F1, Lewis Hamilton na primeira pessoa: “Recuso-me que Abu Dhabi me defina…”

Por a 23 Fevereiro 2022 13:44

Lewis Hamilton esteve longas semanas afastado da Fórmula 1 e as dúvidas quanto à possibilidade de deixar a categoria máxima adensaram-se.

No entanto, o inglês deixou bem claro que essa opção nunca esteve em consideração, muito embora esteja ainda para ver como as modificações emanadas pela FIA serão implementadas, e avisa que este ano vê-lo-ão de uma forma diferente, sendo o “Hamilton versão 2022” o melhor de sempre.

O Toto Wolff afirmou que estavas muito desiludido com a Fórmula 1 depois do acorrido em Abu Dhabi. Podes explicar como foi que nos últimos meses conseguiste ultrapassar esse sentimento?

Lewis Hamilton: Foi obviamente um período difícil, para ser honesto. Antes de mais quero agradecer todo o apoio que recebi. Tem sido fantástico a suporte que tenho recebido ao longo dos últimos quinze ou dezasseis anos e o apoio que me deram no final do ano foi incrível

Desliguei, tive a minha família em redor de mim, toda ela, o que é uma ocasião muito rara, e estive focado em estar com eles.

Obviamente, levou algum tempo a digerir o que aconteceu e é ainda difícil de compreender totalmente, mas o que não nos mata torna-nos mais fortes.

Estive concentrado no treino e em tirar prazer das férias.

Houve algum momento em que pensaste em abandonar a Fórmula 1?

Lewis Hamilton: Considerei abandonar em muitas ocasiões, mas desta vez, honestamente, não. No final de qualquer temporada refletimos e a questão é saber se queremos empenhar o tempo, o esforço que é exigido para nos tornarmos Campeão Mundial, e penso que muita gente não valoriza o esforço que é necessário para sermos Campeões do Mundo. Existem muitas exigências e não é apenas aparecer e pilotar o carro, portanto, a questão é essa – se queremos empenhar o tempo, se queremos continuar a dar o máximo. Este é um processo mental normal para mim, mas este ano foi composto por um factor significativo e penso que no final, o desporto que sempre amei, houve um momento em que perdi um pouco de fé no sistema, mas sou uma pessoa muito determinada e situações como esta podem definir carreiras e eu recuso-me que este defina a minha. Portanto foquei-me em estar o melhor possível e regressar ainda mais forte.

Reviste a corrida de Abu Dhabi e o que foi que disseste ao Max (Verstappen) durante o calor do momento?

Lewis Hamilton: Não, não revi a corrida, era algo cuja experiência estava muito clara na minha mente, nas semanas seguintes à prova. Não me lembro do que disse ao Max, a minha memória dos momentos posteriores é um pouco enevoada. Não revisitei a corrida, quero olhar para a frente e não para trás.

A saída do Michael Masi deixou-te mais confortável?

Lewis Hamilton: Não podemos alterar o passado, nada mudará aquilo que senti naqueles momentos, naquela situação. É bom perceber que a FIA está a dar passos para melhorar o processo. Penso que a responsabilização é muito importante e temos de usar esta situação para garantir que não vai voltar a acontecer.

Dou as boas-vindas às alterações realizadas pela FIA e temos de garantir que veremos essas modificações e que o regulamento é aplicado de forma correta.

Disseste que perdeste a fé no sistema. As modificações realizadas pela FIA devolveram-te essa fé? Se não, o que seria necessário para a recuperares?

Lewis Hamilton: A confiança pode ser perdida num estalo de dedos. A confiança é construída ao longo de muito tempo. Não estava à espera do que aconteceu, como disse, este anúncio das primeiras modificações é um primeiro passo na direção correta, mas não muda tudo, ainda, temos de ver ações e isso levará algum tempo.

Não estou focado nisso neste momento, estou a colocar toda a minha energia em me tornar melhor que no passado.

Nenhum de nós viu o relatório da FIA sobre o incidente de Abu Dhabi. Não sei se tiveste acesso a ele, mas se tiveste qual é a tua reação?

Lewis Hamilton: Não o vi. Ainda nem sequer saiu. Mas estou ansioso por o ver, assim como aos resultados e espero que todos o possam analisar para que possa haver um melhor entendimento do sucedido. Acredito que no final, o mais importante é que tudo seja compreendido e possamos avançar de uma forma positiva.

O ano passado quando te sentiste injustiçado, regressaste ainda mais forte, como aconteceu no Brasil. Depois do sucedido em Abu Dhabi voltas este ano ainda mais forte? E qual é o teu estado de espírito?

Lewis Hamilton: Com estas longas temporadas, o defeso não é tão longo como gostaríamos, parece estar cada vez mais pequeno.

Mas ao longo dos anos aprendi a ser eficiente com o meu tempo com a minha recuperação física, assim como com os treinos e a preparação de corpo e mente. Mas sinto-me muito bem, bem fisicamente, ter mais um ano de experiência também ajuda, claro.

E sempre acreditei que estas experiências sociais podem transformar as emoções em força e poder e é isso que estou a fazer.

Se pensam que o que viram no final do ano passado foi o meu melhor, esperem para verem este ano.

Depois do que aconteceu o ano passado e de toda a pressão que a Red Bull exerceu a Michael Masi, como será a tua relação com a equipa e com o Max Verstappen?

Lewis Hamilton: Isto não tem nada a ver com o Max, ele fez o que qualquer piloto teria feito na mesma situação. Ele é um grande competidor e iremos para uma batalha como a do ano passado, e comportar-nos-emos de uma forma ainda melhor, dada a nossa experiência da temporada passada.

Mas não tenho qualquer problema com ele, não guardo rancor a ninguém. Não creio que esse seja um bom sentimento para carregarmos connosco. Olho para a frente e não para o passado.

Como disse, sinto-me fresco, centrado e completamente focado e não tenho nada nos ombros que me impeça de olhar para a frente. Não que tenha tido o ano passado, mas não vou deixar esta experiência o faça.

Depois do acontecido as coisas ficaram feias e, inclusivamente, o Nicholas Latifi foi ameaçado e teve de contratar um guarda-costas. Consideras que as redes sociais estão ainda por regulamentar?

Lewis Hamilton: Na verdade, considero que as companhias que gerem as redes sociais não se esforçam o suficiente. Temos ainda de as pressionar para realizarem alterações.

A saúde mental é uma coisa real e as pessoas estão a ser abusadas nas redes sociais e ninguém merece isso, não deveria ser tolerado.

Tem de haver alterações, mas parece que não as estão a fazer a um ritmo apropriado, temos de continuar a aplicar pressão.

Estive em contacto com o Nicholas e ele tem todo o meu apoio. Sei como uma pessoa se pode sentir numa situação daquelas e é importante que ele saiba que tem apoio das pessoas à sua volta.

Por outro lado, vi que havia muita paixão por este desporto, e isso é o que o torna especial, temos apenas de canalizar essa paixão de uma forma positiva.

Acredito que já tenhas rodado com o novo carro no simulador e tens muita experiência com monolugares nos últimos anos e com os pneus da Pirelli. Como comparas em pista estes novos carros relativamente aos anteriores?

Lewis Hamilton: Sim, pilotei no simulador. O carro é muito diferente de qualquer um que tenha pilotado no passado, no que diz respeito aos equilíbrios aerodinâmico e mecânico. É uma máquina muito diferente de pilotar e vai exigir muita finesse, muito trabalho para perceber como o afinar com as novas ferramentas que temos. Mas esta é a altura do ano mais entusiasmante para mim, quando vemos todos estes engenheiros, todos estes homens e mulheres, a trabalhar tão arduamente durante meses, vemos os sorrisos e a excitação nas suas caras, dado que finalmente as peças são encaixadas e podemos ver o carro no lançamento para depois o podermos pilotar. É uma experiência especial e que vivemos juntos.

Não tenho ideia do que aguardar quando formos para a pista, espero que o simulador seja preciso, se não for, faremos correcções e trabalharemos intensamente.

As pessoas quando olham para ti veem um piloto de Fórmula 1, mas depois, tens também uma vertente de luta por causas sociais. Como gostarias de ser lembrado?

Lewis Hamilton: Penso que é algo com que sou questionado todos os anos, o meu legado. Nos meus primeiros anos era difícil compreender o que significava um legado. Claro que depois li o livro do Nelson Mandela, olhei para o legado que deixou e para a forma como usou o seu tempo aqui, nesta Terra.

Penso que para mim, foi-me concedida esta incrível oportunidade para fazer o que faço e de ser grande em algo, mas não gostaria de ser definido apenas por ser piloto, porque há muitos mais elementos que contribuem para aquilo que sou.

No final, sou uma pessoa que se importa e que tenta usar uma plataforma para mudar ideais, concepções e colocar pressão no sistema para ser mais inclusivo.

Tivemos o lançamento do nosso carro e vimos um grupo de pessoas que, provavelmente, é o mais diversificado que alguma vez viram no lançamento.

Podemos ver o trabalho fantástico que tem sido feito pela Ignite e pelo Mission 44, é algo de que me sinto muito orgulhoso, por fazer parte dele. (…)

É por isto que gostaria de ser recordado. Ver algumas alterações sérias no nosso desporto e no ensino, de modo que funcionem melhor para aqueles que têm um poder económico mais baixo e para as minorias.

O George Russell é o teu terceiro colega de equipa na Mercedes. Como olhas para ele – como um aliado na luta contra as outras equipas ou é apenas outro rival?

Lewis Hamilton: O George, não me lembro de o conhecer aquando daquela foto em que ele era um miúdo quando eu estava na McLaren, é claro que ele esteve fantástico até achegar a Fórmula 1, mas ele já estava na equipa, vi-o nas reuniões de engenharia e no simulador e depois, claro, quando entrou na Williams.

Ele adapta-se à situação como se fosse uma luva e até agora é fantástico. É claro que aprendi muito ao longo dos anos a relacionar-me com os meus colegas de equipa e como trabalhamos enquanto equipa, a ajudá-la a alcançar o objectivo final e essa é uma das razões pelas quais temos mais títulos mundiais que qualquer outra.

Estou entusiasmado por começar uma relação com ele e por colaborar com ele. Vamos esperar que os nossos estilos de pilotagem não sejam dissimilares.

Sei também como é para ele estar na posição de ter como colega de equipa um Campeão do Mundo e sei as pressões que existem, as expectativas e os sentimentos pessoais que isso envolve.

Quero que ele aprenda o máximo possível, cresça o máximo possível e não tenho dúvidas de que ele será um forte contendor. Eu também estarei concentrado em fazer o melhor que sei

Subscribe
Notify of
0 Comentários
Inline Feedbacks
View all comments
últimas Autosport Exclusivo
últimas Autosport
autosport-exclusivo
últimas Automais
autosport-exclusivo
Ativar notificações? Sim Não, obrigado