WRC, Memórias do Rali da Suécia: No reino dos Vikings

Por a 9 Fevereiro 2023 10:02

O Rali da Suécia destaca-se no Mundial de Ralis pelo facto de ser o único relaxado totalmente em pisos de neve, mas a história do evento traz à memória um rol enorme de aventuras que vale a pena recordar. Aqui ficam alguns exemplos do rali mais gelado do WRC…

Depois do gelo do Monte Carlo a neve do Rali da Suécia! Foi assim desde o arranque do Mundial de Ralis em 1973 e só em 1989 isso não foi verdade. Receios da FISA, que em fevereiro houvesse falta de neve na Suécia, levaram à troca da ordem das provas, uma de poucas exceções ao longo da história do WRC.

A prova sueca sempre foi uma das mais espetaculares do calendário, e para o provar, nada melhor que os troços realizados em hipódromos, com vários carros em disputa direta como se de uma corrida se tratasse. Esse é um exemplo, mas a história da prova sueca está cheia de grandes memórias.

O ano de 1995 é um excelente exemplo. Havia forte tensão entre a comunidade japonesa do WRC, a Toyota vinha de dois títulos consecutivos, a Subaru dava início a uma fase vitoriosa da sua história nos ralis e a Mitsubishi estava a ganhar balanço com as sucessivas evoluções do seu Lancer.Todos os três construtores estavam de olho nos títulos, de marcas e pilotos, e todas as decisões das equipas eram tomadas em função disso mesmo. A Mitsubishi aproveitou uma série de circunstâncias para surgir na frente do rali, e o seu piloto número 1, Kenneth Eriksson, bem como o recém chegado Tommy Makinen eram os mais rápidos nos troços, pelo que de repente se tornou evidente que teria de haver uma escolha do piloto que ganharia a prova. As táticas começaram e o escolhido foi Eriksson.Mas as condições meteorológicas pioraram muito no último dia de prova e Makinen deu-se melhor, surgindo a dado momento na frente do rali, e isso preocupou a equipa. Aos pilotos foi ordenado que dissessem que estavam a lutar pela liderança, mas na verdade não estavam. Makinen tinha recebido ordem para abrandar e a tempestade deu-se no fim do rali quando a imprensa percebeu que estava a ser enganada. O Diretor da Mitsubishi, Andrew Cowan, foi cercado ao mesmo tempo que dava explicações vagas de como as táticas eram a forma como se ganhavam campeonatos. Deu muito brado na altura, pois ficou a perceber-se mais ou menos claramente como a questão desportiva dum evento podia ser manipulada.

Voltando atrás no tempo, a 1982, outro momento ‘iluminado’ no Rali da Suécia. O Presidente da FIA, Jean Marie Balestre, convocou uma conferência de imprensa, não no quartel General da prova, mas numa cidade a 100 Km dali, Eksharad. Apesar disso, estas eram sempre muito divertidas e interessantes, e por isso valia sempre a pena ir. Balestre queria fazer uma declaração a exaltar a excelente decisão da FIA em introduzir a nova regulamentação dos ralis, os Grupos B. Mas destacou o bom senso que era preciso ter na questão da obrigatoriedade de produzir 200 carros, depois duma questão vinda da ‘audiência’ de jornalistas. Na altura, Balestre, esclareceu a questão, referindo a necessidade de construir 20 carros de competição, e não 200, o que reforçou a certeza que os Grupos B seriam mesmo uma fórmula muito ‘reservada’. O mais curioso da questão foi que os seus colegas da FISA também não sabiam muito bem com o que contavam, pelo que perguntavam aos jornalistas o que dissera Balestre…

1995: Ordens de equipa

Em 1995, ordens de equipa controversas custaram a Tommi Makinen o rali, com a vitória a ir parar às mãos do local Kenneth Eriksson, o que deixou os alguns escandinavos à beira de um ataque de nervos, mas o finlandês na liderança do campeonato. Foi a primeira vez que o Rali da Suécia contou tanto para o Mundial de Pilotos como para o de Construtores e marcou o 100º rali da Mitsubishi no WRC, precisamente a marca que estaria no centro de toda a polémica. Os entusiastas locais ficaram chocados com a decisão que obrigou Makinen a abrandar e a penalizar no último controlo, mas toda a indignação foi ultrapassada no ano seguinte quando Kenneth Eriksson ganhou novamente, mas, desta vez, sem qualquer favor ou injustiça. Nesse ano, 31 segundos separaram os primeiros quatro classificados, todos guiando carros de marcas diferentes.

1966: o mais frio

Muito antes da prova entrar no Mundial de Construtores (em 1973), a edição de 1966 ficou marcada mais pelas temperaturas negativas com que se disputou do que propriamente pelos resultados. Com os termómetros a descerem aos 40 graus negativos, ainda hoje a prova é classificada como o rali internacional mais frio de que há memória. Mais do que um rali, tornou-se uma prova de sobrevivência.

1968: sem descanso

Já em 1968, o evento abriu a temporada internacional de ralis com um rali maratona com qualquer coisa como 1800 quilómetros de troços, disputados durante quatro dias e três noites. Uma verdadeira epopeia, agravada pelo facto de durante o rali, que se correu ininterruptamente ter havido apenas uma noite, a meio da prova, para descanso.

1979: 1ª de um turbo

Outra ocasião emblemática foi o que coroou Stig Blomqvist e o seu Saab 99 Turbo, no ano de 1979, com a primeira vitória no WRC de um carro turbo. Naquela altura, os turbos era vistos sobretudo como um chamariz e poucas pessoas sabiam como trabalhava a tecnologia. Não foi uma vitória totalmente convincente de Blomqvist. Durante o rali, o sueco andou à frente Marrku Alen (Fiat), Hannu Mikkola (Ford), Anders Kullang (Opel) e Ari Vatanen (Ford) antes de, a meio do rali, o Saab saltar para a frente e já de lá não sair mais. A questão é que, até aí, Blomqvist já tinha ganho o rali quatro vezes de forma tão clara que esta era muito mais uma demonstração dos dotes do sueco do que do carro. Ficou a ideia generalizada que Blomqvist venceu apesar de ter um carro turbo e não por ter um carro turbo!

1980: tração Quattro

Algumas situações memoráveis, podem, se bem analisadas, não ser, efetivamente, totalmente surpreendentes. Quando Hannu Mikkola se tornou o primeiro piloto a ganhar um rali d Mundial de Ralis com um carro de quatro rodas motrizes não foi exatamente uma surpresa. Apenas três semanas antes, Mikkola tinha liderado o Rali de Monte Carlo, chegando a ganhar mais de um minuto por troço. Por isso, quando chegou ao Rali da Suécia (um evento que nesse ano de 1981 apenas contava para o Mundial de Pilotos) e liderou do princípio ao fim, não causou surpresa. Quanto muito havia ainda algumas dúvidas, mas nove anos antes, num Rali dos EUA, o Press-on-Regardless, quando o Mundial estava ainda longe de espreitar os EUA, a verdade é que um Jeep Wagonner já vencia ralis com Gene Henderson. Precisamente no ano que precedeu o arranque do Mundial de Ralis para Construtores. Por tudo isto, terá sido a vitória de Mikkola realmente histórica?

1982: Digno de Hitchcock

Se há uma edição do Rali da Suécia que merece destaque, essa será certamente a decorrida em 1982 que consagrou mais uma vez Stig Blomqvist. Até 1981, os Audi Quattro tinham dominado de tal forma que a habilidade do piloto que os guiavam passou praticamente para segundo plano. Ao ponto do antigo Campeão do Mundo, Walter Röhrl, ter dito uma vez que até um macaco poderia vence rum rali a guiar um Audi Quattro. Uma citação desapropriada, mas que expressava um sentimento generalizado em relação ao domínio do carro alemão baseado no poder do seu motor, mas sobretudo no poder de tração das suas quatro rodas motrizes. E é neste ambiente que, à chegada do Rali da Suécia de 1982, duas super-estrelas do momento – Hannu Mikkola e Stig Blomqvist – se encontram com máquinas equivalentes para medir forças (ainda que Blomqvist na condição de privado). Durante o rali, Blomqvist ganha 16 troços, Mikkola sete e não sobra mais nenhuma para qualquer outro piloto. O sueco acaba por ganhar o rali, mas não foi simples pois chegou a cair para último após perder três minutos com um problema elétrico num dos primeiros troços e ainda foi penalizado cinco minutos por falsa partida numa das especiais. Blomqvist relembra que “no início do segundo dia, já tínhamos subido até segundo, atrás do Audi do Hannu Mikkola e, sinceramente, por ali esperávamos ficar até ao final do rali pois não havia qualquer hipótese de ganhar o rali ao Hannu e estava já acordado previamente que eu não iria tentar roubar a vitória ao piloto oficial da marca que estava na luta direta pelo título de Pilotos. Mas, subitamente, tudo se precipitou! Blomqvist faz questão de referir que “nunca esquecerei o que aconteceu na 21ª especial, o maior troço do evento que precedia as quatro últimas curtas classificativas. Primeiro passamos pelo Mikkola numa berma. Não podia acreditar. Ele já tinha uma boa vantagem sobre mim (2m11s). Quando chegámos ao final do troço, os rádios da equipa não estavam a funcionar bem. Mas relatos afirmavam também que Michele Mouton (na altura terceira classificada) também tinha saído de estrada no mesmo sítio do Hannu! O meu navegador, ‘Capitão’ Cederberg disse-me que devíamos ficar calados e simplesmente chegar à zona de assistência, na liderança, como se nada se tivesse passado. Parece que o Hannu reduziu o andamento e despistou-se. E quando já tinha praticamente conseguido sair do ‘buraco’ onde tinha caído a Michele também saiu de estrada naquele local e empurrou-o novamente para lá, acabando ela do outro lado da estrada”. E eis que terminou a teoria da conspiração sobre os carros de quatro rodas motrizes. A partir daí, os carros de tração integral passaram a ser guiados a fundo, de lado, a voar baixinho ou de tejadilho para baixo, na máxima força para ganhar ralis. O Rali da Suécia de 1982 acabou por provocar uma serie de alterações na disciplina dos ralis.

1995: ordens de equipa

Em 1995, ordens de equipa controversas custaram a Tommi Makkinen o rali, com a vitória a ir parar às mãos do local Kenneth Ericksson, o que deixou os alguns escandinavos à beira de um ataque de nervos, mas o finlandês na liderança do campeonato. Foi a primeira vez que o Rali da Suécia contou tanto para o Mundial de Pilotos como para o de Construtores e marcou o 100º rali da Mitsubishi no WRC, precisamente a marca que estaria no centro de toda a polémica. Os entusiastas locais ficaram chocados com a decisão que obrigou Makinen a abrandar e a penalizar no último controlo, mas toda a indignação foi ultrapassada no ano seguinte quando Kenneth Ericksson ganhou novamente, mas, desta vez, sem qualquer favor ou injustiça. Nesse ano, 31 segundos separaram os primeiros quatro classificados, todos guiando carros de marcas diferentes.

2004: Queda de um mito

Um dos grandes mitos do rali foi quebrado em 2004 quando SébastienLoeb se tornou no primeiro piloto não-nórdico a vencer o Rali da Suécia. Nos últimos anos, pilotos noruegueses e finlandeses têm sido bem sucedidos no evento. Na verdade, a última vez que um piloto sueco venceu a ‘sua’ prova foi em 1997, num Subaru. Curiosamente, na altura, mais do que ter sido o primeiro não nórdico a triunfar na Suécia, SébastienLoeb valorizou bem mais o facto de ter sido a sua primeira vitória fora do… asfalto. Para ele, nem sequer contou muito a especificidade do evento, não interessava se o piso era branco ou acastanhado. O WRC mudou muito ao longo das décadas. Veja-se por exemplo do facto do primeiro piloto sueco a surgir na classificação do ano passado ter sido PontusTidemand, no 17º lugar. Ajuda ter tido só um WRC nas mãos, mas não explica tudo.

2008: Força da juventude

Aos 22 anos e 313 dias, Jari-Matti Latvala tornou-se no mais jovem vencedor de sempre em provas do WRC, suplantando o seu ídolo Henri Toivonen que, com 24 anos e 86 dias, conquistara, a até então mais jovem vitória numa prova do Mundial, precisamente no Rali da Grã-Bretanha de 1980. Curiosamente, este foi um evento que teve apenas cerca de 50 por cento da prova com pisos de neve, já que se tratou duma prova extraordinariamente quente para a média habitual em fevereiro por aquelas paragens. Os habitantes locais adoraram o verão ter chegado mais cedo, os pilotos tiveram de se adaptar a uma nova realidade, mas a Pirelli teve um fim de semana de pesadelo, pois na terra, os pregos dos pneus só agarravam quando havia gelo.

Como curiosidade final, o facto da prova de 1977, ganha por Stig Blomqvist (Saab 99 EMS) ter sido a mais lenta da história do Rali da Suécia, com uma média de 58.72 km/h, quase metade do recorde estabelecido por Marcus Gronholm (Peugeot 206 WRC) em 2003, com 116.18 km/h. Quase o dobro!

Rali da Suécia 1981

Rali da Suécia 1982

Rali da Suécia 1983

Rali da Suécia 1984

Rali da Suécia 1985

Rali da Suécia 1986

Rali da Suécia 1992

Rali da Suécia 1993

Rali da Suécia 1994

Rali da Suécia 1995

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