Fórmula 1: O dia em que Prost gostava que tivesse sido Senna a ganhar

Por a 3 Junho 2017 17:12

Foi hoje, há 33 anos! Há quem diga que a Ayrton Senna e Stefan Bellof foi roubada uma possível vitória no GP do Mónaco de 1984, num dia em que 31 voltas bastaram para provas que o desporto automóvel se preparava para receber no estrelato dois dos seus melhores protagonistas de sempre. Pelos motivos que vamos explicar a seguir e que muito já conhecem, não foram Senna ou Bellof a vencer, mas, ironicamente, que jeito teria dado a Prost ter somado seis pontos relativos ao segundo lugar dessa corrida…

À partida para o G.P. do Mónaco de 1984, todos se interrogavam se seria ou não possível travar a eficaz dupla Lauda/Prost e os seus magníficos McLaren MP4/2-TAG Porsche em corrida. Se em ritmo de qualificação a potência dos motores BMW e Renault permitia grelhas mais imprevisíveis, a falta de fiabilidade e o consume excessivo de gasolina (a partir de 1984 os reabastecimentos foram proibidos, o que deu origem a uma certa fórmula de consumo, que se fazia notar particularmente em certas pistas) tinham dado a primazia aos McLaren, que contava quatro vitórias em cinco possíveis, indo a restante para o Ferrari de Michele Alboreto no G.P. da Bélgica. No entanto, no sinuoso traçado monegasco Alain Prost dava à McLaren a sua primeira pole da época, numa qualificação marcada pelo violento despiste de Martin Brundle nos treinos, sendo o rookie inglês impedido de alinhar pelo Professor Sid Watkins. O seu colega de equipa e igualmente estreante Stefan Bellof conseguia, no entanto, a proeza de se qualificar em vigésimo e último, “eliminando” desta forma alguns turbos, nomeadamente Surer e Cheever, que estavam ao volante de carros turbo, enquanto os Tyrrell usavam o venerável Cosworth DFY, claramente ultrapassado.

O dia da corrida amanheceu com chuva forte, deixando antever uma prova extremamente dura e acidentada. A partida teve mesmo que ser adiada por 45 minutos devido à intensidade da precipitação, e Lauda aproveitou para persuadir Bernie Ecclestone a “encharcar” o Túnel, já que com o óleo derramado pelas provas de apoio, incluindo uma de históricos, podia tornar o piso seco naquele local num verdadeiro perigo e causar um grave acidente, procedendo-se à “rega” do local com um carro dos bombeiros. Por fim, lá se deu início ao procedimento de partida, e no momento da verdade Alain Prost saiu muito bem da pole, seguido de Mansell. Cá atrás, Warwick largava muito bem, mas foi tocado por René Arnoux e ficou atravessado contra os rails, sendo atingido pelo seu colega Patrick Tambay, entalando a segunda metade do pelotão! Aparte a desilusão natural pela perda dos seus dois carros, a Renault tinha motivos para preocupação já que os pilotos ficaram lesionados devido à deformação da monocoque em fibra de carbono, o caso mais grave sendo o de Tambay que partia uma perna já que a suspensão furou o habitáculo! Assim, no final da primeira volta, Prost liderava Mansell, Arnoux, Alboreto, Lauda e Rosberg.

Lauda passou Alboreto, que fez pouco depois um pião em Mirabeau que o atirou para os últimos lugares, e não tardou a pressionar Arnoux, enquanto na frente Prost era surpreendido à nona volta pelo Brabham de Corrado Fabi, parado após um pião – vindo a atingir, felizmente sem consequências de maior, um comissário – o que, aliado a ligeiros problemas de motor, permitia a ultrapassagem de Mansell, que liderava pela primeira vez um Grande Prémio. Cá atrás, Lauda passava Arnoux, mas a grande surpresa era a exibição do estreante Ayrton Senna em Toleman, que pressionava fortemente Rosberg, não tardando a efectivar a ultrapassagem, lançando-se imediatamente na peugada do Ferrari de Arnoux. Mansell destacava-se com um ritmo extremamente rápido, que provou ser demasiado intenso para as condições dantescas da prova, quando na 16ª volta perdeu aderência na subida para o Casino ao passar sobre uma das linhas brancas que marcam a estrada, bateu nos rails e danificou o Lotus de forma irremediável, nem dando para chegar às boxes. Assim, os dois McLaren estavam na frente, mas Senna estava simplesmente brilhante e já tinha passado Arnoux, ganhando paulatinamente tempo aos dois carros vermelhos-e-brancos. Fora de prova também já estava Piquet, que havia imitado o seu colega de equipa Fabi e deixado o motor ir abaixo após um pião.

Senna passou facilmente Niki Lauda e começou de imediato a pressionar Prost, enquanto a chuva se agravava. Cá atrás, escapando aos despistes e mostrando uma maturidade incomum – se a rapidez e talento eram absolutamente inquestionáveis, a fogosidade traia-o habitualmente – Stefan Bellof fazia maravilhas com o Tyrrell equipado com motor atmosférico e passava Rosberg, um reputado especialista em piso molhado. Verdade seja dita que o pouco potente Tyrrell era talvez o carro mais ágil naquelas condições, e Bellof esteve todo o dia isento de erros, o que lhe permitiu ganhar rapidamente tempo a Arnoux. A subida para o Casino voltava a ser traiçoeira, desta vez para um dos mais experientes pilotos do plantel – Niki Lauda – que se despistava contra os rails, reconhecendo o erro como de sua inteira responsabilidade. Senna parecia devorar a vantagem de Alain Prost (cerca de 34 segundos à vigésima volta), enquanto Bellof fazia uma espetacular ultrapassagem no Casino a Arnoux, e rodava ainda mais rápido que os dois primeiros!!!

Tudo prometia uma prova épica, mas as condições estavam iguais ou piores que na edição de 1972 (vencida por Jean-Pierre Beltoise) e a direcção de prova, liderada por Jacky Ickx, começava a interrogar-se se não seria melhor interromper a corrida antes que se desse algum acidente grave. À 29ª volta Prost sinalizava para a direcção de prova a necessidade de parar o G.P., enquanto a pressão de Senna e Bellof se intensificavam. O McLaren estava também com problemas de travões, que não aqueciam devido ás baixas temperaturas e à humidade – o que pode ter contribuído para o erro de Lauda – e seria escusado pensar que o francês aguentaria muito mais tempo o endiabrado Senna, até então apenas mais uma grande promessa do automobilismo mundial. De facto, já com o Toleman bem perto, Prost voltou a apontar para o céu no final da 31ª volta e Ickx optou pela sua habitual prudência e mostrou a bandeira vermelha na passagem seguinte pela meta, pondo fim à corrida.

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A decisão foi imediatamente polémica. Em primeiro lugar, Ickx liderava a equipa de fábrica da Porsche no Mundial de Endurance, por isso a sua atitude de parar a prova enquanto Prost – num McLaren propulsionado por motores da marca germânica – estava na frente foi vista como um possível favorecimento, dizendo-se também que tinha sido preferível ganhar um francês do que um estreante. Se é bem verdade que Prost dificilmente teria aguentado o comando por mais de uma volta, também há que ter a noção que Bellof era o mais rápido e poderia chegar a Senna se a prova continuasse, e os próprios mecânicos da Toleman viriam a confirmar que o carro do brasileiro não duraria muito mais voltas devido a danos na suspensão provocados por um toque nos rails. Polémico à altura por uns motivos – Ickx viria mesmo a ser temporariamente suspenso das suas funções por não ter consultado os comissários antes de interromper o Grande Prémio – a futura rivalidade Senna/Prost fez com que, retroespetivamente, alguns entusiastas vissem nesta prova o primeiro claro favorecimento do francês em relação ao brasileiro. Por fim, mesmo que Bellof tivesse ganho, perderia a vitória, já que a Tyrrell viu o seu carro considerado ilegal após o G.P. dos EUA-Detroit – uma lista longa e complexa de irregularidades nunca totalmente explicada, aparentemente sem incremento significativo de performance, mas que daria muitas teorias da conspiração ligadas a pressões por parte da FISA já que a pequena equipa inglesa era a única com motores atmosféricos.

Suspeitas aparte, Prost foi de facto o piloto que menos errou – se é que errou – durante toda a prova, enquanto Senna e Bellof mostraram em definitivo ter aquele pequeno bocado de talento que separa os excelentes dos génios, com as suas exibições de luxo. No entanto, Prost certamente teria preferido o segundo lugar e a continuação da prova se soubesse o futuro… Como não tinha sido atingida 75% da distância inicial prevista, foram atribuídos meios pontos, por isso Prost apenas marcou 4.5, vindo a perder o título para Lauda no G.P. de Portugal por apenas… meio ponto! Se fosse segundo no final, teria ganho os seis que lhe daria o seu primeiro título…

Texto Guilherme Ribeiro

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1 comentários

  1. Iceman07

    3 Junho, 2017 at 21:39

    E ganhava se não tivessem interrompido a corrida à favor do Prost!
    Mas se soubessem que o campeonato ia ser ganho pelo Lauda por meio ponto, se calhar a corrida teria continuado.

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