RUDOLF CARACCIOLA: O verdadeiro Rei da Chuva


Para si, Ayrton Senna foi o paradigma do piloto corajoso à chuva? O verdadeiro acrobata? Então leia esta história – e fique com a certeza de que o verdadeiro Rei da Chuva tinha outro nome: Rudolf Caracciola, mais conhecido por “Rudi”. Grande Prémio da Alemanha de 1926, primeira edição da prova, nos inenarráveis tempos da “Fórmula Libre”, em que não existiam limites para os motores, cilindrada e potência.

O circuito era outro paradigma: nada mais nada menos que AVUS (assim mesmo, com maiúsculas), um circuito de testes para a indústria automóvel criado nos arredores de Berlim e formado basicamente por duas longas rectas paralelas, unidas por duas curvas parabólicas com “banking”. Para Caracciola, era a sua primeira prova como piloto oficial da Mercedes, de que era vendedor – as suas experiências anteriores eram provas ocasionais, em fins de-semana livres na sua actividade e sob autorização expressa dos seus patrões. Na largada, o novato deixou o motor ir abaixo e o seu mecânico, Otto Salzer, teve que sair para empurrar o carro. Ficou em último dos 44 carros presentes. Mas eis que a chuva começou a cair e os 500 mil espectadores viram horrorizados os carros irem desistindo, em despistes violentos, saltando para fora dos “bankings” e matando pessoas.

Na frente, ficou então um desconhecido, Caracciola – cujo Mercedes começou de repente a falhar. Nas boxes, o piloto tirou e limpou, uma a uma, todas as oito velas. E regressou à pista. Andando sempre a fundo, sem nada conseguir ouvir, quando cruzou a linha de chegada, recebeu com estupefação a notícia de que tinha ganho a prova. Estava exausto, ao fim de três horas consecutivas sempre a fundo. Caracciola, filho de um hoteleiro e em cuja linhagem familiar estava um príncipe napolitano que um dia conquistou um castelo na cidade de Koblenz, instalando-se na região, foi, além de “Regenmeister” (Mestre da Chuva), um dos maiores pilotos anteriores à Guerra.

Campeão Europeu de Montanha em 1930, venceu o título europeu de pista por três vezes: 1935, 1937 e 1938. Exilou-se na Suíça durante a Guerra e, em 1946, foi convidado a participar nas 500 Milhas de Indianapolis. Nos treinos, obrigado pelos regulamentos a utilizar um capacete metálico, abdicando da sua touca de seda tradicional, “Rudi” teve um acidente brutal, fracturando a base do crâneo e ficando em coma durante dez dias. Sem o capacete teria morrido; agradecida, depois da sua morte, com um cancro, a sua viúva doou ao museu de Indianapolis a quase totalidade dos seus troféus.

Rudolf Caracciola atingiu os 432 km/h em 1938

28 de Janeiro de 1938, 11h47m: o Auto Union Streamliner, preparado para recordes de velocidade e pilotado por Bernd Rosemeyer, vai com a roda traseira à relva da auto-estrada Frankfurt-Darmstadt, fica sem controlo e esmaga-se contra o talude de uma passagem superior, 473 metros depois. Cuspido, o piloto morre de imediato. Tinha 29 anos e era a jovem esperança do automobilismo alemão e do domínio nazi total, mesmo nos desportos motorizados.

Rosemeyer tentava bater o recorde mundial de velocidade para um carro, em terra firme. Não conseguiu: a sua mais rápida tentativa ficou marcada a 429,6 km/h. Poucas horas antes, o seu grande rival Rudolf Caracciola, num Mercedes-Benz, foi cronometrado a 432 km/h. Rosemeyer viajava a cerca de 440 km/h quando teve o seu acidente fatal, ainda hoje inexplicado – testemunhas no local afirmaram que o carro ficou descompensado devido a uma rajada de vento, mas existe documentação que parece provar que os painéis laterais do Auto Union, cuja carroçaria foi especialmente alterada para a ocasião, já não estavam nas condições iniciais, após duas tentativas anteriores efectuadas pelo piloto.

O Auto Union de Rosemeyer era um carro de Grand Prix (como se chamava então a “F1”), o mesmo com que Luigi Fagioli tinha corrido en AVUS, em 1937 e que, entre Junho e Outubro desse ano, Rosemeyer já tinha usado em várias outras tentativas de recorde. Além da carroçaria, a cilindrada do motor tinha crescido de 6 litros para 6,5, permitindo que a potência subisse dos 525 cv originais para 560. De acordo com as relações da nova caixa de velocidades, o carro podia alcançar os 456 km/h. Nunca conseguiu. Só agora, com a BAR, o recorde que, afinal, é de Caracciola, vai tentar ser batido. Os recordes de velocidade em terra actuais, acima dos 1000 km/h, são de máquinas especiais, com motor de foguete, não de automóveis “normais”.

Ativar notificações? Sim Não, obrigado