Renault na Fórmula 1: 46 anos de história

Por a 5 Fevereiro 2023 16:03

                           
A Renault oficializou em 2015 a recompra da Lotus, regressando à disciplina como equipa oficial, depois de anos bem sucedidos como fornecedora de motores. Estreou-se na F1 em 1977, mas os seus resultados tiveram altos e baixos. Recorde a saga da marca do losango, numa altura em que o piloto que ofereceu à marca a primeira vitória da era turbo na F1, Jean-Pierre Jabouille, nos deixou…

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A Renault é claramente a marca francesa mais conhecida na F1, inovou com o lançamento do turbo na disciplina, mas foi preciso esperar pelo renascimento da equipa já no Séc. XXI para que os almejados títulos a ‘solo’ aparecessem. Contudo, a história da marca no desporto automóvel remonta ao fim do Séc. XIX início do Séc. XX. Em 1898, Louis Renault e os seus irmãos, constituem a sua sociedade Renault Fréres. Atingem rapidamente o reconhecimento na competição automóvel, onde as suas ‘voiturettes’ conquistam vitórias, por exemplo o GP de França de 1906, ganho pelo franco-húngaro Ferenc Szisz, uma corrida que é considerada o primeiro Grande Prémio da história. As fábricas da Renault adotam a produção em série em 1905 e durante a 1ª Guerra mundial, a empresa fabrica camiões, macas, ambulâncias, granadas e mesmo os famosos tanques FT17, que dão uma contribuição decisiva para a vitória final.

A Renault moderniza-se, em 1929 surge a primeira linha de montagem da fábrica de Billancourt. Para resistir à crise económica, a empresa reduz os custos, mas o clima social degrada-se. Durante a 2ª Guerra mundial, Louis Renault considera o conflito com a Alemanha um erro: submete-se às exigências dos alemães e após a libertação de Paris, Renault foi acusado de colaboração e é preso em Fresnes. Morreu a 24 de outubro de 1944, aos 67 anos. Como consequência, a Renault é nacionalizada em 1945 e torna-se na Régie Nationale des Usines Renault (RNUR).

A Régie moderniza as suas fábricas, constrói e adquire novas instalações de produção, os sucessos surgem com o 4 CV, o primeiro “pequeno veículo para todos”. Nos anos 50, um Renault 4CV participa nas 24 Horas de Le Mans e vence a sua categoria.

Em 1975, o Presidente da Renault, Bernard Hanon, decide criar uma escuderia de Fórmula 1 e a chegada à modalidade em 1977 faz-se com um motor perfeitamente inédito, um V6 Turbo, criado por Bernard Dudot. Mas para contar a história há que recuar um pouco. Em 1973, aquando da compra do fabricante de carros desportivos Alpine, a Renault tinha ficado com duas divisões desportivas, sendo a outra a Gordini, comprada pela marca em 1968. Nos primeiros anos concomitantes, a Renault dá nome aos desportivos de rua, os motores eram batizados Gordini, e a Alpine batizava as versões de competição. Foi assim até 1976, quando a Renault uniu as duas divisões desportivas e criou a Renault Sport. Mas aí o foco já estava na F1. Recorde-se que nos regulamentos da F1 havia a possibilidade de sobrealimentação, ainda que a cilindrada fosse apenas 1.5 litros. A isto se juntou o facto da Gordini já ter desenvolvido um motor V6 turbo para os protótipos da Alpine no Mundial de Sportscar, e por isso foi natural a decisão de construir um F1 à volta do motor Renault-Gordini V6 turbo. Só tiveram que reduzir a cilindrada do motor de dois litros para 1.5 litros, de modo a se enquadrarem no regulamento da F1. (ler em separado, ver caixa ‘A equipa que ligou o turbo na F1’).

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Chaleira amarela

E foi no Grande Prémio da Grã-Bretanha de 1977 que a marca francesa apresentou ao mundo o Renault RS01 com Jean-Pierre Jabouille ao volante. Mas o carro não era fiável, especialmente o motor, sendo que depressa ficou conhecido pela chaleira amarela. Jabouille teve uma corrida curta, pois o turbo cedeu e o francês abandonou. Com isso em mente, a Renault ficou fora dos dois GP seguintes, voltou no GP da Holanda, onde Jabouille foi 10º. As coisas foram más até ao fim do ano, e na última corrida, o desempenho nos treinos deixou o carro amarelo fora da grelha de partida.

No ano seguinte a Renault manteve um carro e um piloto ainda e sempre Jabouille e o RS01. Não foram à Argentina e Brasil, e na África do Sul, novo abandono devido à quebra do motor. Na corrida seguinte em Long Beach, EUA, durou 40 voltas até o turbo voltar a quebrar. O primeiro GP que o carro terminou foi o Mónaco 1978. Jabouille chegou ao fim mas a quatro voltas do vencedor, Patrick Depailler, em Tyrrell e uma volta atrás do nono classificado, Emerson Fittipaldi. Um pequeno passo em frente. Voltou a terminar em Zolder, na 13ª posição, o mesmo sucedeu em Espanha, mas nos grandes Prémios seguintes, voltaram os abandonos. Em sete corridas, cinco quebras de motor, uma quebra no turbo e uma quebra da caixa de velocidades. Por tudo isto, o nickname ‘Chaleira Amarela’, pois quando o motor partia expelia fumo branco. Mas as coisas iriam mudar…

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Primeira vitória

A época de 1978 foi muito difícil para a Renault e em 1979, os franceses colocaram a correr um segundo carro que entregaram a René Arnoux. Os problemas de fiabilidade não desapareceram, mas a Renault tinha aprendido com os erros cometidos e já estava a desenvolver o RS10, previsto para se estrear em competição na sétima prova de 1979, no Mónaco. O motor permaneceu o mesmo, mas a Renault colocou dois turbos KKK menores em vez de um único, e a caixa evoluiu da Hewland FG400 de cinco velocidades para a FGA400 de seis. Na primeira corrida, Jabouille terminou oito voltas atrás do vencedor e Arnoux sofreu um acidente e abandonou. Mas as coisas iriam mesmo mudar e na corrida seguinte, o GP da França, Jean-Pierre Jabouille assegurou a pole position, para a história a primeira pole de um monolugar com motor turbo na F1, e ao seu lado, a partilhar a primeira linha estava o seu companheiro de equipa René Arnoux. O que aconteceu na corrida, pode ler em separado (caixa 1ª vitória), e marcou um dos pontos mais altos da história da F1, uma corrida que ainda hoje, 38 anos depois se fala.

Os problemas de fiabilidade do motor e do turbo regressaram nas provas seguintes, mas a evolução era notória e o V6 biturbo permitiu mais quatro pole positions, duas para cada piloto. De repente, a ‘chaleira amarela’ já não dava azo a zombaria.

Para 1980, a Renault surgiu com um novo carro, o RE20, que regressou a uma caixa de cinco velocidades, mas a potência do motor passou para 527 cv, mais do que o competitivo V8 Cosworth DFV. O carro já era rápido, contudo, a fiabilidade continuou a ser um problema. Os dois pilotos abandonaram 15 vezes em 14 provas, mas ainda assim, a Renault conseguiu somar 38 pontos que lhe permitiram o quarto lugar no mundial, à frente da Lotus, Tyrrell, McLaren, Alfa Romeo e Ferrari. Uma boa surpresa e mais um sinal de crescimento.


História da Renault na F1


Foi no Grande Prémio da Grã-Bretanha de 1977 que a marca francesa apresentou ao mundo o Renault RS01 com Jean-Pierre Jabouille ao volante. O primeiro ‘turbo’ na F1…


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Estrela em ascensão

Para 1981 e com a saída de Jean-Pierre Jabouille para a Ligier, no seu lugar foi colocado um jovem piloto francês vindo da McLaren, Alain Prost de seu nome. Ainda e sempre a fiabilidade continuou a incomodar os franceses, nas primeiras cinco provas do campeonato, Prost desistiu quatro vezes, com um pódio pelo meio, na África do Sul. Só que a Renault já tinha preparado o RE30, o seu novo carro para 1981, com grandes diferenças face ao modelo anterior. O bloco do motor Renault era igual, mas os turbos KKK eram diferentes, tendo sido conseguido um ganho de potência, num motor que passou a debitar 540 cv, mais potente que o Cosworth DFV. A Ferrari entretanto já tinha um propulsor V6 1.5 biturbo com 558 cv. E foi com o Renault RE30 que Alain Prost conquistou sua primeira vitória na F1, no GP de França de 1981. O francês voltou a vencer as corridas da Holanda e Itália, obteve ainda dois segundos lugares na Alemanha e em Las Vegas, nos EUA, enquanto Rene Arnoux não venceu qualquer corrida, mas em contrapartida assegurou quatro poles e duas voltas mais rápidas. Com a ajuda dos resultados de Alain Prost, a Renault terminou a temporada de 1981 no terceiro lugar do campeonato de Construtores.Mas o ano de 1982 foi ainda melhor! Para além disso, a Renault via finalmente o seu pioneirismo ser seguido, sendo que o gozo da ‘chaleira amarela’ há muito tinha ficado para trás, e agora mais duas equipas passaram também a utilizar motores turbo. A Brabham adotou os motores 1.5 de quatro cilindros da BMW enquanto a Alfa Romeo escolheu um V8 1.5 e desta forma a era Turbo na F1 tornou-se um facto e a F1 passava a ter cinco equipas com motores turbo.De resto, a Renault evoluiu novamente o seu monolugar, agora o RE30B, com um motor ainda mais potente, que chegava aos 590 cv. Alain Prost venceu as duas primeiras corridas, no Brasil e na África do Sul sendo que para além disso o RE30B era quase imbatível nas qualificações, já que entre Prost e Arnoux a Renault assegurou 10 pole positions em 15 corridas. Mas a fiabilidade continuava a ser um problema, desta feita por causa da nova injeção eletrónica. Dessa forma, Alain Prost não foi além dessas duas vitórias e terminou o campeonato apenas no quarto posto, enquanto Rene Arnoux venceu também duas corridas. Esse conjunto de resultados colocaram a Renault no terceiro lugar no Mundial de Construtores, atrás da Ferrari e da McLaren.035Título como objetivo falhado

O carro de 1983 era o Renault RE40, sendo o primeiro monolugar francês totalmente construído em fibra de carbono, com um ganho de peso significativo. Depois de seis anos na F1, esta era a primeira grande oportunidade dos franceses chegarem aos almejados títulos. René Arnoux foi para a Ferrari e agora com o norte-americano Eddie Cheever a seu lado, Alain Prost, claramente primeiro piloto da equipa, assegurou quatro vitórias e três pódios, colocando-se bem na corrida pelo título mas Nelson Piquet e a Brabham tinham também um grande binómio. Prost liderou boa parte da temporada, e na derradeira corrida do ano na África do Sul, um grande balde de água fria. Um problema no turbo do monolugar de Prost levou-o ao abandono e Piquet foi campeão por apenas dois pontos. Com a ajuda de Cheever, a Renault foi vice-campeã de Construtores, atrás da Ferrari. Alain Prost criticou a equipa, e foi despedido, e a partir daí nada mais foi o mesmo na Renault. Nos dois anos seguintes, a prestação da equipa oficial caiu, com um quinto lugar nos construtores em 1984 e sétimo em 1985.

Contudo, a parceria iniciada com a Lotus ainda em 1983 continuou, e começou a dar frutos. A Ligier passou também as utilizar motores Renault, sendo que um perfeito sinal que as coisas na Renault não estavam bem foi o facto da própria Lotus, um cliente, bater os franceses em 1984 nos Construtores.

Na Lotus-Renault, Ayrton Senna substituiu Nigel Mansell e com o 97T, Senna conquistou suas duas primeiras vitórias na F1, a primeira delas em Portugal, à chuva, e Elio de Angelis o seu segundo triunfo, como todos sabemos, também o último. A equipa oficial foi batida por duas das suas clientes, a Lotus e a Ligier, por exemplo, Jacques Lafitte foi três vezes ao pódio.

Fim do programa

Em 1986, a equipa oficial da Renault abandonou a F1, mas para o ano seguinte, a Renault Sport desenvolveu um novo motor, o EF15B, que trazia inovações como ignição estática e retorno pneumático de válvulas. A equipa de fábrica deixou a F1, mas os franceses mantiveram-se na modalidade com o programa de fornecimento de motores para a Lotus, Ligier e Tyrrell. A Lotus cumpriu bem o papel com o terceiro lugar no mundial de Construtores e com Ayrton Senna novamente no quarto lugar no Mundial de Pilotos, atrás de Alain Prost, Nigel Mansell e Nelson Piquet. Apesar dos resultados muito satisfatórios por parte das suas três equipas, a Renault decidiu terminar com o programa de fornecimento de motores, ainda que essa ausência não fosse durar muito tempo.

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A era dos seis títulos mundiais

Ainda que estejamos a recordar o percurso da Renault na F1, que arrancou como se sabe, em 1977, desse percurso não se podem retirar as parcerias muito bem sucedidas que existiram pelo meio. Até aqui a Lotus tinha sido, claramente o parceiro mais forte, mas o melhor estava mesmo para vir. A Renault regressa à F1 em 1989, num contexto bem curioso, pois se anteriormente os franceses tinham sido pioneiros na F1 ao introduzirem o motor turbo, foi precisamente com a sua proibição que decidiram regressar, dando início a uma parceria de sonho com a Williams. Com a proibição dos motores sobrealimentados, desenvolveram o RS1, um motor V10 de 3.5 litros, a cilindrada máxima permitida pelo regulamento. O novo Williams-Renault FW12C venceu apenas uma corrida, por intermédio do Thierry Boutsen no GP do Canadá, mas as boas prestações durante o ano foram uma constante, o que permitiu à equipa de Sir Frank Williams o vice-campeonato de Construtores de 1989.

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Em 1990 ficou a nítida sensação que o Williams-Renault FW13B, pilotado por Thierry Boutsen e Riccardo Patrese, que venceram uma corrida cada, era o carro mais rápido do plantel, mas os seus dois pilotos não permitiram melhor que a equipa terminasse o campeonato em quarto. Por isso, Sir Frank Williams foi buscar Nigel Mansell, que tinha estado dois anos na Ferrari, e o FW14, projetado por Patrick Head e pelo novo designer chefe da Williams, Adrian Newey, era rápido, mas pouco fiável de início pelo que o primeiro triunfo da equipa só chegou no GP do México e logo por Patrese, mas com Mansell logo atrás. A partir dali o campeonato correu bastante bem ao inglês, com diversos triunfos, mas o Campeão foi Ayrton Senna, na altura, piloto da McLaren.

No ano seguinte, 1992, o FW14B, com controlo de tração e suspensão ativa depressa se mostrou bem acima dos rivais, com a Williams finalmente a voltar a vencer um Mundial de Construtores com Nigel Mansell a sagrar-se Campeão. Em 16 corridas o piloto inglês venceu nove, terminou outras três sem segundo. A Williams dominou por completo os Construtores, mas Frank Williams decidiu mexer na sua equipa de pilotos e contratou Alain Prost, mas deixando fugir Mansell, que foi para a Fórmula CART, nos EUA, onde se sagrou Campeão.

Para o segundo carro foi Damon Hill, que nesse ano venceu três corridas, contra as sete de Prost. O francês assegurou o seu quarto título e a Williams voltou a dominar por completo do Mundial de Construtores. No final do ano, Prost ‘reformou-se’ e para o seu lugar foi Ayrton Senna.

O Williams-Renault FW16 foi apresentado com pompa e circunstância no Autódromo do Estoril, mas a Williams mexeu demais um monolugar que era bom. Tantas foram as alterações que o FW16 teve problemas de desenvolvimento, era difícil de pilotar. A classe de Senna permitiu a obtenção de três poles nas três primeiras corridas, mas em San Marino deu-se a tragédia da morte de Senna. O primeiro triunfo do carro só surgiu em Espanha, por intermédio de Damon Hill, que conseguiu lutar pelo título com Michael Schumacher, da Benetton, até a última corrida, o GP da Austrália, que ficou decidido quando ambos colidiram. Schumacher desistiu mas a suspensão do Williams de Hill ficou danificada e o abandono deu o título ao alemão, o primeiro da sua carreira. Contudo, a Williams-Renault assegurou o título de Construtores pelo terceiro ano consecutivo.

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Schumacher tinha conseguido o seu primeiro título com um Benetton equipado com um motor V8 Ford Z-Tec mas em 1995 trocou-o pelo Renault V10 RS7 e com esse monolugar, o alemão foi ao pódio em 11 das 17 corridas da temporada, venceu nove Grandes Prémios e assegurou o seu segundo título Mundial, antes de rumar à Ferrari, com a Benetton a vencer também o título de Construtores, batendo precisamente a Williams. Era o quarto título consecutivo dos motores Renault. As coisas mudaram em 1996 e o domínio regressou à Williams, com 12 vitórias em 16 corridas, oito de Damon Hill e quatro de Jacques Villeneuve, com o piloto inglês e ser Campeão, tornando-se no primeiro filho de um antigo Campeão do Mundo – Graham Hill – a repetir o feito. A Williams venceu novamente o Mundial de Construtores, o quinto consecutivo da Renault.

Em 1997, o último Williams-Renault daquela era. Heinz-Harald Frentzen substituiu o Campeão Hill, e Jacques Villeneuve venceu sete Grandes Prémios e assegurou o seu único título mundial de pilotos. Schumacher bem tentou evitá-lo ao bater em Villeneuve, mas o canadiano foi Campeão e Schumacher desclassificado do mundial. Este foi também o sexto título de Construtores consecutivo. Contudo, apesar dos títulos de Construtores e dos campeonatos de Prost, Mansell, Schumacher, Hill e Villeneuve, a Renault deixou a F1 pela segunda vez, no final de 1997. O motor RS9 V10 continuou a ser usado pela Williams e Benetton até o fim da década, mas ‘gerido’ por estruturas privadas como a Mecachrome (Williams) e Playlife (a Benetton).

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Parcerias de sucesso


A história da Renault na F1 fica também marcada por parcerias de sucesso, como por exemplo com a Lotus

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O regresso ‘oficial’

Depois do motor Renault ter sido fundamental para os vários títulos de pilotos e construtores, que ainda assim culminaram com a decisão dos franceses abandonarem a F1 no final de 1997, não demorou muito até que estes se decidissem pelo regresso e desta feita novamente como equipa oficial. A Renault comprou a Benetton no final de 2001, e depois de 15 anos fora das pistas, deu-se o regresso. Flavio Briatore, que até aí tinha liderado a Benetton com sucesso, permaneceu no comando da equipa. Jenson Button fez dupla com Jarno Trulli e o piloto de testes era um jovem espanhol chamado Fernando Alonso. Na altura com 21 anos e oriundo da Minardi, depois de se estrear nos Grandes Prémios em 2001. Button não esteve mal, mas no final do ano foi trocado por Alonso, a decisão foi criticada por muita imprensa, mas depressa o espanhol calou todas as bocas ao obter a pole na Malásia, e terminando a corrida no pódio, o primeiro da sua carreira na F1. Meses depois, na Hungria, a primeira grande corrida dominadora de Alonso na F1, vencendo com grande categoria, 16 segundos na frente de vários ‘pesos pesados’ da modalidade. Terminou a temporada no sexto lugar. Já em 2004, o ano não teve a evolução que a Renault desejava, e só por uma vez a equipa francesa venceu, no Mónaco, por intermédio de Jarno Trulli. Mas tudo estava prestes a mudar no ano seguinte…

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Finalmente o título

Em 2005 a Renault colocou Giancarlo Fisichella no lugar deixado vago por Jarno Trulli e o italiano venceu logo a abrir, no GP da Austrália, naquela que era a segunda vitória da sua carreira, mas este seria mesmo o ano de Fernando Alonso, que venceu as três corridas seguintes, na Malásia, Bahrein e San Marino. Voltou a vencer no GP da Europa, em França, na Alemanha e na China, isto para além de vários pódios, e no final do ano bateu o heptacampeão do Mundo de F1, Michael Schumacher e Kimi Raikkonen, tornando-se no mais jovem campeão mundial na história da F1, aos 24 anos e 59 dias, batendo o recorde de Emerson Fittipaldi, que durava há 33 anos. A cereja no topo do bolo foi o título de Construtores, 28 anos depois da sua estreia na F1, em 1977. Mas para quem pensar que 2005 foi o pináculo, 2006 ainda foi melhor.

Os regulamentos da F1 alteraram-se e passaram a ser obrigatórios os motores V8, mas o segredo da Renault esteve no amortecedor de massa, que estabilizava perfeitamente o carro na sua passagem sobre os corretores, otimizando o apoio aerodinâmico, e isso fez-se sentir fortemente nos resultados das primeiras corridas, com a Renault a ganhar aí uma vantagem que se viria a revelar decisiva. Isto porque mais para a frente a FIA decidiu banir o sistema, alegando que nenhum dispositivo móvel poderia afetar a aerodinâmica do carro e apesar da maioria das restantes equipas depressa o ter adotado, nenhuma delas, como a Renault, tinha projetado o carro tendo isso em conta e esse facto fez toda a diferença. A Ferrari venceu cinco das sete corridas que faltavam para terminar a época, mas Alonso garantiu os pontos necessários para se tornar bicampeão. Para além disso, a Renault assegurou novamente o título de Construtores.

Foi nesta altura que se iniciou também uma ligação muito frutuosa, pois a Renault voltou a fornecer motores, como fizera entre 1983 e 1986 e desta feita estabeleceu uma parceria com a Red Bull Racing, que como se sabe, em 2010, tornou-se na grande dominadora da F1.

Em 2007 Fernando Alonso foi para a McLaren, na Renault, Heikki Kovalainen dez dupla com Giancarlo Fisichella, mas com a perda do espanhol e um carro bem menos competitivo, a Renault iniciou uma curva descendente. Nem uma pole ou vitória para amostra, em 2007, sendo que a equipa terminou no terceiro lugar do Mundial de Construtores, atrás da Ferrari e BMW. Contudo, com a polémica época de 2007 de Alonso na McLaren, e ainda o escândalo do ‘Spygate’ o espanhol regressou a Enstone, mas já nada seria como dantes.

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Em 2008, o Alonso teve a seu lado o brasileiro Nelson Piquet Jr. e o novo RS28 só venceu pelas mãos de Fernando Alonso em Singapura depois do seu colega de equipa brasileiro ter batido propositadamente no muro – confessaria depois que por ordem de Flavio Briatore – isso faria entrar o Safety Car em pista, o avanço de Felipe Massa esfumou-se e o espanhol acabou por vencer a corrida. Este caso teve como consequência a irradiação de Flavio Briatore da F1. A Renault foi apenas quarta classificada no Mundial de Construtores e o ano de 2009 foi ainda pior, com Fernando Alonso a assegurar apenas 26 pontos para a equipa, com apenas um pódio.

O escândalo do ‘Crashgate’ redundou na perda de um importante patrocinador, Fernando Alonso foi para a Ferrari, e em 2010 a Renault contou com o russo Vitaly Petrov e Robert Kubica. O novo RS30 provou ser melhor que o antecessor, Kubica conseguiu vários bons resultados, Petrov também pontuou em algumas corridas e no final asseguraram o quinto lugar no Mundial de Construtores. Na pré-temporada, Kubica sofreu o seu gravíssimo acidente num rali em Itália, onde quase perdeu a vida, e foi substituído por Nick Heidfeld. E a temperada de 2011 foi a última que a Renault disputou oficialmente, inscrita com o nome Lotus Renault GP. Com o RS31, Vitaly Petrov alcançou o único pódio da sua carreira na F1, Nick Heidfeld também conseguiu um no GP da Malásia. Bruno Senna também passou pela equipa, com a F1 a ver novamente um Senna num Lotus preto, mas o brasileiro só pontuou no GP da Itália, que terminou em nono. Foi o fim da aventura da Renault na F1, pois em 2012 a Lotus deixou de ter qualquer ligação à Renault, exceção feita aos motores.

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Paralelamente à equipa oficial, a parceria com a Red Bull ia de vento em popa. Em 2009, a Red Bull perdeu apenas para a espetacular Brawn GP, depois de Ross Brawn ter lido bastante melhor os regulamentos que os seus adversários, permitindo o título a Button. A Red Bull Racing, entre 2010 e 2013 ganhou tudo o que havia para ganhar, sempre com motores Renault. Todos atribuíram os títulos mais a Sebastian Vettel, ajudado pela experiência de Mark Webber e a ‘magia’ de Adrian Newey no design dos carros, e a Renault sempre foi perfeitamente ‘esquecida’ nesta equação, mas a verdade é que quando em 2014 se passou para a nova era das Unidades Motrizes, o facto da Mercedes se ter sobreposto claramente a todos os seus adversários, Ferrari e Renault, todos ficaram a perceber que o motor contava e muito para os sucessos. Que a Red Bull deixou de ter, passando a queixar-se da falta de competitividade do motor francês. Mas quando venceu os títulos entre 2010 e 2013, pouco se ouviu relativamente à Renault.

Voltando um pouco atrás, em 2011 a Renault também passou a fornecer motores à ‘nova’ Lotus, que depois passou a Caterham, ao mesmo tempo que a Renault estendeu o seu fornecimento à ‘verdadeira’ Lotus e novamente à Williams (recriando a célebre Williams-Renault), e mais tarde também à Toro Rosso, para além da Red Bull num período que só se saldou por um triunfo, no GP de Esapnha de 2012, através de Pastor Maldonado.

Neste período, a Renault tornou-se na terceira fabricante de motores com mais vitórias na F1, perdendo apenas para a Ferrari, que disputou todas as temporadas da Fórmula 1 desde 1950, e para a Cosworth, que ganhou tudo o que havia para ganhar nos anos 70.

Na nova era das Unidades Motrizes híbridas, que se iniciou em 2014, a marca francesa foi a única que consegui interromper o ciclo vitorioso da Mercedes, com três triunfos em 2014. Este ano, a Ferrari foi a única que conseguiu bater os Mercedes, e as relações entre a Red Bull e a Renault pioraram ao ponto de Carlos Ghosn se ter decidido pelo tudo ou nada. Ou saíam da F1 ou se mantinham como equipa oficial. Para o bem da F1, Ghosn escolheu a segunda hipótese e ‘comprometeu’ a Renault como equipa oficial na F1 até 20124. Aguardam-se ‘cenas’ dos próximos capítulos…

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A equipa que ligou o turbo na F1

A Renault foi a marca que introduziu os motores turbo na F1. A tecnologia foi das mais marcantes da história da modalidade, já que ao possibilitar que os motores passassem a atingir níveis de potência tão elevados, isso fez com que os técnicos e engenheiros tivessem que procurar novos limites, para além de contribuir, e muito, para o espetáculo em pista. Quem não se lembra das fabulosas voltas de qualificação de Ayrton Senna em 1986, por exemplo no Autódromo do Estoril, na qualificação para o GP de Portugal de 1986, com o seu Lotus-Renault que debitava – na versão de qualificação – 1200 cv de potência.

Voltando um pouco atrás, a Renault foi a primeira marca que se ‘atreveu a introduzir a tecnologia de sobrealimentação na F1. Tudo começou em 1976, quando os franceses já testavam o seu motor de 1.5 litros turbo. Curiosamente, os regulamentos há muito permitiam a utilização de turbo, mas só o Renault RS01 de 1977 estreou o sistema, no GP da Grã-Bretanha, com Jean Pierre Jabouille. A verdade é que as palavras turbo e fiabilidade não se conjugavam muito bem naquela época, e por isso os primeiros tempos não foram fáceis. Sobreaquecimento e múltiplas falhas foram a ordem do dia. Mas não só, pois o ‘arrasto ‘ turbo era também um problema. Mas como qualquer nova tecnologia, o seu arranque é sempre complicado, sendo sempre necessária uma grande dose de coragem. E a Renault teve-a! Inicialmente, o ‘amarelinho’ da Renault não foi levado a sério e até Ken Tyrrell batizou sarcasticamente a ‘Chaleira Amarela’ mas a verdade é que em 1985 isso não o coibiu de assinar contrato com a Renault para ter os seus motores. A verdade é que foram precisas dez corridas para que o Renault terminasse o seu primeiro Grande Prémio, mas em 10º lugar e a quatro voltas do vencedor. Os primeiros pontos surgiram apenas no GP dos EUA de 1978, a penúltima corrida da época, e o primeiro triunfo apenas no ano seguinte, no mítico GP de França, já com os carros de Jabouille e Arnoux equipados com o sistema de duplo turbo. Pela primeira vez, Gerard Larrousse, responsável máximo da equipa, podia dormir descansado, pois apesar de muitas noites sem dormir, devido aos contratempos do projeto, este afinal estava a começar a vingar e logo com um triunfo no GP de França, com um carro francês, um piloto francês, um motor francês, equipado com pneus franceses e com combustível francês. Vive la France!

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A primeira vitória da Renault na F1

Um Grande Prémio para recordar todos os dias

Depois de tudo o que se tinha passado desde a estreia, poucos acreditavam no sucesso da Renault em Grandes Prémios. Ver um pequeno motor de 1,5 litros turbo bater os ‘poderosos’ 3 litros atmosféricos ainda parecia irreal, mas no dia 2 de Julho de 1979, tudo mudou. Jean-Pierre Jabouille venceu o GP de França e René Arnoux terminava na terceira posição, após uma batalha épica com Gilles Villeneuve.

Mas recordemos a reportagem desta emocionante corrida, publicada no AutoSport , cujo enviado especial ao circuito de Dijon-Prenois foi o diretor da publicação à altura, José Vieira. Nos treinos, o nosso jornal fazia uma alusão tão premente como atual: “É espantoso como a aerodinâmica permite velocidades em curva tão elevadas e reduções nos tempos por volta tão substanciais. Como não hão-de os circuitos envelhecer com tal evolução na F1?”

Os dois Renault de Jabouille e Arnoux dominam a primeira fila da grelha de partida, mas, surpreendentemente, nenhum deles consegue alcançar o comando da corrida. Um arranque canhão de Villeneuve catapulta o Ferrari para o primeiro lugar. Mas, as voltas iniciais da corrida parecem indiciar um jogo tático da Ferrari, com Gilles Villeneuve no papel de lebre, procurando que Jabouille force o andamento, já que o motor turbo da Renault não goza da reputação de grande fiabilidade. Se o piloto francês ‘entrasse neste jogo’ talvez o carro não aguentasse o que poderia beneficiar o segundo Ferrari de Scheckter, então na terceira posição.

Mas Jabouille decide arriscar e beneficiando da ultrapassagem a concorrentes mais atrasados passa Villeneuve e, rapidamente se distancia do Ferrari. Entretanto Scheckter, a braços com a instabilidade do Ferrari, acaba por ser ultrapassado por Arnoux e para nas boxes para trocar os pneus.

A vitória de Jabouille estava lançada, mas as grandes emoções ainda estavam por acontecer. O enviado especial do AutoSport descrevia, assim, a entusiasmante parte final do Grande Prémio: “Arnoux procurava aproximar-se do piloto canadiano, só que Villeneuve não estava pelos ajustes e por indicação da sua box procura salvaguardar-se de qualquer surpresa. Mas Arnoux aumenta a sua cadência, batendo sucessivamente o recorde do circuito, acabando por o fixar em 1m 09,16 segundos. A cinco voltas do fim o Renault cola-se ao Ferrari e a corrida vai viver o seu período de maior emoção. A partir daí os ataques mútuos sucedem-se. À maior potência do motor francês e a uma talvez maior velocidade de ponta, Villeneuve contrapõe a maior aceleração do 12 cilindros da Ferrari… e uma grande dose de temeridade.

Várias vezes se ultrapassaram. Várias vezes as rodas tocaram-se. Várias vezes o despiste esteve iminente.”

Na última volta Arnoux está à frente, mas, após uma travagem digna de um verdadeiro funâmbulo, Villeneuve coloca-se ao lado do piloto francês e consuma a ultrapassagem na parabólica, forçando a passagem. Uma ultrapassagem meio conseguida pela grande coragem e temeridade do homem da Ferrari e meio consentida por Arnoux que pretendia, acima de tudo, terminar a corrida bem colocado.

No final era o delírio! A satisfação dos milhares de espectadores pela vitória de um Renault misturava-se com o enorme prazer de se ter assistido a uma das mais empolgantes lutas vividas numa prova de Fórmula 1.

O Grande Prémio de França disputado a 2 de Julho no circuito de Dijon-Prenois fica, assim, como um importante marco para os anais da Fórmula 1 e todos os que tiveram o privilégio de assistir in loco à prova, ou através da transmissão televisiva jamais esquecerão a beleza de semelhantes imagens.

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Altos  e baixos

A Renault está associada à F1 como Construtor e fornecedor de motores em vários períodos desde 1977, quando arrancou como equipa oficial. Em 1983 passou a fornecer motores a outras equipas, até 1986, depois novamente entre 1989 e 1997. Regressou como Construtor em 2002, ganhou dois Campeonatos, em 2005 e 2006. Saiu novamente no final de 2010 mantendo-se como fornecedora de motores. Regressou em 2016 novamente como equipa oficial, mas as coisas não têm corrido como esperado. Foi em 2021 renomeada Alpine na F1, embora toda a estrutura seja exatamente a mesma de anteriormente com a Renault. Mudou mesmo só o nom por questões estratégicas do Grupo Renault.

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