LECLERC E OCON: OS EXTREMOS TOCAM-SE NA F1

Por a 17 Dezembro 2018 09:11

O Mundial de Fórmula 1 de 2018 ficou marcado por dois jovens em ascensão, Charles Leclerc e Esteban Ocon, em que um brilhou ao ponto de seduzir a Ferrari, e o outro brilhou em pista… até ficar sem lugar na Fórmula 1. O lado bom e o lado mau da Fórmula 1.

Poderíamos aqui falar sobre os desmandos da Ferrari, os erros de Sebastian Vettel, enfim, teríamos pasto suficiente para atiçar o fogo da análise ao título perdido pela casa de Maranello e pelo tetra campeão alemão. Também não vale a pena discutir neste momento quem foi mordomo e quem não vestiu o fato e o laço e como Mercedes e Ferrari chegaram a formas diversas de ordens de equipa, com prejuízo de um ou outro piloto ou até da imagem da equipa. Mas como disse Toto Wolff, muitas vezes é preferível ficar como o mau da fita que fazer figura de parvo no final da temporada.

Enfim, vamos olhar para uma das ‘novelas’ de uma temporada de Fórmula 1 que tem sido, simplesmente, fantástica que começou com a Ferrari na mó de cima e terminou com a Mercedes a ganhar. Vamos olhar para a ascensão meteórica de Charles Leclerc e o trambolhão dado por Esteban Ocon, que não competitivo, pois continua a ser dos melhores pilotos do plantel, mas que, também, mais do que provavelmente, vai ficar sem lugar em 2019. Aqueles que são os altos e baixos mais significativos da temporada de 2018.

O nascer de uma estrela

Como diria o anúncio, “o algodão não engana” e Charles Leclerc é um verdadeiro meteoro na Fórmula 1 e, provavelmente, o melhor piloto dos programas de jovens pilotos apoiados pelos construtores como a Ferrari, Mercedes e Red Bull, em muito tempo.

Campeão na GP3 e na Fórmula 2, cumpriu a sua temporada de estreia na Fórmula 1 este ano com a Sauber Alfa Romeo. Em 2019 estará ao volante do Ferrari SF72H lado a lado com Sebastian Vettel. Wow! Querem mais velocidade ascensional na carreira que isto?! A pergunta que todos temos de colocar é: quais foram as razões para a Ferrari ‘desfazer-se’ de Kimi Raikkonen e dar o lugar a um miúdo que ainda tem as fraldas agarradas?

Numa Fórmula 1 onde ultrapassar não é tarefa fácil, a qualificação é essencial, e para se conseguir lugar nas primeiras filas da grelha de partida é necessário esticar um pouco mais a performance numa só volta. Leclerc aprendeu isso à sua custa, com alguns erros na primeira fase da temporada, sendo hoje um dos melhores nesse exercício. Raikkonen tem como grande dificuldade, nesta fase da carreira, fazer uma volta de qualificação limpa quando está sobre pressão. Vettel, por vezes, também sucumbe à pressão. Outra mais valia de Leclerc reside na sua capacidade de ser consistente, nomeadamente, quando chega à Q2. E com um carro que é, apenas, melhor que McLaren e Williams, o monegasco tem feito exibições de classe durante a qualificação.

Charles Leclerc é dos pilotos do pelotão da Fórmula 1 que melhor gere o início de corrida – raramente é apanhado nas confusões da largada tendo sido vítima inocente dos acidentes na Hungria e na Bélgica – e consegue, mesmo com armas inferiores, arrancar excelentes resultados.

E na memória de todos ficam, certamente, os duelos que já teve este ano com um dos melhores, Fernando Alonso. O que fez no Azerbaijão e em Espanha face ao piloto da McLaren ficará para sempre como uma bela referência no seu palmarés. Além disso, é um piloto que parece estar, sempre, no lado certo das decisões e escolhe as melhores opções para, durante a corrida, poder transformar uma qualificação menos conseguida, devido ao carro, em pontos valiosos para a equipa.

Naturalmente que pilotar para a Ferrari e ter como colega de equipa Sebastian Vettel, é bem diferente de conduzir um Sauber e ter como companheiro Marcus Ericsson. A pressão será muito maior, mas Charles Leclerc já provou que sabe reagir a essa pressão.

Recordemos o GP da China, terceira prova do Mundial, depois de um par de erros de Leclerc nas qualificações. Não hesitou em se penalizar, criticando a sua postura e admitindo que estava com dificuldades em se adaptar à Fórmula 1.

Não meteu a cabeça na areia e a verdade é que chegou ao Azerbaijão e colocou o Sauber na Q2 e acabou a corrida no sexto lugar. Saiu do buraco que escavou na China para a glória no Azerbaijão e, a partir dai, nunca mais foi apanhado a dar um passo em falso. Isto prova, de forma inequívoca que é um piloto mentalmente forte e capaz de dar a volta a uma situação menos boa de uma forma impressionante. Não são todos os pilotos que depois de passarem o fim de semana a serem pressionados pela imprensa sobre a possível ascensão à Ferrari, chegam ao Q3 com um carro que deveria ficar pela Q1 e terminam nos pontos essa corrida. Aconteceu a Leclerc na oitava corrida do campeonato, o GP de França!

Nesta altura pode o caro leitor mais conhecedor dizer que Charles Leclerc conheceu um ponto baixo durante a temporada com várias corridas sem pontuar. É verdade, mas não conseguirá encontrar nesse período alguma falta de Leclerc, tudo ficando a dever-se a erros da equipa e à fragilidade competitiva do Sauber em determinadas pistas. E se compararmos a sua época com a de Ericsson, o monegasco sai, claramente, por cima. Podem sempre dizer, também, que bater o sueco não é grande cartão de visita, mas convirá lembrar que Marcus Ericsson esteve muito bem na luta interna contra Felipe Nasr e Pascal Wehrlein nas duas épocas anteriores, justificando com isso e com a mala dos dólares, claro, a sua presença na equipa Sauber.

A sua maturidade e classe podem ser destacadas por outra qualidade do piloto nascido no Mónaco: a sua adaptabilidade ás situações. Leclerc consegue perceber quando deve recuar e não forçar em demasia. Por causa disso foi acusado por alguns observadores ser um piloto fraco á chuva e como exemplo dão, sempre, o GP da Alemanha. Saiu de pista de intermédios e fez piões com pneus de piso seco. Quais as razões para isso? Erros atrás de erros da equipa, que o colocou em pista seca com pneus intermédios que estavam arrasados quando começou a chover. Vettel fez melhor? Não, entregou uma vitória certa a Lewis Hamilton? Devemos olhar, antes, para aquilo que o monegasco fez nas sessões de treinos com piso molhado onde deu, literalmente, água pela barba a pilotos com carros mais competitivos que o seu.

Mas há duas características que são inauditas em pilotos tão jovens e que ajudam a formar um piloto que vai dar muito que fazer a Sebastian Vettel a partir de 2019: consistência e inteligência.

Charles Leclerc raramente conhece um momento menos bom, mostrando-se sempre otimista e pronto a trabalhar para ser bem sucedido. A sua adaptabilidade permitiu-lhe ser consistente ao longo de todo o ano, em pistas absolutamente desconhecidas, traçados citadinos, circuitos de elevada velocidade, enfim, Leclerc sempre esteve em excelente plano, mesmo nas duas primeiras provas da temporada (Austrália e Bahrain) onde confessou estar com dificuldade em adaptar-se. A partir da China, Leclerc destacou-se, sempre, mesmo onde a sua ferramenta (leia-se o Sauber C37/Ferrari) era das menos competitivas do plantel.

Quando chegou a notícia que seria piloto da Ferrari em 2019, o piloto referiu que “as pessoas dizem que a pressão na Ferrari será de outro nível, mas uma das minhas maiores qualidades é a força mental”. Quem fala assim… Mas o piloto deu mais mostras de classe e inteligência.

Quando lhe foi perguntado se poderia fazer o mesmo a Vettel que Hamilton fez a Alonso na sua época de estreia, na McLaren, em 2007, respondeu que “penso que essa é uma das perguntas mais importantes para muitas pessoas: saber se estou pronto ou não. Esteja ou não, não o posso dizer neste momento, mas se olharmos para o que fez o Lewis em 2007, foi direitinho ao topo. E eu acredito que se formos bons o suficiente – e claro que a experiencia é fundamental! – num qualquer carro, seremos bons quando chegamos a um dos melhores carros do plantel.” E para que não restem dúvidas sobre a sua inteligência e maturidade, rematou “se no próximo ano os resultados não forem bons o suficiente para permanecer na Ferrari, será normal que desça um degrau, mas aí a razão será não ter estado á altura e não merecer um carro como o Ferrari. É assim que vejo as coisas!” E deixou claro que não espera facilidades na Ferrari. “Não, não acredito que tenha um ano de aprendizagem na Ferrari. Tenho de lá chegar e ser imediatamente competitivo!”

Portanto, a chegada de Charles Leclerc à Ferrari é totalmente justa e justificada. E não tenhamos ilusões: o piloto nascido no Mónaco, É o futuro da Ferrari! E nem sequer coloco na mesa o argumento da relação custo/beneficio que será sempre favorável a Leclerc, pois irá ganhar menos que Kimi Raikkonen. Será o futuro da Ferrari porque na casa italiana decidiram seguir o caminho certo ao invés de fazer como em outras ocasiões. Pegaram na conta bancária, esbanjaram milhões para contratar pilotos ganhadores que, afinal, não o foram. Raikkonen venceu nos EUA, é verdade, mas quantos fim de semana esteve profundamente apagado? Sem dúvida nenhuma, Leclerc tem tudo para ser campeão do Mundo de Fórmula 1 e tem pela frente ainda muitos e muitos anos de competição. Sendo a Ferrari uma das equipas que mais promove a estabilidade da dupla de pilotos, a casa de Maranello tem assegurada uma das mais fortes combinações para os próximos anos. E com Vettel a caminhar, naturalmente, para o ocaso da carreira, podem Maurizio Arrivabene e Louis Camilieri, ter encontrado o futuro líder da Scuderia Ferrari. Porém, nunca esquecer que foi Sergio Marchionne quem olhou mais adiante e exigiu que Charles Leclerc chegasse á equipa Ferrari já em 2019. Felizmente que os homens que gerem a Ferrari respeitaram o seu pedido, pois pode estar aqui em Charles Leclerc o líder da Ferrari para os próximos anos! Um líder que apesar de confiante nas suas capacidades, consegue se manter humilde. “Penso que a Ferrari teve uma boa temporada e posso aprender muito com isso e na próxima época conseguir ter a performance esperada de alguém que está numa equipa de topo. Isto porque não posso dizer que não vou aprender nada pois tenho tanto ainda a aprender, tanto a conhecer e a melhorar que seria ridículo pensar o contrário. Mas também sei que após este ano na Sauber estou mais preparado do que estava no começo de 2018.”

 

O caso de Esteban

“Não estou frustrado, antes desapontado. Não estou chateado com ninguém nem contra ninguém, mas trabalhei muito para chegar aqui, continuo a trabalhar muito para ter o desempenho que tenho tido, tenho lutado muito para me manter no topo e… as minhas possibilidades de ficar na Fórmula 1 reduziram-se a zero!” Como é possível que um piloto da qualidade de Esteban Ocon, protegido da Mercedes, estar nesta situação? Ainda por cima quando outro protegido da Mercedes, George Russell, vem diretamente da Fórmula 2 para a Williams, como é que Ocon, com dois anos de Fórmula 1, fica sem volante em 2019?

Em primeiro lugar, a opção Williams não seria muito interessante para o piloto francês devido à falta de competitividade da equipa de Grove, servindo melhor aos propósitos de Russell, estreante na Fórmula 1 e sem responsabilidades acrescidas por estar no ano de estreia em 2019 e, sobretudo, porque não se esperam grandes cometimentos por parte da Williams. O outro piloto escolhido, como se sabe, foi Robert Kubica, que leva muito dinheiro, talento e também muita incerteza…

Tendo a sua carreira sido suportada pela Mercedes, Ocon não pretende virar as costas a Toto Wolff, como fez Pascal Wehrlain recentemente, após desaguar num beco sem saída com a retirada da Mercedes do DTM. Estará na Fórmula E. Mas não é isso que Ocon deseja e o piloto francês sempre esteve disposto a um ano sabático de Fórmula 1.

Muitos consideram esta fidelidade indesejada e um sério entrave às chances de Ocon se manter na F.1. “Nunca falei com o Toto sobre a possibilidade de deixar as fileiras da Mercedes. O que eu sei é que tenho um contrato com a Mercedes e nunca falámos nisso.” Para Ocon, “o que deveria ser tomado em linha de conta são os resultados e o trabalho que o piloto coloca e o esforço que faz para ter excelentes performances. Tudo o que está em redor do desporto e fora das pistas não deveria ser levado em conta.”

A Racing Point Force India já mostrou interesse em manter Ocon como terceiro piloto. Otmar Szafnauer disse claramente que “será um gosto poder ajudá-lo de alguma forma, seja como terceiro piloto, seja oferecendo-lhe tempo no simulador, pois precisamos de um piloto com qualidade para nos dar indicações precisas.” E sobre o facto de Ocon ficar um ano de fora, Szafnauer lembrou Kimi Raikkonen. “Quanto tempo ele esteve fora? Dois anos? Mas regressou e em excelente forma. O Esteban é suficientemente jovem e com talento de sobra para regressar em 2020 em pleno.”

Enfim, Esteban Ocon perdeu a oportunidade de estar na Fórmula 1 em 2019 porque se manteve fiel à Mercedes e acabou por escorregar na incapacidade de Toto Wolff encontrar um lugar competitivo para o piloto francês que, recordamos, assinou o seu primeiro contrato aos 14 anos com a Gravity Sports Management, uma empresa da esfera da equipa… Renault F1.

Por isso mesmo fez carreira nas fórmulas da casa francesa, mas o seu palmarés exibe o primeiro título apenas na Fórmula 3 em 2014. Depois, Ocon começou a trepar até à Fórmula 1, com a vitória na GP3 em 2015 (embora tenha ganho apenas uma vez), a entrada nas fileiras da Mercedes que o levaram até ao DTM, embora continuasse a ser piloto de reserva da… Renault. Chegou à Fórmula 1 através da Manor, depois de testes e sessões de treinos livres com a Lotus F1. Após o desaparecimento da Manor, Ocon entrou para a Force India, como contrapartida para o fornecimento de motores Mercedes à equipa indiana.

Talentoso, coriáceo (que o diga Sérgio Perez, seu colega de equipa!), mas ponderado naquilo que diz, Esteban Ocon joga tudo na entrada na equipa Mercedes em 2020, apostando que Valteri Bottas não é o futuro da Mercedes e que o finlandês sairá da equipa principal no final de 2019.

“Vamos ver qual será a solução para mim. Claro que ser terceiro piloto não é lá grande coisa, mas se forem estes os quilómetros que poderei fazer no próximo ano sem ter um lugar no plantel, serão bem vindos. Veremos.” E a fibra de que é feito fica clara quando Esteban Ocon agradeceu “a todos as simpáticas mensagens de apoio que recebi” lembrando que “já estive em situações difíceis anteriormente e sempre consegui dar a volta por cima. A minha carreira nunca foi fácil como todos sabem.”

Mas isso não o demove. “Posso vos garantir que não vai ser agora que vou desistir. A motivação, apesar de tudo, está forte e os meus anteriores rivais estão em carros bons o que me faz ter ainda mais vontade de dar a volta a esta situação. Eu sonho com a F1, falo de Fórmula 1, como Fórmula 1, bebo Fórmula 1, jogo Fórmula 1 e só penso na Fórmula 1. Nasci para competir e o meu objetivo foi e sempre será, ser campeão do Mundo de Fórmula 1!”

 

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