Ao lado de Didier Pironi: A 70 por cento no Colibri


Por Rui Freire

Como manda a tradição, sexta feira é dia de descanso no GP do Mónaco. A necessidade de abrir as ruas do Principado à circulação automóvel faz com que os treinos livres sejam antecipados para quinta feira e apenas no Sábado se regressa ao “trabalho”. E este dia livre é quase sempre aproveitado pelos mais

diversos patrocinadores para promoverem campanhas mediáticas, tal como a Elf fez nesse ano de 1987. O convite era aliciante e irrecusável: experimentar a sensação de velocidade no mar a bordo do Colibri, barco que Didier Pironi utilizava no Campeonato do Mundo de Offshore e que era patrocinado pela petrolífera francesa.

Confesso que, num primeiro “approach” olhei de soslaio para semelhante possibilidade. Já tinha visto e principalmente ouvido o monocasco junto ao porto do Mónaco e considerei que “aquilo” não deveria ser pêra doce. Mas para meu espanto, o meu nome lá estava na lista de convidados da Elf, inscrito à

revelia pela sábia mão do meu companheiro destas andanças, Sérgio Veiga, enviado especial de A Bola.

Claro que não tive outro remédio e na manhã de sexta-feira fiz-me ao mar. Com o coração ligeiramente apertado (para não lhe chamar outra coisa) lá entrei para dentro do Colibri, encaixando-me, em pé, no lugar traseiro destinado ao navegador, enquanto o Wagner Gonzalez, um jornalista brasileiro radicado

em Inglaterra e colaborador do AutoSport ocupava o espaço destinado ao trothleman. Didier Pironi sorriu, perguntou-nos se estávamos confortáveis, forneceu algumas explicações prévias sobre o barco e lá foi dizendo que o mar estava muito calmo, situação ideal para um catamaran e não para um monocasco. Contudo iria provocar umas ondas para provocar mais alguma excitação, embora apenas fosse explorar a performance do Colibri a menos de 70 por cento.

Ao acelerar o barulho era unsurdecedor e ao movimento de Pironi a empurrar a alavanca do acelerador para a frente correspondia mais e mais velocidade. Até que chegou o primeiro salto: o Colibri deslocou da água, Pironi cortou de imediato a aceleração e só se ouvia um silvo enquanto planávamos sobre o mar. Depois o violento embate na água e o barulho dos motores, de novo. Olhando para a frente só via a cabeça do Wagner aparecer e desaparecer à medida que saltávamos. Curvas apertadas para criar pequenas ondas e mais alguns saltos. Um quarto de hora de velocidade pura e dura e o regresso ao pontão de embarque, não sem antes Pironi ter aproveitado para molhar todos os que aguardavam a sua vez.

Uma experiência inesquecível e recordo ainda a última pergunta que lhe coloquei: «estes embates violentos na água não são prejudiciais para as tuas pernas?» A resposta foi pronta: «Isto que sentiste não é nada comparado com mares mais agitados, mas mesmo assim é uma excelente fisioterapia.»

Um rápido aperto de mão, um adeus que não sabia ser definitivo. Esta foi a última vez que vi Didier Pironi. Três meses depois morria num pavoroso acidente ao largo da ilha de Wight numa prova do Mundial de Offshore.

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