que Rindt, a correr com o Lotus 49C, já que ainda não confiava totalmente no inovador 72, chegou ao segundo lugar após uma boa recuperação e começou a pulverizar os tempos, ganhando segundos atrás de segundos a Brabham.

Na última volta, Rindt já estava colado a Brabham, mas era difícil ultrapassar no estreito traçado monegasco e o austríaco estava conformado quando, na entrada para a curva do Gasómetro – até 1972, as Piscinas e o restaurante La Rascasse não existiam e a última curva era um gancho apertado –, Brabham se desviou de um retardatário para Rindt não tentar surpreendê-lo na entrada da meta, saiu largo e foi direto aos fardos de palha e sacos de areia que delimitavam a última curva, entregando de bandeja a vitória ao austríaco. De todos estes casos, este foi o único em que o piloto não abandonou, já que Brabham conseguiu meter marcha-atrás e, apesar dos danos na frente do carro, cruzou a meta ainda em segundo, fruto da grande vantagem que dispunha. Brabham e Rindt estiveram próximos na tabela de pontos até o australiano perder nova vitória em Inglaterra quando o Brabham ficou sem gasolina à entrada da meta e entregou o comando e a vitória a Rindt de novo. Uma série de falhas mecânicas na segunda metade da época estragaram a última temporada de Jack Brabham na F1.

10 – SEBASTIAN VETTEL, ALEMANHA 2018(CLIQUE AQUI PARA VER O VÍDEO)

O campeonato de 2018 foi, até ao seu segundo terço, um dos mais renhidos da história, com os dois melhores pilotos do momento (excluindo Alonso, que não tinha carro para vencer) a lutarem taco-a-taco pelo título. Pela primeira vez na era turbohíbrida, parecia que a Ferrari tinha um melhor carro que a Mercedes e estava a conseguir acompanhar o habitual ritmo de desenvolvimento da equipa de Brackley. Depois de bater o seu rival em casa, Vettel chegou a Hockenheim na liderança do campeonato e mostrou a sua forma com nova pole-position. Largando na frente, enquanto Hamilton partia de 14º depois de ter problemas mecânicos na Q1, tudo indicava que o alemão poderia sair da sua ronda caseira com mais uma vitória, enquanto Hamilton fazia uma sensacional recuperação.

No entanto, previa-se chuva para a segunda metade da prova e Hamilton adiou ao máximo a troca de pneus na esperança que esta se abatesse sobre o circuito germânico. Pois bem, na volta 42 Hamilton tinha os pneus “nas lonas” e foi obrigado a entrar na boxe. Poucas voltas depois, começou a chover ligeiramente e Hamilton poderia ter a corrida perdida, mas nada previa o que aconteceria em seguida.

Na volta 52, com a chuva a intensificar-se, Vettel desconcentrou-se em pleno Stadium e saiu em frente na esquerda de Sachs.

Com pouca escapatória, o Ferrari não travou a tempo de evitar a barreira de pneus e a prova do alemão ficou por ali. Com a chuva a não ser suficiente para uma mudança de pneus, Hamilton ficou em pista e imprimiu um forte ritmo depois da saída do Safety Car (para a remoção do carro de Vettel) e conseguiu vencer, assumindo a liderança do Campeonato de Pilotos e ajudando a Mercedes a vencer nos Construtores.

A partir daqui, a Ferrari não mais conseguiu encontrar o mesmo ritmo de desenvolvimento e Vettel também pareceu algo desconcentrado e propenso a erros na segunda metade da temporada, enquanto um impecável Hamilton vencia o seu quinto título, igualando Juan Manuel Fangio.

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Pity
Pity
3 anos atrás

Resumindo: errar é humano 🙂

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